Reportagem atualizada às 10h40 de 27 de dezembro de 2023
Na casa vazia, pesada e ainda cheia do terror da manhã, João estava sozinho. O insuportável silêncio das coisas espalhava-se pelo armário de fórmica bege da cozinha, as garças do quadro tropicalista da sala, os livros aos ombros de outros livros na estante sem fim, que subiu até o teto, e no piso de granito fosco sobre o qual Samuel havia passado com a sua mãe nos braços. Criado por muita gente e por muitos sons, João não suportava o vazio. Ele caminhou até o toca-discos, acionou o botão maior do painel de luzes verdes, levantou a tampa de acrílico e colocou o LP The Dude, de Quincy Jones. Ouviu os dois lados até o fim e o trocou por Sunlight, de Herbie Hancock. Ao terminar, desligou o aparelho, guardou os álbuns, retirou o telefone do gancho e discou para 280 31 97 muitas vezes, até alguém atender.
“Antena 1, boa noite.” Se perguntassem sua idade, não mentiria: 11 anos, 6 meses e 19 dias. Mas ele se apressou em dizer: “Meu nome é João. Eu gostaria de ouvir Love X Love, do George Benson.”
A música de Benson, uma inebriante fuga de discoteca dos anos 1980, com um verso que dizia “aqui estamos nós, e nos tornamos mais fortes a cada dia”, tomou a casa, as coisas e os pensamentos, até que os flashes voltaram a explodir em sua cabeça. “Traga a chave reserva, ela trancou a porta por dentro.” “Não venha aqui, espere no quarto!” “Veja se a ambulância chegou.” “Hospital das Clínicas!” “Ela não vai voltar.” “Onde estão os meus irmãos?” Assim que George Benson acabou seu número, João desligou o rádio e andou até o quarto da mãe. Abriu o armário, apanhou o roupão que ela mais usava e o cheirou profundamente até pegar no sono, esperando que Elis Regina entrasse por aquela porta assim que o dia amanhecesse.
O dia 20 de janeiro de 1982 amanheceu e Elis não entrou. Nem ela e nem ninguém. Havia comida na despensa o suficiente para uma semana e uma garrafa de água na geladeira na qual João preferiu não tocar. Melhor guardar o resto da água e a garrafa em que a mãe havia tocado os lábios. E guardar também o armário bege, o toca-discos, os discos, a estante de livros, os livros, as pedras de granito e, por mais frias que fossem, as garças do quadro tropicalista. Depois de viver em ato contínuo o pesadelo iniciado na manhã anterior, com Samuel McDowell, o novo namorado de Elis, pedindo ajuda para arrombar a porta do quarto, retirá-la no colo e levá-la ao Hospital das Clínicas, e finalizado com as imagens pela tevê do corpo de sua mãe sendo enterrado no Cemitério do Morumbi, João esperava que seus irmãos voltassem e que a vida, seja lá o que isso fosse a partir de agora, apontasse algum caminho.
A morte de Elis provocou, além da falta de uma mãe que ocupava todos os lugares ao mesmo tempo, um efeito imediato na vida de João: estava desativada, a partir daquele instante, a cápsula de mimos e bajulações criada sobretudo por homens que disputaram as atenções da artista por toda a vida. Compositores, músicos, técnicos, produtores de discos, empresários, maridos, amantes e fãs agradavam aos filhos para, em algum grau, conquistarem a mãe. Agora, era preciso se habituar às transformações. “Você pode me trazer aqui um dia?”, perguntou João a um dos músicos mais próximos de Elis dias depois de sua morte, ao passarem de carro pelo Playcenter, um antigo parque de diversões de São Paulo. A resposta reforçou suas sensações: “Eu não trago nem meus filhos, rapaz, vou trazer você?”
