From: Jean Claude Bernardet
Date: Wed, 12 Jun 2013 17:01:19 – 0300
To: ‘Eduardo Escorel’
Subject: Hipótese Escorel
Acabo de ler o q vc postou no seu blog após POA. E me deu vontade de te escrever. Aceito tudo o q vc escreve, não me sinto em contradição com vc. No entanto, seu texto me deixa insatisfeito (embora o ache útil por revelar um esforço para pensar), porque eu sinto no teu texto como nos meus q estamos girando em torno de algo q não sabemos o q é, ou preferimos não saber.
O q eu sinto, Escorel, é q nossa forma de pensar é velha, não está em sintonia com a realidade, não nos ajuda a pensar a situação nem a agir. A começar pelo fato q a forma desse pensamento é um binômio. Por mais q seja uma forma essencial à nossa atual cultura (0-1), não acredito ser uma forma enriquecedora e produtiva de pensar a sociedade. Além do mais, esse binômio se resume essencialmente a cultura/comércio, arte/indústria. Deveríamos perceber q essa forma de pensamento é uma ruína, há mais de meio século Malraux a usava e talvez naquele momento do cinema, do pensamento tenha sido – acredito que sim – um pensamento estimulante, produtivo. Hoje deixou de ser. É falso q um filme autoral, da redoma, seja mais cultural q um filme de 5 milhões de espectadores. É falso q a redoma seja detentora da melhor cultura, da cultura mais cultural, q a redoma saiba melhor q os de fora o q é a cultura.
Postei um pequeno texto q me disseram Marisa Leão leu em público. Estou preparando com Roberto Moreira artigo em que há uma frase de apoio à Riofilme. Filmo com Kiko Goifman, 2 atores num apartamento e não há dinheiro para mais. Filmo atualmente com Taciano Valério na minha casa, com equipe de 3 pessoas. Produzo um filme com um cara q está absolutamente contra a Riofilme e vê com horror a possibilidade de Haddad criar uma SPfilm no mesmo modelo, até participei de uma reunião em q esse horror foi expresso.
E no entanto, Escorel, não me sinto em contradição comigo mesmo, não sou anarquista, não me sinto confuso, não me sinto desconexo. Eu diria q me sinto complexo numa sociedade complexa num cinema complexo. Eu sei q essa palavra – complexidade – é uma facilidade, é por enquanto uma facilidade – até conseguirmos torná-la produtiva no pensamento e na ação. E isso é outro binômio a ultrapassar: eu penso trabalhando com uma equipe de 3 pessoas e ajo postando um texto sobre . [referência ao post publicado por Jean-Claude no blog dele em 9/4/2013. Ver transcrição abaixo]
Não penso q seja útil pensar q O som ao redor e O Dia q durou 21 anos sejam 2 filmes da redoma, ou dois filmes autorais, ou seja, botá-los numa mesma categoria, porque isso nos impede de perceber as suas especificidades como obras, como linguagem, como funcionamento social.
Haveria tanta coisa ainda a se dizer, de forma assim hipotética, errática.
O q poderia ser a irrelevância num dos seus aspectos? Acho q Tata e eu pensamos q pelo menos uma das facetas da irrelevância é uma produção desgarrada de um momento social e político imediato, e falar diretamente, sem circunvoluções (o q seria o pós-Hoje), agarrado ao presente quente. Com certeza não é A resposta, mas é uma possibilidade de resposta. Com o q estamos produzindo agora, corremos o risco de quebrar a cara, de não conseguirmos realizar os projetos que estamos deslanchando. Gostaria de pensar q o risco de quebrar a cara (e a várias maneiras de quebrar a cara) é uma forma de pensar-e-de-agir.
Enfim, Escorel, foi o q seu texto me inspirou, primeiro jato, nem releio
Abração
jcb
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DE PERNAS PRO AR 2, Jean-Claude Bernardet
Após acalorada discussão em torno de DE PERNAS PRO AR 2, venho a público manifestar minha esperança de que as gentes bem pensantes, os intelectuais, os artistas, os autores, os poetas e outros de gosto requintado, não caiam na mesma burrice dos anos 50. Foi preciso esperar a morte da chanchada para que a elite percebesse que Oscarito e Grande Otelo eram grandes atores, e que CARNAVAL ATLANTIDA era um filme político.
De pernas pro ar 2 é um filme atual que trata de problemas que angustiam boa parte da classe média como: o trabalho da mulher, a relação da mulher que trabalha com o marido, os filhos e a casa, o stress da mulher executiva que estressa os homens, o péssimo estado da telefonia celular no Brasil e também o celular como adição, a exportação de produtos manufaturados brasileiros etc.
Se o filme não abordasse comicamente questões do seu interesse, o público não teria sido tão numeroso.
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PS. Comentarei amanhã o e-mail do Jean-Claude. EE