O que mais chama atenção na entrevista do novo secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, Leopoldo Nunes, publicada sexta-feira (1/2/2013) no , é o uso sistemático da primeira pessoa do singular e sua reiterada declaração de que vai inventar a pólvora.
Isso para não falar da inusitada declaração de que a nova Lei do Direito Autoral, pela aprovação da qual o MinC vai lutar no Congresso, trará “artifícios [sic] que nos permitirão usufruir” do acervo da extinta TV Manchete, atualmente depositado na TV Cultura.
Tomada ao pé da letra, a afirmação é desmoralizante. O Ministério da Cultura iria defender a aprovação no Congresso de uma lei que propiciará “artifícios”? Esperemos que se trate apenas de um lapso infeliz.
Já o uso sistemático da primeira pessoa do singular não pode ser atribuído ao acaso. “Quero”, “não concordo”, “sou contra!”, “pedi” etc. são exemplos, encontrados em cada resposta, da insistência em creditar à sua vontade pessoal iniciativas que deveriam resultar de um consenso entre política de governo, interesse público e aspirações do setor profissional.
Secretário do Audiovisual é cargo de confiança demissível ad nutum pelo ministro da Cultura, no caso a ministra Marta Suplicy. O ocupante não é um autocrata. Não age em nome pessoal. Deve atuar em conformidade com diretrizes traçadas e aprovadas por quem o nomeia e tem poder para demiti-lo. A primeira pessoa do plural seria, portanto, mais adequada.
Em um estado democrático, ademais, quem ocupa função pública deve satisfações também à população em geral e aos profissionais da sua área de atuação. O servidor da administração direta deve ser capaz de equilibrar com discrição essas diversas fidelidades, o que torna o uso da primeira pessoa do singular ainda mais impróprio.
Além de maior prudência, certa dose de humildade não faria mal ao novo secretário. Afinal, antes dele houve outros secretários do Audiovisual. Por acaso, não deixaram nenhuma realização aproveitável? Ao dar os primeiros passos da sua gestão, Leopoldo Nunes pratica uma curiosa política de terra arrasada às avessas. Sua estratégia sugere nada feito antes dele presta e que sua chegada, qual Dom Sebastião redivivo, será a redenção do audiovisual no Brasil.
O novo secretário não pode desconhecer o trabalho de preservação do patrimônio audiovisual brasileiro que vem sendo realizado há vários anos, muito menos a alta qualidade das restaurações feitas em empresas privadas e na Cinemateca Brasileira. Contando com a participação da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, da Petrobras, além de outros ministérios e empresas, sem mencionar os profissionais envolvidos nesse trabalho, as condições de preservação e restauro alteraram-se drasticamente para melhor no Brasil, nos últimos dez anos. Restando, sem dúvida, muito a fazer, nem por isso se trata agora de “criar” algo que já existe, como propõe o novo secretário.
Quanto a dar “musculatura” ao Centro Técnico Audiovisual (CTAv), à parte a estranheza da metáfora usada pelo novo secretário, muito bem. Fora o fato de que, por melhor que tenha chegado a ser, o estúdio de som nunca foi “o melhor da América do Sul”, como Leopondo Nunes afirma, o fortalecimento do CTAv, com a qualificação de seus quadros, expansão de suas atividades etc. não pode ser feito em detrimento de outras instituições e iniciativas vitoriosas.