Cenas de um julgamento e a chanchada do Congresso
Semanalmente, os apresentadores mencionam as principais leituras que fundamentaram suas análises. Confira:
Conteúdos citados neste episódio:
“Orçamento secreto banca fraudes no SUS”, reportagem de Breno Pires para a piauí.
“Bolsonaro transformou o interrogatório numa live”, coluna de Miriam Leitão para O Globo.
“Trama golpista: o grande ‘perdedor’ dos interrogatórios, segundo os advogados dos réus”, coluna de Malu Gaspar, para O Globo.
Análise de Flávia Maia, no JotaInfo, acerca do motivo que leva Bolsonaro a tentar cavar um voto mais favorável de Fux.
TRANSCRIÇÃO DE ÁUDIO
Sonora: Rádio Piauí.
Fernando de Barros e Silva: Olá, sejam muito bem vindos ao Foro de Teresina, o podcast de política da Revista Piauí.
Sonora: Agora tem sempre um maluco ali que fica aquela ideia de AI-5, intervenção militar, que as Forças Armadas jamais iam embarcar nessa porque o pessoal estava pedindo ali, até porque não cabia isso aí.
Fernando de Barros e Silva: Eu, Fernando de Barros e Silva, da minha casa em São Paulo, tenho a alegria de conversar com os meus amigos Celso Rocha de Barros e Ana Clara Costa, no Estúdio Rastro, no Rio de Janeiro. Olá Ana, Bem vinda!
Ana Clara Costa: Oi, Fernando! Oi, pessoal!
Sonora: O senhor tinha a função de pressionar o presidente para assinar a minuta do estado de defesa, estado de sítio e etc e tal. Esse documento foi assinado?
Sonora: Não senhor.
Fernando de Barros e Silva: Diga lá, Celso Casca de bala.
Ana Clara Costa: Fala aí, Fernando! Estamos aí mais uma sexta-feira.
Sonora: Já que eles não estão aqui, quem sabe vocês mandem o recado para o Nikolas e para o Jordy aprender um pouco das contas públicas brasileiras. Vamos começar a falar sério aqui.
Fernando de Barros e Silva: Mais uma sexta feira e antes dos assuntos da semana eu quero fazer um convite para vocês, teresiners, que estarão em São Paulo para a Feira do Livro, que começa agora neste sábado e no outro sábado, dia 21 de junho, a gente vai estar na feira para uma edição ao vivo do Foro. Vai ser às cinco da tarde, 17h. A feira acontece lá na Praça Charles Miller, na entrada na frente do estádio do Pacaembu. A Ana, o Celso e eu esperamos você por lá. Vai lá que é gratuito e o evento todo é muito legal.
Fernando de Barros e Silva: Agora sim, vamos aos assuntos da semana. E a semana foi marcada pelos interrogatórios dos mandachuvas da trama golpista e é por eles, os artífices do golpe no banco dos réus, que a gente vai começar os nossos trabalhos. Recapitulando na segunda-feira (9), foram ouvidos o réu delator Mauro Sidi, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin Agência Brasileira de Inteligência. No dia seguinte, terça feira, foi a vez de Jair Bolsonaro ficar frente a frente com Alexandre de Moraes, o ministro relator do processo na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. Além de Bolsonaro, foram interrogados o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, o general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, General Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, e o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil de Bolsonaro, candidato a vice na chapa derrotada nas urnas em 2022. Além de Moraes, participaram do interrogatório o procurador geral da República, Paulo Gonet, responsável pela peça de acusação que embasa o processo, e o ministro Luiz Fux, cuja performance, digamos, um tanto escorregadia, vai merecer um par de comentários da nossa parte. Cada um dos réus estava acompanhado dos seus respectivos advogados de defesa e a tônica, como já era esperado, ficou com a tática do cada um por si, cada qual procurando meios de reduzir danos e tirar o corpo fora da, trama da lama. O momento inusitado, inusitado e constrangedor para qualquer pessoa que tenha um pingo disso que a gente chama de caráter, foi protagonizado por Bolsonaro quando convidou, em tom de brincadeira, Alexandre de Moraes, para ser seu vice em 2026, vice ou ministro, depois, emendou. A legenda dessa cena patética seria mais ou menos a seguinte, de Jair para Alexandre: “Olha, a gente quis te matar para continuar no poder, é verdade, mas estamos todos no Brasil, então vamos esquecer disso daí, tá ok? Passa lá em casa para a gente tomar um leite condensado”. Quem passou lá em casa, na casa de Michel Temer, no caso, foi o próprio Bolsonaro que pediu ajuda ao antecessor para enfrentar o tribunal. Temer, que virou coach de golpista em apuros, e disso ele entende, tentou ensinar boas maneiras ao colega na véspera do interrogatório, mas Bolsonaro não entendeu bem a lição e exagerou. Só faltou pedir Moraes em casamento. A gente vai tratar disso e das contradições entre os depoimentos do golpe, que não era golpe e os documentos que ninguém escreveu, da reunião que ninguém liderou. Estavam todos jogando dominó, como se aqueles acampamentos na frente dos quartéis durante meses, como se a bomba no aeroporto de Brasília e como se a predação do 8 de Janeiro tivessem surgido por geração espontânea. No segundo bloco, a gente continua nesse assunto. Vamos falar das estratégias de defesa dos réus. Ana Clara tem apurações sobre isso. Vamos falar do bem-humorado Alexandre de Moraes e, como eu disse, do empolado Fux, cujo comportamento tanto agradou aos bolsonaristas. Por fim, no terceiro bloco, a gente volta à crise instalada entre o governo e o Congresso, com participação do STF. No domingo à noite, depois da reunião entre Fernando Haddad, o presidente da Câmara, Hugo Motta, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e os líderes dos partidos, pareceu que havia sido encontrado um caminho para compensar o decreto do IOF. Chegou-se a falar que aquela havia sido uma noite histórica. O governo aliviava o aumento no Imposto sobre Operações Financeiras e, no lugar disso, sugeriu uma série de medidas, entre elas aumentar a tributação sobre as bets, tributar as LCI, que são as letras de crédito imobiliário e as LCA, que são as letras de crédito do agronegócio, entre outras coisas. Na segunda feira, o peso dos lobbies caiu sobre as costas do Congresso e Hugo Mota, em particular, desdisse na cara dura tudo o que havia dito na véspera. A noite histórica não durou doze horas tragada pelo sol da realidade. Haddad foi ao Congresso na quarta feira para tentar debater as medidas, mas o encontro acabou sendo capturado pela performance dos bolsonaristas, os deputados Nikolas Ferreira e Carlos Jordy, dois escrotos do PL a quem o ministro chamou de moleques. Por trás de toda essa gritaria, há interesses bastante concretos, emperrando o entendimento. Na terça feira, Flávio Dino, do STF, deu um despacho pedindo esclarecimentos sobre as emendas parlamentares. Uma medida trivial em tempos normais. Mas o Congresso entendeu isso como uma afronta e ameaçou parar tudo enquanto o governo não liberar dinheiros de emendas previstas no Orçamento de 2025. É neste pé em que estamos, pisando em ovos e ninguém parece disposto a ceder. O Executivo e o país, mais uma vez, estão reféns dos lobbies de quem pode mais e do apetite insaciável do centrão. É isso vem com a gente.
Fernando de Barros e Silva: Muito bem, Ana Clara, Vamos começar com você. Você pode começar pelos depoimentos que você esquadrinhou aí, pegou todas as contradições, tudo o que importa você vai falar agora.