Se Elis morreu de súbito para um país inteiro, aos 36 anos de idade, ela se foi aos pedaços para João Marcello Bôscoli. O silêncio dos dois dias em que ele narra ter sido deixado só no apartamento da Rua Melo Alves, nos Jardins, o mesmo em que a mãe havia sido encontrada inconsciente depois de ingerir uma mistura de efeito imprevisível, cocaína com bebida alcoólica, era apenas o anúncio de uma tempestade particular. O pior estava por vir. Irmão de Elis, Rogério chegou ao apartamento para assumir a liderança até as coisas se acalmarem. “E se você não estiver gostando, pode ir embora”, avisou ao sobrinho. Uma das primeiras decisões da família foi iniciar a partilha dos bens da cantora, lembrada por João como uma cruel e inegociável dilapidação de seus maiores afetos. “Eles arrancavam um pedaço de mim a cada objeto que levavam.”
Antes das coisas, sumiram os irmãos. Enquanto João era filho do produtor e compositor Ronaldo Bôscoli, casado com Elis entre 1967 e 1972, Maria Rita, de 4 anos, e Pedro Mariano, de 6, eram frutos do segundo casamento da artista, com Cesar Camargo Mariano, entre 1973 e 1981. Não era exatamente reconfortante ter Bôscoli como pai em 1982, um homem de muita sedução artística e nenhuma vocação paterna, conforme atestava a garrafa de uísque servida à mesa dos cafés da manhã de sua casa, no Rio de Janeiro, e em todas as outras refeições. Assim como os distantes avós, Erci e Romeu, Ronaldo não era uma opção de fuga. Cesar, por sua vez, tratou de resgatar Pedro e Maria Rita para viverem com ele, e combinou de apanhá-los na Melo Alves numa tarde em que João não estava. Assim, quando o menino voltou, não havia mais irmãos. “Eu nunca me despedi deles. E Cesar, a quem eu chamava de pai, jamais ligou para saber se eu estava bem.”
Dias depois, mais uma determinação de Rogério: “A partir de amanhã, você vai pegar um ônibus para ir à escola, o ponto é logo ali na frente.” E um lembrete da família, como João conta: “Disseram que a vida havia mudado, que precisávamos colocar as coisas da Elis na roda.”
Em 26 de dezembro, Cesar Camargo Mariano divulgou uma nota de esclarecimento na qual contesta o relato de João. “As insinuações de abandono de minha parte (…) são totalmente inverídicas e extremamente ofensivas à minha pessoa.” Disse que estava em busca de um apartamento para viver com as três crianças quando foi informado sobre a decisão de deixar João com o tio Rogerio, o que foi do “total agrado” do garoto, segundo conta. Anos depois, recorda, João o procurou para viver em sua casa, ao lado dos irmãos, foi prontamente acolhido e lá permaneceu até a maioridade. “Se em algum momento nos afastamos, jamais foi por irresponsabilidade ou abandono.” Depois de ler a nota, João Marcelo reafirmou seu relato.
Rogerio morreu na década de 1990, em um acidente de moto.
Alguns dias depois da morte da mãe, João soube pelo noticiário que fãs haviam saqueado a casa que Elis mantinha na Serra da Cantareira, Zona Norte de São Paulo. “Não levaram televisão, videocassete, nada disso. Só o que realmente importava.” Quadros, objetos de cozinha, fitas cassete, bilhetes e roupas, tudo estava desaparecido. Já na Melo Alves, os objetos sumiam às vistas. Ao ser questionado sobre a perda que mais sente até hoje, João precisou recuperar o fôlego depois de chorar por um tempo. “Foi o papel… O papel da escola.” Ao ser matriculado no colégio Pueri Domus, em São Paulo, a secretaria, como era de praxe, pediu à mãe do aluno que preenchesse uma ficha sobre ele, descrevendo os traços principais de sua personalidade. E Elis escreveu: “Charmoso, inteligente, cínico, bonito e debochado.” O documento também desapareceu. “Por que alguém sumiria com esse papel? Por que fizeram essa maldade?”
Sua reação à desintegração gradual de Elis foi orgânica e silenciosa. A partir daqueles dias, sem que ele mesmo soubesse, fragmentos de medo, traumas, instinto de sobrevivência e alguma revolta se fundiriam para originar duas características norteadoras: uma memória com capacidade robótica de armazenamento arquivaria datas, imagens, sons, aromas e informações. A cabeça era o único lugar de onde ninguém poderia subtrair nada. E um ímpeto para manter a onipresença de Elis compensaria os dias em que ela havia se desmanchado diante de seus olhos. Como se pudesse reconstruir a mulher roubada, João passou a criar projetos, remixar discos, analisar pedidos, digitalizar áudios e, sem pudores, assumir uma profissão: “filho de Elis Regina.”
