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citações do foro

O tarifaço e a jogatina

11jul2025_10h24

Semanalmente, os apresentadores mencionam as principais leituras que fundamentaram suas análises. Confira:

 

 

 

 

 

Conteúdos citados neste episódio:

 

‘A república do tigrinho’, reportagem de João Batista Jr. para a piauí.

 

 

‘Programa de Proteção ao Ditador de Trump’, texto de Paul Krugman, vencedor do Nobel de Economia.

 

 

 

 

 

 

TRANSCRIÇÃO DE ÁUDIO:

 

 

 

 

 

 

Sonora: Rádio Piauí.

 

 

 

Fernando de Barros e Silva: Olá, sejam muito bem vindos ao Foro de Teresina, o podcast de política da Revista Piauí.

 

Sonora: Ele tem que respeitar a justiça brasileira, como eu respeito a americana. Se o que o Trump fez no Capitólio, ele tivesse feito aqui no Brasil, ele estaria sendo processado como Bolsonaro. E arriscado a ser preso.

 

Fernando de Barros e Silva: Eu, Fernando de Barros e Silva, da minha casa em São Paulo, tenho a alegria de conversar com os meus amigos Celso Rocha de Barros e Ana Clara Costa, no Estúdio Rastro, no Rio de Janeiro. Olá Ana, bem-vinda!

 

 

 

Ana Clara Costa: Oi, Fernando! Oi, pessoal!

 

Sonora: A partir de 1° de agosto, empresas brasileiras que desejarem acessar o maior mercado consumidor do planeta estarão sujeitas ao que se pode chamar de Tarifa Moraes.

 

Fernando de Barros e Silva: Diga lá, Celso Casca de Bala.

 

 

Celso Rocha de Barros: Fala aí, Fernando! Estamos aí mais uma sexta feira.

 

Sonora: O Cássio é um amigo meu de mais de dez anos atrás, lá do Piauí, de comer panelada, buchada de bode e galinha caipira.

 

Fernando de Barros e Silva: Mais uma sexta feira e hoje teremos a participação do nosso querido João Batista Jr., repórter da piauí que está na Agência de Podcast aqui em São Paulo. O João vai estar com a gente no terceiro bloco do programa. Bem-vindo, João! Você já é da casa.

 

 

João Batista Jr: Obrigado pelo convite para mais uma vez estar aqui falando com vocês a respeito do assunto que a gente tanto gosta: bets.

 

