A lógica é simples: para evitar o consumo de substância entorpecente, promulga-se uma lei para proibi-la. O interesse em consumir não desaparece com uma canetada, e vender ilegalmente torna-se perigoso e lucrativo na mesma medida. Para reprimir o comércio ilegal, a saída é combater à mão armada os vendedores, também (e cada vez mais) armados. Não deu certo nos Estados Unidos com a Lei Seca de 1920 — e, para muitos especialistas em segurança, também não funciona no Brasil de cem anos depois. Para discutir o peso orçamentário da execução da Lei de Drogas nos cofres públicos dos estados brasileiros e debater alternativas, o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), da Universidade Cândido Mendes (Ucam), lança a primeira etapa do projeto “Drogas: quanto custa proibir”. Intitulado “Um tiro no pé: Impactos da Proibição das Drogas no Orçamento do Sistema de Justiça Criminal do Rio de Janeiro e São Paulo”, o estudo detalha o quanto os dois estados gastaram em 2017 com a chamada “guerra às drogas”. Confira no =igualdades.
Juntos, Rio de Janeiro e São Paulo gastaram R$ 5,2 bilhões na guerra às drogas em 2017. O valor empregado pelos dois estados seria suficiente para manter uma renda básica de R$ 600 mensais para quase um milhão de famílias mais pobres durante um ano. O R$ 1 bilhão empregado pelo governo fluminense poderia bancar o auxílio para 145 mil lares, enquanto os R$ 4,2 bilhões do governo paulista seriam suficientes para apoiar 583 mil beneficiários.
O R$ 1 bilhão empregado pelo governo fluminense em 2017 na guerra às drogas permitiria comprar 36 milhões de doses da vacina da AstraZeneca contra a Covid-19. Já os 4,2 bilhões aplicados pelo governo paulista são suficientes para adquirir 72 milhões de doses da CoronaVac. Isso corresponde à imunização de 54 milhões de pessoas, o que representa 85% da soma das populações dos dois estados, estimada em 63,6 milhões em 2020.
Em 2017, o governo fluminense aplicou R$ 1 bilhão na guerra às drogas. O Hospital Estadual Getúlio Vargas, referência em emergência no Rio, funciona com um quarto desse valor. O orçamento da unidade orbita em torno de R$ 229 milhões.
O governo fluminense gastou R$ 1 bilhão com a guerra às drogas em 2017. A quantia equivale a um ano de aluguel social para 156 mil famílias. O cálculo considera o valor de R$ 560,43, o equivalente de R$ 500 mensais atualizado para valores constantes de novembro de 2020. Naquele ano, o programa de assistência à moradia para famílias de baixa renda do Rio pagava de R$ 400 a R$ 500 por mês.
O governo paulista gastou R$ 4,2 bilhões com guerra às drogas em 2017. No mesmo ano, o custo médio anual de um aluno de ensino médio da rede pública do estado era de R$ 5 mil. Ou seja: o valor empregado na aplicação da Lei de Drogas seria suficiente para bancar o ensino anual de 840 mil secundaristas.
Em 2018, São Paulo estimava em R$ 9,1 milhões o valor necessário para erguer uma unidade de ensino por meio do Programa Creche Escola. No ano anterior, o estado gastou R$ 4,2 bilhões com a guerra às drogas, o suficiente para construir 462 escolas.
Em 2017, o governo do Rio investiu R$ 32,8 mil em cada um dos estudantes da Uerj. O R$ 1 bilhão empregado na guerra às drogas financiaria um ano da educação de 32 mil alunos, o que quase dobraria o total de matriculados que a universidade tinha naquele momento (36.402). Já o custo médio de um aluno da USP foi de R$ 97,6 mil naquele ano. Os R$ 4,2 bilhões aplicados pelos paulistas na guerra às drogas poderiam custear a educação de 43 mil universitários, um aumento de 70% em relação ao que a USP tinha àquela altura (62.547).