Poucas figuras do passado tiveram a honra de batizar termos correntes no vocabulário de várias línguas. O marquês de Sade, que viveu no século XVIII e deu origem ao termo e o escritor alemão do século XIX Sacher-Masoch, a partir da obra do qual se cunhou a expressão masoquismo.
Um aventureiro famoso do século XVIII também influenciou o vocabulário ao criar a teoria do magnetismo animal e aperfeiçoar um tipo de hipnotismo que o tornou célebre em toda a Europa no final do século. Foi o alemão Franz Anton Mesmer o autor da façanha, tido já em seu tempo por charlatão por muitos e gênio por alguns. A palavra mesmerizar no sentido de fascinar ou magnetizar é hoje usada em português e especialmente no inglês , onde mesmerize é um termo corriqueiro, com o mesmo sentido.
Não se pode negar a imensa influência que Mesmer teve em seu tempo, quando impressionou muitas mentes científicas, a ponto de o rei Luis XVI, quatro anos antes da queda da Bastilha, ter convocado uma comissão de notáveis que incluía entre seus membros o famoso físico e político americano Benjamin Franklin e o grande químico francês Lavoisier, para julgar a validade das teorias de Mesmer.
O alemão cercava-se, de fato, de muitos mistérios e exigia dos iniciados em sua ciência que mantivessem um segredo absoluto em torno de seus métodos. Algumas curas notáveis parecem, porém, terem sido constatadas e a teoria do magnetismo animal, que considerava que uma energia poderia passar de organismos vivos para objetos inertes, fascinou boa parte do mundo culto durante pelo menos uma década.
A carta reproduzida aqui é escrita em 1784, no auge da carreira de Mesmer, pouco antes de o rei nomear a comissão para investigá-lo. Mesmer a escreve num tom tenso a um de seus ricos alunos, que resolvera deixar o seu curso, o que naturalmente causava-lhe um grande prejuízo e ameaçava-o com um detrator a mais. Mesmer faz questão de deixar claro ao ex-discípulo seu compromisso de confidencialidade:
“Acabo de saber que renunciou a fazer parte dos meus alunos. Sua instrução não tendo terminado, o senhor Kormann está encarregado de lhe devolver, contra seu recibo, a quantia de 2400 libras, preço de sua matrícula." (Essa era uma quantia enorme para a época que permitia inclusive a aquisição de uma casa.) "Não preciso lhe lembrar o seu compromisso, e não duvido que o cumprirá, qualquer que seja sua opinião sobre minha doutrina, de manter a lei de silêncio mais absoluto sobre os princípios que a constituem e sobre os processos que dela resultam”.
Consciente das imensas fraquezas de suas experimentações e das falhas de sua teoria, Mesmer procurava proteger-se ao máximo das intrusões de verdadeiros espíritos científicos, e postergar o quanto possível o momento de ser desmascarado, como sabia ser inevitável. De fato, a comissão nomeada pelo rei para julgar sua doutrina não a considerou com base científica. Aceita-se hoje que, ao suscitar discussões sobre a possibilidade da hipnose, Mesmer teve ao menos o mérito de estimular uma discussão pioneira sobre certos mecanismos do cérebro.
As cartas de Mesmer são extremamente raras e esta, adquirida por um colecionador francês por volta de 1850, ficou esquecida por mais de 150 anos nas gavetas de seus descendentes. Ressurgiu recentemente em leilão e foi disputada com ardor por colecionadores de manuscritos cientificos.