Russomanno devolve ‘R$ 40 mil, R$50 mil por mês’ de cota parlamentar?
Por Lucas Ferraz
Na disputa pela Prefeitura de São Paulo, o deputado federal Celso Russomanno (PRB) se apresenta como um político que trata o dinheiro público “com carinho”. No mês passado, durante sabatina na rádio CBN, ele fez questão de ressaltar que, desde que chegou à Câmara dos Deputados, em meados da década de 1990, se esforça para economizar sua cota parlamentar, verba a que os deputados federais têm direito e que serve para ajudá-los a divulgar os feitos de seus mandatos.
“Eu sempre devolvi e continuo devolvendo (a cota)”, disse Russomanno na rádio. “Devolvo (aos cofres públicos), em média, R$ 40 mil, R$ 50 mil por mês”.
Mas o discurso do deputado-candidato não se sustenta quando confrontado com dados públicos obtidos pela Lupa por meio da Lei de Acesso à Informação. Segundo informações da própria Câmara dos Deputados, entre julho de 2009 – quando os deputados incluíram no benefício os gastos com telefonia, passagens aéreas e despesas com correspondências – e o mês de setembro deste ano, Russomanno deixou de gastar, por mês, bem menos do que sugeriu na entrevista à CBN.
Entre julho e dezembro de 2009, segundo dados da Câmara, o saldo não utilizado por Russomanno em sua cota parlamentar foi de R$ 94.209,75. Isso dá uma média de R$ 15,7 mil por mês.
Em 2010, a economia foi de R$ 178.341,37, numa média mensal de R$ 14,8 mil. No ano seguinte, em 2011, o saldo não utilizado pelo deputado foi de R$ 7.102,82. Isso fica bem longe da média mensal de R$ 40 mil ou R$ 50 mil que ele informa.
Russomanno não teve mandato parlamentar em 2012, 2013 e 2014. No ano passado, voltou à Câmara e, ainda segundo dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação, também não economizou mensalmente tanto quanto diz.
Em 2015, o saldo não utilizado de sua cota parlamentar foi de R$ 232.210,34, o que dá uma média de R$ 19,3 mil por mês. Neste ano, até o mês de setembro, a economia foi de R$ 192.456,80, ou seja, aproximadamente R$ 21,3 mil por mês.
Desde maio, quando já se apresentava como pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, Russomanno aborda esse tema sempre que pode. Chegou a escrever sobre o assunto em seu próprio site:
“Todo deputado federal tem direito a uma verba de gabinete para sua estrutura administrativa. Geralmente, esta verba é utilizada em sua totalidade. Em meu caso, uso apenas o extremamente necessário. Desde meu primeiro mandato, já devolvi mais de um milhão de reais aos cofres públicos. Isso porque considero que dinheiro público é sagrado, pertence à população brasileira e não deve ser mal utilizado”.
A cota de Russomanno, conforme tabela fixada para os deputados de São Paulo, é hoje de R$ 37.043,53 ao mês. Quando faz uso desse dinheiro, o deputado precisa levar as notas fiscais ao Congresso e solicitar reembolso. É importante frisar aqui esse ponto: o pagamento da cota parlamentar é feito por reembolso. Ou seja: Russomanno não teria como ter devolvido parte dessa verba. Na melhor das hipóteses, teria deixado de gastar o que tem direito.
Ao ser questionado sobre o tema, o candidato do PRB ajustou o discurso. Embora tenha dito publicamente que, desde o início de seu mandato como deputado federal, nos idos de 1995, já devolveu “mais de R$ 1 milhão” ao cofres públicos, só apresentou à Lupa informações financeiras a partir do ano 2001. Veja a nota na íntegra.
Russomano sustenta que, nesse período, economizou R$ 1.127.574,37, mas faz isso somando valores computados em períodos que tinham regras diferentes. De 2001 até junho de 2009, a verba indenizatória dos deputados não incluía gastos com passagens aéreas, telefonia e serviço postal. Esses gastos eram pagos e computados diretamente pela Câmara. Só a partir de julho de 2009, é que eles foram unificados e passaram a integrar a cota parlamentar. Misturar as duas formas de contabilidade pode gerar confusão.
Por fim, a título de pura curiosidade, vale destacar que a Lupa ainda encontrou mais uma dissonância entre os cálculos apresentados por Russomanno e os dados públicos repassados à reportagem pela Câmara. O deputado-candidato diz que, na atual Legislatura, ou seja, entre fevereiro de 2015 e setembro de 2016, deixou de gastar R$ 399.881,57 de sua cota parlamentar. Os dados obtidos pela Lei de Acesso à Informação mostram, entretanto, que o aperto de cinto foi maior. Russomanno teria economizado R$ 424.667,14. Nem a Câmara nem o candidato souberam explicar a diferença.
A LEI DA FICHA LIMPA
Apesar de se apresentar publicamente como defensor da Ficha Limpa, há, no Congresso, registros de que Russomanno atuou para modificar a legislação. Na campanha eleitoral de 2012, quando também disputava a Prefeitura de São Paulo, um eleitor cobrou dele que se posicionasse publicamente sobre a Ficha Limpa, e o candidato não hesitou:
“Eu votei para deixar a lei mais dura”.
Mas os registros da Câmara mostram o contrário. Em maio de 2010, durante a tramitação da legislação no Congresso, Russomanno era filiado do PP e foi um dos 41 deputados que votaram na proposta apresentada pelo então deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para retirar do projeto a parte que fixava o período em que um político se tornaria inelegível caso fosse condenado por compra de votos ou abuso de poder econômico.
Se essa informação tivesse sido suprimida da lei, segundo a maioria parlamentar que votou contra a proposta de Cunha, a legislação se tornaria inconstitucional e poderia ser barrada no Supremo. Foi por isso que o movimento do qual Russomanno fez parte não prosperou.
Promulgada em junho de 2010, a Lei da Ficha Limpa, barra a candidatura de pessoas que já tenham sido condenadas pela Justiça Eleitoral ou em órgãos colegiados, entre outros pontos. E Celso Russomanno já respondeu no Supremo Tribunal Federal por uma ação por peculato (desvio de dinheiro público), sendo acusado de pagar a funcionária de sua empresa privada com recursos da Câmara. Em agosto, foi absolvido, distanciando-se da Lei da Ficha Limpa.
Procurado para comentar esse assunto, Russomanno não respondeu.
IMPEACHMENT DE DILMA
Como diversos parlamentares, o hoje candidato pelo PRB também mudou de posição com relação ao processo de impeachment que afastou Dilma Rousseff (PT) da Presidência da República.
Em setembro de 2015, antes que o caso começasse a tramitar na Câmara, o candidato do PRB assinou, ao lado de 300 deputados, uma carta de apoio a Dilma, chamada de “proba, honrada e dedicada”.
Em abril, na sessão da Câmara que determinou a abertura do processo de impeachment contra ela, Russomanno votou em outra direção:
“Pelo meu estado, pela família brasileira, pela minha família, meus filhos, a geração dos meus filhos e dos meus netos, eu voto sim pelo impeachment, senhor presidente”.
Confrontado com essa aparente contradição, Russomanno também não quis falar.
*Nota: Segundo a Câmara, o saldo não utilizado da (cota parlamentar) acumula-se ao longo do exercício financeiro, mas é vedada a acumulação de saldo de um exercício para o seguinte. Essa verba só pode ser utilizada para despesas de competência do respectivo exercício financeiro.
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