Em 8 de janeiro de 2023, manifestantes bolsonaristas que não aceitavam o resultado das urnas invadiram as sedes dos Três Poderes da República em Brasília. A depredação foi geral. No Supremo, um homem invadiu o gabinete de Alexandre de Moraes e arrancou à força a porta do armário onde estava a toga que ele veste nos julgamentos. Este episódio conta onde Alexandre estava nesse dia. E como a responsabilização dos atos golpistas o manteve em evidência nos meses seguintes.
Acompanhe aqui a transcrição do episódio:
ALEXANDRE
Thais Bilenky: No dia 1º de janeiro de 2023, Lula tomou posse como presidente da República e pôs fim ao governo Bolsonaro.
[Globonews – Lula]: Apesar de tudo, a decisão das urnas prevaleceu. Graças a um sistema eleitoral internacionalmente reconhecido por sua eficácia na captação e apuração dos votos.
Thais Bilenky: A cerimônia começou com um discurso do novo presidente no Congresso Nacional. Do lado de fora, uma multidão de bonés, camisetas e bandeiras vermelhas ocupava a praça dos Três Poderes e a Esplanada dos Ministérios.
[Rede Globo – William Bonner]: Luís Inácio Lula da Silva está prestes a subir a rampa na condição de presidente pela terceira vez em sua vida. O único brasileiro a ser presidente da República três vezes, as três pelo voto popular.
Thais Bilenky: A subida da rampa do Palácio do Planalto é simbólica. Lá em cima, o novo presidente recebe a faixa do seu antecessor. É um dos principais ritos do dia da posse. Mas Bolsonaro estava nos Estados Unidos. E não voltou para entregar o cargo. A equipe de Lula, então, criou seu próprio rito.
[Globonews – Natuza Nery]: Pessoa com deficiência, indígenas, mulheres… Uma criança negra com Lula, Janja, de braços dados sobem a rampa no sentido de que é o povo brasileiro na sua diversidade, na sua completude que sobe essa rampa, vamos ouvir.
Thais Bilenky: Mudaram os personagens, mudou o figurino, mudou a cena.
[Globonews – Aline Midlej]: Coube à catadora Aline Souza entregar a faixa para o presidente. Ela tem 7 filhos e é ativista pela luta dos direitos dos catadores.
Thais Bilenky: Era o começo de novos tempos. Já de noite, como manda a tradição, o novo presidente ofereceu um coquetel no Palácio do Itamaraty para convidados. Em um ambiente mais descontraído, autoridades circulavam à vontade entre militantes, artistas e jornalistas. Alexandre de Moraes estava lá. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral passou a noite fazendo selfie e escutando elogios. O coquetel acabou e Alexandre foi para sua casa em Brasília. Feita a transição de poder, o ministro saiu de férias. Deu a missão por cumprida. Ele não comentou para onde ia, nem quando voltava. Uma saída discreta. À francesa.
Passou-se uma semana. Veio o domingo, 8 de janeiro de 2023. À tarde, começou a quebradeira na praça dos Três Poderes. Manifestantes bolsonaristas que não aceitavam o resultado das urnas pediam um golpe. Eles invadiram o Palácio do Planalto, onde trabalha o presidente. Também vandalizaram o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal. Depredaram relíquias, quebraram vidraças. Destruíram o que encontraram pela frente.
No Supremo, um bolsonarista invadiu um gabinete específico. O gabinete de Alexandre. E arrancou à força a porta do armário onde estava a toga que ele veste nos julgamentos. O ministro? Tava em Paris. Tinha acabado de sentar para jantar num bistrô com a família. Foi o tempo de escolher a mesa, pedir um vinho. E o telefone tocou.
Esse é o Alexandre. Um podcast original da Trovão Mídia e da revista piauí.
Meu nome é Thais Bilenky. Nos últimos meses, conversei com muita gente da política para contar aqui como o presidente do TSE foi figura central no enfrentamento ao golpismo em 2022 – e além. Porque a tensão continuou em 2023. Te conto neste podcast os momentos decisivos dessa história.