Fernando de Barros e Silva: Bem-vindo! Vamos aos assuntos da semana. Prepotência, desleixo e esculhambação se misturam na carta mal ajambrada que Donald Trump enviou ao presidente Lula para avisar que todos os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos serão taxados em 50% a partir de 1° de agosto. Prepotência porque o presidente norte-americano afronta de forma inédita a soberania brasileira. Desleixo porque o documento que ele assina está repleto de mentiras e esculhambação porque Trump age deliberadamente para avacalhar a institucionalidade democrática em nome de seus delírios obscurantistas. Coisa de mafiosos, disse em editorial o insuspeito Estadão. Trump impõe tarifas comerciais absurdas ao Brasil para constranger o país a se render a exigências descabidas e ultrajantes. Diz primeiro, que o julgamento de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado não deveria estar acontecendo e deveria terminar imediatamente. É um golpista defendendo outro. É disso que se trata. E aqui o Brasil até agora tem lições a dar à combalida democracia dos Estados Unidos. Trump alega a seguir que as empresas americanas que administram as redes sociais estariam sendo censuradas pelo Supremo Tribunal Federal. E aqui faz eco a ladainha dos bolsonaristas e aos interesses das big techs que não querem ser responsabilizadas por aquilo que publicam, como se vivessem num mundo à parte, livre de regras e obrigações. Trump, por fim, mente ao afirmar que o Brasil vem causando déficits comerciais insustentáveis contra os Estados Unidos. O que ocorre é exatamente o contrário. Ao longo dos últimos 15 anos, o superavit dos Estados Unidos com o Brasil foi da ordem de 410 bilhões de dólares. Ficou claro que esse trecho da carta foi copiado de documentos semelhantes enviados a outros países com os quais os Estados Unidos têm de fato déficit. É coisa de gente amadora e desqualificada. Lula reagiu à guerra tarifária devolvendo a carta à embaixada americana, fez muito bem. Disse também que o Brasil irá recorrer à lei da reciprocidade. Em nota no Twitter, presidente brasileiro afirmou que o Brasil é um país soberano, com instituições independentes e que não aceitará ser tutelado por ninguém. Disse ainda que o processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de Estado é de competência apenas da Justiça brasileira e não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais. Finalmente, Lula afirmou que, no contexto das plataformas digitais, a sociedade brasileira rejeita conteúdos de ódio, racismo, pornografia infantil, golpes, fraudes, discursos contra os direitos humanos e a liberdade democrática que para operar no nosso país, todas as empresas nacionais estrangeiras estão submetidas à legislação brasileira. São falas sensatas que demarcam o terreno. Dias antes de sua carta infame, Trump havia dito que os países alinhados a políticas anti-americanas dos BRICS sofreriam sobretaxas de 10% nas exportações para os Estados Unidos. Era um recado à cúpula do bloco realizada no Rio de Janeiro entre os dias 4 e 7 desse mês e uma demonstração de desconforto com o avanço na articulação internacional liderada pela China e pelo Brasil. O BRICS, que agora tem 11 países, representa cerca de 40% do PIB global. Boa parte dele, a maior parte dele, é da China obviamente. A gente vai dedicar os dois primeiros blocos do programa. Esse imbróglio, que não é apenas comercial. Vamos tratar dos aspectos econômicos primeiro, dos impactos mais prováveis e do alcance da investida de Trump contra o Brasil. O dólar subiu e as ações de empresas brasileiras, como a Embraer caíram. No segundo bloco, a gente vai falar de política. Nas redes sociais, o governo lançou um slogan eficaz “Lula quer taxar os super ricos, Bolsonaro quer taxar o Brasil”. E Tarcísio de Freitas, o governador de São Paulo, soltou uma nota culpando Lula sem nenhuma crítica ao presidente dos Estados Unidos. É uma estratégia e é mais uma rendição ao bolsonarismo. Por fim, no terceiro bloco, a gente recebe o João Batista para falar sobre a nova reportagem na piauí deste mês a respeito do submundo das apostas esportivas. Após sete meses de CPI e nenhuma consequência efetiva, o João nos mostra como o setor se tornou um terreno fértil para lavagem de dinheiro, financiamento de campanhas e acordos entre políticos, juízes, artistas e bicheiros, todos jogando no mesmo time. A reportagem revela os bastidores da CPI das Bets, a queda do relatório final e os nomes que escaparam ilesos, apesar de todas as evidências. É um retrato desolador de como Brasília entrou na jogatina. É isso. Vem com a gente!

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bem, Celso. Vamos começar com você. Vamos começar pela tarifa propriamente. Tratar dos aspectos econômicos. Faz um resumo para a gente do que você apurou, ouviu e está pensando.

 

 

Celso Rocha de Barros: Então, Fernando, eu acho que esse episódio confirmou o que o Ian Bremmer da consultoria Eurasia, que não é um cara de esquerda nem nada disso, já vinha dizendo que os Estados Unidos se tornaram a principal fonte de incerteza geopolítica do mundo desde que o Trump ganhou a eleição. Os Estados Unidos é basicamente é um bêbado, entendeu? Quebrando tudo pelo seu caminho. A carta do Trump é a pior violação da soberania brasileira na história republicana. Assim, se você for para a época do Brasil Império, vai ter coisa pior, mas só ali. Porque basicamente assim os Estados têm o direito de fixar suas tarifas, inclusive de fazer besteira, fixando suas tarifas. As tarifas são problemas deles. Mas você acrescentar na carta uma interferência no Judiciário brasileiro e uma interferência na democracia brasileira… Isso é gravíssimo. Isso é altamente ofensivo. É uma violação dos princípios mais elementares de diplomacia. Isso é um negócio, assim que realmente o pessoal de relações internacionais e diplomacia, quando viu aquilo, ficou absolutamente chocado. Porque uma coisa é o Trump lá na rede social dele, falar aquelas coisas sobre Bolsonaro. Já é ruim, mas enfim, mas é uma coisa. Outra coisa é você meter uma tarifa de 50% num país aliado porque você quer salvar o seu candidato a ditador de estimação ou enfim, já vamos falar sobre as motivações do negócio. Agora, o tamanho disso é gigantesco e inclusive na imprensa internacional vocês veem que foi comum no dia de hoje sair uma matéria sobre as tarifas em geral e uma matéria sobre o Brasil, porque o caso do Brasil foi totalmente destoante do caso dos outros países. E aí fica a questão por que o Trump fez isso? Porque no domingo de noite o que se ouvia, é que não sei se todo mundo estava acompanhando isso, o Trump tinha anunciado aquelas tarifas despirocada dele lá com aquelas alíquotas que, enfim, perguntou pro chat GPT como é que ia fazer… Mas aí depois ele suspendeu por 60 dias.

