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    Ilustração de Paula Cardoso

questões político-orçamentárias

Coronavírus debilita orçamento da escola pública

Para cobrir despesas com covid-19, governo cortou R$ 718 milhões do ensino básico

Allan de Abreu | 22 abr 2020_19h45
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O Colégio Pedro II, uma das mais tradicionais instituições de ensino do Brasil, viu suas finanças ficarem ainda mais críticas nesses tempos de coronavírus. A rede de escolas federais do Rio de Janeiro, com cerca de 12 mil alunos, teve uma emenda parlamentar de R$ 1,15 milhão redirecionada para o combate ao covid-19. O drama do Pedro II promete se estender por outras escolas Brasil afora. Dos R$ 2,7 bilhões em emendas parlamentares originalmente destinadas à educação básica, profissional e superior do país, R$ 891,6 milhões foram realocados para ações de combate à epidemia pelo Ministério da Saúde, de acordo com levantamento da ONG Transparência Brasil. No total, o governo federal cancelou R$ 172,18 bilhões em emendas parlamentares para destinar os recursos a ações de enfrentamento à pandemia – praticamente nenhum ministério se livrou dos cortes.

No Ministério da Educação (MEC), a educação básica foi a mais prejudicada: foram cancelados R$ 718 milhões, o suficiente para custear, ao longo de um ano, 98 mil alunos, considerando o gasto de R$ 7,3 mil por estudante do ensino fundamental, segundo dado do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). Nos últimos dois anos, além de investimentos em infraestrutura, o dinheiro de emendas de deputados e senadores tem sido utilizado para gastos de custeio, como compras de insumos. “Não sabemos ao certo o tamanho do impacto desse corte, mas certamente afetará a construção e a reforma de creches, de mais salas de aula, de novos laboratórios, sem contar a aquisição de mais ônibus para o transporte escolar”, diz João Marcelo Borges, diretor de estratégia política da ONG Todos pela Educação. Havia a previsão de R$ 28,4 milhões apenas para a compra de ônibus e vans nos estados do Rio Grande do Norte, Goiás, Tocantins e Paraíba. “São regiões carentes do Brasil, com grandes áreas rurais, em que a falta de ônibus pode comprometer o acesso à escola”, afirma Borges.

No caso do Pedro II, o novo corte se soma a um contexto de sucessivos cortes orçamentários desde 2014. No ano passado, o Ministério da Educação (MEC) já havia cortado R$ 18,5 milhões do Pedro II, o equivalente a 36,3% do orçamento do colégio, com “implicações devastadoras”, nas palavras da direção, em nota divulgada na ocasião. Já faltam verbas para reformas dos prédios (são catorze unidades no estado) e consertos dos aparelhos de ar condicionados das salas de aula. Também não há mais dinheiro para que os alunos participem de eventos fora do colégio, como congressos e passeios pedagógicos. “Não sei o que vai acontecer quando as aulas recomeçarem. Vai ser um caos”, diz Luciana Zanetti, mãe de um aluno do ensino médio do Pedro II em São Cristóvão e ex-integrante do Conselho Superior (Consup) da instituição.

Esse corte nas emendas se soma a um contexto ruim para o MEC: o orçamento deste ano para a pasta é 8% menor do que o do ano passado, segundo Borges, do Todos pela Educação. Essa receita, diz o diretor, certamente será reduzida ainda mais ao longo do ano devido à queda da arrecadação tributária federal, estadual e municipal, fonte da maior parte dos recursos destinados à educação pública no Brasil. Paralelamente à crise orçamentária, discordâncias com a postura ideológica do ministro Abraham Weintraub têm provocado baixas em postos chave do MEC: no dia 9, o então secretário de Educação Básica, Janio Macedo, pediu demissão do cargo; onze dias mais tarde, foi a vez de Sônia Nair Báo, diretora de avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), solicitar sua saída do posto.

Na educação superior, o corte foi de R$ 113,9 milhões. Quem mais perdeu foi a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com corte de R$ 27,9 milhões, seguida pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), com R$ 19,1 milhões, e pela Universidade Federal de Alagoas, com R$ 17,9 milhões. “Era um recurso da bancada paulista que usaríamos para concluir a construção dos campi de Osasco e Diadema, incluindo uma farmácia-escola”, diz a pró-reitora da Unifesp Tânia Mara Francisco. As obras, segundo ela, se arrastam há três anos. “Certamente vai ficar para 2021.” Hoje, os dois campi funcionam de maneira precária em imóveis alugados ou cedidos pelas prefeituras.

A assessoria do MEC informou que o corte das verbas de emendas parlamentares não afeta a execução orçamentária da pasta para 2020 porque o dinheiro das emendas não entra no orçamento base do Ministério da Educação para este ano, e é dessa receita que se originam os recursos que financiam os projetos básicos do MEC. A piauí procurou a assessoria do Colégio Pedro II, mas não houve retorno.

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