Episódio 5: Terceiro tempo
O Palácio da Justiça tem uma vista privilegiada da praça dos Três Poderes. Do gabinete do ministro, todo envidraçado, dá para ver o Planalto, o Congresso e o Supremo. É impactante. Mas naquele 8 de janeiro, a visão era perturbadora. O ministro da Justiça, Flávio Dino, chegou lá para às 3 da tarde, quando a quebradeira já tinha começado. Depois, vieram outros ministros, como o da Defesa, José Múcio Monteiro, e o do Gabinete de Segurança Institucional, Gonçalves Dias. As figuras que seriam centrais no desenrolar daquele dia estavam reunidas ali. Eles viam pelas paredes de vidro uma horda correndo para dentro das edificações com cadeiras na mão, destruindo tudo. Deixaram a TV ligada nos canais de notícia, mas estavam desnorteados. Assessores entravam e saíam da sala, cada vez com algum pepino novo. Até o wifi estava instável. A bem da verdade, eles mal sabiam as senhas. Não fazia nem uma semana que todos eles tinham assumido os seus postos no novo governo.
Thais Bilenky: O senhor se importa de por essa lapela assim, só para gente pegar…
[Flávio Dino]: Não, nada, não tem problema…
Thais Bilenky: Conversei com Dino para esse podcast na sala de reunião do seu gabinete, em maio. Ele estava sentado na cabeceira da mesa, de costas para parede de vidro, de onde poucos meses antes ele tinha testemunhado a tentativa de golpe. Eu tava à direita dele e via a Esplanada lá embaixo.
[Flávio Dino]: E para esclarecer aos que estão nos ouvindo, nós estamos defronte de uma janela, olhando para a Esplanada, que é um espaço gigante. 5 mil pessoas é um pingo de gente.
Thais Bilenky: O que deixava Dino mais perplexo era o sumiço das forças de segurança. Uma semana antes, a Polícia Militar do Distrito Federal tinha sido impecável na posse de Lula. E agora, tinha desaparecido.
[Flávio Dino]: Essa Esplanada já recebeu passeata de 100 mil pessoas, 200 mil pessoas, 300 mil pessoas, em vários momentos da história brasileira. Vários momentos da história brasileira. E sempre houve, de um modo geral, manutenção da ordem pública. Mas 5 mil pessoas? 5 mil pessoas, 100 policiais com equipamento adequado conseguem conter. Querendo, conseguem.
Thais Bilenky: Além do baixo efetivo, os policiais não estavam equipados, nem tinham uma conduta que o ministro da Justiça esperava.
[Flávio Dino]: A atitude não era de enfrentamento, pelo contrário, era uma atitude de contemplação do que estava acontecendo. Havia ali uma sequência de erros que explicam que não se cuidava apenas de erros, porque é uma sequência inacreditável. Absolutamente inverossímil alguém considerar isso como falhas. Porque, realmente, isso, tenho certeza, é algo inédito.
Thais Bilenky: Lula estava em Araraquara, no interior paulista, a quase 800 quilômetros de Brasília. Ligou para Dino no meio da tarde e perguntou que opções eles tinham. O ministro apresentou um cardápio que ia de estado de sítio a intervenção federal. O presidente questionou se a intervenção podia ser pontual, apenas na segurança pública. Podia. A intervenção é uma medida de exceção, para momentos de distúrbio da ordem pública. Quando é aprovada pelo Congresso, o governo federal se sobrepõe ao governo local.
[Flávio Dino]: Foi preciso escrever um pedido de intervenção, nós escrevemos aqui no ministério. Eu mesmo ajudando a escrever com uma assessora minha. Escrevemos, mandamos ao presidente, vai, volta, formaliza, enfim o interventor pega esse documento e se apresenta à tropa, diz: “olha, agora eu sou o interventor.” Então, quando nós conseguimos em tempo recorde. Com certeza foi a intervenção…
Thais Bilenky: Quanto tempo?
[Flávio Dino]: Ah, 1 hora mais ou menos.
Thais Bilenky: O braço-direito de Flávio Dino no Ministério foi nomeado interventor. Assumiu o comando da polícia militar do Distrito Federal. E só de noite os palácios foram liberados.
[Globonews – Poliana Abritta]: A gente vê que já escureceu. E agora, o que a gente vê são eles voltando, ali, diante da repressão da Polícia Militar que demorou, mas aconteceu agora à noite.
