A fragmentação da política brasileira nesta pré-campanha eleitoral extrapolou o ambiente dos partidos e chegou à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp, um dos mais ricos sindicatos patronais do país. Nesta semana, um fato inédito se deu na Avenida Paulista, a mesma que tantas vezes abrigou o pato inflável manifestante. Três dos principais dirigentes deixaram a cúpula da entidade, cada um com um destino partidário diferente. O presidente Paulo Skaf, sob cuja gestão ascendeu o pato, deixou o comando para ser o candidato do MDB ao governo do estado de São Paulo. O dono da Companhia Siderúrgica Nacional e primeiro vice-presidente da federação, Benjamin Steinbruch, se colocou à disposição do PP para uma possível aliança com o presidenciável Ciro Gomes, do PDT. E Josué Gomes da Silva, vice-presidente, dono da Coteminas e filiado ao PR, também saiu da entidade para ser candidato em uma aliança em chapa majoritária.
A saída do presidente e dos dois vices reforça, na visão de alguns empresários ligados à entidade, o perfil eleitoreiro que hoje se instalou na Fiesp. O caminho de cada um dos dirigentes nestas eleições, no entanto, só será definido com segurança a partir das convenções partidárias do fim de julho, quando serão oficializados os candidatos. Até lá, o ambiente será de especulações e de negociações para formação de alianças. O cenário atual, no entanto, mostra que pelo menos um racha na Fiesp é evidente: o de Paulo Skaf e Benjamin Steinbruch, dono da siderúrgica CSN.
O primeiro atrito, segundo uma fonte próxima de Skaf, foi quando Steinbruch se filiou ao PP, em abril. A relação se deteriorou mais ainda a partir da notícia de que Steinbruch está cotado a vice na chapa de Ciro Gomes – que tem repudiado, com declarações assertivas, qualquer aliança com o MDB. O dono da CSN, no entanto, tem tido há tempos uma atuação discreta na Fiesp, desde que sua empresa começou a passar por problemas financeiros e por dificuldades para reduzir sua dívida. A relação com Skaf teria começado a azedar dois anos antes, em 2016, quando o presidente da Fiesp, na avaliação de Steinbruch, não se empenhou suficientemente com o governo Temer para ajudar a Transnordestina, empresa de ferrovias que pertence ao dono da CSN e que já teve Ciro Gomes no comando.
O clima pesou ainda mais nesta semana, quando Steinbruch insinuou em sua carta de desligamento que a sucessão de Skaf não teria sido acertada com ele, que era o primeiro vice-presidente. Na terça-feira – antes, portanto, de Steinbruch oficializar sua saída –, a imprensa já noticiava que o segundo vice-presidente, José Roriz Coelho, seria o novo presidente, o que de fato aconteceu.
Roriz chegou à Fiesp junto com Skaf, em 2004. Dois anos depois, tornou-se vice-presidente e ocupou, ao mesmo tempo, a diretoria de competitividade, tecnologia e economia. Por trinta anos, foi presidente de empresas ligadas ao setor petroquímico, de óleo e gás, de transformação plástica e de meio ambiente. Atualmente estava como presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico e do sindicato do setor. Alguns empresários acreditam que Roriz não deve ter atuação relevante no período que ficar à frente da Fiesp e criticam seu desempenho à frente do departamento de competitividade. “A indústria só perdeu competitividade nos últimos anos, e os departamentos da Fiesp viraram lugar de convescote de relacionamento, não para se discutir ideias”, disse o representante de uma associação ligada à Fiesp.
O novo presidente da federação assume o cargo apenas por quatro meses, até o fim das eleições. Depois disso, Skaf deve assumir novamente. Se for eleito governador, terá que deixar o cargo em definitivo. Ele afirma que sua única opção é ser candidato ao governo do estado, mas existe ainda a possibilidade de se lançar ao Senado. Como senador, não precisaria deixar o cargo de presidente da Fiesp.
Ao deixar a federação, Skaf deixou os seus cuidando da casa. Além de Roriz na presidência da entidade, indicou interinamente para seu lugar na presidência do conselho do Sebrae-SP Tirso Meirelles, vice-presidente da Federação de Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo.
Na base dos sindicatos filiados à Fiesp, que assistem de longe a disputa de poder, cresce um descontentamento com a forma como a federação tem atuado, privilegiando um discurso mais eleitoreiro do que de apoio efetivo à indústria, na visão de alguns industriais. Há quem diga que, com a partidarização da entidade, a Fiesp virou nos últimos dez anos uma espécie de “mini-República”. O presidente precisa administrar os interesses de 123 sindicatos, dando cargos, visibilidade, ficando refém de politicagens para garantir apoio nas eleições internas. Skaf já se reelegeu duas vezes, a última no ano passado, e tem mandato até 2021. A crítica é de que para atender a demandas de sindicatos grandes e importantes, que conseguem reunir maior número de votos, a Fiesp adota discursos que vão contra a maior parte da indústria.
Além disso, as críticas também são a de que Skaf usa o sistema Fiesp para alcançar suas ambições políticas. Desta forma, teria feito campanha para a aprovação da medida provisória do setor elétrico, ainda no governo Dilma, que baixava o preço da luz para toda a população, mas não chegava à indústria. Ou quando lançou o pato, símbolo da reivindicação de redução de impostos, mas usado politicamente durante o processo de impeachment da ex-presidente, que foi sucedida por Michel Temer, do mesmo partido de Skaf.
Uma das críticas mais recentes de alguns industriais foi quanto à demora da federação em questionar o tabelamento do frete que foi usado para acabar com a greve dos caminhoneiros. No início da semana, a Confederação Nacional da Agricultura se posicionou contra a tabela, que afeta diretamente as empresas que dependem do transporte de cargas. A Fiesp só fez isso de maneira mais efetiva na quinta, quando já estava sob o comando de Roriz, e quando o próprio governo federal já dava sinais de que voltaria atrás no uso do dispositivo. Hoje, durante sabatina do Uol, Skaf como pré-candidato criticou o tabelamento do frete e também defendeu o sucesso do seu pato, que segundo ele atingiu o objetivo de baixar impostos.
Paulo Skaf já está em sua terceira eleição, todas elas depois de ter assumido a Fiesp. A primeira delas foi em 2010 quando conseguiu pouco mais de um milhão de votos e não chegou nem ao segundo turno. Em 2014, ele ficou em segundo lugar, com 4,5 milhões de votos. Skaf atribui o bom resultado ao quanto foi ficando conhecido. Agora está com 15% das intenções de voto ao governo do estado, atrás do candidato João Doria, do PSDB, que tem 22%, segundo pesquisa Ibope.
Desde que assumiu, a cada eleição Skaf deixou a instituição sob comando de terceiros para se dedicar a seu próprio projeto político, e aos poucos foi desmobilizando o protagonismo da federação. Em 2010, por causa desta ausência, a Fiesp deixou de realizar seu histórico debate entre presidenciáveis. Alguns industriais dizem que desde Mario Amato (presidente entre 1986 e 1992), a Fiesp foi perdendo relevância no debate político. Foi de Amato a célebre frase de que se Lula se elegesse em 1989, ano das primeiras eleições diretas pós-ditadura, 800 mil empresários deixariam o país. Mais tarde, o industrial reconheceu o exagero. Na época, a indústria representava 35% do PIB. Hoje não chega a 15%.