Venezuelanos protestam em Caracas no dia seguinte à eleição: O governo e a polícia política criaram aplicativos para que as pessoas denunciem quem está envolvido nas manifestações CRÉDITO: YURI CORTEZ_AFP_2024
“Maduro não vai reconhecer a derrota”
Um diário do mês de protestos e medo na Venezuela depois da eleição presidencial
A jornalista venezuelana Paula Ramón, que vive em Los Angeles, escreve na piauí deste mês um diário em que conta, a partir de contatos com amigos e familiares, os dias de protestos e medo que se seguiram à eleição presidencial.
“Minha aposta nas primeiras horas da manhã era que o governo Maduro acharia um jeito de cantar vitória, mesmo que perdesse”, escreve a jornalista, em 28 de julho, dia da votação. “Caso houvesse uma forte abstenção, tudo ficaria mais fácil para ele. Porém, à medida que as horas foram passando e as filas nos locais de votação não paravam de aumentar, cresceu em mim a dúvida sobre como Maduro poderia se dizer vitorioso. Com milhões de pessoas decididas a votar, a situação estava se complicando para ele.”
Não foi fácil votar. Uma ex-cunhada da jornalista viveu uma situação tensa na cidade de Valencia. Logo pela manhã, ela se dirigiu com o marido à zona eleitoral, e cada um seguiu para a sua fila, porque eles votavam em seções diferentes. A fila em que ele estava começou a andar, embora lentamente, mas a dela permaneceu parada. Ninguém dava explicações sobre o que estava acontecendo. Seu marido conseguiu votar em torno das 11 horas, enquanto ela continuava na mesma posição na fila. “As pessoas reclamavam, e a única resposta que recebemos foi que tinha ocorrido um problema técnico na máquina”, contou a ex-cunhada. “Mas ninguém queria ir embora, todos suspeitávamos de que era outra armadilha do governo para não deixar a gente votar. Passamos fome e sede, mas aguardamos. Eu queria votar, todos queríamos votar.”
Ao fim da votação, depois de uma longa espera, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou que Maduro havia sido reeleito, com 51,2% dos votos. No dia seguinte, a oposição, liderada por María Corina Machado e Edmundo González – que concorreu contra Maduro –, anunciou que dispunha de outro resultado. Sua enorme rede de fiscais nos locais de votação havia guardado cópia de mais de 40% das atas eleitorais, que indicavam que González havia ganhado com 70% dos votos.
Em 3 de agosto, sábado, milhares de venezuelanos foram às ruas dentro e fora do país para protestar contra a recusa do governo em aceitar o que eles consideram o legítimo resultado eleitoral e exigir que o CNE apresentasse as atas de votação. Um rapaz de 32 anos que mora em Caracas ficou em dúvida se deveria ir ao protesto. “No final, achei que tinha que ir, porque, emocionalmente, precisava sentir que não estava sozinho.” Antes disso, ele se mudou da casa de sua família, para não comprometê-la, deletou todas as informações pessoais do celular e calculou como agir caso fosse detido. Foi para o protesto apenas com o telefone “vazio” e a carteira de identidade.
Alguns venezuelanos colocam suas esperanças nas possíveis negociações empreendidas pelos governos de Lula, do colombiano Gustavo Petro e do mexicano López Obrador. Mas há também ceticismo. “Maduro não vai reconhecer a derrota”, disse a Ramón um colega que trabalha em Caracas. “Talvez o único jeito seja negociar, talvez esses países ofereçam algum tipo de alternativa para Maduro aceitar uma transição.”
Assinantes da revista podem ler a íntegra do diário neste link.
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