Pouco mais de um ano depois de a pandemia de Covid-19 chegar ao país, o que houve com a desigualdade e a prosperidade trabalhistas desde então? E os indicadores subjetivos de bem-estar? Como o Brasil se compara com o resto do mundo? Respondemos a estas perguntas tomando como base os principais pontos de pesquisa recente do FGV Social sobre a felicidade na pandemia. Em oito tópicos, algumas conclusões:
O topo da desigualdade – A pandemia adiciona mais três centésimos ao índice de Gini de renda per capita trabalhista, que chegou a 0.674 no primeiro trimestre 2021, nosso recorde na série histórica desde 2012. A literatura considera esse movimento um grande salto de desigualdade, depois de outro grande salto ocorrido entre 2015 e 2019. Essa recorrência de perdas é um aspecto que diferencia a trajetória do Brasil frente à maioria dos países.
Prosperidade – No trimestre de janeiro a março de 2020, a renda média do trabalho alcança o maior ponto da série, 1.122 reais, e em menos de um ano vai para o ponto mais baixo da série histórica, 995 reais, ficando pela primeira vez abaixo de 1 mil reais mensais.
Bem-estar social – No primeiro trimestre de 2020, o bem-estar trabalhista estava em empate técnico do nível com o do início da série histórica em 2012, ou seja, não tinha havido progresso social líquido nesta década. No ano seguinte, o bem- estar cai 19,4% e é o novo piso da série.
Pobres perderam mais – A média das rendas individuais do trabalho, incluindo os informais e os sem trabalho, caiu 10,89% na pandemia; a queda de renda da metade mais pobre foi 20,81%, queda quase duas vezes maior que a da média.
Felicidade foi-se embora – O estudo olhou também medidas subjetivas de bem-estar, resultado de respostas diretas das pessoas sobre a sua vida. Começamos com uma medida geral de felicidade dada por uma nota de avaliação de satisfação com a vida numa escala 0 a 10. O Brasil tem uma queda de 0,4 pontos em 2020, chegando a 6,1, o menor ponto da série histórica desde 2005.
Desigualdade de felicidade – A queda da felicidade se dá nos 40% mais pobres (-0,8) e no grupo do meio (-0.2), situados entre 40% a 60% da renda. Já os grupos mais abastados mantiveram a satisfação com a vida. Ou seja, há aumento da desigualdade de felicidade na pandemia. A diferença de satisfação com a vida entre os extremos de renda, que era de 7,9% em 2019, sobe para 25,5% em 2020.
Comparações internacionais – A pandemia de Covid-19 afeta de maneira marcada o dia a dia das pessoas ao redor do globo terrestre. Usamos, a título de experimento, a comparação do Brasil com a média de 40 outros países pesquisados, que cobrem da Áustria à China, passando pelo Zimbábue. A nota média de satisfação da vida presente do brasileiro caiu de 6,5 em 2019 para 6,1 em 2020. No resto do mundo a nota tinha ficado parada durante a pandemia em torno de 6. Ou seja, ocorre marcada perda de felicidade no Brasil em relação a outros países durante a pandemia.
Emoções cotidianas – Medidas pontuais de bem-estar indagam sobre emoções sentidas em quantidades relevantes na véspera da pesquisa. Aqui nos referimos a sentimentos de raiva, preocupação, estresse, tristeza e divertimento. A sensação de raiva sobe de 19% em 2019 para, em 2020, 24% dos brasileiros, uma mudança de 5 pontos percentuais. No mundo esse avanço foi de 0,8% ponto percentual. Ou seja, a raiva aumenta 4,2 pontos percentuais a mais no Brasil durante a pandemia que no resto do mundo. Similarmente: preocupação, estresse e tristeza sobem, respectivamente, 3,6, 2,9 e 2,2 pontos percentuais a mais no Brasil do que no resto do mundo. Todos os indicadores subjetivos de bem-estar considerados pioraram mais no Brasil durante a pandemia do que na média dos 40 demais países.
Em geral, indicadores objetivos e subjetivos mostram na pandemia piora das desigualdades dentro do Brasil e uma perda maior gerada para o conjunto do país do que para o conjunto de 40 outras nações pesquisadas.