Apeça Enquanto você voava, eu criava raízes, da companhia franco-brasileira Dos à Deux, é um exemplo de que para sentir, não é preciso dizer palavra alguma. Mesclando teatro gestual, dança e audiovisual, a peça – que teve uma nova temporada no início do ano em São Paulo e estará de novo em cartaz entre 10 de maio e 30 de junho, em São Paulo – transporta o público para uma experiência sensorial que evita contar uma história ou forjar uma narrativa. Na penumbra da sala de teatro, o público é convidado a entrar em uma realidade paralela por trás de uma tela cilíndrica que mais parece um oráculo. Ali, sem proferir nenhuma palavra, dois seres flutuam e desabam numa cama elástica posicionada na vertical. Os movimentos são por vezes acompanhados pela projeção de vídeos, e pela trilha sonora original do violoncelista Federico Puppi.
A peça estimula o público a fazer diferentes associações com as imagens criadas a partir dos movimentos. Através da tela cilíndrica é possível visualizar tanto um relógio, no qual as pernas dos atores são os ponteiros, quanto um espelho, um olho ou até mesmo o espaço sideral, onde não há gravidade. Em alguns momentos, o espectador pode se questionar se as cenas são mesmo reais.
A companhia Dos à Deux foi criada por André Curti e Artur Luanda Ribeiro em 1998 em Paris. O grupo de teatro gestual já lotou plateias em mais de cinquenta países e atualmente tem sede no Rio de Janeiro. Com dramaturgia, cenografia, encenação e performance da dupla, Enquanto você voava, eu criava raízes foi concebida durante a pandemia e surgiu a partir da procura do entendimento do que é o medo – e das sensações causadas por ele. É um projeto ambicioso, mas, através do rigor estético e de uma sincronia de movimentos e belas imagens, os autores conseguem construir um tom melancólico e complexo que remete aos diversos abismos da existência humana. Durante uma hora, os atores dão ao público uma experiência catártica, um momento de reflexão acompanhado de sensações intensas.