O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se favorável à condenação por peculato (desvio de dinheiro público) do deputado federal e apresentador de tevê Celso Russomanno (PRB-SP). A manifestação de Janot se deu nos autos do processo contra o deputado no Supremo Tribunal Federal (STF). Se a Corte acatar as considerações do procurador-geral até agosto, prazo para registro das candidaturas, Russomanno não poderá disputar a Prefeitura de São Paulo nas eleições de 2016.
Em manifestações enviadas ao STF em fevereiro deste ano e, depois, no último dia 11, Janot afirma que mantém as razões que levaram à condenação de Russomanno pela 10a Vara da Justiça Federal do Distrito Federal, em fevereiro de 2014, por ter pago com recursos da Câmara dos Deputados uma funcionária que trabalhava em sua produtora em São Paulo. De 1997 a 2001, Sandra de Jesus atuou na empresa privada do parlamentar, embora o salário fosse pago pela Câmara.
Russomanno foi condenado a 2 anos e 2 meses de prisão, em regime aberto. A condenação foi substituída por prestação de serviços comunitários e pagamento de multa de 25 cestas básicas, no valor de 200 reais cada. Pela Lei da Ficha Limpa, pessoas condenadas por órgão colegiado em determinados crimes, como é o caso do peculato, ficam inelegíveis por oito anos.
No mês passado, o deputado pediu ao STF que fosse revista a pena imposta pela Justiça Federal. Na avaliação de especialistas ouvidos pela piauí, com esse pedido o parlamentar pretendia não só ganhar tempo como possivelmente conseguir a diminuição da pena para que houvesse prescrição do crime.
“Do que se infere da análise da última manifestação da defesa nos autos, em conjunto com a argumentação lançada nas razões de apelação, há a pretensão em ver reduzida a pena imposta na sentença, tendo em vista a alegada devolução de verba de gabinete e o agora sinalizado compromisso de recolhimento dos valores pagos à ex-servidora Sandra de Jesus. No entanto, essa pretensão não merece acolhida”, declarou o procurador-geral da República em manifestação, enviada ao STF no último dia 11.
Russomanno é líder nas pesquisas para prefeito de São Paulo. No final do ano passado, tinha cerca de 34% das intenções de voto, segundo o Datafolha, mais que o dobro que a segunda colocada, Marta Suplicy (PMDB). A disputa em São Paulo está fragmentada em cinco candidaturas com potencial de chegar a dois dígitos nas pesquisas. Além de Russomanno, de Marta e do prefeito Fernando Haddad (PT), terceiro colocado na disputa, devem concorrer o empresário e também apresentador de tevê João Doria Jr. (PSDB), o vereador Andrea Matarazzo (PSD) –e a deputada Luiza Erundina (PSOL).
A saída de Russomanno da disputa tem potencial, portanto, de embaralhar muito a eleição na maior capital do país, com a diluição, entre os outros cinco candidatos, do seu caminhão de votos no centro expandido e, principalmente, na periferia.
O resultado da eleição em São Paulo tem impacto direto sobre a dimensão que o PT passa a ter no pós-impeachment. Haddad é hoje o principal candidato do partido na disputa municipal, e sua reeleição na capital, mantendo a maior cidade do país sob a administração do PT, o colocaria como peça importante do xadrez eleitoral de 2018.
Os autos do caso Russomanno foram enviados em 2015 do Tribunal Regional Federal, em Brasília, ao STF, uma vez que ele tomou posse como deputado federal, eleito no ano anterior, e passou a ter direito a foro privilegiado. O processo está pronto para a sentença da ministra Cármen Lúcia, relatora do caso, que submeterá sua decisão à 2ª Turma do STF, composta pelos ministros Dias Toffoli, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Teori Zavascki. Seu relatório deverá ainda passar por Zavascki, ministro revisor, antes de entrar na pauta da turma.
A avaliação dos advogados ouvidos é a de que, pelo ritmo atual, o STF deverá votar a questão antes de agosto.
Na mesma petição enviada ao STF sobre a redução da pena, Russomanno também reafirmou sua inocência, mas pediu para devolver os valores pagos à funcionária pela Câmara. “Embora esteja convicto de sua inocência e acredite que esta Corte dará provimento ao Recurso de Apelação interposto, a fim de que não se tenha dúvidas quanto a sua lisura no agir e de sua conduta como homem público, requer que seja expedida guia de recolhimento, com a devida atualização monetária, do valor que, segundo a acusação, teria sido indevidamente pago pela Câmara dos Deputados à senhora Sandra de Jesus, a fim de que o requerente proceda ao seu pagamento”, declararam os advogados de Russomanno nos autos.
O procurador-geral da República não se opôs ao recolhimento dos valores, mas voltou a questionar os argumentos usados na defesa de Russomanno, entre os quais o de que o deputado nem usaria toda a verba a que tinha direito na Câmara, devolvendo os valores não utilizados. “Nos termos do que já foi aduzido pelo Ministério Público Federal em contrarrazões de apelação, a verba indenizatória de gabinete e a cota para o exercício de atividade parlamentar são utilizadas mediante reembolso. É dizer: a rigor, o congressista apenas não utilizou o total da cota disponível, gastando menos do que o limite”, declarou Janot, que finalizou sua manifestação dizendo “reiterar as contrarrazões apresentadas [em fevereiro], pugnando pela manutenção da sentença recorrida”.
O advogado de Russomanno, Marcelo Leal de Lima Oliveira, disse não ter expectativa de que o caso entre em pauta até agosto. Segundo Oliveira, casos mais antigos ainda não foram analisados pela Corte. “De qualquer maneira, estou muito confiante na vitória do Celso. Ouvimos várias testemunhas e produzimos provas de que a funcionária trabalhou no escritório político. O problema é que havia uma confusão. O imóvel onde funcionava a produtora também era a sede do escritório político em São Paulo”, afirmou.
Oliveira disse ainda que a discussão nos autos não é se a funcionária trabalhou ou não para a produtora, o que ela pode ter feito nas horas vagas, mas “se ela prestou serviço para o escritório político”. “E isso temos várias testemunhas falando que sim”, declarou.
O advogado afirmou também que Russomanno disse se sentir mal com a condenação, mesmo sabendo ser inocente. “Sentei com o Celso, e a gente estava preocupado com a candidatura. Ele reafirmou a inocência e me disse: ‘Como homem público me sinto mal. Queria devolver e mostrar minha boa fé.’”