Nelson Xavier, o Amador de Comeback: Um Matador Nunca Se Aposenta, foi-se em 10 de maio, aos 75 anos. Quis o acaso que seu último filme estreasse duas semanas depois, realçando, sem que fosse preciso, o que a perda do ator, e colega de fino trato, representou.
Há um ano, tivemos ocasião de admirar o talento de Nelson como o memorável Almirante, em A Despedida, título do filme de Marcelo Galvão que em retrospecto adquiriu conotação tristemente premonitória. Agora, imagem e voz de Nelson estão nas telas para sua verdadeira despedida como intérprete.
A lamentar, o alheamento do público que está perdendo rara oportunidade de ver um grande ator em ação.
─
Não sei se comeback é termo usual entre matadores de aluguel ou mesmo de uso corrente por parte da população em geral, na periferia de Anápolis e outras cidades médias de Goiás. Se essa e outras palavras em inglês por acaso fizerem parte do vocabulário local, para evitar a estranheza causada pelo redundante título Comeback: Um Matador Nunca Se Aposenta, o filme escrito e dirigido por Érico Rassi poderia ao menos ter indicado a existência dessa curiosa, mas improvável peculiaridade do bravo povo goiano.
Também desconheço se os moradores da mesma região falam com acentuado sotaque paulistano. É pouco provável, mas em Comeback, a julgar pela entonação dos atores secundários, todos parecem estar no Bixiga, em São Paulo, causando por isso incômodo adicional aos ouvidos mais sensíveis.
Com enredo que o cinema já explorou à exaustão, modo de filmar frequentemente repetitivo e excesso de música brega, Comeback: Um Matador Nunca Se Aposenta disputa a preferência do público com Guardiões da Galáxia Vol 2, Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar e Mulher-Maravilha, aparentemente sem a menor chance de vencer a competição, muito menos de atrair número expressivo de espectadores. É um duelo desigual entre, de um lado, uma pistola e, do outro, um tanque.
Apesar dos desacertos, porém, além da soberba interpretação minimalista de Nelson Xavier, Comeback: Um Matador Nunca Se Aposenta tem qualidades. Uma, que já vai se tornando comum em filmes brasileiros, é a ambientação desoladora na periferia de Anápolis, cidade natal de Rassi, somada à fotografia, em que pese algumas sequências terem parecido escuras demais na sala em que assisti ao filme.
Além de diretor, Rassi é também roteirista do filme e revela ter mão para escrever diálogos lacônicos, pontuados de insinuações, beirando o absurdo, como o de Amador com o dono do bar a quem ele quer impingir uma máquina caça-níquel.
Para lutar contra seu ostracismo e esquecimento, Amador recorre à violência. É o meio a seu alcance. O gesto de desespero e a precariedade geral, a ponto da pistola do matador só funcionar com uma pancadinha para uma peça solta se encaixar, são uma lamentável, mas bela, metáfora do Brasil.