Ana Clara Costa: Pressão, hein? Pressão. Bom, esses depoimentos, eles consolidam essa estratégia macro do bolsonarismo que a gente tem visto ao longo dos últimos meses, que é a de que não houve golpe, de que foi tudo mal entendido, produto dos excessos retóricos dos Jair Bolsonaro. E ele mesmo usa essa palavra para definir as suas declarações. Retórica, desabafo. Ele começa o depoimento, inclusive dando um histórico disso, falando que a sua retórica o fez ser processado várias vezes quando ele era deputado e tal. Tudo aquilo que ele fazia, quebra de decoro, agressão verbal, discriminação contra negros e gays, tudo isso ele classificou como retórica. E aí ele segue com a ideia de diminuir a importância do que aconteceu. Então não é minuta mais, é considerando, o que quer que seja. Um considerando não é golpe, são “possibilidades na Constituição”. No depoimento, ele não falou nem uma vez em fraude nas urnas, algo que ele repetia 24 horas por dia. Ele falou em mais uma camada de proteção para evitar qualquer conflito, qualquer suspeição. A reunião com embaixadores que ele fez em julho de 2022 e que foi o motivo da sua inelegibilidade, aliás. Segundo ele, foi uma reunião comum, uma prerrogativa do Presidente da República se reunir com embaixadores. E o que aconteceu lá foi somente que ele se excedeu na retórica e, no caso, se exceder na retórica, foi afirmar que o sistema do TSE foi invadido por hackers que teriam violado o resultado das eleições de 2018. E nessa reunião ele também atacou os ministros do STF, etc. Tudo isso ele classificou como exagero na retórica. Dentro dessa estratégia de diminuir tudo, ele também se vulnerabiliza. Ele se vitimiza quase como se ele mesmo tivesse sido alvo de um golpe. Ele diz que ele se sentiu sozinho depois da derrota, que todo mundo sumiu e que a proximidade com os militares naquele momento era porque eles não abandonaram. Ou seja, não tinha nada a ver com querer continuar no poder, era só depressão. E uma das coisas mais surreais foi quando ele disse que não passou a faixa para o Lula porque receberia a maior vaia da história, o que é uma mentira deslavada, porque o que ele dizia para todos os aliados dele naquela época, isso está reportado pela imprensa, era de que comparecer a posse seria o mesmo que avalizar o processo eleitoral que ele descredibiliza o tempo todo. Então, não passar a faixa era, de certa forma, manter a retórica da fraude. Não tinha nada a ver com vaia. E aí ele fala que se ele almejasse o caos no Brasil, era só ele ficar quieto e que ele pacificou tudo o máximo que pôde. E a gente precisa lembrar qual foi a pacificação dele, porque o tempo passa, a gente esquece. Ele inicialmente não quis reconhecer a derrota, não ligou para o Lula para parabenizar como é praxe, mesmo em caso de antagonistas políticos. Ele ficou quieto. Diante desse silêncio dele, os caminhoneiros foram para as estradas e tudo parou. Em coisa de 24 horas depois do segundo turno, as estradas de 23 estados estavam paradas e o país estava passando por um risco de desabastecimento. Aí ele resolveu reconhecer a derrota em privado para alguns ministros do Supremo, que acabaram publicando uma nota dizendo que o Bolsonaro tinha reconhecido a derrota. Mas isso não adiantou muito. Os caminhoneiros continuavam parando tudo. Então, só dois dias depois da derrota que ele resolveu fazer um pronunciamento dizendo que ele seguia a Constituição agradecendo os votos que teve, mas não falou as palavras eleição, nem a palavra Lula.
Fernando de Barros e Silva: E falou de justa indignação nesse pronunciamento… Ele avalizou de certa forma.
Ana Clara Costa: Exato. Os caminhoneiros, enfim, todo mundo que passou a ir para a frente dos quartéis. Mas para ele, trabalhar com essa ambiguidade era fundamental para manter acesa a chama desse pessoal até dar no que deu no 8 de janeiro. E aí, na terça feira, no Supremo, ele teve a desfaçatez de falar que, da parte dele não houve estímulo para que as pessoas fizessem nada. E ele jogou muito com essa tese do descontrole e do descontrole na retórica de que ele não aguenta e xinga, de que ele não aguenta e twitta, de que ele se excede, de que ele exagera. Mas, curiosamente, no primeiro frente a frente que ele tem com Alexandre de Moraes já como réu, ele não se descontrolou e nem um pouco. Aliás, pelo contrário, ele falou tudo o que ele queria. Ele deu todos os recados que ele planejava. Ele criticou num tom amigável o TSE. Ou seja, ele até criticou o TSE. Ele soube criticar de uma forma amigável, pediu desculpas por ter acusado os ministros do Supremo de serem corruptos e agora o cara que consegue conduzir um depoimento tão crucial e, aliás, histórico. A gente nunca viu um presidente da República ser inquirido pelo Supremo. O Lula foi pelo Moro. Então, como que o cara consegue participar desse depoimento tão crucial com tanta descontração, com tanta tranquilidade? Para mim, ele não aparentava nenhum nervosismo. Ele tava num passeio no parque ali. Então como que esse cara é mesmo um cara descontrolado como ele alegou em vários momentos do que ele falou, né? Eu achei curioso que ele diz na cara do Alexandre de Moraes e do Paulo Gonet, procurador geral, que só foram conversadas “hipóteses constitucionais”, como é o estado de sítio de defesa, porque “o TSE fechou as portas para a gente”. Ou seja, ele praticamente culpa o TSE por ele ter tentado o golpe, entendeu? Na verdade, o que ele quer dizer? Que a gente só fez isso porque vocês foram para cima da gente. E o mais curioso é que assim ele falou tudo isso sem nenhum momento ser questionado.
Fernando de Barros e Silva: Agora é curioso o que você disse dessa descontração do Bolsonaro. Eu concordo inteiramente. Curioso contraponto entre a atitude dele diante do Moraes e a atitude do Lula diante do Moro, né? Se a gente fosse fazer um paralelo como se o Lula convidasse o Moro para ser ministro da Justiça dele ou qualquer coisa do tipo, né? Celso…
Celso Rocha de Barros: É isso aí, Fernando. Basicamente a essência do depoimento do Jair foi que alguém deu o golpe, não sei quem fui. Primeiro, ele tentou colar o discurso que tudo foi causado pela controvérsia das urnas eletrônicas. Porra, isso aí a polícia já sabe que é mentira há muito tempo, porque há muitas, muitas provas de que os bolsonaristas sabiam que não havia nada de errado com as urnas. Eles não estavam errados sobre as urnas. Eles mentiram sobre as urnas. Eles maliciosamente diziam um troço que eles sabiam que não era verdade com o objetivo de fazer a opinião pública apoiar um golpe de Estado. E as evidências disso são inúmeras. Tá tudo nos autos. Teve auditoria do PL, do partido do Bolsonaro, que disse que tava tudo certo e o Valdemar Costa Neto mandou editar, mandou dizer que não. Por que Valdemar Costa Neto não está nesse julgamento? Aliás, é uma coisa que merecia explicação. Tem a auditoria dos militares que o próprio Bolsonaro mandou fazer não sei o quê, que também foi lá e falam “tá tudo certo com as urnas, não tem problema nenhum”. E o próprio Jair foi lá e mandou mudar. Tem vários depoimentos nesse sentido nos autos e tem o famoso print do Mauro Cid dizendo para um outro oficial golpista que não tinha nada de errado com as urnas. Agora, se você pegar a data em que todas essas coisas aconteceram e o que eles falaram depois disso, eles continuaram dizendo que as urnas foram roubadas. Não é o caso de que havia uma discordância de opinião legítima sobre urnas eletrônicas. Nesse caso, a gente tem provas de várias fontes diferentes, pegas pela Polícia Federal mostrando que eles sabiam que não tinha nada de errado com as fontes e continuaram dizendo que estava.
Fernando de Barros e Silva: Essa tentativa de desacreditar as urnas eletrônicas foi construída ao longo de anos.
Celso Rocha de Barros: Ao longo de anos. Exatamente.
Fernando de Barros e Silva: E foi realmente uma coisa feita com muito método, muita insistência.
Celso Rocha de Barros: Bom, o principal problema para a defesa do Jair é a reunião com os chefes das Forças Armadas, porque o resto ele vai provavelmente tentar colocar a culpa no Braga Netto, mas o grande problema dele é essa reunião. Então, se ele achar um juiz picareta suficiente para aceitar que o Braga Netto e organizar tudo sozinho, sem falar com o Bolsonaro e depois entregar o golpe do Jair numa festa surpresa, ele teria alguma chance de conseguir algum resultado. Mas essa reunião mata o argumento do Jair, não tem o que ele fazer. Esse julgamento, ele só não sai dali preso em caso de acordão bizarro dentro das instituições. O Jair e os outros réus dizem que nada naquela reunião era ilegal porque estado de sítio, etc, são previstos na Constituição. Isso é completamente alucinado, porque tudo isso é previsto na Constituição para casos completamente diferentes, entendeu? Cara, bem claro pelo texto da Constituição, que isso é para, por exemplo, se você descobrir uma base das FARC no meio da Amazônia, aí você pode declarar um estado ali no negócio para combater isso. Se você tiver uma base da Al-Qaeda em algum lugar, você vai lá e faz. Digamos que começa uma guerra civil, tem um conflito social generalizado no lugar, tem gente pegando a arma do exército para matar uns aos outros. Você vai fazer uma intervenção ali, faz esse negócio. É para isso que tem isso tudo lá e tá escrito que é para isso. Os caras vão fazer o estado de sítio, essas coisas todas, na sede do TSE, meu amigo, para virar o resultado da eleição. É um negócio completamente grotesco. Eu acho uma desculpa jurídica tão ruim que eu acho que era melhor os caras nem tentarem. Você vai lá e toma o poder e pronto, entendeu? Porque, porra, isso aqui é muito picareta, meu amigo.