 

Ana Clara Costa: Ele anunciou em abril. Exato. E a bolsa derreteu, O dólar caiu e.

 

Celso Rocha de Barros: Foi um desastre completo.

 

 

Ana Clara Costa: Ele ficou receoso e voltou um pouco atrás.

 

Celso Rocha de Barros: Então, aí ele suspendeu e disse “vamos negociar no prazo de 90 dias”. Então, esses 90 dias estão acabando. Então, agora ele está soltando aí as tarifas que ele disse que ia soltar. Ele inclusive falou um negócio completamente louco que ele disse “não, a gente tá conseguindo vários acordos” e ele tá dizendo que as cartas são acordos, entendeu? Então, como passar essa carta para o Brasil, por exemplo fosse fazer um acordo comercial com o Brasil. Não faz o menor sentido. .

 

Ana Clara Costa: Me obedece aí que a gente tem um acordo.

 

 

Celso Rocha de Barros: E teve muito pouco acordo desde que ele propôs o negócio. Porque, cara, acordo comercial é complicadíssimo de negociar, claro. Então, a ideia de que em 90 dias existem países soberanos vão chegar lá e fazer o que ele quisesse. Enfim, era uma alucinação do cara. Então assim, agora tá acabando esse prazo de suspensão, começaram a sair as tarifas. O Brasil ia receber tarifa como todo mundo, o que ninguém esperava que fosse 50%. É muito maior do que a dos outros países. Então foi realmente um escândalo. Então, vamos decompor aqui os fatores que levaram o tempo a fazer isso. O primeiro é: ele está jogando tarifa em todo mundo. Ele meteu uma tarifa de mais de 20% na Coréia do Sul, que é um país com quem os Estados Unidos tem acordo de livre comércio. A tarifa é zero lá. Não tem como a Coreia do Sul diminuir a tarifa para os Estados Unidos. Então, está ficando claro que o que ele está fazendo não é tentar jogar o jogo da tarifa no cenário de economia internacional. Ele está de fato forçando um aumento de preço de produtos estrangeiros, porque a economia americana não é mais capaz de competir com ele. Então, enfim, é uma parte de 50% é algo que já vinha para a gente mesmo, porque veio para todo mundo, entendeu? Vai ter para Israel, por exemplo, que é um país fortemente aliado dos Estados Unidos. Bom, o segundo aspecto que chamou muita atenção foi o fato de isso acontecer depois da reunião dos BRICS, o Trump veio a público protestar contra as declarações dos dirigentes dos BRICS e o Brasil é o país mais fraco dos quatro fundadores. Se ele meter uma sanção dessas na China, é mais custoso. E ele já estava botando mesmo. A Rússia, ele tá lá naquela valsa ali com o Putin. Então o Brasil teria sido o cara que apanhou pelo BRICS. Isso aí pode ser parte da história sim, mas aí a gente tem que explicar direitinho qual é o problema. Em tese, o que ele tá com raiva dos BRICS é pela ideia de criar ou uma moeda internacional ou um sistema de pagamentos alternativos ao sistema de pagamentos do dólar. Agora, os BRICS já estão falando disso há muito tempo e não tem a menor importância, porque isso você não faz com uma decisão política. Não adianta o Brasil ou a China chegar e dizer agora a moeda de reserva internacional é a minha. O que é preciso é que o mercado internacional acredite que a sua moeda é suficientemente estável para ser o padrão internacional. Os Estados Unidos construiu o dólar como moeda de reserva por mais de um século em que o dólar se comportou de maneira previsível. Não houve grande barbeiragem de política econômica. Os vários partidos no poder concordavam em não mexer muito com o dólar. O Banco Central era independente. Então é por isso que o dólar é uma moeda de reserva nacional, não é só porque