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    ILUSTRAÇÃO DE PAULA CARDOSO SOBRE FOTOS DE PEDRO LADEIRA/FOLHAPRESS

questões eleitorais

Maia, Witzel e 2022

A aproximação entre o presidente da Câmara e o governador do Rio para isolar Bolsonaro

José Roberto de Toledo, Thais Bilenky e Fernanda da Escóssia | 03 set 2019_10h33
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Rodrigo Maia e Wilson Witzel estão cada vez mais próximos, física e politicamente. O presidente da Câmara e o governador do Rio de Janeiro se encontraram várias vezes nas últimas semanas para falar sobre Rio de Janeiro, política nacional e até de futebol. De tanto conversarem, entrelaçaram seus partidos e parecem prontos para dar o próximo passo na relação: o DEM de Maia deve aderir ao governo do PSC de Witzel. Em troca de seus cinco votos na Alerj, a Assembleia Legislativa, os democratas devem levar uma secretaria estadual no Rio, talvez a de Infraestrutura e Obras. O acerto tem implicações na eleição de prefeitos em 2020, inclusive na capital fluminense, mas vai além. Pelo menos dois anos além.

O perdedor da aliança de Witzel com Maia é o presidente Jair Bolsonaro, que assiste a dois rivais seus armarem um churrasco no meio do quintal bolsonarista. Witzel sonha disputar a Presidência já em 2022. Maia não sonha porque não dorme: mantém conversas regulares com todos os presidenciáveis do lado azul do espectro político. É interlocutor permanente do apresentador Luciano Huck – um pré-candidato sem partido mas com potencial de agradar tanto financistas da Avenida Faria Lima em São Paulo quanto eleitores no interior do Nordeste. Semana sim, semana não, Maia posa com o governador paulista João Doria e até apadrinhou a filiação ao PSDB de um ex-aliado de Bolsonaro, o deputado Alexandre Frota, expulso do PSL por criticar o presidente. Só faltava Witzel. 

Não falta mais. As amarras entre o DEM e o PSC no Rio foram costuradas pelo governador e pelo presidente da Câmara, mas tiveram uma agulha inusitada. Secretário de governo de Witzel, Cleiton Rodrigues é uma espécie de Forrest Gump da política fluminense. Durante a segunda gestão de Cesar Maia na Prefeitura do Rio de Janeiro, projetou-se como operador, atuando nos bastidores. Ganhou a confiança do pai de Rodrigo e, até hoje, vez por outra aparece sem avisar na casa do atual vereador e presidente estadual do DEM. É recebido.

Quando, após perder a eleição para o Senado em 2010, Cesar Maia refugiou-se na Câmara Municipal do Rio, Cleiton Rodrigues transferiu-se para o barco dos Garotinho – do ex-governador Anthony, de sua mulher, a também ex-governadora Rosinha, e da filha Clarissa, deputada federal. Cleiton, como é conhecido, virou operador do clã e, há até pouco tempo, era visto com frequência ao lado da família. No célebre vídeo em que Garotinho é levado de maca para a cadeia, o Forrest carioca aparece no meio do tumulto, junto à porta traseira da ambulância, assistindo o chefe da ocasião. Garotinho e Rosinha foram presos nesta terça-feira (3), sob suspeita de participar de um sistema de superfaturamento de contratos nas gestões dela na Prefeitura de Campos.

Mas foi outro vídeo, mais recente, que levou Cleiton à ribalta da política e ao Jornal Nacional. Depois do sequestro de um ônibus na ponte Rio-Niterói, é ele quem aparece saltando do helicóptero na ponte e correndo de celular em punho atrás de Witzel, enquanto o governador comemora – a ação resultou na morte do sequestrador Willian Augusto Silva, abatido pela polícia.

Entre uma cena notória e outra, Cleiton trocou novamente de padrinho, provando pela segunda vez sua capacidade de pular para uma nova embarcação sem incendiar a anterior. Em 2018, depois que a candidatura de Garotinho foi proibida pela Justiça Eleitoral, Cleiton se aproximou de Witzel. Segundo reportagem do jornal O Globo, conseguiu o celular do então candidato e mandou-lhe uma mensagem com análises de pesquisas eleitorais. Os dois passaram a conversar e Witzel convidou Cleiton para assumir um cargo no governo. Houve uma outra coincidência a uni-los: Witzel se beneficiou da saída de Garotinho da disputa para governador. O então desconhecido candidato do PSC foi atrás do eleitorado evangélico que ficou politicamente órfão do ex-governador e cresceu na reta final do primeiro turno. No embate final, venceu o ex-prefeito Eduardo Paes, candidato pelo DEM dos Maia. Eleito, Witzel não esperou o fim do primeiro ano de governo para anunciar que mira o Planalto.

