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anais da política

Novo cargo, novo trampolim para Doria no Facebook

Depois de quase dois anos de queda, interações no perfil do tucano mais que dobram após a posse; movimento é atípico em relação a outros governadores

Luigi Mazza | 17 jan 2019_18h35
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Nas duas vezes em que João Doria assumiu um cargo no Executivo, sua página no Facebook decolou em popularidade logo em seguida. Após dois anos de declínio quase constante, o engajamento no perfil do político do PSDB na rede social voltou a crescer em 2 de janeiro, um dia depois de tomar posse como governador de São Paulo. Do início do ano para cá, em duas semanas, as interações em seu perfil mais que dobraram na comparação com o mês anterior – foram 330,4 mil reações, comentários e compartilhamentos, um volume 116% maior do que em dezembro inteiro. É um movimento atípico quando comparado com outros governadores eleitos, que cresceram continuamente na rede ao longo de 2018, ano de campanha e de maior exposição. No caso de Doria, a subida começou imediatamente depois de ele assumir um posto de comando na administração pública.

Não é a primeira vez que isso acontece. Em janeiro de 2017, assim que assumiu a Prefeitura de São Paulo, Doria multiplicou por vinte o alcance de seu perfil na rede social em apenas um mês. E teve um pico de popularidade até hoje não superado – e que foi seguido por uma queda vertiginosa. Num período de um ano, a página do político perdeu 94% de suas interações, como mostrou a piauí em março de 2018.

Com o recém-assumido cargo no Palácio dos Bandeirantes, o tucano voltou a crescer no Facebook: ganhou 5,7 mil novos seguidores em duas semanas. Ele reverte assim uma longa trajetória de queda: desde agosto de 2017, havia perdido um total de 121 mil usuários. A exceção foi em outubro do ano passado, mês da eleição, quando Doria – assim como a maioria dos outros governadores eleitos – ganhou seguidores. Os números foram compilados por meio da ferramenta CrowdTangle.

Uma retomada de crescimento como essa não tem paralelo entre os outros 27 governadores eleitos no país. Ao passo que Doria perdeu seguidores num ritmo constante em 2018 (foram 83 mil a menos em relação a 2017), seus pares mantiveram uma linha reta de crescimento ao longo do ano eleitoral. Foi assim com os quatro governadores mais populares no Facebook depois do tucano: Ronaldo Caiado, do DEM de Goiás, ganhou 3 mil seguidores ao longo do ano passado; Ratinho Junior, do PSD do Paraná, 87 mil; Paulo Câmara, do PSB de Pernambuco, 3,7 mil; e Camilo Santana, do PT do Ceará, 63 mil. A trajetória destes governadores no Facebook foi, em geral, estável em 2018. Doria foi o único cujo desempenhou só mudou depois da posse.

“O Doria tem um pico súbito em janeiro como ninguém. Só acontece com ele, e isso sugere compra de engajamento no início da administração”, afirmou o professor da USP e pesquisador de mídias sociais Pablo Ortellado. “Mas não quer dizer que seja ilegal.” Segundo ele, o governador pode estar usando tanto perfis falsos quanto perfis verdadeiros para inflar seu engajamento na rede.

A perda constante de seguidores, para Ortellado, é um indício do uso de contas falsas. “Se ele comprou perfis falsos, é possível que, em algum momento, o contrato com a empresa responsável tenha acabado e essas contas tenham sido retiradas da sua página.” O pesquisador ressalta que a rejeição a Doria causada por sua saída da Prefeitura de São Paulo, no início do ano passado, poderia justificar parte dessa queda, mas não explicaria números tão elevados. “É muito incomum que dezenas de milhares de usuários deixem de seguir uma página. Em geral, as pessoas seguem e depois esquecem que seguiram.”

Além do tucano, o único governador a ter perdido seguidores em 2018 foi Wellington Dias, do PT do Piauí. Em agosto, o político protagonizou o chamado #piauigate, quando sua campanha foi acusada por influenciadores digitais de pagar para divulgar mensagens positivas sobre ele nas redes – uma prática irregular, segundo a lei eleitoral. O declínio de Dias no Facebook foi menor: ele deixou de ser seguido por 1,5 mil usuários no ano passado (0,6% do total de seguidores), enquanto Doria perdeu quase 82 mil (3% do total).

Procurado pela piauí, o coordenador das mídias sociais de Doria, Daniel Braga, afirma que a queda do número de seguidores em 2018 se deve a desgastes naturais sofridos pelo governador. “Se pegarmos casos de nomeações que desagradaram a população enquanto ele era prefeito, ocorre a perda de seguidores. Quando ele agrada, há crescimento.” O mesmo aconteceu, segundo Braga, nos meses que antecederam a eleição. “Ninguém foi tão bombardeado quanto o Doria. A oposição bateu muito, viram que ele estava com força. Os blogs de esquerda falavam mais dele do que do Lula.”