os Estados Unidos é um mercado gigante. A China, por exemplo, não tem a menor condição de fazer isso no momento, porque a China manipula o seu câmbio, o que é direito dela também, entendeu? Mas se você faz isso, você não vai botar suas reservas internacionais na moeda de um cara que amanhã, se tiver uma inflação mais alta, uma crise comercial, vai desvalorizar aquilo 30%, entendeu? As suas reservas internacionais caem 30%. Então, assim, não tem a menor condição de ninguém do BRICS fazer isso no momento. Então, a princípio, seria só uma declaração de princípios para o futuro. A gente tem que andar em direção a isso, né? Não teria porque os Estados Unidos retaliar em absoluto. Só que tem um problema, o dólar está perdendo credibilidade por causa do Trump. Sim, esse ano foi o maior queda do dólar no mercado internacional nos últimos 50 anos, porque o Trump avacalhou a reputação do dólar. Porque os Estados Unidos deixou de ser um país que não interessa quem ganhe a eleição vai ter uma gestão macroeconômica mais ou menos padrão, deixou de ser um país economicamente previsível. O valor do dólar deixou de ser previsível. O Trump está ameaçando o papel do dólar como moeda de reserva internacional. E aí ele vai para cima dos BRICS primeiro, para ter algum bode expiatório para jogar a culpa caso o dólar despiroque de vez. E em segundo lugar, porque aí ele começa a ter medo… Os BRICS não são capazes de fazer isso sozinho, mas se o Trump afundar demais o dólar, de repente uma União Europeia, uma coisa dessas, conversar sobre o novo sistema de pagamento ou até uma moeda internacional. Então ele está meio em pânico por causa disso, porque ele esculhambou a economia americana, porque ele esculhambou o dólar, que era uma coisa que nenhum presidente americano até hoje tinha feito. E, aliás, eu não sei se vocês lembram do dia que ele anunciou as tarifas… Ele falava “nossa, eu não sei por que que nenhum presidente até hoje fez isso que eu tô fazendo agora”. Bom… Por isso, né filho? Todos os outros caras sabiam que ia dar essa merda. Então, assim, esse negócio do BRICS tem que ser colocado nesse contexto. O dólar só continua a ser internacional quando aparecer uma alternativa. Mas agora ele começou a se preocupar com isso por causa das besteiras que ele mesmo está fazendo. E finalmente, eu acho que tem mais um aspecto que a gente tem que lembrar de motivação para esse negócio que eu acho até que é a principal. São as big techs. A gente falou na semana passada sobre a decisão do STF sobre regulação de big techs e sempre que o Trump faz alguma coisa, você tem que se perguntar: quem subornou o Trump para fazer isso? E o suspeito número um nesse caso, são as big techs que dão grana para ele a torto e a direito e estão com muita raiva da decisão do STF. É bom lembrar o Trump é dono de uma rede social, aquela truth dele. Então assim é, ele tem inclusive interesse financeiro nisso. E eu acho que boa parte da negociação do Brasil vai passar por isso. Talvez até não envolva o Trump. Talvez seja uma negociação do governo brasileiro com as big techs. Essa, inclusive, talvez fosse uma boa oportunidade para o Congresso fazer o que o Supremo pediu que ele fizesse, a gente falou isso na semana passada, que é legislar sobre o assunto. O Supremo teve que agir porque o Congresso não estava fazendo nada.

 

Fernando de Barros e Silva: É, de qualquer forma, acho que não podemos esperar nada de muito bom vindo do Congresso. Ana, você conversou com muita gente, já organizou as ideias aí, enquanto o Celso falava.