Em reunião com parlamentares do Rio de Janeiro, na quarta-feira passada (28), Bolsonaro e seu filho senador, Flavio, demonstraram mais de uma vez sua irritação com Witzel. Quando Clarissa Garotinho (Pros) falou na criação de um fundo especial em socorro ao estado, Bolsonaro imediatamente retrucou, sugerindo que o problema do Rio era o governador. Flavio reforçou a desconfiança ao dizer que pediria um estudo sobre o regime de recuperação fiscal com o qual o governo do Rio se comprometeu. Como exemplo da alegada inação de Witzel, o senador mencionou o caso da Cedae, a companhia de esgotos fluminense cuja privatização ainda não tinha saído do papel. Na interpretação de deputados presentes, Jair Bolsonaro quis passar o recado de que não ajudaria Witzel para depois encontrá-lo como adversário nas eleições presidenciais de 2022.

Aliados do presidente da Câmara contam que a negociação de Maia com Witzel envolve o comando de uma secretaria com orçamento e capilaridade política. A preferência é pela pasta da Infraestrutura, para a qual a influência do presidente da Câmara em Brasília faria diferença. O governador fez essa promessa há cerca de um mês a Maia, afirmou um interlocutor, mas há desconfiança de que efetivamente a realize. Políticos fluminenses criticam a atitude de Witzel de assediar prefeitos que estão negociando a ida para o DEM, ao mesmo tempo em que tenta a aliança com Maia. “Witzel me disse que conversou com o Rodrigo, disse que daria espaço para o DEM no governo, mas quero ver na prática”, cobrou o deputado federal Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ). 

Único deputado federal do PSC fluminense, Otoni de Paula disse estar de saída do partido. Não conseguiu legenda para disputar a Prefeitura do Rio, por isso tentará a sorte em outra sigla. “Tudo o que Witzel está negociando agora é pensando em 2022, ele solapou a eleição municipal, porque só pensa na sua candidatura presidencial”, criticou. Paula se disse alinhado com Bolsonaro, o que inviabiliza sua permanência no projeto concorrente de Witzel. Na sua avaliação, o governador negocia para a disputa municipal uma chapa em que o PSC indicaria o vice do ex-prefeito Eduardo Paes, hoje no DEM, mas egresso do MDB, dragado pela Operação Lava Jato no Rio. “O juiz federal com o cara que era sócio político de quem destruiu o Rio de Janeiro? Muita coragem do governador se fizer esse tipo de aliança”, comentou. “Tudo é possível.”

Paes, já derrotado por Witzel em 2018, tem contra si a associação imediata que o eleitor faz entre ele e o ex-governador Sergio Cabral. O deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL) é candidato de Flavio Bolsonaro a prefeito, mas não tem o apoio do presidente da República, diz Otoni de Paula. Tanto é assim que Jair Bolsonaro lançou o deputado federal Helio Lopes (PSL-RJ), cuja proximidade com o presidente permitiu que adotasse o seu sobrenome nas urnas. Confusão e candidato é o que não deve faltar nas eleições municipais. Pela primeira vez não estão permitidas coligações entre partidos para eleger vereadores. Logo, todos os partidos têm interesse em lançar seu próprio candidato a prefeito para divulgar o número da legenda e, assim, alavancar a votação para o legislativo municipal.

Para além da eleição de 2020, Rodrigo Maia mira a de 2022 ao se aproximar de Witzel. Em vez da troca de farpas em público que protagonizou meses atrás, o presidente da Câmara adotou uma tática mais sutil. Tem se empenhado em enfraquecer as alianças que poderiam ajudar Bolsonaro em sua campanha pela reeleição. Maia teve participação no desgaste da relação do presidente com seu ministro mais popular, Sergio Moro; estimulou a saída de deputados do partido bolsonarista e, agora, está colocando sua cunha entre Witzel e o homem que foi decisivo para elegê-lo governador no Rio. Um feito.

Maia virou uma centopeia política. Pôs o pé nas canoas de três pré-candidatos que correm entre o centro e a direita da raia presidencial – as de Huck, Doria e Witzel –, mas não se aboletou em nenhuma delas. Há uma razão para isso. Apesar de dizer que é racional demais para disputar uma eleição majoritária no Brasil de hoje, o presidente da Câmara não hesitaria em aprender a remar se uma quarta canoa passar vazia à sua frente.

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