Thais Bilenky: Muitos dos golpistas voltaram pro acampamento montado desde as eleições do ano anterior em frente ao QG do Exército, a oito quilômetros dali.
[Mídia Ninja]: Pessoal, boa noite. Tô passando aqui no QG agora para mostrar para vocês que as barracas continuam aqui, tá bom? Ninguém tá saindo, ó. O Exército está nos protegendo aqui.
Thais Bilenky: A polícia tentou entrar no acampamento para prender os invasores, mas os militares impediram. Mandaram os policiais voltarem só no dia seguinte. Ninguém dormiu naquela noite. Nem em Paris. Alexandre saiu do restaurante e voltou para o hotel. Começou a disparar telefonemas. Ficou em linha direta com Rosa Weber, a presidente do Supremo. Ele agia como se estivesse no Brasil. E, de fato, a informação de que não estava no país não era conhecida, nem por alguns de seus interlocutores – até agora. Já era mais de meia noite em Brasília, alta madrugada na França, Alexandre soltou as primeiras decisões. Obrigou os golpistas a abandonarem o acampamento, autorizou prisões em flagrante e mais. Mandou prender o então secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Torres, que tinha sido ministro da Justiça de Bolsonaro e tinha viajado para fora do Brasil na véspera da depredação. Alexandre cogitou ir mais longe.
Thais Bilenky: O Alexandre de Moraes, nessa ocasião, chegou a aventar e cogitar a prisão do próprio Ibaneis, além do Anderson Torres, e a AGU e o governo mais amplamente, segundo eu apurei com a sua efetiva contribuição no processo de decisão, decidiu não pedir a prisão do Ibaneis. Por quê? Como é que foi essa decisão?
[Flávio Dino]: Não havia, como não há até hoje, qualquer indicação de que o governador Ibaneis tinha participado de um desses vetores, ou seja, de que ele estava do lado dos que haviam praticado a agressão, ou do lado daqueles que deliberadamente resolveram se omitir.
Thais Bilenky: A prisão do governador Ibaneis acabou sendo descartada. Mas Alexandre determinou seu afastamento do governo por 90 dias. E determinou a prisão de Torres, o secretário de segurança, assim que voltasse para o Brasil.
Thais Bilenky: Em relação ao Anderson Torres já havia, e agora mais ainda na sua avaliação? Motivo para responsabilizar?
[Flávio Dino]: Os fatos mostram que os indícios, no caso dele, são múltiplos, eu não posso, obviamente, pré-julgar, nem é meu papel, mas nós temos uma rede de indícios: desde as operações da Polícia Rodoviária Federal no dia do segundo turno, até outros eventos ao longo do tempo, né? Atitudes omissivas naquele período, e nós temos a minuta do golpe, né? Apreendida na casa dele.
Thais Bilenky: A minuta do golpe foi um documento encontrado na casa de Torres. Era uma espécie de passo a passo, com ares de legalidade, para anular o resultado das eleições.
[Flávio Dino]: E nós temos aquela estranhíssima ausência ali, exatamente na véspera do 8 de janeiro.
Thais Bilenky: Na manhã do dia seguinte, 9 de Janeiro, seguindo as decisões de Alexandre, uns 50 ônibus foram usados pela polícia para levar 1.400 invasores presos em flagrante para averiguação. Passaram por audiência de custódia e mais de 900 pessoas ficaram em prisão preventiva na Papuda e na Colmeia. O restante ficou em liberdade provisória, alguns com tornozeleira eletrônica.
[TV Afiada]: A gente precisa de respeito. Direitos humanos agora, socorro. Damares, socorro Damares, socorro Carla Zambelli, nos ajudem. Michele Bolsonaro, te mexe mulher!
Thais Bilenky: Enquanto isso, Alexandre cruzava o Atlântico. Na madrugada de domingo para segunda, ele tinha comprado uma passagem de avião de última hora e voou de Paris para Brasília. Depois de dois ou três dias de férias com a família, Alexandre estava de volta. A expectativa era que Alexandre saísse de cena depois das eleições e da transição de poder. Mas o episódio do 8 de janeiro manteve o ministro em evidência. Em fevereiro, veio uma decisão de impacto: Alexandre fixou que cabia ao Supremo julgar os militares envolvidos no 8 de janeiro, não à Justiça militar. Ele foi prontamente apoiado pelo presidente do Superior Tribunal Militar.