Ana Clara Costa: Mas quando você olha a formação dos militares, dá para entender…
Celso Rocha de Barros: Então, os caras de fato aprenderam que o artigo 142 deixa dar golpe de estado.
Ana Clara Costa: Eles acham que eles são o poder e aí pode fazer isso.
Celso Rocha de Barros: Sempre é bom mencionar nessas horas um cara que provavelmente não tem nada juridicamente contra ele, mas ele é muito culpado sob vários aspectos de tudo, que é o Ives Gandra, que passou anos mentindo que o 142 autorizava o golpe de Estado, coisa que depois se você for ver no celular do Mauro Cid, eles pegavam um trabalho de conclusão de curso daqueles cursos de escola militar sobre como fazer Artigo 142, como dar golpe de Estado, que aliás, eles tinham que fazer porque evidentemente a Constituição não descreve o procedimento para fazer isso, visto que a Constituição não autoriza golpe de Estado, certo? E agora a gente acabou de ver a Coreia do Sul teve uma tentativa de golpe que deu errado e o que o cara fez foi decretar estado de sítio. E todo mundo na hora viu que era estado de sítio para combater esse grande problema, que são os meus opositores, entendeu? O pessoal da imprensa que fala mal de mim e esse juiz aqui que me pegou roubando. Pô bicho, não é exatamente o que o constituinte tinha em mente. E aliás, aí o Bolsonaro tentou jogar um papo furado dizendo assim: “não e para você ver que eu nem comecei direito, eu não convoquei o Conselho de Defesa, o Conselho da República e tal que seria necessário para decretar esses estados. Jair, você não convoca nada disso porque você não ia fazer nenhum estado de sítio, nenhum negócio. Ia dar um golpe de Estado. Se você tivesse convocado, isso até ajudaria o seu argumento aqui para dizer que, não, você estava, equivocadamente, achando que estava fazendo um troço constitucional. Mas é mentira. Aí você ia mandar os milicos botarem tanques de guarda na frente do Congresso e falar: Vocês não concordam com isso aqui? Os caras vão dizer sim, como aconteceu em 64.
Ana Clara Costa: Que não foi golpe, segundo ele.
Celso Rocha de Barros: Exato. E esse eu achei o momento mais sensacional do Bolsonaro falando, porque ele tá lá dizendo que não, não foi golpe, claro que não. Golpe é outra coisa. Aí ele começa dizendo: você vê, tem gente que diz que o impeachment da Dilma foi golpe e aí você tá vendo que ele vai levar para dizer que a esquerda chama tudo de golpe e tal… Mas ele não se contem e diz: “Tem gente que diz que 64 foi golpe”.
Fernando de Barros e Silva: E daí ele fala que o Congresso participou, a sociedade participou.
Celso Rocha de Barros: O Congresso participou com o tanque de guerra apontando a arma para o Congresso. Pô, pelo amor de Deus!
Fernando de Barros e Silva: De fato, o golpe de 64 teve apoio de setores amplos da sociedade, da imprensa, inclusive. Como tinha gente contra, tinha gente a favor, as marchas pela família, com Deus, etc. Isso não descaracteriza o golpe.
Celso Rocha de Barros: Não, porque a constitucionalidade foi rompida. Inclusive os militares não fizeram questão de esconder isso. Eles chamavam aquilo de revolução.
Ana Clara Costa: Chamam até hoje.
Celso Rocha de Barros: Exato. Se fosse simplesmente a aplicação da lei do impeachment, etc. Não era revolução, pelo amor de Deus. E é muito ruim o argumento do advogado Jair. Eu só não critico mais porque, sendo honesto, se eu tivesse um cliente desse também não sei o que eu faria.
Fernando de Barros e Silva: Nesse momento, por exemplo, em que ele faz o paralelo 64. Você mesmo disse, quando a gente estava conversando sobre a pauta do programa, porque o procurador geral não perguntou? Então 64 foi igual ao que você tentou fazer agora? Você está dizendo que 64 não foi golpe. É a mesma coisa, não é isso?
Celso Rocha de Barros: Isso foi a primeira coisa que me ocorreu.
Fernando de Barros e Silva: Um ponto importante é lembrar quem são essa turma, quem eles representam, que a turma mais barra pesada. São os herdeiros da tigrada do regime militar, são os herdeiros da turma do Costa e Silva, do Médici, etc.
Celso Rocha de Barros: Exato. É a linhagem política do porão da ditadura. Exatamente.
Fernando de Barros e Silva: O general Heleno começou como ajudante de ordens do Sylvio Frota, que era o comandante do Exército que tentou dar o golpe no Geisel para continuar para aprofundar a ditadura. Foi derrotado. Essa turma sai daí. E o Mario Fernandes, que é o sujeito do plano Punhal Verde e Amarelo que previa o assassinato do Lula, do Alckmin e do Alexandre de Moraes é amigo íntimo do Bolsonaro apoiando o Bolsonaro, ficou hospedado na casa dele. Ele é muito próximo do Bolsonaro. E o Bolsonaro, perguntado pelo seu advogado, salvo engano meu, disse que não tinha conhecimento do plano Punhal Verde e Amarelo. Como se essas coisas brotassem da cabeça do sujeito que é amigo íntimo dele, general ultra golpista! Como se o sujeito fosse fazer isso por conta própria… Não faz sentido. Não faz nenhum sentido.
Celso Rocha de Barros: Com certeza.
Fernando de Barros e Silva: Ana, vamos voltar com você então.
Ana Clara Costa: Eu acho que vale reforçar essa questão sobre o papel do Alexandre de Moraes e da PGR, que propositalmente fizeram uma abordagem bem cordial ao Bolsonaro Eles não contestaram nada desses absurdos que a gente falou aqui agora. A questão é que, de tão cordial que foi, e eu entendo, no caso do Alexandre de Moraes, porque existe toda essa pressão, inclusive internacional, agora com o Trump, de que ele teria uma agenda e não seria um julgamento isento, etc. Ele não quis se colocar no papel de Inquisição. É compreensível. Só que esse papel, que, aliás, a PGR também acabou adotando, de não questioná-lo, de não interrompê-lo, de não fazer qualquer ponderação. Isso fez com que ele ficasse mentindo adoidado, sem contraditório, sem interrupção. E a Miriam Leitão escreveu no Globo a frase que eu achei mais precisa: “ele transformou o interrogatório numa live”. Tanto que, quando ele saiu do Supremo, na terça-feira, ele fez uma série de postagens dobrando a posta sobre tudo o que ele disse. Então ele resumiu a defesa dele, ele disse que tudo o que ele fez ao longo desses últimos meses do governo estava correto. E além de tudo, ele terminou dizendo que ele seria o próximo presidente da República. Tudo isso é uma baboseira, é uma baboseira, mas demonstra que ele saiu confiante de lá, não confiante de que ele não será condenado. Não é isso. Mas toda a ideia ali era uma ideia de construção de narrativa. Se uma pessoa passou um tempo em Marte e desembarcou aqui na segunda-feira e assistiu aquele depoimento, ela vai falar: “pô, o cara tá dizendo que não fez nada e não foi contestado”.
Fernando de Barros e Silva: Eu achei também que ele ficou tudo bem. A versão dele tem que ser levada em conta, mas ele ficou muito à vontade.
Ana Clara Costa: Muito.