Aos 54 anos e de solteirice reconstituída depois de dois casamentos, com a apresentadora Eliana e a pianista Juliana D’Agostini, com as quais teve, respectivamente, Arthur, de 11 anos, e André, de 7, João vive, aparentemente, sem a companhia de fantasmas em um confortável condomínio no bairro do Morumbi, em São Paulo. A Trama, estúdio de gravação que mantém o nome da produtora criada por Elis, em 1975, funciona hoje no bairro de Campo Belo, perto do Aeroporto de Congonhas, com o sócio André Szajman, amigo desde 1981 e colega de trabalho desde 1997. Dentre os mais de 4 mil títulos lançados, estão os álbuns de Gal Costa, Baden Powell, Ed Motta, Pedro Mariano, Nação Zumbi e Jair Rodrigues. Diretor musical da agência de propaganda DPZ aos 23 anos e titular de colunas musicais em rádios e jornais, ele segue dando prioridade às realizações de Elis. “Minha agenda de 2025 já acabou, estou pensando em lançamentos para 2026.”
As estratégias para colocar projetos na praça são planejadas, quando possível, com um criterioso encaixe de peças. Se um filme vai sair, segura o documentário. Se um musical vai estrear, adia o livro. Se um comercial da Volkswagen vai ao ar, suspende tudo. Mais de 40 anos depois de morrer, Elis estava pronta para orientar a nova investigação ética dos tempos digitais ao ser vista dirigindo uma Kombi enquanto cantava Como Nossos Pais. Assim que o filme foi ao ar, as mensagens não pararam de chegar ao celular de João. Muitas delas não eram de felicitações.
Ver Elis viva, cantando de novo, era tudo o que seus fãs queriam desde 1982, mas a propaganda do carro, para muitos, a mostrou fake demais, robotizada, descontextualizando uma canção de Belchior e, o mais grave, perigosamente emocionante. Se Elis não era Elis, por que sentíamos aquela vontade de chorar? Os robôs responsáveis por tal arrebatamento humano deveriam ser caçados e extintos (como os sintetizadores resistiram por tanto tempo?). Dias depois de a propaganda criada por meio de recursos de Inteligência Artificial ultrapassar todos os limites bíblicos, ressuscitando uma Elis sem coração, vieram os áudios com a voz da artista. Agora, em mídias postadas nas redes sociais, Elis cantava uma música de Marilia Mendonça.
João Marcello não se intimida com as reações negativas. “As pessoas fizeram isso com amor. A Marilia Mendonça era fã de Elis.” Mas não estaria ficando perigoso? Chegará o dia em que avatares soarão imperceptivelmente humanos em meio às vozes verdadeiras? Imagine Elis Regina cantando para uma campanha de Jair Bolsonaro? “A sua questão se autorresponde”, diz João. “Se soubermos que não foi ela quem escolheu aquilo, saberemos que não será ela quem estará lá. Se depender de mim, vai ter Elis para tudo o que é lado.”
Outro plano da dimensão dos sonhos, o lugar que nunca mais será distante, é colocar Elis Regina para cantar a música Nem Luxo Nem Lixo ao lado de Rita Lee. (E, nesse instante, tudo pareceu muito surreal, com João falando como produtor pragmático sobre levar para o estúdio duas cantoras que estão comprovadamente mortas, o que não parecia fazer nenhuma diferença.) “Eu tenho a voz isolada de Elis cantando uma parte da canção de Rita. Basta juntar as duas.” Outro projeto, ainda maior, é de um álbum inteiro a ser feito com a voz de Elis harmonizada pelo pianista Herbie Hancock, um dos maiores jazzistas da história. “É escolher as músicas, isolar as vozes, enviá-las para ele colocar o piano e morrer no dia seguinte.”
