Em 13 de setembro de 2018, o general Eduardo Villas Bôas, então comandante do Exército, compareceu à posse do ministro Dias Toffoli à presidência do Supremo Tribunal Federal. Estava ali prestigiando um magistrado que, duas semanas antes, fora até seu gabinete para lhe fazer uma confidência. “Ele [Toffoli] nos procurou e aí nos afirmou, nos garantiu: ‘Vocês fiquem tranquilos. Enquanto eu estiver na presidência [do STF] não haverá alteração da lei de anistia e tampouco outras coisas de caráter ideológico”, contou Villas Bôas a um interlocutor, na época. “Nos afirmou”, completou o general, “que até a eleição ele não ia pautar nada que alterasse a situação do presidente Lula, tanto do ponto de vista de punição de segunda instância, quanto da questão da lei da ficha limpa eleitoral.” O pleito aconteceu em outubro daquele ano e elegeu Jair Bolsonaro.
Na cerimônia de posse, o general sentiu-se, ele próprio, muito prestigiado. Contou que recebeu várias manifestações de solidariedade em razão do polêmico tuíte que divulgara seis meses antes, quando o STF se preparava para julgar um habeas corpus que poderia livrar o ex-presidente Lula da prisão. No tuíte, largamente interpretado como uma ameaça destinada a forçar os ministros do STF a votar contra o petista, Villas Bôas dizia que o Exército estava “atento às suas missões constitucionais” e compartilhava “o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade”.
Na época, ao mesmo interlocutor, o general disse: “Eu achei interessante que na posse do Toffoli a quantidade de pessoas que vieram se solidarizar comigo, me cumprimentar, pessoas que eu nem conhecia, como o [diretor de cinema] Luiz Carlos Barreto, que eu nunca tinha visto, enaltecendo o meu nacionalismo, como aquele do Sistema S, como é o nome dele? Guilherme Afif! Nunca tinha visto. O que foi presidente do STF, o Joaquim Barbosa… E olha, os ministros todos, eu fiquei impressionado com aquela onda de solidariedade e de apoio.”
O general achou que seu tuíte era o motor dos elogios. Talvez não tenha sido bem assim, pois nenhum dos mencionados confirma a versão de Villas Bôas.
O diretor de cinema Luiz Carlos Barreto foi o primeiro a desmentir. “Quando fui apresentado ao general Villas Bôas, pelo próprio Toffoli, durante o coquetel que se seguiu à solenidade de posse, lhe parabenizei pela bravura com que vem enfrentando a grave enfermidade que o acomete e também pelo seu acentuado espírito nacionalista, sempre se posicionando em defesa da soberania nacional”, escreveu Barreto, em e-mail enviado à piauí, no qual se refere à doença degenerativa do general, que o obrigou a ir à posse de Toffoli numa cadeira de rodas. A respeito do tuíte ameaçando os ministros do STF, Barreto completou: “Jamais prestaria solidariedade ao seu desrespeitoso ato de afronta ao Estado de Direito Democrático.”
Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF, segundo publicou a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, surpreendeu-se com a versão do general, com quem não deve ter trocado mais do que “uma palavra, um boa-noite”. A interlocutores, o ex-ministro disse: “Está me parecendo um certo delírio dele [do general] achar que todos os que o cumprimentaram rapidamente na festa prestaram algum tipo de solidariedade.” O ex-ministro Guilherme Afif Domingos também disse que apenas procurou ser “carinhoso” com o general, mas que seu gesto não teve motivação política ou de apoio a “esta ou aquela situação”.
Villas Bôas não quis comentar as negativas com a piauí. De modo que restam duas alternativas: ou o general, como diz Joaquim Barbosa, andou delirando – ou está saindo de moda aplaudi-lo e elogiá-lo publicamente.