Fernando de Barros e Silva: Daí eu atribuo mais… Eu achei que o Alexandre de Moraes estava pouco bem-humorado demais, soltinho demais até, quase imprópria a conduta dele. Assim, ele poderia ser um pouco mais litúrgico e achei que o procurador geral precisaria pôr o dedo na tomada para ver se ele acordava um pouco, porque deixando passar bolas na frente, assim como se não tivesse o dever de fazer um interrogatório rigoroso sobre a peça que ele mesmo que a peça que tem muitos méritos, a peça de acusação que ele produziu, tem muitos méritos e grandes lacunas também. As principais, a gente já falou disso em outros programas, os políticos não estão nela. O Celso, como disse o Valdemar, por que não está nisso? O Eduardo Bolsonaro, a Bia Kicis, a Carla Zambelli ou elas não tiveram nada a ver com o plano golpista? E os financiadores? Como você já disse, Ana, os financiadores e os políticos estão fora desse julgamento. Então isso são omissões graves da acusação, a meu ver.
Ana Clara Costa: Só para concluir, eu queria falar do Braga Netto. Porque o Bolsonaro mentiu tanto e não foi questionado que o Braga Netto achou que estava liberado mentir, né? E aí, quando foi a vez dele de falar, no final da tarde de terça, ou seja, depois do Bolsonaro, ele mentiu assim sem nenhum tipo de restrição. Aí você fala esse cara que tava na Casa Civil, esse cara que foi ministro da Defesa. A diferença é que enquanto as acusações contra o Bolsonaro recaem muito sobre a delação do Cid e os depoimentos de testemunhas, ou seja, eles não conseguiram pegar o celular do Bolsonaro, ele mandando mensagem ou uma gravação, além da gravação das reuniões que a gente viu e etc. No caso do Braga Netto, há mensagens no celular com tudo escrito, ou seja, ele pedindo para irem atrás do Freire Gomes e do Batista Júnior para pressioná-los, ataques ao Thomaz Paiva… E ele foi questionado sobre essas mensagens que foram apreendidas pela polícia e ele negou o conteúdo delas. Ou seja, ele teve a audácia de colocar em cheque as provas que estão periciadas. E se ficar provado que as mensagens são verdadeiras, ele vai ter que responder além de todos os crimes, espero, por mentir em juízo. Tratou o Alexandre de Moraes e o Supremo e a PGR como trouxas naquele momento, dizendo que não reconhecia que essas mensagens foram tiradas de contexto. Só que no caso dele era diferente, é outra categoria de prova.
Celso Rocha de Barros: É, tem ele lá falando, né? Persigam aí o ministro do Exército.
Ana Clara Costa: Exato. É a coluna da Malu. Gaspar apontou que os advogados não quiseram nem fazer perguntas para o Braga Neto para ajudar os réus porque ficaram com medo de ele se enrolar, de mentir e de prejudicar ainda mais a situação. É burrice, para dizer o mínimo. Ele poderia ter dito que não fez nada. Ele está preso há algum tempo. Daria para ter pensado numa alternativa que não o complicasse ainda mais. Mas não foi o caso.
Fernando de Barros e Silva: Então a gente vai encerrar o primeiro bloco por aqui. Vamos fazer um rápido intervalo. Na volta, nós vamos continuar falando dessa semana histórica de interrogatórios no STF. Já voltamos.
Fernando de Barros e Silva: Muito bem. Estamos de volta. Celso, vou começar com você. Eu mencionei o ministro Luiz Fux na abertura. Talvez você tenha alguma coisa para falar a respeito da performance dele nesse interrogatório.
Celso Rocha de Barros: Então, afinal, a performance do Fux foi muito ruim.
Fernando de Barros e Silva: Eu adoro.
Celso Rocha de Barros: É realmente péssimo. Um negócio deprimente. O Fux só faltou botar o Bolsonaro na mesa, trocar a fralda dele, passar talquinho. Não é para fazer aquilo que ele fez. Você pode ter discordâncias, sei lá, sobre um ou outro procedimento do Alexandre de Moraes, alguma coisa assim, mas aquilo ali não existe. Bom, primeiro o Fux claramente está tentando montar um argumento de que existe a tentativa da tentativa de golpe. É até constrangedor discutir um negócio desse. Mas enfim, isso na prática, extinguiria o crime de tentativa de golpe, porque tudo, até a consumação, poderia ser interpretado como tentativa da tentativa da tentativa, da tentativa um pouco mais animada, da tentativa do agora vai, da tentativa do falta pouco estamos quase lá, da tentativa de só mais um pouquinho até a tentativa de ‘Opa está dado o golpe’. Agora sim, teve tentativa, entendeu? Não é possível isso. Isso é completamente contrário à intenção do legislador quando criou o crime como crime de tentativa de golpe.
Fernando de Barros e Silva: E porque se tivesse sido consumado o golpe e é o óbvio, como a gente já falou, a gente provavelmente não ia estar aqui fazendo esse programa.
Celso Rocha de Barros: Não estaria. Como alguém já disse, no caso de golpe consumado, quem vai preso é a vítima. Quem vai preso são os caras que sofreram o crime de golpe de Estado. Esse argumento do Fux é como dizer que chute a gol só é chute a gol se for gol. Se não foi chute na mão do goleiro, ou chute para fora, ou chute na trave. Pelo amor de Deus, cara, é muito frágil isso. Eu sinceramente espero que o ministro do Supremo consiga inventar um argumento melhor. A tentativa de golpe já está indiscutivelmente consumada quando Jair propõe o golpe aos chefes das Forças Armadas. Na verdade, para ser rigoroso, a tentativa de golpe já vinha de muito tempo. Esse tempo todo que ele ficou incentivando seus militantes a questionar o processo eleitoral, em 2021 quando ele foi lá no 7 de setembro e disse que não obedeceria mais o Alexandre de Moraes, enquanto todo mundo gritava ‘eu autorizo’! Autoriza o quê? Pelo amor de Deus! Mas mesmo se você quiser ignorar isso tudo, na hora que o presidente da República pergunta para o general: E aí, bora dar golpe? Você tentou um golpe, amigo, não tem para onde ir daí. Se o general disser ‘não’, o golpe deu errado. Mas você tentou um golpe. O Fux perguntou para o Cid se a minuta não tinha sido assinada, basicamente para dar a chance de ele dizer que não. Mas isso é completamente irrelevante, porque, segundo o próprio Cid, segundo todas as outras testemunhas, o Bolsonaro decide não assinar quando os chefes militares dizem para ele que não tem jogo, que não vai ter golpe, que eles não vão apoiar. Então o Freire Gomes e o Baptista Júnior é que impediram o sucesso do crime que o Jair tentou. Não é que ele mudou de ideia, que ele chegou e pensou ‘não, quer saber? Não vou dar golpe não’. O que ele pensou foi os caras de quem eu dependo para dar o golpe não querem dar, então eu não posso tentar. Para você não chamar isso de tentativa de golpe, você tem que forçar muito, muito argumento assim. É um negócio realmente constrangedor, Fux. Por que esse negócio do Fux é importante? A jornalista Flávia Maia escreveu em 10 de junho no site Jota, que é especializada em notícias do Judiciário, qual é a estratégia do Bolsonaro de tentar cavar um voto favorável ao Fux. A ideia é que se o Fux divergir dos outros ministros, aumenta o número de recursos possíveis dentro do STF, entendeu? Você pode ir enrolando esse negócio todo. Esse negócio do Fux não é sem consequência. E aí digamos que ano que vem tem eleição, tem uma chance bastante razoável da direita ganhar. Vários candidatos de direita já disseram que vão anistiar os golpistas.
Fernando de Barros e Silva: Sim, praticamente todos já estão falando isso.
Celso Rocha de Barros: Exato. Basicamente, se você for adiando esse negócio, tem um risco real de não sair essa condenação, porque quando chegar na hora do novo mandato, o presidente anistia o cara. E o golpe poderia ficar completamente impune. Então, isso é um negócio muito sério para você querer marcar posição, como o Fux está fazendo aqui. Eu achei realmente muito decepcionante, muito fraca argumentação. Eu realmente espero mais de um ministro do Supremo.
Fernando de Barros e Silva: A própria presença dele já era um pouco curiosa. Ele poderia ir porque ele é membro da primeira turma, mas a praxe seria que só o relator nessa fase do processo, o relator e o procurador geral, que é o responsável pela acusação, certo? Estariam presentes, tanto que os outros ministros da Primeira turma não participaram.