 

Celso Rocha de Barros: Eu acho que um outro fator que a gente tem que levar em consideração é essa questão da atenção, né? Atenção, não tensão. Que é o fato de estar acontecendo um evento internacional do qual ele não participa, para o qual ele não é convidado, enfim, não viria se fosse, né? Um evento que não é sobre os Estados Unidos ou sobre ele. Então você vê que ele começa a tweetar sobre isso como forma de entrar na discussão dos BRICS, né? E é uma coisa que foi uma análise recorrente ali, que teve depois do evento, que o evento estava meio esvaziado com a ausência do XI Jinping. Apesar de ter a presença tanto do primeiro ministro da Índia Narendra Modi quanto do presidente da África do Sul. Mas sem o XI Jinping ficou meio aquela coisa e também não teve grandes decisões nesse evento, né? Então esses ataques do Trump, eles acabaram dando uma importância para o evento dos BRICS que nem a gente estava dando, na verdade. E um outro bastidor aqui, enfim, conversando com algumas fontes, lá nos dias dos BRICS, uma fonte do governo estava me dizendo “olha para gente do Brasil, não é tão ruim que essa cúpula dos BRICS não seja o foco de tudo hoje, que ela esteja mais apagada, digamos, porque a gente justamente não quer despertar”… A pessoa não falou nesses termos, mas assim, só para traduzir: “a gente não quer despertar a ira dos Estados Unidos, porque a gente está focado na COP. Para a gente, a COP é o principal evento internacional que o Brasil vai sediar no governo Lula. Não é o G20, não é o BRICS, é a COP. Então, assim, para a gente não ter problema na COP, vamos fazer esse comunicado mais suave, sem grandes dilemas aqui, para justamente não ter problema. Mas isso me foi falado 24 horas antes de tudo acontecer, então realmente.

 

 

Celso Rocha de Barros: Não deu certo.

 

