O aquecimento global retoma espaço na agenda internacional. Foi tema de campanha do presidente americano, Joe Biden, que agora inicia ações internas e propõe reunião mundial sobre o tema para o próximo mês de abril. A China, a maior emissora de GEE (Gases do Efeito Estufa), apresenta plano zerando o efeito líquido de suas emissões de gases até 2060. A União Europeia inclui entre suas prioridades o chamado Acordo Verde, com repercussões no setor agrícola. Inexiste dúvida sobre os efeitos do gás carbônico, o principal deles, no aumento da temperatura global.
Sob qualquer métrica, os grandes emissores de GEE não incluem o Brasil. Cerca de 75% das emissões de GEE vêm de fontes fósseis, que nunca foram relevantes na matriz energética brasileira.
O problema brasileiro são as emissões de gás carbônico provenientes do desmatamento das florestas – e deveríamos ter esse ponto equacionado. Temos um Código Florestal que trabalha com modernos conceitos de manejo florestal, sustentabilidade e absorção de carbono. Falta ser rigorosamente observado seu cumprimento legal.
Com a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, o Brasil iniciou um processo de liderança no tema – e não somente porque a floresta Amazônica ocupa pouco menos da metade do território nacional. Somos o país dos biocombustíveis, do primeiro carro a álcool, do biodiesel, da geração de energia com a biomassa. A matriz energética brasileira contou no passado com importantes usinas hidrelétricas, com geração de energia renovável e limpa de emissões de carbono, antes mesmo das pressões por esse conceito. Desenvolvemos a energia eólica e avançaremos também na energia solar.
Já contamos com uma agricultura de baixo carbono, com enorme potencial para desenvolvimentos futuros na produção de alimentos. Estamos, ou estivemos, à frente em alguns temas – mas, para assim continuar, precisamos exigir prioridade e compromisso de todos em relação ao tema.
Perdemos a oportunidade de liderar, por exemplo, no recente comunicado sobre a Contribuição Nacional Desenvolvida (NDC), sinalizando as metas de redução de emissões de carbono a serem apresentadas na COP26 – Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. O encontro será realizado em novembro de 2021 em Glasgow, na Escócia, e seu debate se coaduna com a proposta de Joe Biden.
O Brasil propôs alterar critérios e metodologia de cálculo para comparações entre valores de 2005 com as reduções futuras de emissões – o que seria possível, mas não recomendável, até pela questão da frágil credibilidade brasileira no assunto. Em especial para um país que continua a ter sua principal fonte de emissões de gases do efeito estufa atrelada ao desmatamento da floresta amazônica – desmatamento ilegal perante a legislação nacional. E insustentável em relação a seus compromissos internacionais.
Pior ainda: o Brasil concordou em antecipar a data do compromisso de zerar emissões líquidas mediante compensação financeira, atitude que desmonta qualquer posição de liderança que o país possa almejar. O Brasil deveria pressionar o mundo a assumir compromissos maiores e antecipados. A remuneração financeira prevista no Acordo de Paris, e infelizmente ainda em processo de negociação, prevê transações entre países que apresentem déficits em seus compromissos de redução de emissões. A medida tem tudo para beneficiar o Brasil – não por negociação de antecipação de metas, conforme apresentado, e sim pela liderança em pressioná-los a realizar as transformações necessárias para todos.
O que o governo brasileiro não vê é que, quanto maior a ambição mundial em reduzir as emissões de carbono, mais energia renovável terá que ser consumida via biocombustíveis – e maior a oportunidade para o Brasil. Cumpriria ao Brasil pressionar os países desenvolvidos a ajustarem seu modo de vida e consumo de energia, pois isso claramente se reflete no aquecimento global. Caberia ao Brasil pressionar países em processo de desenvolvimento para que ajustem o rumo olhando o clima e o futuro. Assim como cumpriria ao Brasil já ter reduzido o grau de ilicitudes na região amazônica – clara obrigação não cumprida pelo poder público e que cada dia mais prejudica a sociedade, em especial a agropecuária.
O Brasil é o país para liderar a questão climática. Não para se colocar na posição atual – quando nunca é reconhecido como solução e é erroneamente apresentado como problema. Com propostas como a que foi apresentada, o Brasil corre o risco de se tornar pária no processo, quando deveria liderá-lo.