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    ILUSTRAÇÃO: PAULA CARDOSO

questões político-futebolísticas

EUA devolvem fortuna à família Hawilla

Com a morte do delator do escândalo Fifa, Justiça restitui à viúva e aos filhos patrimônio de R$ 59 milhões em dinheiro e apartamento em condomínio em ilha de Miami

Allan de Abreu | 21 set 2018_13h01
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Passados cinco anos desde que J. Hawilla tornou-se delator na investigação de um grande esquema de corrupção no futebol, a família do empresário brasileiro, morto em maio, terá de volta em suas contas bancárias 5 milhões de dólares, além de um apartamento com praia privativa avaliado em 9,5 milhões de dólares situado no metro quadrado mais caro dos Estados Unidos, em Miami. Um patrimônio somado de 59 milhões de reais, no câmbio desta sexta-feira.

Tanto o dinheiro quanto o imóvel foram dados em garantia no acordo de delação assinado por J. Hawilla com o FBI em maio de 2013. Era a condição para que o empresário, preso no início daquele mês em um quarto de hotel na capital da Flórida, deixasse a cadeia. Com a morte do empresário, porém, a ação penal contra Hawilla na Corte do Distrito Leste de Nova York foi extinta, e em 28 de agosto a juíza Pamela K. Chen determinou que a fortuna e o apartamento fossem restituídos à família. “Depois da extinção do processo, não havia mais motivos para a fiança permanecer”, disse o advogado George Niaradi, especialista em direito internacional do Ibmec, em São Paulo.

No acordo de delação de 2013, além de admitir os crimes de formação de quadrilha, obstrução de Justiça, lavagem de dinheiro e fraude bancária, ele também se comprometeu a pagar 151 milhões de dólares ao governo norte-americano. Procurada pela piauí, a assessoria do Departamento de Justiça não informou se o valor já foi inteiramente quitado pela família.

Em depoimento no tribunal do júri em Nova York que condenou José Maria Marin, ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol, em dezembro, o próprio Hawilla estimou seu patrimônio em 500 milhões de dólares. São fazendas, empreendimentos imobiliários e uma rede de emissoras de TV afiliadas da Rede Globo no interior paulista. Em 7 de maio de 2013, Hawilla engordou ainda mais seus bens ao adquirir, por 6,5 milhões de dólares, um apartamento de 1,3 mil metros quadrados em Fisher Island, pequena ilha ao sul de Miami Beach que abriga um condomínio de apartamentos nas bordas, tendo no centro um campo de golfe – que era um dos esportes preferidos de Hawilla – e na parte leste uma marina repleta de iates. A ilha abriga moradores como o ex-tenista Boris Becker, o ator Mel Brooks e a apresentadora de tevê Oprah Winfrey.

Fisher Island, onde fica apartamento de luxo dado como fiança por Hawilla à Justiça norte-americana em acordo de delação, agora devolvido à sua família

 

Para a compra do imóvel, a família usou sua rede de empresas offshore no Caribe: dessa vez, a escolhida foi a obscura Pacific Peach International, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas. No contrato de compra e venda ao qual a piauí teve acesso, aparece como endereço da Pacific o mesmo da sede da Traffic em São Paulo: rua Bento de Andrade, 700, no Jardim Paulista.

Naqueles dias de maio, dias antes de se tornar delator, Hawilla estava hospedado no hotel Mandarim, na ilha de Brickell Key, de onde podia avistar, quatro quilômetros a oeste, a ilha onde fizera seu mais recente investimento imobiliário. Mas o empresário ficou na posse do imóvel por pouquíssimo tempo. No dia 9, ainda no hotel, foi preso por agentes do FBI, acusado do crime de obstrução de Justiça. Isso porque, sete dias antes, logo após receber a visita daqueles mesmos policiais no Mandarim, Hawilla havia telefonado para o amigo Chuck Blazer, cartola norte-americano, e pedido para que nem o nome dele nem o da Traffic fossem citados à polícia. Sem querer, caiu em uma armadilha: àquela altura, Blazer já era um grampo ambulante a serviço do FBI.

 

Após algumas horas na cadeia, Hawilla aceitou proposta do Departamento de Justiça dos Estados Unidos para tornar-se, ele também, um delator. Deixou a cadeia dando em garantia os 5 milhões de dólares em dinheiro e o apartamento que acabara de adquirir em Fisher Island – e que agora sua família recebe de volta. Com uma tornozeleira eletrônica e um gravador escondido no corpo, continuou a manter contato com cartolas e outros empresários do ramo, reunindo provas para o FBI. No fim de 2014, formalizou o acordo de delação, pelo qual admitiu seus crimes e se disse arrependido.

Na época, Hawilla já enfrentava os primeiros sintomas da DPOC, doença pulmonar obstrutiva crônica, decorrente dos anos de tabagismo. Sofria constante falta de ar, quadro que se agravaria nos meses seguintes. Já muito doente e abatido, pois sabia ter pouco tempo de vida – a DPOC é incurável –, o empresário teve permissão da Justiça em Nova York para regressar ao Brasil em fevereiro deste ano, mesmo antes de ser sentenciado. Os termos do acordo que permitiu o retorno de Hawilla ainda permanecem sob sigilo judicial. Em maio, seu quadro se agravou. Depois de cinco dias internado na UTI do hospital Albert Einstein, em São Paulo, morreu na manhã do dia 25 daquele mês.

Desde que o escândalo Fifagate veio à tona, os Hawilla desapareceram das colunas sociais e evitam dar declarações. Procurada na tarde desta quinta-feira, 20 de setembro, Eliani Maria Menezes Hawilla, viúva do empresário, não atendeu aos pedidos de entrevista. O advogado da família no Brasil, José Luís de Oliveira Lima, não quis se pronunciar.

O fim da ação penal contra o patriarca não significa que o clã esteja livre da Justiça nos Estados Unidos. A Traffic, empresa pivô do Fifagate, é ré em outra ação penal, cuja sentença está prevista para dezembro deste ano – diferentemente do que ocorre no Brasil, o direito norte-americano prevê a responsabilização criminal de empresas. A família também é investigada pelo Ministério Público Federal em São Paulo pelos crimes de estelionato e lavagem de dinheiro. Neste caso, a piauí apurou que o procedimento de investigação preliminar do MPF caminha para o arquivamento.

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