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    Ilustração: Carvall

anais do bolsonarismo

O agosto que levou à setembrada

A história da mobilização digital até o "tudo ou nada" de Bolsonaro no Sete de Setembro

Pedro Bruzzi e Leonardo Barchini | 06 set 2021_17h58
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Fotos mostrando a fraca adesão às manifestações em defesa do voto impresso, promovidas por bolsonaristas no dia 1 de agosto, ainda circulavam nas redes sociais quando, em 3 de agosto, a deputada Carla Zambelli começou a convocar os apoiadores do presidente Bolsonaro para a Avenida Paulista no dia 7 de setembro. 

(https://twitter.com/CarlaZambelli38/status/1422703575260614662).

A manifestação do início de agosto foi pequena, apesar de toda a mobilização de influenciadores bolsonaristas. Após protestos maiores da oposição, liderados pela esquerda, apoiadores do governo precisariam dar uma resposta à altura, com muita gente na rua, para tentar “estancar a sangria” e mostrar apoio popular, tendo em vista os sucessivos fracassos da gestão no campo da economia, em especial com o avanço da inflação. Nem mesmo o anúncio de um “novo” Bolsa Família, chamado de “Auxílio Brasil” e com 50% de reajuste, em 04 de agosto de 2021, deu trégua para o governo em termos de apoio popular. As pesquisas dos últimos meses mostram um derretimento de Bolsonaro. E a expectativa de que a economia dê ao menos um voo de galinha se mostra cada vez mais distante. Aí se deu a senha para um “tudo ou nada” eni Sete de Setembro.

E o bolsonarismo aprendeu direitinho como funciona o “tudo”. Aprendeu que mobilizações assim custam dinheiro e que o amor incondicional ao “Mito”, por parte de seus apoiadores, não enche protesto algum, seja em Brasília, seja em São Paulo. A tal da “mortadela” — crítica recorrente de bolsonaristas às manifestações da esquerda em que sindicatos se organizam para dar estrutura para participação de manifestantes — passou a ser utilizada abertamente também por apoiadores do governo. Dessa vez, contudo, os sindicatos que estão bancando os ônibus e uma “ajuda de custo” que supostamente encherão Brasília e São Paulo são predominantemente do mundo agro e patronais. (https://theintercept.com/2021/08/21/ruralistas-financiam-manifestacoes-golpistas-7-setembro/ – 14.230 interações no Facebook).

A movimentação para um grande ato no Dia da Independência começou a aparecer nas redes sociais no fim de julho. Bolsonaristas fizeram circular nas redes um vídeo em que Sérgio Reis dizia que não faria manifestações no Sete de Setembro para não atrapalhar o desfile, mas que ele, junto com caminhoneiros e empresários, estariam organizando movimentos para os dias 4, 5 e 6 de setembro, a fim de esquentar os motores para a data final. 

Jo Brasil da Silva ???? (@Jotinjas) tweetou: Eita lelê! Sérgio Reis movimentando caminhoneiros para o Congresso em Brasília. Apoiando @jairbolsonaro 

(https://twitter.com/Jotinjas/status/1420229790691381253?s=20)

Na primeira quinzena de agosto, o nome do cantor, sempre associado a caminhoneiros, seguiu em alta no agrupamento bolsonarista. Ele também foi se empolgando, até que passou do limite, declarando que iria “invadir, quebrar tudo e tirar os caras na marra”. As instituições reagiram, o STF abriu inquérito contra ele e inflamou os mais fanáticos nas redes. Daí pra frente, Sérgio Reis foi largado na banguela, e o plano inicialmente proposto foi por água abaixo, inclusive com o cancelamento do desfile militar.

De toda maneira, mesmo sem os tanques nas ruas, apoiadores do presidente mantiveram a intenção de ocupar a Avenida Paulista e a Esplanada dos Ministérios. Com o mote de “defesa da liberdade”, influenciadores deram o tom. Tentaram criar um léxico mais amigável, buscando aumentar a adesão aos atos — afinal, quem é contra a liberdade? Não é a primeira vez que Bolsonaro e seus seguidores fazem uso desse tipo de estratégia — “voto auditável” e tratamento precoce são exemplos recentes —, e novamente não deu certo. Continuaram falando sozinhos nas redes. 

