Em setembro de 2020, a capa da edição 1 218 da Exame, a principal revista de economia do país, trazia a seguinte manchete: Que Brasil o Brasil quer?? Era uma reportagem sobre o que os brasileiros queriam para o país depois da pandemia. Mas o subtítulo era mais detalhado: “Uma pesquisa exclusiva Exame/Ideia mostra que os brasileiros desejam menos impostos e mais programas sociais. Um Estado generoso aliviou as dificuldades da pandemia, mas escancarou a fragilidade do projeto liberal. As incoerências são latentes – a dificuldade de reconstrução, também.” Nenhum leitor e nenhum assinante da Exame viu essa manchete. Rodrigo Goes, um diretor do BTG, o banco cujos sócios são donos da revista, não gostou das palavras. Achou que falar em “Estado generoso”, em “fragilidade do projeto liberal” e “incoerências latentes” podia “dar merda com o governo” e mandou a redação mudar o título. Os 50 mil exemplares que já estavam impressos foram para o lixo e uma nova capa foi feita.
O episódio, narrado em reportagem de Denyse Godoy publicada na edição de outubro da piauí, é um exemplo de uma característica singular do Brasil: o domínio que as instituições financeiras estão exercendo sobre os veículos que se dedicam exclusivamente ao noticiário econômico. Seis dos maiores títulos com presença na internet pertencem a algum banco ou corretora. A começar pelo campeão de audiência digital (com média de 33,9 milhões de visitas mensais) o InfoMoney, da XP Investimentos, uma das maiores corretoras de valores do país, que conta com uma participação minoritária do Itaú Unibanco, o maior banco privado brasileiro[1]. O site da revista Exame, com 12,2 milhões de visitas mensais, vem em segundo lugar. Em terceiro, está o Money Times, com média de 11,5 milhões, que pertence à Empiricus, empresa de análise de investimentos também controlada pelo mesmo BTG. Seu Dinheiro, que ocupa o quinto lugar, com 6,2 milhões de visitas, também pertence à Empiricus-BTG.
Considerando a lista dos dez veículos, 79% das consultas feitas nos mais populares veículos de economia e negócios do país acabaram nas páginas de portais controlados por instituições financeiras – nos quais a informação de que pertencem a bancos ou corretoras nunca aparece na primeira página. “Uma situação em que uma instituição financeira é dona e administra um site de jornalismo econômico é altamente incomum nos Estados Unidos e em outros lugares do mundo”, disse o americano Chris Roush, professor de jornalismo econômico e autor de dez livros sobre o assunto. “Não é um lugar em que eu confiaria para buscar informações sobre investimentos, porque pode favorecer os interesses do controlador”, diz Roush.
Os assinantes da piauí podem ler a íntegra da reportagem neste link.
[1] A família de João Moreira Salles, fundador da piauí, é acionista integrante do bloco de controle do Itaú Unibanco.