Se em 2018 Ciro Gomes “não ajudou muito” o senador pela Bahia Jaques Wagner a defender sua candidatura a presidente com apoio do PT, como ele diz, em 2020 o pedetista continua criando dificuldades. Alianças costuradas pelo PDT nas eleições municipais não só colocam a sigla na disputa com o PT como soam como provocação para o principal defensor do pedetista no partido de Lula.
Ao apoiar o candidato do prefeito ACM Neto à sua sucessão na capital baiana e indicar a vice na chapa, o PDT mexe com os brios da esquerda na Bahia e sua histórica oposição ao carlismo. O PT lançou candidata própria na disputa com o apoio somente do PSB. O DEM reuniu catorze siglas em sua coligação, entre as quais oponentes quase inconciliáveis do PT, como PSL e PSDB. “Isso aponta mais o caminho de 2022 que o encontro com Lula”, critica Wagner.
O ex-presidente esteve com Ciro Gomes reservadamente em setembro. A conversa só foi revelada nesta semana, pelo jornal O Globo, dias depois de o marqueteiro João Santana sugerir, no programa Roda Viva, da TV Cultura, uma chapa com o pedetista – ou Wagner – como candidato e Lula vice.
Para as personagens todas fazerem da conversa uma aliança formal, primeiro será preciso que o ex-governador da Bahia se convença da conveniência disso.
“É público o movimento que ele está fazendo para ser candidato de centro, centro-direita [em 2022], na aproximação com o DEM”, diz Wagner sobre Ciro. “Na estratégia dele, se o PT lança candidato próprio, o eleitorado de centro, centro-esquerda [tende a votar no petista], então ele tem que procurar outro nicho.”
A manifestação de Wagner é um contra-ataque, uma vez que Ciro, já em 2018, rejeitou a conclusão de que, ao enfrentar o PT, mudaria de posição no espectro político-ideológico. “Não vou votar na direita, não vou fazer como a Marina, que o PT empurrou para a direita”, afirmou à revista Carta Capital naquele ano.
A contraposição tem um peso diferente daquela protagonizada por Ciro e outros petistas como a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, já que Wagner é a principal ponte entre as duas siglas, além de Lula.
Outras disputas entre PDT e PT nas eleições de 2020 expõem as arestas na relação. Em Fortaleza, capital do Ceará, reduto político da família Gomes, o candidato do clã, José Sarto, tem o apoio de nove siglas, como o DEM e o PSDB, enquanto o PT tem candidatura isolada, com Luizianne Lins.
O PDT também se aliou a adversários petistas em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Branco, Maceió e João Pessoa.
Wagner deixa escapar resquícios da frustração com o temperamento do cearense durante a campanha de 2018, quando ele subiu o tom nas críticas ao PT, a Lula e ao candidato do partido, Fernando Haddad. “Ciro não me ajudou muito. Eu defendia [a composição], e ele em seguida dava chapuletadas em alguém”, lembra o senador. A chapuletada mais famosa foi disparada pelo irmão de Ciro, o senador Cid Gomes, dirigida a militantes petistas: “O Lula tá preso, babaca!”, e repetida pelo ex-ministro, coincidência ou não, em Salvador, meses depois. Virou bordão.
O senador baiano rejeita as hipóteses de, um, Lula sair como candidato a vice de qualquer pessoa, dois, o PT não lançar candidato próprio em 2022, e, três, Ciro abrir mão da cabeça de chapa. A reaproximação entre Ciro e Lula é, portanto, pouco promissora eleitoralmente, segundo Wagner. “A conversa é bem-vinda, mas não acho que tenha sido para organizar nada para 2022, e sim para estabelecer uma convivência positiva. O foco era mais tirar as feridas de um relacionamento antigo.”
Sua preocupação em se mostrar cético quanto à aliança entre PT e PDT é tal que, depois da conversa com a reportagem da piauí, Wagner pediu a seu assessor que reiterasse por mensagem que não fez a defesa da candidatura de Ciro em 2022.