A sessão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já durava 2 horas e 46 minutos quando Efrain Cruz começou a ler o 45º parágrafo do seu voto. Naquele 9 de agosto de 2022, faltando apenas uma semana para terminar seu mandato como diretor da Aneel, Cruz estava sob pressão. Numa decisão inédita, individual e ilegal, ele havia determinado que as indenizações devidas a empresas transmissoras de energia, cujo impacto chegava a cerca de 13 bilhões de reais, deviam ser recalculadas, num caso conhecido no setor como RBSE. A decisão de Cruz havia sido derrubada pela diretora-geral substituta da Aneel, Camila Bomfim, porque a lei das agências reguladoras proíbe que decisões dessa natureza sejam tomadas individualmente. A Procuradoria Federal junto à Aneel adotou a mesma posição.
Por tudo isso, o advogado rondoniense Efrain Cruz estava nas cordas quando começou a ler o trecho do seu voto. E apelou à sua origem humilde. “Sou filho de uma parte do Brasil que muitos aqui até desconhecem, de pais analfabetos, de mãe dona do lar, meu pai analfabeto, deficiente físico e feirante, que nunca na seara dos estudos tiveram nem a condição de me ajudar na correção da fala, mas por outro lado me ensinaram valores que carrego por toda minha vida”, disse, a voz embargada, própria para sensibilizar os presentes. Segundo sustentou, o fato de sua decisão ser inédita não a caracterizava como ilegal. Não convenceu ninguém, sua decisão continuou revogada, mas o espanto estava renovado.
Em seus quatro anos como diretor da Aneel, Efrain Cruz causou muito espanto entre os técnicos, advogados e empresários do setor de energia, com decisões que contrariavam pareceres técnicos e, por vezes, a própria lei. Criou fama de deixar processos de molho, como se esperasse que os interessados lhe procurassem para uma conversa. Promoveu benefícios milionários a empresas que descumpriram contratos, tomou decisões heterodoxas, recebeu reprimendas públicas de órgãos de fiscalização. Mas chegou longe: ele acaba de ser escolhido secretário executivo do Ministério de Minas e Energia no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Embora seja mais político do que técnico, Efrain Cruz será o número dois do ministro Alexandre Silveira (psd), ocupando uma função com poderes enormes sobre a política energética, tema que é alvo constante de lobbies pesados. Com cheiro de enxofre no ar, assim que seu nome foi confirmado na sexta-feira 17, as ações das empresas de energia na Bolsa de São Paulo desabaram.
O caso mais polêmico em que Efrain Cruz se envolveu na Aneel diz respeito a um benefício excepcional que concedeu à Âmbar Energia S. A., empresa do grupo J&F, a holding dos irmãos Joesley e Wesley Batista, que controla a JBS, o colosso da indústria das carnes. A Âmbar havia comprado os projetos da empresa EPP que venceram o leilão emergencial realizado pelo governo federal em outubro de 2021, na crise hídrica. O certame, um dos mais caros da história do setor energético do Brasil, exigia a participação de novas usinas e previa que o atraso na construção dessas usinas implicaria multas pesadíssimas, superiores a 200 milhões de reais por mês, com a rescisão antecipada do contrato em caso de atraso superior a 90 dias. A Âmbar assumiu, então, o compromisso de construir quatro usinas, novas e emergenciais, mas não cumpriu os prazos contratuais, e tentou escapar da sanção da Aneel. Relator do processo, Efrain Cruz entrou em campo.
Em maio do ano passado, ele articulou uma decisão em que a Aneel autorizou que as obrigações assumidas pela Âmbar fossem atendidas pela Usina Termelétrica Mário Covas, conhecida como UTE Cuiabá, que já existia havia décadas. (A UTE Cuiabá é conhecida pela presença no noticiário policial desde que o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (MDB-PR), histórico aliado do então presidente Michel Temer, foi filmado correndo na rua com uma mala recheada de 500 mil reais. A bagagem era propina paga pela J&F, a holding dos irmãos Batista, dona da usina. A J&F queria destravar um negócio no Conselho Administrativo de Defesa Econômica.)
A decisão articulada por Efrain Cruz acabou sendo questionada por um recurso apresentado à Aneel pela Associação Brasileira dos Consumidores de Energia (Abrace), que classificou a decisão como desastrosa e apontou prejuízos de 20 bilhões aos consumidores. Além disso, o caso entrou na mira do Tribunal de Contas da União. “A substituição das termelétricas contratadas pela UTE Cuiabá, que estava em operação comercial à época da licitação, se caracteriza como infração à norma infralegal e aos termos contratuais”, disse a área técnica do TCU, citando o descumprimento a uma portaria do Ministério de Minas e Energia.
