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De trampolim, Facebook vira escorregador de Doria

Página do tucano perdeu 94% das interações; saída da prefeitura após 15 meses no cargo provoca avalanche de críticas na rede

Allan de Abreu e José Roberto de Toledo | 14 mar 2018_14h41
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Em outubro de 2016, Thalita Barbosa, de 25 anos, ajudou a eleger João Doria, do PSDB, prefeito de São Paulo. A vendedora de cosméticos diz que não ajudará o tucano a se eleger governador em outubro próximo, porém. O estopim para a sua decepção foi aceso pelo próprio Doria na segunda-feira, 12 de março, quando o prefeito, que não completou nem 15 meses no cargo, anunciou sua pré-candidatura ao governo paulista, quebrando a promessa de ficar os quatro anos de mandato na prefeitura.

“O prefeito desonrou a palavra dele”, resumiu Barbosa à piauí, na terça-feira. Na véspera, logo após Doria anunciar seus planos eleitorais em sua página oficial no Facebook, a vendedora tratou de registrar sua crítica publicamente naquela mídia social. “O senhor é um verdadeiro fanfarrão! […] Vai deixar São Paulo nas mãos do seu vice para assumir o governo do estado e depois fará o mesmo deixando o governo para assumir a Presidência?”, questionou.

A vendedora não estava sozinha. Em horas, uma pequena multidão inundou a página de Doria no Facebook com comentários ácidos sobre a atitude do prefeito. Até a tarde desta terça-feira, eram mais de 11 mil postagens, a imensa maioria criticando o tucano. “Mais um traindo o voto do povo de São Paulo. Quem usa prefeitura como trampolim não merece voto nem pra síndico de prédio. O meu não terá!!! Lamentável”, escreveu um internauta. A maior parte se diz traída por Doria. É mais um capítulo da crise digital vivida pelo prefeito – que, até poucos meses atrás, era citado por tucanos tão emplumados quanto Fernando Henrique Cardoso como exemplo de político que sabia usar bem as mídias sociais.

Não mais. A página de Doria no Facebook perdeu 94% das interações. No seu auge, ela registrou quase 8 milhões de comentários, likes e compartilhamentos por mês. Foi em janeiro de 2017. Um ano depois, em fevereiro de 2018, eram menos de meio milhão. Os números foram compilados pela piauí com a ajuda do CrowdTangle, uma ferramenta de monitoramento das mídias sociais distribuída pelo próprio Facebook.

A derrocada digital de Doria começou logo após seu ápice – e não parou mais. De 7,8 milhões em março de 2017, as interações dos usuários com a página dele no Facebook caíram para 5,1 milhões em abril, 2,2 milhões em junho e 1 milhão em outubro. Em fevereiro de 2018, bateram em seu ponto mais baixo: 458 mil. Foram bem menos interações do que as ocorridas no mesmo período nas páginas do senador Álvaro Dias, do Podemos, e do presidenciável João Amoêdo, do Partido Novo.

Coordenador de comunicação pessoal de Doria e responsável pelas mídias sociais do tucano, Daniel Braga atribui a perda de interações na página do prefeito à “queda de audiência” do Facebook como rede social.

O Facebook mudou seu algoritmo ao longo dos últimos meses e isso provocou mudanças no comportamento dos usuários. A perda de relevância, porém, parece ser um fenômeno particular do tucano. Enquanto a de Doria escorregava, as páginas oficiais de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e de Jair Bolsonaro, agora no PSL, oscilavam de um mês para o outro mas mantinham o mesmos patamares milionários de interações mensais com os usuários. No caso do militar reformado, entre 3 milhões e 5,6 milhões, como ele registrou em janeiro passado. E, no do ex-presidente, entre 900 mil e 3,6 milhões, também em janeiro de 2018.

Não são apenas comentários e likes. Ao contrário de outros políticos, Doria também começou a perder seguidores no Facebook. Foram 50 mil a menos desde outubro. O prefeito ainda tem 2,759 milhões de seguidores, mas eles se tornaram muito menos ativos do que costumavam ser. Essa perda de entusiasmo coincidiu com a piora significativa da popularidade do prefeito entre os paulistanos. Segundo o Datafolha, os moradores da capital paulista que acham sua gestão ótima ou boa caíram de 44% para 29%, entre fevereiro e novembro de 2017. Ao mesmo tempo, os que a consideram ruim ou péssima triplicavam para 39%.

Trabalhando com Doria desde a pré-campanha à prefeitura paulistana, Daniel Braga disse que já esperava a chuva de críticas no Facebook ao anúncio da pré-candidatura do chefe ao governo paulista. Para ele, o percentual de eleitores do tucano como Thalita Barbosa é “minoria ínfima, quase nada”, e que a maioria são “detratores tradicionais” ou robôs.

Entre eles, afirmou Braga, “há muita bolha vermelha” (referindo-se aos petistas). Mas o auxiliar de Doria atribui parte da culpa ao atual vice-governador de São Paulo, Márcio França, do PSB. “Ele replicou dezenas de postagens críticas ao João na página oficial dele no Twitter. Isso influenciou, com certeza”, disse o marqueteiro.

França, que tem apenas 7,2 mil seguidores no Twitter, rejeitou a hipótese em entrevista à piauí, feita pelo WhatsApp. “Kkkkk”, escreveu o rival do tucano na disputa pelo governo paulista. “Não tem nenhuma lógica que minhas redes sociais pequenas tivessem influência para gerar tanta reação. [As críticas ao tucano] ocorrem pela frustração da palavra descumprida”, disse o pré-candidato do PSB, que disputa com Doria o apoio explícito do governador Geraldo Alckmin na sucessão paulista.

Sobre a avalanche de críticas à pré-candidatura a governador do tucano, Braga afirmou que vai responder “as que merecem ser respondidas”. Foi o caso do internauta identificado como Mauro A. Oca: “Não podemos correr o risco de deixar anos de trabalho bem feito à frente do Governo de São Paulo ser entregue nas mãos de partidos que possam não ter o mesmo nível de comprometimento e responsabilidade”, escreveu o prefeito. “Assumimos esta convocação confiantes de que possamos dar continuidade neste legado, apoiando o Bruno Covas [vice-prefeito] que, temos certeza, representará muito bem nossa cidade.”

Em outubro, a vendedora Thalita Barbosa e os demais críticos de Doria responderão, na urna, se foram convencidos pela justificativa do prefeito para descumprir a palavra empenhada por escrito e de viva voz em repetidas entrevistas dadas por ele ao longo da campanha de 2016. Ele se comprometera a não abandonar a Prefeitura de São Paulo antes de completar o mandato – como seu correligionário José Serra havia feito na década anterior. Mas Serra se elegeu governador mesmo assim.

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