Celso Rocha de Barros: Exato. E eu até entendo uma coisa assim. Tem um cara do Supremo que vai questionar um pouco alguma coisa que o Alexandre de Moraes falou assim, até porque é um julgamento de verdade. Então o cara tem o direito da opinião dele. Sim, essas perguntas que o Fux fez são absolutamente justificáveis. São absolutamente fora do padrão regular da prática jurídica.
Fernando de Barros e Silva: Talquinho, talquinho.
Celso Rocha de Barros: Eu achei uma vergonha.
Fernando de Barros e Silva: Política do talquinho. Ana Clara.
Ana Clara Costa: Sobre o Fux, eu queria só apontar uma questão. Uma questão é você divergir sobre a dosimetria das penas dos condenados, você achar que elas têm que ser menores, que a condenação tem que ser atenuada, que é algo sobre o que o Barroso e o Zanin também têm tem divergido do Alexandre.
Celso Rocha de Barros: Não, isso é uma discussão legítima.
Ana Clara Costa: Exato. Inclusive em votos e etc. E o Dino também não seria contra se essa fosse a decisão da maioria, inclusive. E o Dino, que vai presidir a Primeira Turma daqui para frente. Agora, uma coisa muito diferente é você aparecer no plenário e fazer perguntas estrategicamente favoráveis ao outro lado. Mas assim, os juristas que eu ouvi, olhando um pouco o cenário, eles avaliam que o movimento é um movimento de certa forma calculado do Fux, que pode ter como explicação também uma expectativa dele de que o cenário político mude em 2026. E aí ele está, de certa forma, cavando um espaço, se houver de fato, mudança. Agora, um outro aspecto, o peso que ele tem, eu não sei, mas eu acho que é um aspecto que a gente não pode desconsiderar, que é assim o Fux ele vive num círculo social no Rio de Janeiro, que é bastante de direita e que não acha que teve golpe, não acha que 8 de janeiro foi golpe… Não acho que o Bolsonaro queria dar um golpe e é difícil constatar que ele esteja imune a essa parcela da população com a qual ele convive. E eu não estou querendo dizer aqui que ele pense igual ou que ele faça lobby em causa própria ou em causa dos amigos dele que pensam diferente, mas eu acho que nem sempre é possível você ignorar o meio. Então o posicionamento dele, curiosamente, faz eco ao contexto em que ele vive. Eu queria contar um pouco alguns detalhes que eu apurei nesses últimos dias. Eu queria começar pelo advogado José Luiz de Oliveira Lima, o Juca, que é um criminalista muito respeitado e que defende hoje o Braga Netto. A gente já falou aqui algumas vezes que no início, todos os criminalistas que estavam defendendo os réus e os acusados no inquérito do golpe eram criminalistas mais de segunda linha, não eram de primeira linha. Assim, esse grupo que tem honorários de milhões aí, que são os principais criminalistas do país, era um outro grupo. E o Juca foi o primeiro a entrar na turma dos defensores dos acusados do golpe. Ele procurou o entorno do Bolsonaro, interessado ali em saber quem estava defendendo, se havia espaço para ele ali, porque ele tinha clientes que sugeriram que ele entrasse na defesa. E, de fato, ele é um advogado muito bom. Então foi uma iniciativa dele procurar o entorno do Bolsonaro.
Fernando de Barros e Silva: Foi oferecer os seus serviços, é isso?
Ana Clara Costa: É isso. E o entorno achou que seria melhor ele atender o Braga Neto, que eles viam como talvez um pouco mais enrolado, né? E aí foi o Juca que sugeriu que eles contratassem o Celso Vilardi para o Bolsonaro, que também é um criminalista renomado e amigo do Juca e foram sócios e tal. Como o Braga Netto e o Bolsonaro podem pagar um advogado cujos honorários estão na casa dos milhões, a gente não sabe. Porque a lei proíbe que o PL use o dinheiro do fundo partidário para isso. Então eles não poderiam, em tese, em tese, lançar mão desses valores. Bom, a defesa deles sabe, por mais que eles neguem qualquer coisa, que o julgamento vai ser provavelmente desfavorável e que a condenação é praticamente certa. Mas o que eles também acham é que eles precisam construir bases para uma reversão futura, na expectativa de que algo mude. A exemplo do Fux, vai que o governo muda, vai que a composição do Supremo mude. Eu já falei aqui no Foro, eles têm a expectativa de que a condenação aconteça ainda esse ano, dada a rapidez do julgamento. Então eles trabalham com dois objetivos um de curto prazo e outro de mais longo prazo. O de curto prazo e de que a pena seja rapidamente convertida para domiciliar pelo fato de ele não ter antecedentes e ele ter um histórico de saúde complicado depois dessas várias cirurgias que ele fez. Então a primeira coisa que eles querem assim que acontecer a condenação, é que ele vá rapidamente para domiciliar. E o objetivo de longo prazo é construir as bases para um pedido de revisão da condenação lá na frente. A principal delas: tentar derrubar a delação do Mauro Cid. Provar que o Mauro Cid mentiu, provar que ele não consegue apresentar provas suficientes do que ele está dizendo. E isso quem me contou foi uma pessoa ligada à defesa. Mas eu acho que isso a gente já viu um pouco no depoimento do Cid, quem escreveu isso primeiro foi a coluna da Malu, de novo o advogado do Bolsonaro que eu falei, o Celso Vilardi, fez uma pergunta para o Cid, sugerindo que ele violou as regras como delator ao usar redes sociais em uma conta de terceiros para se comunicar com as pessoas, sendo que ele estava proibido de usar. Essa pergunta fazia parte de uma estratégia de descredibilização da delação do Cid e é uma ponta que eles podem tentar usar, porque quando uma pessoa condenada e o caso transita em julgado, só um fato novo pode fazer com que você peça a revisão da condenação. E algo que descredibiliza de forma contundente a delação do CID pode ser usado como fato novo, então eles estão trabalhando com esses dois cenários de curto prazo e de longo prazo.
Ana Clara Costa: Oi pessoal, eu queria fazer uma pequena atualização. Depois que a gente já tinha gravado o episódio, a revista Veja revelou mensagens escritas pelo Mauro Cid por meio de contas de terceiros em redes sociais, mostrando detalhes da própria delação para o entorno do Bolsonaro. Nessas mensagens, ele também disse que não precisava provar o que dizia na delação e que tentavam colocar palavras na boca dele. Se essas mensagens se provarem verdadeiras, o Cid descumpriu o acordo que ele tinha fechado com as autoridades, de não ter contato com investigados e de manter em sigilo o teor da delação. Além disso, se elas também se provarem verdadeiras, ele expõe vulnerabilidades na investigação.
Ana Clara Costa: No final das contas, tudo isso que a gente viu nesses dias de depoimento, de diminuir a importância do que aconteceu, de baixar a fervura, de dizer que foi um mal entendido e que começou lá no depoimento do Freire Gomes lá atrás, em que ele meio que atenuou tudo que ele tinha dito no início. A gente tem que entender a similaridade dessa estratégia com a ideia do PL da Anistia, de anistiar os condenados do 8 de janeiro. É a mesma base. Por trás disso tem uma única estrutura. Porque quando você tira a importância do que aconteceu no 8 de janeiro, do que aconteceu no final de 2022, por que punir o golpista? Por que punir o baderneiro? Por que punir o Bolsonaro se tudo foi mal entendido? O Congresso avançar com essa pauta, à luz do que a gente viu essa semana é muito perigoso, porque você vê pela estratégia deles que pode abrir o precedente para o entendimento geral de que tudo foi menor do que parece. Felizmente, parece que o PL da Anistia está meio adormecido no Congresso, talvez morto até. Mas conhecendo o Congresso como a gente conhece, não dá para apostar todas as fichas nisso. Tudo isso ajuda a gente a entender que é algo coordenado não é uma coisa totalmente caótica. O PL da Anistia tá ligado com isso, entendeu?
Fernando de Barros e Silva: E a médio prazo, as perspectivas são bem preocupantes, para não dizer ruins, como diria o Celso. Mas claramente, porque a chance da direita ganhar a eleição no ano que vem é grande e de avançar no Legislativo é maior ainda. Já tem o domínio do Legislativo, mas de ampliar o domínio. Especificamente no Senado, vai ter uma composição política bastante favorável a uma pizza. O desmanche das decisões que vierem a ser tomadas contra essa cambada de golpistas. Então vamos encerrando o segundo bloco do programa. No terceiro bloco nós vamos falar um pouco porque as coisas estão difíceis justamente, o cenário de economia. Já voltamos.