Os auditores do TCU consideraram a fundamentação da decisão frágil e destacaram que a decisão da Aneel concedia à Âmbar mais do que a própria empresa havia pedido. Ela apenas pedira para adiar o início do contrato, com o objetivo de tentar concluir as obras. Com o presente articulado por Efrain Cruz, a Âmbar foi duplamente beneficiada: não só deixou de pagar multas pelo atraso como passou a receber receitas pela energia gerada na UTE Cuiabá. Havia ainda uma vantagem colateral: os custos da energia previstos nos contratos do leilão emergencial, no contexto de crise hídrica, eram elevadíssimos: 1.594,84 reais por MWh, cerca de sete vezes o valor médio dos últimos dez leilões de energia nova, considerando as usinas a gás natural. Um trecho do relatório do TCU sobre essa operação é taxativo: “A decisão da Aneel, além de ilegal, foi temerária, no sentido de que colocou em risco a possibilidade de que a decisão fosse revista posteriormente sem que se pudesse atribuir os prejuízos aos demandantes, pois estes sequer fizeram o pedido que lhes foi deferido.”
Camila Bomfim, a diretora-geral substituta da Aneel, suspendeu a decisão cautelar que beneficiava a Âmbar no início de junho do ano passado. A área técnica da agência voltou a ser ouvida e manifestou-se contra a substituição das termelétricas. Ainda assim, os consumidores de energia tomaram um tombo. Considerando apenas o período em que a decisão surtiu efeitos antes de ser revogada, o TCU estimou um prejuízo de 126 milhões em multas que deixaram de ser arrecadadas pelo descumprimento do contrato. Esse dinheiro deveria ter sido pago para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que vai para o consumidor.
Mesmo depois disso tudo – da decisão de Bomfim, do parecer técnico e do prejuízo do TCU –, o colegiado da Aneel decidiu manter a decisão que beneficiava a Âmbar. Em sessão realizada no dia 12 de julho, o placar foi de 4 votos a 1. Chamou a atenção que em nenhum momento o processo foi encaminhado à Procuradoria Jurídica da Aneel para o devido parecer jurídico. Com a decisão, a Âmbar também ficou dispensada de pagar 209 milhões de reais por mês em multas que seriam destinadas aos consumidores.
Apesar de ter sido fruto de uma decisão colegiada na Aneel, o caso da Âmbar caiu no colo de Efrain Cruz por algumas razões, expressas pelo próprio TCU. Primeiro: o pedido da Âmbar foi mantido sob sigilo até o momento em que a Aneel concedeu a liminar que beneficiou a empresa. A falta de transparência impediu a manifestação de outros interessados. A principal razão, no entanto, é que o TCU considerou que Efrain Cruz havia extrapolado sua competência como relator perante a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Aconteceu o seguinte: a Âmbar pediu à CCEE, em 29 de julho, que flexibilizasse os critérios para o cumprimento das suas obrigações em relação às quatro usinas contratadas. Mas a CCEE apontou que, para isso, seria preciso uma autorização específica da Aneel. Foi aí que Efrain Cruz fez a lambança. Ele, relator no caso, respondeu à CCEE que estava de acordo com a flexibilização. Sustentou que a decisão colegiada que havia sido tomada antes em favor da Âmbar podia ser entendida como um aval da diretoria da Aneel. Na prática, Efrain Cruz, sozinho, determinou que a CCEE abrisse uma exceção à Âmbar — o que causou estranheza geral no setor elétrico. O mandato dele na Aneel terminou dias depois.
A história, no entanto, não se encerrou aí. Efrain Cruz foi desautorizado pela Diretoria-Geral da Aneel. Questionada pela CCEE sobre o ofício que ele mandara à CCEE, Camila Bomfim afirmou que o pedido da Âmbar Energia de um “tratamento diferenciado” não podia ser atendido nos termos que Efrain Cruz o fez. O caminho era mais longo: precisava passar pela “devida instrução técnica pelas superintendências”, ser distribuído para um novo diretor-relator e, por fim, passar por votação no colegiado. E nada disso tinha acontecido.
