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Ele e seus eleitores

Os insatisfeitos e o que o candidato do PSL representa

Ana Carolina Evangelista | 28 set 2018_14h31
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A socióloga Esther Solano publicou recentemente uma pesquisa com entrevistas em profundidade com simpatizantes do deputado Jair Bolsonaro. O trabalho aponta elementos relevantes para compreendermos uma parcela da população brasileira com demandas que continuarão existindo, quer o candidato seja eleito ou não. É importante analisar os perfis, valores e anseios dessas pessoas.

Para eles e elas, como aponta a pesquisadora, Bolsonaro representa o político honesto, em contraposição à “classe política”, generalizada exatamente dessa forma por todos eles. Além do combate à corrupção, a questão da insegurança é fator fundamental e proteger o “cidadão de bem” deve ser uma prioridade.

Para eles, também, as políticas públicas como o Bolsa Família ou cotas universitárias são negativas porque levariam à acomodação, ao clientelismo e ao cidadão dependente do Estado. Eles reconhecem que negros, mulheres e a população LGBTQIA sofrem preconceito, mas consideram que esses grupos têm se “vitimizado” demais para obter benefícios do Estado, tirando de quem não pertence a essas parcelas da população.

Reportagem recente feita pelo El País na periferia de Porto Alegre, a partir do trabalho de campo das antropólogas Rosana Pinheiro-Machado e Lucia Mury Scalco, destaca algo que está também no estudo de Solano: a parcela jovem dos simpatizantes se identifica com a forma direta, clara e rebelde com a qual Bolsonaro se comunica. O texto aponta que há simpatizantes do presidenciável em universos variados: no funk, no tráfico, na igreja ou na escola. “Cada um desses grupos juvenis se apega a uma parte do repertório que, em comum, apenas passa pela figura de um homem que oferece uma solução radical à vida como ela é”, esclareceu Rosana.

Claro que é importante entender se esses eleitores acreditam ou não que a candidatura Bolsonaro-Mourão representa uma ameaça concreta à democracia. Mas, em paralelo a isso, não se pode deixar de ouvir suas demandas por mais segurança, mais ordem e controle e melhoria nas suas condições de vida.

O que mais se encontra em mensagens de parte de seus eleitores é o bordão “não me importam as propostas, o que importa é que ele vai mudar o país”, como disse uma eleitora no Twitter. Uma parte do seu eleitorado não está preocupada com o conteúdo do que ele propõe. A insatisfação é tamanha que o sentimento é de que alguma mudança tem de acontecer, não importa qual seja e nem de que forma ela venha.

Como sociedade teremos que entender e lidar com essas demandas de quase uma em cada quatro pessoas no país, sejam o candidato-capitão e seu vice-general eleitos ou não.

 

O sentido político de uma candidatura como essa, pautada numa figura que dissemina um discurso fundado no ódio, na intolerância e no autoritarismo, extrapola essas eleições. Por um lado, será preciso interpretar melhor de que forma o fenômeno multifacetado da emergência de forças de extrema direita no Brasil traduz as demandas reais dos eleitores insatisfeitos com a situação do país. Por outro, é também fundamental analisar o significado e os desdobramentos da reação que isso gera na sociedade, na reocupação do espaço público para dizer #EleNão.

A sociedade reage para dizer: não a esta figura, não a estas formas de enfrentar os problemas do país. As demandas dos eleitores e simpatizantes de Bolsonaro estão conectadas a problemas e dificuldades reais em suas vidas cotidianas, hoje canalizadas para plataformas de baixíssimo apreço democrático. Isso não termina com as eleições.

“Ele não” não significa “todos vocês que pensam em votar nele não”, mas é afirmar que “desta forma não”. Racismo, misoginia, intolerância, ódio, autoritarismo não. Não autorizar mais esses valores e práticas que têm consequências diretas nas vidas das pessoas não significa não escutar ou excluir os interesses de simpatizantes da candidatura de Bolsonaro, mas sim dizer que precisaremos agir publicamente e dialogar em outras bases.

De acordo com a última pesquisa Ibope, Bolsonaro é o candidato cujos eleitores são os menos propensos a mudar o voto. Entre os que declararam voto nele, 55% afirmaram que a decisão é definitiva, mas ao mesmo tempo existem os outros 42% que ainda estão tentando entender se de fato o candidato representa o que eles querem que mude.

No seu plano de governo, o que a candidatura diz que irá fazer se resume a generalidades e a palavras de ordem militares. Paulo Guedes, principal avalista da candidatura Bolsonaro do ponto de vista do mercado, vem se esquivando de toda e qualquer entrevista. O líder da chapa que representaria uma possibilidade, segundo seus eleitores, de “comando e controle” num país aparentemente desgovernado, não consegue demonstrar controle da situação nem no âmbito da própria candidatura. A cada dia, tem de desmentir declarações do seu vice. Nem o homem honesto que Bolsonaro diz ser para “limpar a classe política que está aí” ele tem conseguido sustentar. Esta semana vieram à tona reportagens que relatam processos em que a ex-mulher o acusava de ocultação de patrimônio e de furto. Em resumo, não fez em 27 anos de vida pública, não sabe o que vai fazer daqui para a frente e já mostra que não é nada do que diz que é.

Dos atuais 27% de intenção de voto no candidato, uma parte são pessoas que radicalizam discursos e posturas fascistas nas redes sociais e nas ruas. Com essas não há diálogo. Mas outra parte é composta por uma parcela de eleitores insatisfeitos, que se autodenomina de direita, e já está entendendo que a figura caricata de Bolsonaro não lhes dará as respostas que procuram. Possivelmente um “Ele Não Mais” torne-se  realidade nos próximos dias, porque mesmo seus simpatizantes não são pessoas desinformadas que assinam cheque em branco.

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