Haveria alguma crise em sua decisão de entregar a vida aos trabalhos da mãe? Não estaria João eliminando a si mesmo e os talentos de músico ou produtor para viver em uma sombra, por mais confortável que ela fosse? Ele diz o seguinte: “Eu vejo muitas pessoas trabalharem em lugares como uma loja, representam uma marca, uma empresa. Eu represento minha mãe, é meu trabalho. Se posso trabalhar para ela e ainda acessar minha cantora favorita, é um sonho que seja assim.” Um sonho cheio de demandas específicas.
Um filho de Elis pode escolher entre dar ou não dar uma entrevista sobre a mãe em um dia tenso como o da Volkswagen, ou ir ou não ir ao show de uma cantora que o convida para uma homenagem. O filho profissional de Elis, em geral, não tem escolha. Convidado para jantar em um restaurante de Jundiaí, no interior de São Paulo, depois de presidir o júri de um festival de novos compositores, João foi recebido com músicas de Elis nas caixas de som. As canções eram tocadas em looping. “Eu não consigo comer ouvindo minha mãe cantar, tive de pedir para tirar. Mas, naquela situação, eu pediria para tirar mesmo se fosse o Stevie Wonder.”
É uma coisa indelicada de se dizer, a de que shows ou gravações de cantoras, em geral, não são experiências prazerosas para o filho de Elis, e ele mesmo não diria isso não fosse seu corpo denunciá-lo diante do repórter por, ao menos, duas vezes. Uma delas foi durante a gravação de uma faixa na Trama, quando João desapareceu do estúdio no instante em que a intérprete cantou a primeira nota. A segunda se deu durante a apresentação de uma jovem interpretando Elis na Casa de Francisca, no Centro de São Paulo. Cada vez mais agitado, ele se levantou da mesa e procurou um lugar longe do palco, distante o suficiente para retomar o ar.
“Cara, o problema é que eu vi o lance. Vi até onde alguém pode chegar. Eu vi uma mulher ser tomada por inteiro, ser instrumento da música em um processo contínuo. E aí fica tudo muito… parece que aquelas pessoas são visitas, não convidadas, parece que a música não está contente em suas bocas.” Mas, fisicamente, o que é que ele sente? “É como se todos os botões fossem apertados ao mesmo tempo. Sinto um curto-circuito neurobiológico. É como se eu tivesse ciúme da música, como se a música estivesse fazendo uma concessão, aturando uma pessoa que a maltrata. A pessoa está cantando, mas a música não está ali. Quando ouço Billie Holiday ou Aretha Franklin, eu falo: ‘A música está ali.’”
Seria Elis o último filtro de excelência da canção brasileira pós era do rádio? A não desafinar nem em nome do fluxo das emoções? Alguém que rejeitou a bossa nova ao prever que aquele era o gênero da ascensão autoral em detrimento da redução de instrumentistas e cantoras? Ao mesmo tempo, teria Elis instalado, com sua perfeição, a maldição da impossibilidade? “O talento de Elis não veio para ofuscar ninguém”, diz João, “mas para iluminar os caminhos, embora seja uma referência difícil de ser alcançada. Ela é uma escola de canto, algo tão forte quanto Jimi Hendrix. Um garoto não precisa conhecer Hendrix para passar por ele. Ao ligar uma guitarra, ele passará obrigatoriamente por ele. Muita gente passa por Elis sem imaginar que está passando.”
O “filho profissional” divide as análises e as autorizações dos pedidos de uso da obra da cantora com a irmã Maria Rita e o irmão Pedro Mariano. Para que não haja travamento dos projetos familiares, eles respeitam um trato de cordialidades. Se o pedido vier de fora, os três analisam. Se vier de uma das partes, os outros dois aprovam. O comercial da Volks chegou por Maria Rita. Uma exposição prevista para 2025 está sendo encampada por João Marcello. Pedro trabalha a ideia de, sobre a voz principal de Elis, retirada de algumas canções, criar arranjos vocais sem instrumentos, usando apenas a sobreposição de sua própria voz para acompanhá-la. Pelo resultado embrionário conhecido pela reportagem, o projeto tem força para se tornar uma das mais brilhantes atualizações de Elis feitas desde a sua partida, e sem nenhuma sombra de IA. “Esta é uma gaveta que eu não abro”, diz Pedro.