À época, nos bastidores, o então ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, chamou de absurda a decisão da Aneel liderada por Efrain Cruz. O Ministério de Minas e Energia emitiu nota técnica e parecer jurídico em reprovação à medida. “É clara a inadequação jurídica da decisão”, disse o parecer da consultoria jurídica do Ministério de Minas e Energia, que apontou afronta às competências do ministério, do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
A área técnica do TCU quis apurar a responsabilidade de Efrain Cruz e dos outros três diretores que acompanharam seu voto: Hélvio Neves Guerra, Ricardo Lavorato Tili e Sandoval de Araújo Feitosa Neto. Mas o relator do caso, ministro Benjamin Zymler, achou por bem primeiro ouvir a Aneel. O gerente executivo da auditoria interna da agência, em resposta à consulta do TCU, fez uma defesa burocrática dos diretores e da decisão e pediu que o caso fosse arquivado, mas nem se deu ao trabalho de rebater a usurpação de competência por parte de Efrain Cruz. Diante dessa manifestação inconsistente, os auditores do TCU decidiram continuar a investigação do caso. Uma das possibilidades é que Cruz e os demais diretores sejam investigados.
Procurado pela piauí para comentar o caso envolvendo a Âmbar, o grupo J&F não se manifestou.
Efrain Cruz ingressou na Aneel em 2018, indicado pelo presidente Michel Temer. Seu padrinho político era o então senador Valdir Raupp (MDB). Filiado ao MDB desde 2007, Efrain Cruz havia feito uma doação de 10 mil reais para a campanha eleitoral da deputada federal Marinha Raupp, mulher do senador, em 2014. Já no governo de Jair Bolsonaro, ele aproximou-se do senador bolsonarista Marcos Rogério (então no DEM, hoje filiado ao PL) e chegou a nomear a ex-mulher do senador, Andreia Schmidt, como sua assessora na Aneel. (Marcos Rogério foi o principal defensor de Bolsonaro na CPI da Pandemia, o que lhe deu prestígio junto ao ex-presidente.)
No ano passado, quando o mandato de Efrain Cruz estava perto do fim, Marcos Rogério lutou para nomeá-lo como diretor-geral da Aneel, o cargo máximo da agência. Mas o então ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, conseguiu emplacar o seu próprio afilhado, Sandoval Feitosa Neto – cujo mandato de diretor estava no fim. Como prêmio de consolação, Marcos Rogério indicou dois diretores da Aneel: Fernando Mosna, que era assistente júnior no seu gabinete parlamentar, e Ricardo Tili, próximo de Efrain Cruz. Conseguiu ainda uma terceira indicação: colocou a servidora comissionada Giovana Travassos Lucena dos Santos como assistente de direção da Aneel. Até 2021, a função anterior de Lucena dos Santos, segundo aparece no site do Senado, era de motorista do gabinete de Marcos Rogério até 2021.
Com o ocaso político de Marcos Rogério, que perdeu a eleição para governador em outubro passado e atualmente está de licença do Senado, Efrain Cruz trocou de figurino para se encaixar no governo Lula, ao estilo camaleão. Sua ascensão ao Ministério de Minas e Energia prova que deu certo, ainda que tenha produzido surpresa em razão de suas conexões bolsonaristas recentes. Notas na imprensa disseram que ele se destacou por uma suposta independência em relação ao governo Bolsonaro. Também informaram que os papéis da Petrobras se valorizaram depois que se anunciou sua indicação para outro posto, o de conselheiro da estatal. O anúncio se deu no dia 8 de março, quando o Brasil estava mesmerizado pelo escândalo do contrabando das joias sauditas para a família Bolsonaro.
A ficha só caiu quando o nome de Efrain Cruz foi confirmado para o novo cargo pelo ministro Alexandre Silveira, na sexta-feira, dia 17. As ações das empresas de energia na Bovespa despencaram. O maior baque ocorreu em empresas que trabalham com as áreas que estão mais sujeitas à ação do Poder Executivo: a geração e a distribuição de energia. Ao todo, as dezessete empresas energéticas na Bolsa perderam 11,8 bilhões de reais em valor de mercado. Entre as maiores quedas, estão a CPFL ON (-6,55%), a Energisa Unit (-6,42%), a Equatorial ON (- 5%), a Eletrobras PNB (-4,82%) e a Eletrobras ON (-4,30%). Especula-se que a queda expressa a preocupação do mercado de que a ascensão de Efrain Cruz venha a produzir uma possível “instabilidade” no setor.
Quem conviveu com Efrain Cruz na Aneel o descreve como carismático, habilidoso no diálogo e dono de um agudo senso de oportunidade. É um cumpridor de metas. “Se tiver uma pauta específica, ele vai trazer resultados, independentemente das consequências e dos meios”, disse à piauí uma fonte que preferiu não ter sua identidade revelada. Bem relacionado com o meio político, era visto com frequência carregando pastas de senadores nos corredores da Aneel. Ele também é próximo de David Alcolumbre (União Brasil), ex-presidente do Senado.
