Daqui a dez meses, a carta oficial reproduzida nesta página, escrita em 25 de agosto de 1514, completa quinhentos anos.
O papel está tão branco e consistente quanto na época em que a carta foi escrita. Foi fabricado com trapos, e não a partir de polpa de madeira, como se faz hoje. Com isso, esta folha estará inteira daqui a mil anos quando todos os papéis que usamos hoje tiverem virado pó.
A carta é dirigida pelo rei da Inglaterra ao rei da França. Dois monarcas intimamente ligados pela história, a tal ponto que a língua usada na carta pelo rei inglês é o francês, que falavam seus antepassados e que fala seu destinatário.
O rei da Inglaterra é ninguém menos que Henrique VIII, hoje famoso por suas seis mulheres, (e pela série de televisão ) um dos monarcas mais importantes da história inglesa, que criou nada menos que uma fé própria para seu país, a Religião Anglicana.
Ao querer divorciar-se de sua primeira mulher, irmã do rei da Espanha, Henrique VIII enfrentou a decidida oposição do Papa. A solução foi afastar-se da Igreja Católica e criar uma nova religião.
Mas tudo isso só aconteceria muitos anos após esta carta.
Quando a escreve para elogiar um embaixador francês que desempenhara seu trabalho com competência, Henrique é um jovem rei ainda esbelto de 25 anos, muito longe da imagem do monarca obeso que ficou em todas as memórias.
A carta leva o selo com as armas da Inglaterra e foi ditada a um secretário, mas o rei escreve de próprio punho a saudação final: “Seu muito leal irmão, primo e bom compadre, Henrique”.
No momento desta carta Henrique VIII acabara de assinar um Tratado de Paz com o rei Luís XII da França, a quem prometera em casamento sua própria irmã, Mary. Um mês depois da carta Mary chegava a Paris para casar-se com o rei. Quatro meses mais tarde, estava viúva.
Frente da carta | clique na imagem para ampliá-la
Verso da carta
As cartas originais trocadas entre monarcas europeus dessa época são muito raras, pois a maior parte permanece nos arquivos dos países respectivos.
Esta tem uma história curiosa. Não chegou a ser entregue ao rei Luís XII, pois este morreu antes que seu portador, o presidente do parlamento de Rouen, Jean de Selve, tornasse à França, e pudesse entregá-la.
A carta ficou junto aos papéis do magistrado após sua morte. Num caso raríssimo, seu arquivo permaneceu quinhentos anos na mesma família, até os documentos serem dispersados no ano passado, num leilão em Paris, quando esta carta foi redescoberta.