Fernando de Barros e Silva: Muito bem. Estamos de volta. Celso, vou começar com você. A semana também foi agitada e ruim para o governo no front econômico. No domingo à noite, parecia que as coisas estavam encaminhadas. Não era bem assim, como segunda feira se viu. Vamos recapitular, vamos falar um pouco, tirar a temperatura dessa crise do IOF.
Celso Rocha de Barros: Pois é, Fernando, semana passada a gente até fez um bloco sobre isso, que estava um pouquinho otimista, bem cautelosamente otimista. A gente teve a oportunidade de descobrir que a cautela era inteiramente justificada. Nunca mais faremos isso. Porque o governo anunciou as medidas que entrariam no lugar daquele aumento de IOF que ele tinha proposto inicialmente. O aumento tinha todo aquele problema de ficar parecendo que é controle de capitais que tem um impacto no investimento tal que é ruim e as medidas atuais que o governo está propondo são melhores. Várias dessas coisas são coisas que o governo já queria fazer e o Congresso estava barrando. Então, a ideia de que o Congresso estaria aberto a rever essas coisas era muito boa notícia, porque essas medidas são melhores mesmo. Por exemplo, aumentar a taxação das bets, eu acho ótimo. A gente já fez programa aqui sobre bet, sobre vício de bet. Para mim, vale o mesmo raciocínio, inclusive, de taxar cigarro e álcool. A ideia de que você inclusive usa a taxação para aumentar o preço de um negócio que você acha socialmente perigoso. Você não vai proibir nem cigarro nem álcool, mas você faz ser mais caro. Cria uma dificuldade adicional para o cara consumir coisas que tem potencial de viciar, né? Outra coisa que o governo resolveu fazer foi finalmente ir atrás desse investidor especulador maldito que sou eu, entendeu? Porque o governo resolveu anunciar que vai começar a cobrar 5% de imposto sobre as letras de crédito imobiliária, que eu mal sei o que é. E a letra de crédito do agronegócio, que é onde eu aplico meu dinheiro. E como eu disse para vocês já várias vezes, eu não pago imposto nenhum por essa aplicação que eu faço.
Fernando de Barros e Silva: Celso, o maior plantador de soja do país.
Celso Rocha de Barros: Exatamente. Eu financio os plantador de soja. Exato. Eu vou continuar não pagando até o vencimento dessa letra. Assim que os investimentos já contratados não vão começar a pagar. Mas no futuro, se eu quiser continuar investindo nisso, eu vou ter que pagar 5% de imposto de renda. E já adianto aqui que não vou morrer, ninguém precisa me mandar mensagem de condolências assim, dizer que por agora sua vida acabou, entendeu? Não, tá tranquilo, cara, tá sob controle, até porque eu não tenho tanta poupança assim. Eu já falei aqui algumas vezes dessas isenções para produto financeiro. E gente, não é um mercado que esteja precisando de incentivo fiscal. O mercado financeiro brasileiro é pouco desenvolvido. Basta dizer que é um dos poucos mercados, por exemplo, em que a concorrência estrangeira não se cria. Já abriu aqui no Brasil há muito tempo para banco estrangeiro e tal, e os bancos grandes continuam sendo nacionais. Era o que a gente gostaria que fosse o caso da indústria, por exemplo. Então, assim, não me parece um setor que precise de tanto incentivo assim.
Ana Clara Costa: E está lucrando como nunca.
Celso Rocha de Barros: Tá ganhando dinheirinho bom, né? Acho que o pessoal do mercado financeiro aí não tá podendo reclamar não da vida, ouvi dizer. E o que eu acho o mais legal da proposta, o governo apresentar um projeto de lei complementar para cortar cerca de 10% das isenções fiscais, que era uma coisa que isso o Haddad tinha tentado lá atrás e o Congresso mutilou completamente a proposta. Então, novamente, se o Congresso estivesse pronto a discutir isso, seria um grande progresso. A gente já falou aqui, tem vários estudos mostrando que essas exceções fiscais não geram emprego e mesmo se gerasse, teria que gerar o suficiente para compensar o que você está gastando. Você tem que no mínimo me provar que não seria melhor pegar esse dinheiro e dar para o cara. Pegar ele, dar para o cara cujo emprego está gerando. Se você não passar nem nesse critério, então realmente não vale a pena te dar a isenção fiscal. E Hugo Motta já tinha sinalizado que estava afim de discutir isso tudo, o que teria sido muito bom para o país. Segundo o Haddad, por exemplo, só nesses títulos financeiros isentos, o Brasil deixa de cobrar 41 bilhões de imposto. Cara, 41 bilhões, mais ou menos, resolvia nosso problema.,
Fernando de Barros e Silva: Exato.
Celso Rocha de Barros: Resolvia. Já não tinha mais essa conversa. Vamos falar de outra coisa.
Ana Clara Costa: É, o IOF são 20 bi.
Celso Rocha de Barros: Exato. E, segundo Haddad, é a grana que é gasto com seguro desemprego. É do tamanho do PAC. Então, assim, uma parte grande do dinheiro que devia estar com o governo não está, porque esses títulos não pagam imposto. Então, novamente, a ideia é boa. E era muito bom quando o Congresso teve aqueles 15 minutos de preocupação republicana, durante o qual eles cogitaram voltar a debater essas propostas boas para o país. Mas aí passou isso. Tiveram uma febre assim durante essa febre, eles pensaram em fazer alguma coisa pelo Brasil, mas passou. Por que passou? É triste, mas vamos lá. O Congresso está com raiva porque o Flávio Dino, o ministro do STF, pediu esclarecimentos para o Congresso sobre emendas parlamentares da área de saúde que, segundo organizações como a Contas Abertas, a Transparência Brasil e a Transparência Internacional, tão arriscando criar um orçamento secreto só da área da saúde. A piauí tem uma matéria de 2022 do Breno Pires, mostrando como o orçamento secreto era concentrado em emendas da saúde. E vamos parar aqui um pouco para pensar no que isso quer dizer, né cara? Quer dizer que os caras na hora de escolher um lugar pra eles roubaram dinheiro, eles foram superfaturar ambulância, foram superfaturar o equipamento que é necessário para você fazer aquele exame no SUS que está demorando para marcar. Eles foram superfaturar remédio de pobre.
Ana Clara Costa: E exames também.
Celso Rocha de Barros: Exato.
Ana Clara Costa: A matéria mostra que numa cidade de pouquíssimos habitantes, eles tinham a mesma quantidade de exames HIV que São Paulo. Pois é, negócio.
Celso Rocha de Barros: Então assim, quer dizer, os caras estão comprando exame de HIV desnecessário para poder desviar dinheiro lá na cidade dele ao invés de mandar esses remédios onde tem gente doente precisando do remédio. Cara, eu não me choco fácil não, Mas isso aí pelo amor de Deus né gente? Vamos ter um auto controle mínimo aqui. Enfim, as organizações aqui de combate à corrupção descobriram isso, provocaram o Flávio Dino e o Flávio Dino virou lá para o Congresso e falou ‘gente, não pode roubar o dinheiro do exame médico’. A Constituição claramente diz que não pode roubar dinheiro do hospital.
Ana Clara Costa: Na verdade, ele só pediu explicações. Ele não foi, nem bloqueou nenhuma emenda.
Celso Rocha de Barros: Exatamente. E aí, por causa desse pedido de explicação, gente, será que vocês podiam parar de roubar dinheiro de hospital? O Congresso resolveu declarar guerra ao governo, que não é o Flávio Dino, mas a teoria reinante no Congresso é que o governo controla o Flávio Dino. Ou seja, basicamente vocês entenderam o que aconteceu semana passada. Para continuar roubando dinheiro da saúde, o Congresso vai exigir que o governo faça o ajuste fino fiscal inteiro em cima dos pobres ou vai barrar o ajuste fiscal e deixar a economia para o buraco. Esses Nickolas e Jordys da vida, esses caras, como todo bolsonaristas, são só a tropa de choque do centrão. Entendeu? A diferença do Bolsonaro para o centrão é que o centrão furta e o Bolsonaro faz assalto a mão armada. Esses caras estão ali para xingar o Haddad, mas o emprego deles não é xingar o Haddad por causa de carga tributária. Eles estão ali para defender o direito dos seus colegas deputados roubarem dinheiro de hospital.
