Nos primeiros dias do Festival É Tudo Verdade, foi possível ver, em São Paulo, , de Nahid Persson Sarvestani, e Nosso Nixon, de Penny Lane; além de, no Rio, Os guardiões, de Dror Moreh; Cine-olho, de Dziga Vertov; Mataram meu irmão, de Cristiano Burlan; Antártica, de Evaldo Mocarzel; e, em cópia 35mm, os primeiros minutos de Entusiasmo, de Dziga Vertov, antes da projeção ser interrompida por um defeito do projetor.
Ao sucumbir ao cansaço, no terceiro dia do Festival, no Rio, e adormecer durante a sessão de Primo de segundo grau, de Alan Berliner, foi preciso fazer uma pausa, na esperança de recuperar o fôlego para conseguir ver, nesta quinta-feira, Em busca de Iara, de Flavio Frederico, Serra Pelada – A lenda da montanha de ouro, de Victor Lopes, e Philip Roth, sem complexos, de William Karel.
Festivais de cinema são assim. Exigem disponibilidade total e muita resistência física. Estão longe de ser a melhor maneira de apreciar um filme. Ver tantos em tão pouco tempo torna difícil fazer justiça a cada um deles. Sem falar dos vários que sequer são vistos. Ainda assim, alguns festivais oferecem oportunidades únicas que é sempre lamentável perder.
Primo de segundo grau, de Alan Berliner, por exemplo, pareceu merecer espectador menos sonolento. Apesar da visão de apenas alguns trechos, intercalados com cochilos, impressiona e dá vontade de rever em melhores condições. Imagens fortes, edição ousada, tema difícil de tratar, interação franca e afetuosa entre diretor e personagem, que é seu primo, foi seu mentor e tem o mal de Alzheimer.
Minha revolução roubada e Mataram meu irmão partem de uma motivação comum – a perda de um irmão. A culpa do sobrevivente move Nahid Persson Sarvestani e Cristiano Burlan a investigar as circunstâncias dos assassinatos. Acima das diferenças entre Irã e Brasil, há uma mesma tragédia servindo de base para os dois filmes.
Nosso Nixon revela a obsessão dos assessores do presidente americano pelo registro continuado dos bastidores do poder. Surpreende que possam ter tido tempo e disposição para filmar tanto em super-8. São registros que não tem nada de comprometedor, ao contrário das gravações de áudio feitas no Salão Oval – decisivas para levar Nixon a renunciar à Presidência.
Antártica é um assunto impossível do qual Evaldo Mocarzel, como tantos diretores antes dele, inclusive Werner Herzog, não conseguiu dar conta. Híbrido, hesita entre ser o registro da beleza do continente gelado e tratar da expedição científica.
Em retrospecto, vendo pela primeira vez Cine-olho projetado numa tela, é possível entender que Dziga Vertov tenha acabado sendo marginalizado na União Soviética. O que ele escolhe incluir no Cine-olho não poderia ser do agrado das autoridades cinematográficas. E ao transformar o ato de filmar no tema de O homem com a câmera, e fazer experiências sonoras em Entusiasmo, foi estreitando suas próprias perspectivas, independente do caráter propagandístico que hoje sobressai em seus filmes.