Ana Clara Costa: Não deu certo. Bom, assim, se a gente pensar em impacto econômico, eu acho que ainda é um cálculo meio imponderável para a gente. Primeiro, porque essa tarifa vai entrar em vigência só a partir de 1° de agosto. Então, só então a gente vai saber o que pode acontecer. Mas os Estados Unidos são grandes importadores de aço, que já foi tarifado em 50% para o mundo todo nessa mesma leva. Então os Estados Unidos já iam pagar 50% de tarifa sobre o aço brasileiro de qualquer forma. Metais de uma forma geral, peças para a indústria automobilística. Mas eu queria destacar aqui dois produtos do agronegócio: o café e a carne. Os Estados Unidos são o maior consumidor de café do mundo e o Brasil é o maior produtor. O Brasil também é o maior exportador de café para os Estados Unidos. 32% do café que é consumido nos Estados Unidos vem do Brasil. Quando Trump anunciou a tarifa de 10% para todo mundo, em abril, os produtores de café do Brasil ficaram meio sossegados porque, primeiro, o câmbio brasileiro é favorável porque está desvalorizado, segundo os concorrentes do Brasil, que também exportam café, estavam recebendo tarifas maiores que o Brasil. Então, se você pegar Colômbia, Vietnã, Indonésia, Honduras, eram países que estavam com uma tarifa maior. Então assim o Brasil ainda era vantajoso apesar dos 10%. Com 50%, ele deixa de ser vantajoso como era antes. Agora, os Estados Unidos podem se dar ao luxo de não comprar o café brasileiro mais caro? Porque é isso que vai acontecer. Quem vai pagar os 50% de tarifa são eles. É o importador que paga, não é a gente. Então, eles podem se dar ao luxo de simplesmente abrir mão de 32% do café que eles compram? Porque você tem que julgar que a Colômbia, o Vietnã e a Indonésia e Honduras possam suprir essa quantidade de café. Só que se você pegar o Vietnã, ele fornece 8% do café dos Estados Unidos. Então você dizer que o Vietnã tem uma produção que vai do dia para a noite abastecer o território americano. O Vietnã não tem nem território para isso. A Indonésia também não. A Colômbia também não. A questão territorial é importante. O Brasil é o maior exportador do mundo porque ele é o maior produtor, porque ele tem terra para plantar café. Então você não pode achar que o Vietnã vai suprir a produção brasileira. Então, assim, essa questão das tarifas, eu acho que a indústria pode ter mais problema, mas no caso do agronegócio, existe uma demanda interna que eles vão ter que suprir de alguma forma. Duas coisas podem acontecer: o Brasil pode negociar ali algum tipo de isenção ali que beneficie de certa forma os produtores de café. Ou eles vão comprar o café mais caro mesmo. Outra coisa é a carne. Os Estados Unidos são grandes produtores de carne, né? Então, não é a mesma coisa do café. Mas as exportações de carne do Brasil subiram muito para os Estados Unidos porque eles estão com falta de gado em razão do alto consumo e etc, por questões climáticas. Então, assim subiu vertiginosamente a importação de carne brasileira. Você não cria gado do dia para a noite. Você não engorda gado, aperta um botão e o gado engorda, não acontece isso. Então assim, você vai poder prescindir dessa carne brasileira, porque ela vai ficar mais cara. São questões que estão sendo discutidas agora e que, enfim, a gente não sabe ainda o que o governo brasileiro vai fazer, porque o governo brasileiro, na verdade, só vai poder iniciar a discussão comercial depois do dia 1° de agosto. Você não sabe o que o Trump pode fazer até o dia 1° de agosto. Ele pode voltar atrás, ele pode, enfim, mil coisas. Então, assim, essa discussão só vai começar a partir de 1° de agosto. A gente ainda não sabe. Agora eu queria só voltar no BRICS rapidinho. Uma coisa que aconteceu na reunião do BRICS. O Vietnã ele tinha sido inicialmente tarifado em 46% pelo Trump lá em abril, que é um grande exportador de café para eles. Agora, nessa revisão tarifária que o Trump fez esses dias, ele cortou a tarifa do Vietnã de 46 para 20. Só que durante a reunião dos BRICS, o Vietnã estava aqui no Brasil. O representante da China também estava aqui no Brasil e eles dialogaram. O Vietnã foi justamente falar com a China sobre isso. Ou seja, ele quer vender para a China a produção dele mais do que já vende, porque não tá dando para depender dos Estados Unidos. E isso foi discutido nos BRICS nessa cúpula do fim de semana. Então, assim, eu queria dizer que cabem muitas críticas à retórica dos BRICS. O Lula fala muito isso, que os BRICS poderiam ser uma plataforma de diálogo até mais eficaz que a ONU, porque os países do Sul global têm mais voz nos BRICS do que na ONU. Enfim, como se todos os países dos BRICS fossem os grandes amigos do diálogo, né? A gente sabe que não é o caso, né? Mas apesar dessa retórica que o Lula usa muito para justificar os BRICS, o fato é que é um grupo que tem que existir. E não é por essa questão de serem supostamente todos amiguinhos da paz que não são. Mas se você está numa situação em que tem uma pessoa como Trump na presidência dos Estados Unidos, que está dominando a ONU, implodindo os organismos multilaterais, como a OMC, pressionando a OTAN, você tem que ter uma alternativa para que os países criem redes de proteção comercial, busquem novos parceiros, novas rotas. Então, eu acho que a gente tem que reconhecer que essa diversificação é fundamental e já vem acontecendo com a China ocupando muito esse espaço e tal. Mas eu acho que essa situação do Trump, na verdade ela fortalece a ideia de existência dos BRICS hoje, porque se não fosse essa cúpula, o Vietnã ia ter esse encontro com a China para falar sobre isso em outros países, que possivelmente tiveram encontros bilaterais para discutir esse assunto? E uma cúpula alternativa, né? É saudável que haja uma cúpula de discussão entre países da qual os Estados Unidos não participe, porque o que eles estão fazendo em termos de tarifa, embora eles tenham todo o direito de colocar a tarifa que eles quiserem, é uma coisa que está prejudicando o comércio mundial. E a plataforma para discutir isso, que era a OMC, eles implodiram.

 

Fernando de Barros e Silva: Perfeito. Celso, mais alguma coisa para arrematar nesse bloco, não?