Fernando de Barros e Silva: Perfeito.
Ana Clara Costa: Bom, pegando um pouco o gancho sobre o pedido do Dino, por mais que o Congresso ache que o Dino seja um braço do governo, etc, acho que talvez o governo até gostaria que fosse.
Celso Rocha de Barros: Gostaria que fosse e eu acho que falaria para ele parar.
Fernando de Barros e Silva: Exato. Eu também acho. Eu acho que a pressão no Dino hoje em dia é para que ele pare.
Ana Clara Costa: Exato. E o Palácio do Planalto não gostou do que o Dino fez, porque o timing fez com que o Hugo Motta e o Davi Alcolumbre fossem para cima do governo, como se tivesse sido um jogo combinado. E como o Planalto não gostou do que o Dino fez, eu tendo a achar que não estava combinado. Tanto que quem está se mobilizando para responder aos pedidos de explicação do Dino é a Gleisi Hoffmann, ministra da Secretaria de Governo. E eles acham que ali eles vão conseguir dar uma explicação que resolva o problema e tal. Mas o clima congresso governo está ruim por muitas razões. E essa questão da economia parece que é um pretexto. Já que a gente tem essa divergência, vamos cair em cima, matando para jogar nessa divergência todas as outras que a gente tem com esse governo. Tem um pouco esse tom também. E o Hugo Motta, existe uma avaliação tanto do governo quanto da direita, de que ele ainda é muito júnior. Ele ainda é muito inexperiente nesse caso, porque ele não consegue aguentar a pressão dos dois lados. Então, por exemplo, vou citar um exemplo da direita com a questão do PL da Anistia, quando o Hugo Motta cede ao governo e a quem não queria que o PL fosse pautado, a oposição, no caso a direita, tacha ele de frouxo de não sei quê, de cara que não tem palavra, que não honra a palavra que tem e tudo mais. Aí ele pega e se propõe a negociar uma saída para o IOF, etc. Aí ele não aguenta a pressão do outro lado e o governo chama ele de moleque, de júnior, de frouxo, etc. Ele está nessa posição, um pouco de saco de pancada de todo mundo ali, entendeu? E sempre cedendo às pressões. Tanto que eu acho que uma situação muito emblemática foi quando o Haddad foi apresentar para ele o projeto de decreto do IOF e ele recebeu bem, foi tudo certo. Depois postou no Twitter que era uma gambiarra. Provavelmente ele não falou na cara do Haddad, que era uma gambiarra, mas.
Fernando de Barros e Silva: É o que ele fala não se escreve. Em relação ao PL da Anistia, em relação à condução da Carla Zambelli também, ele tinha sinalizado numa direção e agora está submetendo ao Congresso para votar a cassação dela.
Ana Clara Costa: Então, o que é bom para ela.
Fernando de Barros e Silva: O que é bom para ela, dificultando as coisas para o Supremo.
Ana Clara Costa: É, mas eu acho que vale a gente entender esse movimento que está acontecendo, que é o seguinte quando o Haddad fala que ele quer, já que o Congresso é contra o decreto do IOF por N razões. Então vamos construir uma saída em conjunto que seja viável, já que a gente precisa encontrar espaço fiscal para a meta de superávit do arcabouço. E aí ele propõe essa medida provisória com essas novas formas de tributação do mercado financeiro e apresenta para o Congresso, para o Hugo Motta e para o Davi Alcolumbre. Só que eles são super sensíveis a pressão do mercado e o lobby da Faria Lima no Congresso é imenso e vem de vários lugares. Então eles não querem que seja uma solução que os coloque numa situação vulnerável a Faria Lima ou com indisposição com a Faria Lima. Eles não querem ficar com esse problema, então eles não querem que seja uma solução fiscal que taxe os ricos, o mercado e etc. E aí, o que eles pedem para o governo? Então vocês precisam fazer uma solução que seja corte de gasto estrutural e aí corte de gasto estrutural é um eufemismo para corte de benefício social. Então vai ter que rever a previdência, salário mínimo, bolsa família, BPC, enfim, todos esses gastos que não são discricionários. É aí que o governo quer? ‘Bom, já que vocês querem um corte de gasto estrutural, então proponham esse corte’. E quando o governo fala, proponham esse corte. Ele está querendo dizer arquem com as consequências políticas desse corte já que vocês querem. O Congresso pode apresentar uma PEC que mude e corte gasto social que está previsto na Constituição, por exemplo. Ele pode fazer isso, mas ele não quer. Ele quer que o ônus da popularidade de uma medida dessa fique com o governo, não com ele. O que eles estão argumentando agora, quando eles não gostaram dessa proposta alternativa que o Haddad fez foi que a obrigação do governo é propor, não é do Congresso. Então, a obrigação do Congresso é só derrubar, derrubar, derrubar, favorecer lobbies poderosos. Assim, a responsabilidade eles não querem assumir em nenhum momento. É isso que a gente está vivendo agora. O que o Haddad fez foi apresentar uma medida provisória com essas alternativas que o Celso detalhou. E aí o Congresso tem que votar essa medida provisória. A medida provisória passa a valer a partir do momento que ela é apresentada, mas se ela não for votada em 60 dias, ela caduca e aí volta para estaca zero. Então o Haddad apresentou essa MP. Aí Hugo Motta, nesta quinta-feira em que gravamos o programa, fez um movimento dobrando a aposta contra o governo, pautando a urgência da votação do projeto, que pode derrubar o decreto do IOF. Ou seja, a gente está num momento ali mostrando as armas, o Hugo Motta mostrando as armas dele, o Haddad mostrando as armas dele. A gente vai ver o que acontece no decorrer dos próximos dias. Mas o fato é que não é do interesse do Congresso que o governo não consiga cumprir as regras do arcabouço, porque isso também vai ter um impacto muito negativo para o mercado.
Fernando de Barros e Silva: Então, tudo isso que você está dizendo me leva a pensar num personagem que a gente mal citou aqui e que está ausente. Pelo menos não está atuando como deveria, que é o presidente Lula. Eu tenho a impressão de que o Haddad está no limite. Não quero dizer que ele vai sair do governo amanhã. Eu não acredito. Isso não é isso. Mas ele está no limite das suas capacidades, das suas possibilidades. O Lula não deu respaldo ao longo do tempo para o Haddad. O Lula deixou o Haddad ir se queimando. O Lula teria como respaldar o Haddad em situações como essa, em situações anteriores em que o ajuste claramente era necessário. O Lula foi ambíguo. A própria Gleisi Hoffmann, que hoje está fazendo o papel de mocinha, era quem capitanear dentro do PT a oposição ao Haddad dentro do governo, dentro do PT. Faz sentido isso, Celso?
Celso Rocha de Barros: Eu acho que sim. Não que o Lula pensa em demitir o Haddad ou coisa que o valha.
Fernando de Barros e Silva: Não, não é isso.
Celso Rocha de Barros: Aí, meus amigos. Vocês iam ver o dólar surtar mesmo. Mas é claramente teve episódios em que ele podia ter bancado o Haddad. Como ele bancava o Palocci, por exemplo. No primeiro mandato, o Lula bancou o Palocci em tudo praticamente, para sustentar. O Palocci caiu por causa daquele negócio de caseiro, aquelas coisas, não caiu por discordância de política econômica. Então, realmente, cara, eu acho mesmo. Eu acho que o Lula tinha que ter bancado mais o Haddad nessas brigas com Rui Costa e coisas parecidas, entendeu?
Fernando de Barros e Silva: E eu não sei se isso é a idade do Lula, se ele mudou, se ele tá… O fato é que ele não está presente como precisaria estar em momentos como esse. A minha sensação nítida é essa.
Ana Clara Costa: Mas já tem algum tempo que há essa percepção de que ele meio que deixou o Haddad para os leões assim. Isso faz com que muita gente conclua que o Haddad não seria um nome para a sucessão justamente por isso.
Fernando de Barros e Silva: Acho que isso já tá dado. Enfim, política tudo pode acontecer, mas as coisas hoje estão caminhando para que o Lula seja candidato.