[Uol – Joseli Parente Camelo]: O ministro Alexandre de Moraes fundamentou muito bem essa sua decisão de que teria que ser julgado pela Justiça Comum.
Thais Bilenky: Esse apoio deu força a Alexandre para responsabilizar o golpismo até mesmo entre comandantes de tropas.
Thais Bilenky: No fim de março, em uma palestra em São Paulo, Alexandre comentou as prisões do 8 de janeiro.
[Fundação FHC – Alexandre de Moraes]: Essas pessoas que depredaram a sede dos Três Poderes, várias… eu fui na, com a Ministra Rosa, no presídio, várias pessoas alienadas! Acham que não fizeram nada. Uma delas chegou a dizer que estava passando por perto e viu, e aí Deus disse para ela ir orar. Deus disse para ela se refugiar embaixo da mesa do presidente do Senado, só por causa disso ela entrou! É um negócio assustador o que essa lavagem cerebral das milícias digitais está fazendo com inúmeras pessoas. Essas pessoas têm que ser responsabilizadas – todas – para perceber que não é fácil atentar contra a democracia.
Thais Bilenky: O Supremo, em conjunto, decidiu deixar as investigações sobre os ataques daquele dia sob relatoria de Alexandre. O entendimento foi de que os atos golpistas cabiam nos inquéritos que ele já relatava:o dos atos antidemocráticos e o das fake news. E várias decisões de Alexandre, nesse caso, foram respaldadas pela maioria do Supremo. Só André Mendonça e Kassio Nunes Marques, ministros indicados por Jair Bolsonaro, divergiram.
A prisão em massa de manifestantes, o afastamento do governador Ibaneis e a prisão de Anderson Torres foram confirmadas em plenário. Conversei com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo, no seu gabinete. E perguntei sobre o apoio dos outros ministros às decisões de Alexandre no tribunal.
Thais Bilenky: Agora, o respaldo do plenário foi tão importante quanto.
[Gilmar Mendes]: Com certeza. Com certeza.
Thais Bilenky: Como que é feita essa articulação? Como que foi feito…
[Gilmar Mendes]: Nós normalmente conversamos e fazemos análises, e obviamente fazemos uma análise do quadro, e fazemos ponderações, isso sempre se faz.
Thais Bilenky: As negociações a portas fechadas se tornaram decisivas no Supremo. O tribunal, que era conhecido pelo isolamento de cada ministro, cedeu às imposições dos novos tempos.
Thais Bilenky: O Ministro Alexandre, quando tem que tomar uma decisão, monocrática em relação a esses temas, como é que é feito essa conversa anterior? Ele fala individualmente com cada ministro, com o senhor?
[Gilmar Mendes]: Acho que varia de momento para momento essa dificuldade, inclusive, do debate sobre decisões monocráticas, em casos que tais, como esses de questão de segurança, o melhor é não falar. Né? Até porque depois, você não tem segurança, como é que as pessoas vão se comportar, se não concordam, vazam… Então, tem que ter todo o cuidado. Mas, sempre há, em algum momento, algum tipo de conversa, ou antes ou depois, a vida se estrutura para se fazer uma análise, colocar no plenário a própria questão das prisões, depois veio para o plenário, o plenário chancelou, né, portanto tudo tem sido feito colegiadamente e com amplo respaldo do tribunal.
Thais Bilenky: Mas muita gente no mundo político e jurídico passou a criticar as decisões de Alexandre. E a apontar um excesso de poder concentrado nas mãos do Supremo como um todo – e do ministro em particular. No caso do afastamento de Ibaneis, o governador tinha sido reeleito por voto popular em primeiro turno pouquíssimos meses antes.
[Alberto Toron]: Por analogia, nós deveríamos dizer que essa decisão do Ministro Alexandre de Moraes devesse se submeter à Assembleia Distrital. Porque ele é detentor de um cargo eletivo, eu não posso, numa penada, tirar o sujeito do cargo.
Thais Bilenky: Esse é o criminalista Alberto Toron, que defende Ibaneis. Quando eu falei com ele pela primeira vez para esse podcast, em fevereiro, o governador ainda estava afastado.