 

 

Celso Rocha de Barros: Eu queria falar um pouquinho sobre o efeito nos Estados Unidos. O diagnóstico dos economistas americanos até agora é que, como suspenderam as tarifas por 90 dias, ainda não dá para você saber qual vai ser o tamanho da porrada na economia americana quando essas tarifas, se essas tarifas entrarem em vigor, do tamanho que elas estão propostas. Mas eles já estão preocupados com algumas coisas. Por exemplo, no momento não teve ainda aumento de inflação, mas em grande parte foi porque como a tarifa não entrou em vigor, os importadores estão estocando, estão comprando um monte de coisa para guardar la e ter estoque, para ter o que vender antes das tarifas entrarem em vigor. E eles já estão vendo alguns sinais de que se o blefe do Trump não der certo, aí vai ter inflação séria nos Estados Unidos. E aí o Banco Central, que lá é independente também, vai aumentar os juros e a situação do Trump vai ficar pior. Levando em conta sempre que ano que vem tem midterms, aquelas eleições para o Congresso americano que acontecem no meio do mandato. Então ele também não vai querer chegar nas urnas com uma inflação explodindo. É uma comparação que tem sido muito feita. Tem muita gente achando que o que vai acontecer com Estados Unidos com essas tarifas não é um crash, por exemplo, como teve em 2008. É o que aconteceu depois do Brexit. Depois do Brexit, a Inglaterra não teve uma crise aguda, um negócio que de um dia para o outro caiu tudo, mas as expectativas de crescimento foram caindo sistematicamente, desde então, a economia tornou estruturalmente mais fraca por não ser mais tão bem integrada com a economia europeia. E isso pode acontecer nos Estados Unidos também. Assim, mesmo que não haja um crash ou alguma coisa dessas, o Trump pode deixar um legado para os seus sucessores de uma economia estruturalmente mais fraca.

 

Fernando de Barros e Silva: Perfeito. Bom, a gente vai encerrando o primeiro bloco do programa por aqui. Fazemos um rápido intervalo. Na volta, vamos continuar falando deste assunto. Dos aspectos políticos especificamente, já voltamos.

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bem. Estamos de volta. Ana Clara, vou começar com você. Estamos diante de um terreno conflagrado. O governo já está tentando fazer do limão uma limonada, atiçando ou esquentando o discurso patriótico contra os patriotas vendidos ao boné do Trump. Tarcísio entre eles. Qual é o saldo político desse imbróglio?

 

 

Ana Clara Costa: Eu queria começar pelos Bolsonaro. Quando a carta veio, né? Eu imediatamente procurei algumas fontes ali do núcleo duro do Bolsonaro para perguntar o que o Eduardo tinha feito ali para conseguir essa façanha. Porque metade da carta faz referência ao Bolsonaro e o Eduardo está lá há meses dizendo que é isso que ele quer fazer com que o Trump ajude a poupar o Bolsonaro da condenação que ele possivelmente vai ter. Então, né? Quando Trump manda essa carta fazendo menção ao Bolsonaro, ao Alexandre de Moraes e tudo mais, você imagina que o Eduardo trabalhou direitinho, né? Então eu queria conversar com essas pessoas sobre o que tinha acontecido, o que ele tinha feito, né? E aí todo mundo meio que disse que ainda não sabia o que tinha acontecido, que estava apurando o que tinha acontecido e tal. E todo mundo meio que dando a mesma resposta, né? E aí, até o momento em que eles começaram a responder e aí, numa resposta super coordenada: é culpa dos BRICS. O Eduardo não tem nada a ver com isso. É tudo culpa dos BRICS. E aí, a partir dessa resposta coordenada que todos me deram ao mesmo tempo, veio a carta do deputado em exílio que foi publicada na imprensa e tal.

 

Fernando de Barros e Silva: E o jornalista em exílio também, chamado de jornalista é um título de cortesia. O amigo do Celso, Paulo Figueiredo, que o Guga Chacra, na GloboNews, fazia questão de chamar o jornalista Paulo Figueiredo, dos jornalista… Eu falei o Celso deve estar tendo trigêmeos, parindo trigêmeos.

