“O maior poeta dramático do Brasil”, nas palavras de Manuel Bandeira, Nelson Rodrigues continua reverenciado hoje como o mais influente autor teatral brasileiro do século XX
O documento reproduzido nesta página é o último passaporte emitido em seu nome, em abril de 1970, quando o dramaturgo tinha 57 anos. É possível que planejasse alguma viagem à Copa do Mundo de 1970, que ocorreu no México dois meses após a emissão do documento, mas sua saúde já começava a declinar nessa época. Isso talvez explique porque o passaporte deixou de ser usado ou renovado nos dez anos que Nelson ainda teve de vida, e permaneceu virgem de qualquer carimbo de país estrangeiro.
O passaporte vem apenas com o carimbo (então presente em todos os passaportes brasileiros) dizendo que era “Válido para as América do Sul, Central, Norte, Europa, Ásia, África e Oceania” e, sobretudo, “Não é válido para Cuba”.
Nelson é qualificado como “escritor”, “casado”, nascido em “Pernambuco”, com “rosto oval”, cor dos olhos “castanhos” e cabelo também “castanho”. A menção “casado” era apenas formal, pois estava separado de sua mulher, Elza Bretanha, havia quatro anos, mas não se divorciara (e voltaria a viver com ela os últimos três anos de sua vida).
A história da sobrevivência deste passaporte está ligada a de um grupo de papéis e fotografias de Nelson Rodrigues encontrado no lixo por um catador de papel em 2001, e logo revendido a um comerciante de itens de colecionismo, que o quis oferecer em leilão no Rio de Janeiro.
A família inicialmente se opôs, ainda que reconhecendo que os objetos haviam de fato sido jogados “por engano” no lixo por uma parente… Os filhos disseram aceitar a venda das fotos, mas não dos documentos. O processo não foi adiante e o detentor dos papéis revendeu mais tarde este passaporte para um colecionador carioca.
Na verdade, a família tinha, e tem, preocupações maiores que a de tentar recuperar velhos papéis: o espólio de Nelson Rodrigues arrasta-se há mais de trinta anos. Sua viúva, Elza Bretanha Rodrigues, tem hoje 96 anos e disputa o patrimônio e os direitos autorais com quatro filhos de Nelson, nascidos de relações com duas outras mulheres.