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O conservadorismo vai à faculdade

Pesquisa Ibope revela que proporção de conservadores cresceu mais rapidamente entre brasileiros com diploma universitário

José Roberto de Toledo | 11 abr 2018_11h15
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O conservadorismo cresce no Brasil principalmente entre os mais escolarizados, revela o Ibope. Pesquisa inédita e divulgada em primeira mão pela piauí mostra que, embora a variação tenha sido marginal no conjunto da população entre 2016 e 2018, o índice de conservadorismo cresceu muito acima da média entre quem fez faculdade. O índice reflete a proporção de brasileiros que apoiam ou refutam cinco propostas: casamento de pessoas do mesmo sexo, legalização do aborto, redução da maioridade penal, prisão perpétua para crimes hediondos e adoção da pena de morte.

A proporção da população com alto grau de conservadorismo cresceu de 49% em 2010 para 54% em 2016 e chegou a 55% em 2018.

Esta é a terceira vez que o Ibope calcula esse índice. Entre a primeira e a segunda vez, o conservadorismo teve um crescimento significativo em quase todos os extratos sociais, puxado pelas questões sobre segurança pública. O apoio tanto à pena de morte quanto à redução da idade mínima para alguém ser preso e condenado foi o que alavancou a parcela de conservadores na sociedade brasileira entre 2010 e 2016. À época, esse crescimento se concentrou entre quem tinha passado menos tempo na escola. Nos últimos dois anos o fenômeno se inverteu.

De 2016 para 2018, o conservadorismo cresceu mais entre quem fez faculdade, mas também entre quem cursou o ensino médio, enquanto refluía um pouco entre as pessoas que não passaram do ensino fundamental. Essa mudança pode ter duas origens: os mais escolarizados se tornaram mais conservadores ou os conservadores se tornaram mais escolarizados. Seja qual for a ordem dos fatores, o produto dessa mudança é que desfez-se a escada do conservadorismo na qual cada degrau de escolaridade conduzia a um aumento do liberalismo de costumes e contra o punitivismo.

Na mais recente pesquisa do Ibope, concluída este ano, o índice de conservadorismo revela-se praticamente tão alto quanto para quem passou quatro, oito ou doze anos na escola. Ainda há proporcionalmente menos conservadores entre quem passou pela universidade, mas mesmo essa diferença está ficando menor na comparação com os segmentos menos escolarizados da população.

Os brasileiros contrários à legalização do aborto eram 78% em 2016 e são 80% em 2018. Os favoráveis à pena de morte continuam no mesmo patamar: eram 49% e são 50%. O mesmo ocorreu com os que defendem a prisão perpétua para crimes hediondos (oscilaram de 78% para 77%). Houve pequeno refluxo do apoio à redução da maioridade penal (de 78% para 73%), mas cresceu a rejeição ao casamento entre pessoas do mesmo sexo (de 44% para 50%).

CEO do Ibope Inteligência, Marcia Cavallari explica que as principais preocupações do brasileiro hoje são: desemprego, corrupção, saúde e segurança pública. Ela tem uma hipótese para explicar o crescimento do conservadorismo: “Além dessas preocupações, estamos passando por uma crise institucional que abarca a economia, a política, o social e a moral, por isso há um desejo da reconstrução dos valores. E esse desejo juntamente com o problema da segurança pública faz com que haja um conservadorismo maior da população, principalmente entre os mais escolarizados”.

Quando se olha para o que aconteceu na divisão geográfica do conservadorismo percebe-se que o Sudeste tornou-se mais conservador do que o Nordeste. O crescimento conservador foi constante nos estados mais ricos do Brasil, como São Paulo e Rio de Janeiro, tanto entre 2010 e 2016 quanto entre 2016 e 2018. Já no conjunto dos estados nordestinos, mais pobres, houve refluxo do conservadorismo nos dois últimos anos, segundo o Ibope.

Como resultado, a proporção de conservadores só não é maior hoje no Sudeste do que no Norte/Centro-Oeste. Foi no conjunto dessas duas regiões que o conservadorismo deu seu maior salto nos dois últimos anos. Em contraste com essa mudança, não houve variação significativa nos estados do Sul entre 2016 e 2018. O índice de conservadorismo hoje é equivalente no Nordeste e no Sul do país.

Os evangélicos seguem sendo os mais conservadores entre os brasileiros, com um aumento constante do índice entre eles desde 2010. O conservadorismo também cresceu entre os católicos, mas em proporção menor – e desacelerou nos dois últimos anos. Proporcionalmente, porém, o crescimento recente do conservadorismo foi maior no segmento onde essa característica era menos pronunciada: entre quem não é católico nem evangélico.

Embora nem sempre seja possível estabelecer relação de causa e efeito entre conservadorismo de costumes (contra a legalização do aborto e o casamento de homossexuais) e punitivismo (apoio à pena de morte, redução da maioridade penal e prisão perpétua) com a opção eleitoral dos brasileiros, os resultados da pesquisa do Ibope indicam que candidatos de perfil mais conservador terão maior facilidade para sensibilizar o eleitor do que os liberais.

O discurso genérico que apoia punições mais severas para crimes e que pretende brecar o avanço da liberalização dos costumes encontra menos resistência em quase todos os segmentos sociais. Isso só não implica automaticamente uma onda conservadora nas urnas porque o moralismo costuma ser temperado pelo bolso. O eleitor é pragmático e vota, principalmente em eleições majoritárias, para tentar melhorar sua condição econômica.

Quanto maior for a sensação de prosperidade na época da eleição, menor será o peso da economia na decisão do voto e, portanto, sobrará mais espaço para o avanço de candidatos conservadores. Porém, a continuar a estabilidade em baixo patamar da confiança do consumidor, o bolso ainda tende a falar mais alto na urna.

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