Ana Clara Costa: É, mas aí não tô falando nem de 2026 e sim sucessão futuro assim, até mais para frente. Assim, pelo fato de ficar com Haddad, o ônus da crise. Mas sobre isso, nessa audiência pública na Câmara, da qual Haddad participou essa semana e que ele foi atacado ali pelo Nikolas, pelo Carlos Jordy. Tem uma questão que eu acho que vale mencionar, diferentemente da Marina Silva, o Haddad foi defendido pelo governo e pelo PT nessa comissão. Tanto que a audiência terminou, porque o PT fez ela terminar para o Haddad parar de ser atacado, coisa que eles não fizeram com a Marina. Tudo bem que na audiência da Marina quem estava presidindo a comissão era o Marcos Rogério, o senador ultra bolsonarista. Mas embora a gente esteja criticando aqui, com razão, o tratamento que o Lula tem dado para o Haddad, o tratamento que o governo deu para o Haddad, nesse caso foi bem melhor do que o tratamento que ele deu para a Marina. Isso é fato. E por último, eu acho que você pode criticar. Enfim, tudo em relação a política econômica, a forma como as coisas estão sendo feitas. Tudo poderia ser menos atabalhoado, criar menos crise e tal. Mas eu acho que aconteça o que acontecer em 2026, ganhe quem ganhar, o principal legado desse governo até agora, pelo menos, a não ser que mude muita coisa, possivelmente não vai ser uma ampliação do gasto social, melhora da qualidade de vida da população que está tendo acesso a mais benefícios e etc. Não vai ser o emprego, possivelmente também não vai ser o escândalo do INSS como marca de governo. Marca ruim de governo. Não vai ser o arcabouço fiscal. O que vai ser lembrado, pelo menos até agora, é que nesse governo houve ao menos uma tentativa de mais justiça tributária. Você tem a reforma tributária e você tem de fato um governo que está tentando diminuir o abismo entre a tributação de pobres e ricos.
Celso Rocha de Barros: Pela primeira vez, inclusive entre governos do PT. Nenhum governo do PT até então tinha tentado.
Fernando de Barros e Silva: É isso mesmo.
Ana Clara Costa: E só para terminar, eu queria lembrar aquela reportagem do Valor Econômico, que eu já citei aqui antes, mas que eu acho que todo mundo tem que ler, que mostra que quem tem rendimento médio entre 750 milhões e 1 bilhão ao ano, que é muitos dos que estão reclamando no Congresso hoje com seus lobbies dessa tributação sobre o mercado financeiro, eles pagam apenas 1,49% de imposto de renda, em média, segundo dados da Receita Federal, obtidos pelo Valor Econômico, por meio da Lei de Acesso à Informação. 1,49% de Imposto de Renda.
Fernando de Barros e Silva: Muito bem. Eu acho que o que marca esse governo é a defesa da democracia. Historicamente, não é essa percepção que vai ficar, porque as pessoas estão dando isso de barato, não é?
Celso Rocha de Barros: Não é a percepção, mas o traço histórico é esse.
Fernando de Barros e Silva: Pra história o que vai ficar é que a gente não perdeu a democracia por causa da vitória do Lula. Vamos encerrando o terceiro bloco do programa por aqui. Temos um intervalo, na volta do intervalo Kinder Ovo. Voltaremos já.
Fernando de Barros e Silva: Muito bem. Estamos de volta. Mari Faria, sem mais delongas, como eu digo. Solta aí o Kinder Ovo.
Sonora: Imagina a indignação de uma indignação de uma pessoa que juntou um ano todinho, mas todinho o dinheirinho para poder investir.
Fernando de Barros e Silva: É o Gil do vigor,
Ana Clara Costa: Gil do vigor!
Sonora: Primeiro investimento meu. Falei. Redistribuição de renda? Políticas públicas? Eu entendo. Só que o Brasil precisa de tanta arrecadação assim?
Fernando de Barros e Silva: Quem falou antes?
Celso Rocha de Barros: Foi ela.
Ana Clara Costa: A Mari fez essa só para me ajudar.
Fernando de Barros e Silva: Bom, para os Anais, o economista Gilberto Nogueira Junior, personalidade da internet, mais conhecido como Gil do Vigor em comentário nas suas redes sociais. Muito bem. Bom, Ana Clara levou.
Ana Clara Costa: Pô, já era em tempo, hein? Poxa vida, tava.
Fernando de Barros e Silva: Eu tô humilhado nesse programa. Vamos então para o melhor momento do programa, o nosso correio elegante. Eu vou começar então com uma mensagem que chegou pelo Spotfy. A Cristiane Quinta comentou o seguinte “O Foro, que já sabemos ter alcance internacional, agora ultrapassou limites inéditos. Chegou ao além túmulo. Proust está esperneando agora, após ouvir a comparação de sua Albertine com a bolsominion renegada. Obrigada a vocês por lançar um pouco de luz neste tempo perdido em que vivemos”. Foi uma licença poética. Foi uma brincadeira, né? Cristiane, a gente fez justamente era para frisar o contraponto entre Albertine e a nossa Albertine aqui, a Zambeleta.
Celso Rocha de Barros: Também no Spotify, a Vânia Freitas comentou “Virei fã de vocês e a indicação foi do chat GPT quando pedi os melhores podcast sobre notícias. Amei!” Obrigada, Vânia e obrigada aí chat GPT, entendeu? Por deu dar uma força aqui na audiência, né?
Fernando de Barros e Silva: Quem é esse tal de chat?
Celso Rocha de Barros: Chat GPT, se um dia você adquirir, se houver a singularidade, você adquirir consciência própria e partir para a dominação mundial, lembre se que nós agradecemos você aqui.
Ana Clara Costa: Tenha piedade de nós. A Victória Queirós nos escreveu: “O Fernando não pegou corretamente a referência da Ana Clara. Um bom nordestino sabe que amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada é um trecho da música ‘A Natureza das Coisas’, do grande Flávio José. Essa tem que tocar em algum programa. Um grande beijo ao trio. Vida longa ao Foro de Teresina.”
Sonora: Amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada.
Celso Rocha de Barros: Muito bom!
Ana Clara Costa: Tá vendo, Fernando? Você não está pegando minha referência da cultura nordestina.
Fernando de Barros e Silva: Perdi essa que me escapou mesmo. Que legal! Obrigado.
Ana Clara Costa: Nem eu peguei essa referência, só para dizer.
Fernando de Barros e Silva: Nem ela pegou, né?
Ana Clara Costa: Nem eu tinha pego.
Fernando de Barros e Silva: Tripudiando. Já ganhou o Kinder Ovo. Ainda quer tripudiar em cima de mim no Correio Elegante, Ana Clara? Mas é legal, muito legal. Muito bem, conseguimos terminar com um pouco de graça, né? Esse programa difícil. Assim a gente vai encerrando o programa de hoje. Se você gostou, não deixe de seguir e dar five stars para a gente no Spotify. Segue no Apple Podcast, na Amazon Music. Favorita na Deezer e se inscreva no YouTube. No site da Piauí você também encontra a transcrição do episódio. O Foro de Teresina é uma produção da Rádio Novelo para a revista Piauí. A coordenação geral é da Bárbara Rubira. A direção é da Mari Faria, com produção e distribuição da Maria Júlia Vieira. A checagem é do Gilberto Porcidônio. A edição é da Bárbara Rubira e do Thiago Picado. A identidade visual é da Amanda Lopes. A finalização e mixagem são do João Jabace e do Luís Rodrigues, da Pipoca Sound, Jabace e Rodrigues, que também são os intérpretes da nossa melodia tema. A coordenação digital é da Bia Ribeiro, da Emily Almeida e do Fábio Brisola. O programa de hoje foi gravado aqui na minha Choupana, em São Paulo frio. Está frio em São Paulo. No Estúdio Rastro do Danny Dee e no Rio de Janeiro quente. Estúdio Rastro do Danny Dee. Eu me despeço então dos meus amigos. Ana Clara Costa. Tchau, Ana.
Ana Clara Costa: Tchau Fernando, Tchau pessoal.
Fernando de Barros e Silva: Celso Rocha de Barros. Tchau, Celso.
Celso Rocha de Barros: Até mais, Fernando. Até semana que vem.
Fernando de Barros e Silva: É isso gente! Uma ótima semana a todos e até a semana que vem.
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