[Alberto Toron]: Eu estive uma vez com o Ministro Alexandre, ele tinha acabado de tomar posse, e eu pedi uma audiência, e ele me concedeu a audiência e comentando coisas eu falei: “mas viu, Ministro, muitos ministros só recebem advogado com assessor do lado”, há exceções, né? Mas ele me disse: “Toron, eu fui secretário de Estado, eu tô acostumado a receber pessoas, eu não tenho problema. Se uma pessoa vier com uma conversa atravessada para mim, eu mando a pessoa embora, comigo não tem isso, eu não tenho problema de conversar com as pessoas.” Hoje, no entanto, é dificílimo o acesso a ele. Outro dia queria ir no gabinete para ver se eu poderia ter acesso a uma decisão, acho que era o mandado de busca e apreensão no caso do governador Ibaneis, e você não pode ter nem acesso ao andar dele.
Thais Bilenky: Os gabinetes dos ministros no Supremo ficam espalhados por andares e corredores em um prédio anexo ao do plenário. Para circular por esse ambiente, você precisa se identificar, passar pelo raio-x e informar para onde vai. Advogados vivem lá dentro para ter acesso aos processos e falar com o estafe dos ministros. É algo corriqueiro.
[Alberto Toron]: Se você não agendar previamente. Não para falar com ele, tô falando do gabinete. Nunca vi isso em 41 anos de advocacia.
Thais Bilenky: Alexandre acabou revogando o afastamento de Ibaneis Rocha um mês antes do previsto. E o governador voltou ao cargo. Mas o ministro não cedeu em relação à prisão de Anderson Torres. A defesa passou a alegar problemas de saúde mental para apelar por sua soltura. Disse que Torres entrou em depressão, emagreceu mais de dez quilos e estava no limite da sobrevivência. Políticos bolsonaristas foram visitá-lo na cadeia.
[Deputado Sanderson]: Olá, amigos! Aqui Deputado Federal Sanderson, eu vi aqui uma situação muito difícil. Não pode prisão preventiva ser um instrumento de tortura psicológica, ou até mesmo de tortura física. E é isso que eu presenciei aqui hoje: Anderson, absolutamente abalado.
Thais Bilenky: Alexandre mandou Torres ser avaliado por médicos e só decidiu soltá-lo quatro meses depois. Torres foi solto, mas vários outros não. Em agosto, Alexandre autorizou a prisão de 5 integrantes da cúpula da Polícia Militar do Distrito Federal. Eles se juntaram a um coronel preso desde fevereiro – sem ter sido julgado, e sem previsão de saída, assim como mais de 120 pessoas detidas desde o 8 de janeiro. Ao longo do primeiro semestre, Alexandre foi soltando investigados a conta gotas.
[BandNewsTV – Diego Sarza]: O ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal determinou hoje a soltura de 137 pessoas que foram presas por causa dos atos criminosos em Brasília. Elas vão voltar às cidades de origem, mas vão ser monitoradas por tornozeleira eletrônica.
Thais Bilenky: Quando avaliava que os presos não apresentavam mais risco às investigações, Alexandre soltava. Em vários casos, mandou botar tornozeleira, cancelou passaporte, obrigou recolhimento noturno em casa ou, ainda, proibiu acesso à rede social.
[Hamilton Mourão]: Hoje, nós temos um juiz da mais alta corte, ou seja, não tem nem mais a quem apelar após isso aí, só a Deus, não é? Que é, ao mesmo tempo, o investigador, o denunciador e o julgador
Thais Bilenky: Esse é o general Hamilton Mourão, que foi vice de Bolsonaro, e hoje é senador.
Thais Bilenky: Quais características que o senhor vê no Alexandre de Moraes que o diferem dos outros ministros do Supremo?
[Hamilton Mourão]: Acho que o Alexandre de Moraes, ele atua muito mais como um delegado, não é, do que como um magistrado.