No último fim de semana, foram 465 mil publicações no Twitter sobre o tema com o agrupamento bolsonarista (63%) registrando participação de diversos perfis influentes. A deputada Carla Zambelli continuou como destaque, mas também vale destacar o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o empresário Luciano Hang e o jornalista Alexandre Garcia. Ainda assim, não conseguiram alcance para além da base de apoiadores mais fiéis. De quebra, mais uma vez conseguiram aglutinar a oposição, com representantes do Psol, PT, MBL e diversos nomes da imprensa se apresentando juntos. 

GRAFO DE MENÇÕES SOBRE A MANIFESTAÇÃO DE 7 DE SETEMBRO NO TWITTER

Período: 04 e 05/09

Como em outros episódios, a coordenação vista no debate digital se destacou. Todos os perfis influentes se mostraram uníssonos e usando os mesmos argumentos. Dizem defender a nossa liberdade de um suposto golpe dado pelo STF. Ainda, buscam reforçar o caráter “antissistema”, fundamental a Bolsonaro em 2018 e caro até hoje — o presidente sequer tem partido político. 

(https://twitter.com/AdrillesRJorge/status/1430228950064771085)

O volume de posts sobre o tema impressiona. No Twitter, foram 3,14 milhões de publicações sobre a manifestação entre 1 de agosto e 5 de setembro de 2021, geradas por 398 mil perfis distintos, incluindo a oposição. Não é irrelevante e foi capaz de, mais uma vez, trazer uma pauta bolsonarista em destaque, evitando assuntos espinhosos e negativos ao governo. A título de comparação, dados da Arquimedes mostram que a manifestação bolsonarista de 15 de maio gerou 198 mil postagens, incluindo aquelas do dia do evento. 

Enquanto o governo se esforça para conseguir uma boa foto da Avenida Paulista para os influenciadores postarem nos seus perfis no Instagram, a realidade se impõe. A expectativa de que a economia se recuperaria findadas as restrições decorrentes da pandemia deram lugar a aumento de preços de combustíveis e alimentos. O desemprego segue sem perspectiva de melhora, e Paulo Guedes vale cada vez menos até mesmo na Faria Lima — vide os comentários nada elogiosos ao seu nome no evento da XP.

(https://www.instagram.com/p/CS9OtHQLONE/?utm_medium=copy_link

Independentemente do sucesso ou fracasso da manifestação, que será medida pela imprensa e pelas redes de acordo com a quantidade de gente que for à Paulista ou à Esplanada, há que se observar dois fatores que talvez reduzam a importância da “Setembrada Bolsonarista”. 

O primeiro é que, nas redes, não há adesão de outros agrupamentos à tese bolsonarista de que é necessário “defender a liberdade”. Isto é, fora dos seguidores do Mito não houve uma mobilização que tivesse ampliado, até agora, o cluster (cada vez mais isolado) de apoio ao governo.

Por último, é sintomático que a postagem de maior alcance do deputado André Janones (AVANTE-MG) no Facebook — território ainda dominado por bolsonaristas no debate político — dos últimos sete dias tenha superado qualquer outra postagem de Bolsonaro ou de bolsonaristas. O deputado mineiro obteve 278 mil compartilhamentos no dia 31 de agosto falando de Bolsa Família, Auxílio Emergencial e do novo aumento da energia elétrica. No mesmo dia, Bolsonaro em suas redes mostrava vídeo de sua visita à Uberlândia, obtendo 89 mil compartilhamentos. 

O problema da estratégia “tudo ou nada” de Bolsonaro para o Sete de Setembro, quando provavelmente mostrará força, tendo em vista que mantém o patamar de 25% de apoio popular, é que haverá o 8 de setembro. Depois teremos o 9 de setembro. E assim sucessivamente. O arroz não vai baixar de preço na gôndola. A gasolina manterá sua trajetória de alta na bomba. E o povo vai voltar a se preocupar mais com as postagens do Janones do que com as do Jair. 

(https://www.facebook.com/239872239397663/posts/649767706004403)

(https://www.facebook.com/211857482296579/posts/2550385145110456)

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