E quais seriam os critérios para quem quiser usar a credibilidade de Elis? João diz que, em 40 anos, os irmãos liberaram a imagem ou a voz da cantora para apenas quatro campanhas publicitárias: “Uma do Bradesco durante a pandemia, para agradecer aos profissionais de saúde com Fascinação, uma para o Nubank, que eu quis por ser algo ligado à tecnologia e renovação, uma para a empresa de cosméticos Nívea e outra para a Volkswagen.” Cigarros, ele liberaria? “Claro, a Elis fumava, eu não vejo nenhum problema.” E os cuidados com a imagem associada a um produto que mata pessoas todos os anos? E o politicamente correto? “Não, não, nenhuma correção. Já existem as fotos de Elis fumando. Não somos politicamente corretos lá em casa.” Um produto que teria seu veto, por outro lado, é o açúcar. “Eu não aceitaria, diz respeito às crianças. Para açúcar, não dá.”
O nome do negócio, segundo João, é zeladoria. E não fazê-la constantemente, arquitetando uma agenda de lançamentos póstumos, colocaria a memória de Elis, como coloca a de outros artistas, na fila das extinções. O termo é duro, mas João diz que “isso já está acontecendo”. “Eu não sei se para essa geração que está aí vai ser importante amar alguém ou lembrar de algo, mas vamos lá: cadê a Marlene? A Dalva de Oliveira? A Dolores Duran? A Silvia Telles? A Clara Nunes? A Nara Leão? Elas ocupam um espaço muito menor do que aquele que deveriam ocupar.” Muitos dos nomes que cita são da era do rádio, mas há casos mais recentes, e de artistas ainda vivos, que podem preocupar por não contarem com gestores dedicados a administrar relançamentos digitais e a produzirem conteúdos transversais.
Grandes artistas, em geral, são representados por controladores de royalties, não por gestores de afeto. Mortos como Raul Seixas, Tim Maia, Gal Costa, Cassia Eller, Beth Carvalho, Bezerra da Silva e muita gente graúda pode não se manter no pós-vida se continuar vivendo do passado. E é isso: nem mais os mortos podem viver do passado ou terão, para uma geração que chega aos 20 anos de idade sem constrangimentos de perguntar “quem é Tom Jobim?”, o destino de muitos vivos em processo de desbotamento geracional. “Esse não é o cara do meme?”, perguntou um garoto de 16 anos, aluno de uma escola particular na Zona Oeste de São Paulo, ao entrar na casa do repórter e ver um ímã de geladeira com o rosto de Chico Buarque.
João fala de herdeiros de forma geral. “Se eu fosse eles, daria tudo para eu cuidar. Coloca o Milton Nascimento na minha mão e volta em cinco anos para ver o que acontece.” Ele não acha que esses artistas estejam maltratados por seus representantes, mas diz sentir “uma outra trip” em seus entornos. “As pessoas que estão ao lado da maioria deles são parasitas. Elas drenam os artistas para saber quanto é que podem ganhar com isso. Eu sei fazer, aprendi a fazer, e não vou discutir com filhos ou afilhados. Se o artista me pedir, e me der uma procuração, eu faço.”
Elis não sentiria ciúmes? “Não”, diz João. “Ela era orgulhosa demais para sentir ciúmes.” E talvez também porque os próximos passos sobre sua eternidade não param de ser dados. Para o aniversário do dia 17 de março de 2024, quando faria 79 anos, João quer exibir, na TV Cultura, um show inédito feito no Japão, nos anos 1970. Uma operação para localizar a gravação original junto aos arquivos da TV Asahi, uma subsidiária da NHK, tem envolvido até a embaixada brasileira em Tóquio. Há também um documentário de três episódios já finalizado pela HBO, ainda sem data de exibição, e um baú pessoal de João com poucos objetos e cartas da mãe que não se perderam, como roupas que não foram levadas a nenhuma exposição. Mas qual seria o Santo Graal, a grande descoberta, a pérola que o guardião de Elis ainda não conseguiu encontrar? João volta a chorar, recupera o fôlego e diz: “O papel da escola.”