Thais Bilenky: Alexandre conta com uma estrutura inédita no Supremo. Desde janeiro de 2023, oito policiais federais trabalham exclusivamente em inquéritos que ele relata, como o das milícias digitais. Quando necessário, em operações especiais, a equipe de oito policiais pode até ser reforçada. Isso não vale para o 8 de Janeiro, que tem uma força tarefa própria para investigar o episódio. Os outros ministros do Supremo contam com uma mesma divisão da Polícia Federal, que trabalha em todas as investigações que tramitam no tribunal. Um policial me disse reservadamente que é bom trabalhar com Alexandre. Ele fala a língua dos policiais, faz ponderações e até sugestões de diligências. Diz ele que muito juiz dá trabalho para entender as operações da PF. Os policiais às vezes têm que praticamente desenhar a investigação para conseguir uma autorização judicial. Com Alexandre, flui melhor. Em alguns casos, a polícia manda por escrito e ele resolve em minutos. Estamos em 4 de maio de 2023. E logo pela manhã uma notícia domina as redes, as TVs e os grupos de Whatsapp.
[Joven Pan News – Adriana Reid]: A Polícia Federal deflagrou operação para investigar uma associação criminosa responsável por inserir dados falsos de vacinação contra a COVID-19 em sistemas do Ministério da Saúde. Segundo as informações iniciais, até as 7h20 dessa manhã policiais estavam presentes inclusive no condomínio onde o ex-presidente Jair Bolsonaro mora.
Thais Bilenky: A suposta fraude no cartão de vacina foi descoberta pela equipe da Polícia Federal que trabalha nos inquéritos relatados por Alexandre. E acabou atingindo o entorno mais próximo de Bolsonaro. O ajudante de ordens dele no governo, tenente-coronel Mauro Cid, e mais cinco pessoas ligadas ao ex-presidente foram presas. E nessa mesma operação, a PF tomou uma medida que, há meses, preocupava Jair Bolsonaro. Apreendeu seu telefone celular. Todo o material obtido nas buscas deu à Polícia Federal acesso a potenciais provas que abasteceriam outras investigações sobre o ex-presidente que não só a do cartão de vacina.
[CNN – Cris Dias]: O Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal já começou a periciar os telefones de Jair Bolsonaro, telefone esse que foi apreendido na operação da PF na semana passada, e também a periciar o celular do ex-ajudante de ordens do ex-presidente, o tenente-coronel Mauro Cid.
Thais Bilenky: Alexandre decidiu deixar o caso sob sua alçada por ter relação com inquéritos que ele já relatava. Dessa vez, o plenário do Supremo não analisou a quem caberia relatar a investigação. A decisão ficou por conta de Alexandre. Esse procedimento foi questionado por concentrar muito poder nas mãos de Alexandre. E tem mais: ele não é só ministro do Supremo, ele é também presidente do Tribunal Superior Eleitoral. E como presidente do TSE, Alexandre concentra ainda mais poder. Ele decide a pauta do tribunal, o que e quem vai ser julgado e quando. Naquele momento, em cima da sua mesa no TSE, tinham 16 ações contra Bolsonaro.
[Metrópoles – Neila Guimarães]: O ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, marcou para o dia 22 de junho o julgamento da ação que pode deixar inelegível o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Thais Bilenky: No próximo e último episódio dessa série, eu te conto onde Alexandre se localiza na geografia do poder de 2023. E como ele se aproximou de um outro corinthiano roxo, como ele. Alexandre é um podcast original da Trovão Mídia e da revista Piauí. Eu sou Thais Bilenky e fiz a reportagem e o roteiro. Alexandre está disponível na sua plataforma de áudio preferida. Se você gostou, não deixa de seguir, dar 5 estrelas e comentar o episódio no Spotify. Assinar no Apple Podcasts. Favoritar na Deezer. Também dá para seguir a gente no Amazon Music, se inscrever no Google Podcast ou no Castbox e assim, você recebe uma notificação sempre que tiver um novo episódio.
A direção geral e o tratamento de roteiro são da Ana Bonomi e do José Orenstein. A produção executiva é da Ana Bonomi, do José Orenstein e da Mari Faria. Assistência de produção da Ana Azevedo. A trilha sonora original, o desenho de som e a montagem são do Arthur Decloedt. A finalização é da Phonocórtex. Checagem feita por João Felipe Carvalho. Gravado no estúdio Nanuk, em São Paulo. Agradecimentos especiais a Marcelo Mesquista.
Esse episódio usou áudios de Globonews, TV Globo, Poder 360, CNN, canal TV Afiada no youtube, canal da Fundação FHC no youtube, twitter do deputado Sanderson, Jovem Pan e Metrópoles.