Em um setor que exige rigor técnico, um dos casos que geraram mais comentários negativos sobre a atuação de Efrain Cruz na Aneel tem contornos políticos claros. Trata-se de uma disputa em que os planos de uma empresa de transmissão de energia esbarraram nos interesses empresariais do deputado federal Hercílio Coelho Diniz (MDB-MG) e de seu irmão Alex Coelho Diniz (PSC-MG), primeiro suplente do senador Cleitinho (PSC-MG).
A empresa TPE (Transmissora Paraíso de Energia S.A.) estava construindo uma linha de transmissão de energia em Governador Valadares-MG que passava pelas terras da HAF Empreendimentos Imobiliários, uma empresa dos Coelho Diniz. A HAF alegava que a linha de transmissão estava fora da rota prevista na Declaração de Utilidade Pública (DUP) e tinha “gerado rastro de destruição nas propriedades”. A TPE, como é comum nesses casos, fizera algumas pequenas alterações na rota, mas a HAF, para solucionar o caso, queria uma bolada de 60 milhões de reais. A TPE topou pagar 10 milhões, mas um laudo pericial estimou que o valor da compensação financeira não deveria passar de 5,1 milhões — cifra que os dois políticos mineiros não aceitaram.
Como relator do caso, Efrain Cruz demorou alguns anos para levar o processo a julgamento. No meio do caminho, houve uma controversa visita técnica. Era 23 de julho de 2021, Efrain Cruz fez uma viagem a Governador Valadares junto com o assessor Reinaldo da Cruz Garcia. Em consulta a registros públicos, a piauí atestou que a viagem foi registrada como “urgente”, com o seguinte motivo: “Acompanhar o deputado Euclides Pettersen em agenda em Governador Valadares-MG.” Estranhamente, a Aneel não pagou pelas passagens aéreas da visita urgente — um indicativo de que o diretor pode ter pegado carona, como se especula nos bastidores da Aneel. (O deputado federal, cujo nome correto é Euclydes Pettersen, do Republicanos-MG, aliás, é dono de uma aeronave da marca Neiva, estimada em 500 mil reais, e também proprietário de 50% de uma aeronave modelo Cessna, no valor de 160 mil reais, segundo a declaração de bens que apresentou ao TSE nas eleições de 2022.)
Ocorre que o deputado Euclydes Pettersen é primo da mulher de Alex Coelho Diniz, um dos donos da HAF Empreendimentos Imobiliários. O resumo da tal “visita urgente” é que o diretor Efrain Cruz fez uma viagem a Governador Valadares, município onde se desenrolava havia tempos o imbróglio de uma indenização, acompanhado de um parlamentar ligado a uma das partes no processo. Mas tem mais.
Quando finalmente desengavetou o caso para julgamento, em 2022, Efrain Cruz apoiou seu voto com base na realização de uma “visita técnica no local”. Examinados os detalhes, constata-se que o que Efrain chamou de “visita técnica no local” era a “viagem urgente” que ele e um assessor haviam feito. A data – da visita e da viagem – é a mesma: 23 de julho de 2021. Mas, em seu voto, Efrain Cruz não contou aos pares que se referia à viagem que ele próprio fizera. Também não disse que ele e o assessor foram à cidade para se encontrar com um deputado cuja prima é casada com o dono das terras.
No processo, o relator não anexou nenhum relatório da suposta “visita técnica” – nem texto, nem foto, nem vídeo. Ao contrário, ele terminou requisitando um relatório de fiscalização da área técnica adequada, meses depois, no início de 2022. E a resposta dos técnicos dizia que não havia nenhuma irregularidade na atuação da TPE e que era possível fazer a retificação, incluindo as adaptações realizadas na rota da linha de transmissão – um procedimento, frisava o relatório, muito comum nesses casos. Em outras palavras, a resposta veio desfavorável à HAF da família Coelho Diniz.
Efrain Cruz votou contra a área técnica e a Procuradoria Federal, e propôs uma medida radical e – outra vez – inédita na Aneel. Sua ideia cabia como uma luva nos interesses dos Coelho Diniz. Defendeu que a TPE simplesmente derrubasse a linha de transmissão, que já fora construída e já estava em funcionamento, e erguesse uma nova linha em outro lugar. O ineditismo de sua posição estava no fato de que já existe uma jurisprudência clara para casos como esse. Segundo a jurisprudência, quando uma área é relevante para o interesse público, o caminho é a indenização – e não o deslocamento para um outro lugar.
