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    Mão Santa ao lado de Jair Bolsonaro: "sou o homem mais preparado para presidir o Brasil.” Sem chances de concorrer à presidência, ele espera pela candidatura do deputado. FOTOS: 180 GRAUS

questões eleitorais

Início de namoro

O verborrágico e folclórico Mão Santa quer ser o vice de Bolsonaro na corrida presidencial de 2018

Vanessa Mendonça | 01 set 2017_16h58
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“Mão Santa”, como é conhecido Francisco de Moraes Souza, ex-senador da República, primeiro governador cassado do país e atual prefeito de Parnaíba, a segunda maior cidade do Piauí, é conhecido por suas ações superlativas. Trocou de partido sete vezes, proferiu mais de mil discursos na tribuna do Senado entrando para os anais da Casa como um orador profícuo e autor de bordões grudentos (“atentai bem!”, antes de falas eloquentes; “ô, luiz inácio!”, quando se referia ao ex-presidente Lula). Aos 74 anos, ele planeja outra jogada hiperbólica: quer concorrer à vice-presidência da República em 2018 na chapa do deputado Jair Bolsonaro, o militar reformado do Exército que aparece em segundo lugar nas pesquisas eleitorais.

Em abril, Bolsonaro esteve em Parnaíba e chamou sua relação com Mão Santa de “o início de um namoro”. Depois de cumprimentar o prefeito com uma continência militar, a seu estilo, Bolsonaro remendou: “Mas um namoro hétero.” Em entrevista ao canal de tevê Cidade Verde, ao vivo, disse: “A intenção é basicamente um namoro e, se transformar em um noivado no futuro, será motivo de grande honra e satisfação.” A proposta estava no ar.

Na ocasião, diante do pretendente, Mão Santa desconversou (“eu sou casado com Adalgisa e fiel a ela”, disse). Quatro meses depois do flerte inicial, numa noite de agosto, quando o prefeito de Parnaíba me recebeu em seu gabinete, ele parecia mais propenso à infidelidade.

Passava das nove da noite quando terminou a última reunião do dia. Vestindo calça jeans, terno escuro sem gravata, camisa branca aberta até o terceiro botão, ele disse: “Se você é seminarista, quer ser papa; se é soldado, quer ser general; se entrou na política, tem que almejar [a disputa pela Presidência].”

Durante a conversa, Mão Santa se autoproclamou “o homem mais preparado para presidir o Brasil – à exceção de Fernando Henrique Cardoso”. Sem convites para o que seria o grande feito de sua vida, ele agora cola em Bolsonaro para testar terreno para a vice-presidência. “Ele disse que eu seria bom vice, e ele é um grande líder. Eu me preparei, mas não tenho ansiedade. Então, está lançado.”

A recepção ao deputado federal em Parnaíba foi intensa: reunião aberta ao público pela manhã, almoço vagaroso na capitania dos portos, solenidade à noite com entrega de homenagem ao visitante sob discursos inflamados seguidos de gritos de “Mito! Mito!” vindos da plateia.

Assim como Bolsonaro, Mão Santa também foi militar. Serviu ao Exército em Fortaleza, no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva, quando cursava Medicina. Lembra da época como “muito boa”, quando, diz, aprendeu “disciplina, firmeza, dignidade e hierarquia”. “O Bolsonaro empolga o povo quando fala da violência. O pessoal acredita que ele pode mudar isso por sua vida de militar. O Brasil está uma zorra!”

A recepção ao candidato terminou tarde. “Passamos o dia juntos, encheu de gente aqui. Ele chegou com 4% de intenções de voto, saiu com 18%. Para você ver o eco da Parnaíba”, ironizou o prefeito.

 

Mão Santa foi conduzido à política partidária na década de 70 pelas mãos de Petrônio Portella, uma das poucas figuras políticas do Piauí a alcançar cargos de relevo na política nacional. O ex-ministro da Justiça teria dito, segundo o próprio Mão Santa: “Você vai ser tudo na política do Piauí.”

Se não foi tudo, foi muito. Em seu segundo mandato como prefeito da maior cidade do interior do Piauí, ele também já foi deputado estadual e governador (duas vezes). Foi cassado em novembro de 2001, acusado de abuso de poder econômico e político na campanha de 1998, quando foi reeleito governador.

Médico cirurgião – daí veio o apelido quando foi chamado por um ex-paciente de “doutor das mãos santas” – se diz leitor voraz, e recorre ao filósofo grego Aristóteles para ponderar que, mesmo feliz como médico na Santa Casa de Parnaíba – função que retomou após a inesperada derrota eleitoral de 2010, quando perdeu a vaga ao Senado –, “o homem é um animal político”.

Foi essa natureza que o levou a disputar a Prefeitura de Parnaíba em 2016, mesmo desenganado politicamente, sem apoio local e contra um candidato petista apoiado pelo governador do Estado. Venceu. Agora, a disputa em uma chapa majoritária ao Planalto mexe com seus brios.

Bolsonaro busca em Mão Santa o dom que parece lhe faltar: o do contato direto com o povo. Quando foi governador, o piauiense abriu as portas do Palácio Karnak, em Teresina. O povo costumeiramente tomava seus jardins e salões, seja durante festividades, seja durante protestos. À época, lançou programas populares com nomes autocongratulatórios: Sopa na Mão, Luz Santa, Água Santa. Cumpria agendas externas sempre priorizando o contato com a população, sobretudo nos discursos em calçadas das periferias.

A plataforma moral de uma chapa Bolsonaro-Mão Santa já está desenhada: o discurso anti-PT, a defesa da “família tradicional” e a invocação do nome de Deus devem dar o tom.

 

O convite de Bolsonaro foi inesperado, mas não inédito, segundo o próprio Mão Santa. Na década de 90, Antônio Britto, então governador do Rio Grande do Sul, teria tentado uma dobradinha com ele, governador do Piauí na época, na disputa ao Palácio do Planalto. Não colou. O segundo convite, ainda segundo Mão Santa, teria vindo de Alckmin, às vésperas da campanha de 2006. O governador de São Paulo deixou de lado o sobrenome para parecer mais popular, surgindo em seu material de campanha somente como Geraldo, e buscava um nome do PMDB, forte no Nordeste, para ser seu vice. O mesmo propósito do também tucano José Serra ao uma possível sondagem de Mão Santa, já no PSC, para a composição de sua chapa em 2010, por sugestão, diz o piauiense, de Fernando Henrique Cardoso.

Nas três oportunidades, Mão Santa negou os convites alegando um vago “coisas do destino”. Já o quarto aceno foi empurrado de volta com veemência. Fora feito pelo Pastor Everaldo, presidente de seu partido naquele 2014, o PSC. “Jamais! Eu fui para o PSC mineiro, de Pedro Aleixo, de Vitor Nósseis. O PSC era bom. Não é mais. O Everaldo é sócio do Eduardo Cunha, da mesma Igreja”, disse, ele que hoje é filiado ao Solidariedade, presidido por Paulinho da Força, que teve os direitos políticos suspensos por cinco anos por um caso de improbidade na utilização dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador. Cabe recurso.

Bolsonaro saiu de Parnaíba sem um “sim” – mas com uma Medalha do Mérito Municipal, dada a ele pelo prefeito. Em resposta à piauí, ele disse que não se manifestaria sobre o assunto. Após a festiva recepção nordestina, ambos encontraram-se mais uma vez em Brasília, “com muita gente ao redor”, desconversou Mão Santa. E não falaram sobre o “namoro hétero”, garantiu.

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