Quem acha que a eleição de 2022 vai ser um passeio da oposição deve repensar suas expectativas. Os dados do debate digital sobre Bolsonaro e suas férias em Santa Catarina mostram que, mesmo em circunstâncias plenamente desfavoráveis, o presidente continua resiliente. Apesar de seu descaso com a tragédia ocorrida na Bahia, onde as chuvas deixaram dezenas de mortos e milhares de desalojados desde o começo do mês, apoiadores do presidente não arredaram o pé – e, com isso, conseguiram redirecionar parte da discussão a seu favor. Nas redes sociais, os bolsonaristas dominaram 31% do debate em torno do passeio presidencial pelas praias catarinenses. Os dados levam em conta as menções ao episódio no Twitter entre os dias 29 e 30 de dezembro (até as três da tarde).
É um patamar ligeiramente mais baixo do que os 40% que os bolsonaristas costumam obter quando se analisa as menções a Bolsonaro. Nas discussões sobre política de maneira mais ampla, os apoiadores do presidente geralmente respondem por 25% das citações nas redes sociais, num agrupamento fanático e isolado dos demais. Ou seja: apesar dos pesares, Bolsonaro ainda prevalece em ao menos um quarto das discussões. Não é um fato irrelevante. O Twitter é a principal caixa de ressonância do debate político na internet e reflete, até certo ponto, o cenário das pesquisas eleitorais.
Mas as boas notícias para Bolsonaro terminam por aí. Não é nenhuma surpresa que o debate político, quando analisado de forma geral, é desfavorável ao presidente. Os petistas, a centro-esquerda (entre eles os apoiadores de Ciro Gomes) e os liberais lavajatistas (entusiastas de Sergio Moro) se somam nas críticas ao governo. Por diferentes ângulos, todos desancam Bolsonaro diuturnamente (no grafo abaixo, os grupos de oposição estão representados pelas cores vermelho e verde). Diante dos passeios despreocupados de jet ski que Bolsonaro fez nos últimos dias, ignorando a tragédia humanitária em curso na Bahia, a reação da internet não foi diferente. O presidente levou uma lavada.
Grafo de publicações sobre Bolsonaro no Twitter
Entre 29 e 30 de dezembro até as 15h
Viralizou, nos últimos dias, a hashtag #BolsonaroVagabundo. A expressão subiu aos trending topics do Twitter e foi citada 308 mil vezes até as três da tarde desta quinta-feira (30). Nesse quesito, a oposição – tanto a “oficial” quanto a informal – a Bolsonaro deu um banho nos governistas. A hashtag de apoio ao presidente que teve maior alcance nesse período foi #BolsonaroOrgulhodoBrasil, num patamar bem inferior, com aproximadamente 100 mil postagens.
Nesse debate, os perfis de fora da política vêm obtendo um alcance que chama atenção. Influenciadores, funkeiros, artistas e personalidades relevantes na rede são unânimes: Bolsonaro é a Geni da vez. Diferentemente de 2018, quando o então candidato tinha a vantagem de ser até certo ponto desconhecido do grande público, agora Bolsonaro é malhado com frequência por nomes de fora do debate cotidiano sobre política. Entre os dias 29 e 30 de dezembro, esses perfis de celebridades somaram 19% das postagens que mencionavam o presidente. A imensa maioria delas falava mal do mandatário.
Exemplo disso é que o post de maior repercussão dentre aqueles que mencionavam Bolsonaro não veio de nenhum ator da cena política. Veio, em vez disso, de uma atriz (de ofício): Paolla Oliveira. Em sua conta no Twitter, ela escreveu: “Fim de ano chegando e não consigo pensar em nada que deseje mais que saúde, leveza e um FORA BOLSONARO”. Até as 19 horas desta quinta-feira (30), a publicação tinha sido curtida 90,4 mil vezes e retuitada 11,5 mil vezes.
O segundo post de maior repercussão veio do jornalista Renan Brites Peixoto, que repercutiu entre seus seguidores o fato de que Bolsonaro havia rejeitado o apoio humanitário oferecido pela Argentina para lidar com as enchentes na Bahia. O terceiro post mais curtido tratava do mesmo assunto e, novamente, vinha de um perfil que nada tem a ver com política: o portal POPTime, especializado em notícias sobre o mundo do entretenimento. A postagem foi curtida 46 mil vezes e recebeu mais de 11 mil retuítes.
Bolsonaro acusou o golpe. Na manhã desta quinta-feira (30), o presidente se viu forçado a fazer um pronunciamento no Twitter explicando os motivos pelos quais rejeitou o apoio humanitário oferecido pelo governo argentino.
A postagem de Bolsonaro não mudou a opinião predominantemente negativa sobre o episódio, mas ao menos deu munição para que seu bloco de apoio saísse em sua defesa com novos argumentos. Foi, em última instância, um suspiro necessário para que Bolsonaro pudesse curtir o restante de suas férias sem maiores preocupações. A situação da Bahia, da economia, da pandemia, afinal, nunca esteve melhor.