A controversa tese do diretor – outra vez – venceu no plenário da Aneel, dessa vez por um placar mais apertado, de 3 votos a 2. Um pedido de reconsideração da TPE, no entanto, ainda está sendo analisado na agência. O relator do recurso, Giácomo Bassi, foi contra a derrubada das torres de transmissão, no que foi acompanhado pelo diretor Fernando Mosna. Na última terça-feira, 14, porém, Mosna mudou de posição para acompanhar o diretor Ricardo Tili, que tinha pedido vista e retornou com um voto semelhante ao do ex-diretor Efrain. A eles, uniu-se Helvio Guerra, somando o terceiro voto. O diretor Sandoval Feitosa Neto pediu vista, mas o caso deve terminar com um 3 a 2 a favorável à causa dos políticos mineiros, e só restará à transmissora de energia tentar uma vitória na Justiça.
Consultado pela piauí, Alex Coelho Diniz, sócio da HAF, disse que só se reuniu com Efrain Cruz uma vez, na sede da Aneel, para tratar do processo, que está convicto que agência reguladora manterá a posição favorável à sua empresa e que a Justiça não dará ganho de causa à TPE. Ele afirma que a decisão da Aneel está correta que diz que a rota usada pela TPE para construir a linha de transmissão está em “completa divergência” com o plano original. Quando foi alcançado pela piauí para dar sua versão, o deputado Euclydes Pettersen, o primo da mulher de Alex Coelho Diniz, estava entrando em um voo. Mais tarde, continuou sem fazer contato com a reportagem.
No plano político, a indicação de Efrain Cruz ao posto de vice-ministro de Minas e Energia é uma vitória do Centrão, que vem abrindo espaço a golpes de picareta no governo Lula, refém das votações no Congresso. O presidente da Câmara, Arthur Lira, com seu estilo direto e contundente, deixou claro que o governo precisa negociar “com bom senso”, pois o Congresso tem hoje “uma atribuição mais ampla”. Na política brasileira, como se sabe, verbas e cargos são os fatores do “bom senso”.
Apesar de ser mais vinculado a senadores do que a deputados, a ascensão de Efrain Cruz pode ajudar a abrir caminho para um dos grandes sonhos de consumo de quase todo o Congresso: a construção dos gasodutos para viabilizar térmicas a gás. O tema já foi objeto de diversas propostas legislativas, que são logo apelidadas com nomes sugestivos, entre os quais “Centrãoduto”. Mesmo sem ser sua área de atribuição na Aneel, Efrain Cruz também já defendeu os gasodutos.
O interesse singular dos congressistas em gasodutos pode ser explicado pela influência igualmente singular que um empresário do setor de energia detém hoje em dia junto ao Congresso Nacional: o baiano Carlos Suarez, conhecido como “rei do gás”, dono de empresas cuja viabilidade depende do avanço de gasodutos. Pelo que corre nos bastidores de Brasília, essa ideia, que não se concretizou no governo Bolsonaro, já tem defensores dentro do governo Lula. Entre eles, o ministro Alexandre Silveira e o ministro da Casa Civil e ex-governador da Bahia, Rui Costa. Carlos Suarez, Joesley Batista, Rubens Ometto, os grandes players da energia estão cheios de expectativas de grandes negócios pelos próximos anos.
Questionado pela piauí sobre a nomeação de Efrain Cruz, o ministro Alexandre Silveira preferiu não comentar, mas afirmou ter a impressão de que ele é preparado. “É público e amplamente noticiado que eu lutei muito pelo Bruno Eustáquio, que eu entendia que era melhor. Mas eu compreendo também que a política tem as suas nuances e que eu me sinto muito seguro com a equipe. E as decisões que interferem diretamente na vida da sociedade serão de responsabilidade do ministro de Estado. Eu não vou delegar as decisões que são importantes para o Brasil”, disse o ministro.
O nome de Bruno Eustáquio foi apresentado ao Sistema Integrado de Nomeações e Consultas (Sinc), do Palácio do Planalto, e barrado sob alegação de que havia sido secretário no governo Jair Bolsonaro. Segundo a piauí apurou, o veto veio da Secretaria de Relações Institucionais, do ministro Alexandre Padilha, que tem entre suas atribuições atender ao conjunto de forças políticas do Congresso (no topo dessa hierarquia está o Centrão).
A piauí tentou contatar Efrain Cruz por WhatsApp, sem sucesso. Procurada, a assessoria de imprensa do Ministério de Minas e Energia respondeu “Efrain Cruz tem mais de 20 anos de atuação como servidor público na área de energia, sendo reconhecido como uma das principais referências do setor. O novo secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia sempre pautou sua atuação de maneira ética e em prol do interesse público.”