O assessor nega que tenha havido compra de seguidores na página do governador. “É patético sugerir isso. O desempenho do Doria é 100% orgânico. Ele não foi eleito no primeiro turno em 2016 criando ‘fantasminha’”, afirmou Braga. Segundo ele, a campanha só impulsionou conteúdos durante um curto período de tempo, em setembro de 2018. “Compramos alcance, porque ficamos com medo de a concorrência fazer o mesmo. Foi um valor pequeno, mas vimos que não adianta. A rede dele funciona de forma orgânica.”

 

O desempenho de João Doria no Facebook é marcado por grandes oscilações. O tucano repete agora, em menor escala, o súbito crescimento de janeiro de 2017, quando iniciou o mandato como prefeito de São Paulo. À época, ele saltou de 289 mil para 7,9 milhões de interações no intervalo de um mês. O pico de popularidade foi seguido por um longo período de queda, interrompido apenas no mês das eleições, outubro, quando as interações do político pularam de 413 mil para 3,4 milhões na rede. Pouco tempo depois, em dezembro, elas despencariam novamente.

O gráfico de crescimento do perfil do tucano é repleto do que Ortellado chama de “escadas”: mudanças súbitas que não obedecem a uma linha clara de crescimento. “Normalmente, o crescimento de páginas como essa é constante ao longo do tempo. Quando ocorre de forma brusca, chama a atenção.” Segundo ele, explosões de crescimento como a de janeiro de 2017 só podem ser explicadas por fatos atípicos. “Isso só acontece quando uma pessoa muito desconhecida tem uma exposição gigantesca de forma pontual. O Doria foi eleito em outubro, e não em janeiro.”

Na explicação do assessor Daniel Braga, os picos de crescimento em janeiro – tanto em 2017 como em 2019 – acontecem porque, após a posse, os usuários passam a ter “maior interesse” em acompanhar a página do político. Ao se comunicar como governador e não mais como candidato, disse Braga, o tucano adquire “uma relevância maior”. Além disso, o novo impulso da página neste início de 2019 estaria associado ao volume maior de postagens, segundo o assessor. Em dezembro, foram 37 publicações no perfil de Doria, entre fotos, vídeos e lives; em janeiro, elas já somam 56. Essa mudança, segundo o assessor, se deve a um “reaquecimento” das pautas políticas depois da posse.

A publicação de maior repercussão feita pelo tucano em janeiro, porém, não tinha relação direta com o recém-iniciado governo. Trata-se de um post “frio”, um vídeo de 8 de janeiro em que o governador aparece na abertura de um evento em Barretos realizado pela Igreja Adventista do Sétimo Dia. Na legenda, ele agradece a receptividade do público. Até 16 de janeiro, o post acumulava 163 mil visualizações, 14,5 mil reações e 26 mil compartilhamentos.

O engajamento em postagens de pouca relevância é um indício de compra de perfis, segundo o pesquisador Ortellado. “Em geral, posts frios como esse não têm milhares de compartilhamentos, sequer centenas”, afirmou. “E perfis verdadeiros que possam ter sido comprados não compartilham informação desse tipo. São assuntos que não geram reação ou comoção.”

Segundo Braga, a afirmação não tem fundamento. “Em uma rede social tradicional, você vai botando conteúdo e peneirando. De repente, um ou outro post dá pico, é normal.” O assessor nega que o vídeo de Doria no evento da Igreja Adventista possa ser considerado um post “frio”. “Isso é quente. Algum grande influenciador da igreja pode ter estado lá. As pessoas compartilham entre elas na rede social e isso pega como rastilho de pólvora.”

As oscilações de Doria entre meados de 2017 e o início de 2019, de acordo com Braga se devem também à mudança do algoritmo usado pelo Facebook, que tem priorizado publicações patrocinadas. “Isso acaba diminuindo o alcance potencial de páginas como a nossa.” Entre as causas estaria também a migração crescente de público para o Instagram. Os picos de crescimento, por sua vez, para ele, teriam relação com a estratégia de redes do tucano. “Quantas vezes na vida você teve a chance de entrar na casa de um prefeito de São Paulo e descobrir como é a vida dele? O Doria fez isso pela primeira vez.”

Alguns dos posts de Doria em 2019 demonstram ter interações orgânicas. Das vinte primeiras publicações feitas em janeiro pelo ex-prefeito, dezessete trazem comentários críticos à indicação de Gilberto Kassab, do PSD, para a Secretaria da Casa Civil do governo paulista. O anúncio, feito pelo tucano em novembro, resultou na hashtag #ForaKassab. No dia 4 de janeiro, o novo secretário pediu licença do cargo para se defender de denúncias de recebimento de propina da J&F entre 2010 e 2016.

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