 

Celso Rocha de Barros: Chamar o Paulo Figueiredo de jornalista é chamar o Hitler de pintor de aquarela, entendeu? Assim, pô, o cara foi na Jovem Pan, leu o manifesto dos oficiais golpistas, foi na Jovem Pan e deu o nome dos oficiais que resistiam ao golpe para que eles fossem perseguidos. Quer dizer, isso não é jornalismo não, gente. Calma aí.

 

 

Ana Clara Costa: Não, e foi depois dessa resposta coordenada que veio a carta e o Tarcísio, que é o governador do estado que mais vai sofrer as consequências dessa taxa, dessa tarifa. Manda uma nota praticamente pedindo para o Trump bater mais, né? Esse era o tom da nota do Tarcísio. E aí essa turma veio pesado aí defendendo o Trump, dizendo que a culpa do Lula, culpa dos BRICS e tal. Então você vê uma coordenação de discurso muito impressionante, né? O Tarcísio chega a dizer que os Estados Unidos foram atacados pelo Lula. Veja bem. Esse é o candidato dos empresários, dos donos das empresas que vão ser penalizadas. E aí eu queria só fazer uma pequena digressão no Tarcísio, porque ele deixa claro muitas coisas quando ele publica essa nota. Primeira, que ele não é de São Paulo. Essa é a primeira coisa que qualquer governador eu acho de Paulo Maluf, Orestes Quércia, a maior escória da direita que São Paulo já ofereceu para o Brasil…

 

Fernando de Barros e Silva: Fleury.

 

Ana Clara Costa: Exato. Qualquer governador defenderia a indústria de São Paulo numa situação como essa. E é claro que um carioca não vai fazer isso, porque, enfim, não tem a mesma relação histórica com a indústria e não se importa. Então, assim, o Tarcísio, quando ele solta essa nota, ele deixa claro que ele não sabe o que isso significa. Ele não tem ideia.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Eu acho que ele está dançando miudinho e dobrou a aposta no apoio do Bolsonaro.

 

Ana Clara Costa: Não, com certeza ele dobrou a aposta. Mas eu estou falando que você vê claramente que o cara não…

 

Celso Rocha de Barros: Não deu o peso que deveria ter dado a esse outro…

 

 

Fernando de Barros e Silva: Às tradições que o Estadão tão bem soube defender, né?

 

Celso Rocha de Barros: Exato.

 

Fernando de Barros e Silva: Ontem, quando a Ana mandou o editorial do Estadão pra gente, ela falou: “é, mexeu com a indústria de São Paulo…”

 

 

Ana Clara Costa: Exato.

 

Fernando de Barros e Silva: 9 de julho na cabeça, né?

 

Ana Clara Costa: Pois é, e assim eu acho que tem uma outra coisa que essa nota mostra, que ele é um cara muito frio, né? Ele fez um cálculo frio, ele pensou: a elite eu já tenho para 2026, os empresários. O que eu não tenho é o Bolsonaro. Então, nessa situação, a minha lealdade está com Bolsonaro. Eu preciso que ele me apoie. E isso vale para o Ricardo Nunes também. O prefeito rastejante de São Paulo, que comentou no post do Tarcísio apoiando o que ele disse. O prefeito de São Paulo, a cidade sede das empresas que vão se ferrar.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Onde chegamos, né? Porque tem um problema de forma. A carta do Trump realmente é uma indignidade na forma, inclusive é mal escrito, mal ajambrado, cheio de mentira. É uma coisa que a degradação começa na fatura. É um negócio realmente assustador, onde nós chegamos, o prefeito, o governador ajoelhando para isso.

 

Ana Clara Costa: E o governo aproveitou essa oportunidade para tentar, inclusive, conectar essa narrativa da participação da direita nessa carta, porque a carta não faz qualquer menção aos BRICS. Ela faz uma menção ao Bolsonaro. Até eles tentaram adaptar isso ao discurso da taxação dos ricos. E aí queria falar um pouco desses bastidores. O Lula, ainda na quarta-feira, quando tudo aconteceu, ele estava recebendo os chefes de Estado que vieram para os BRICS, que acabaram ficando para visita de Estado. Então, assim, esses tweets do Trump sobre o Bolsonaro, que vieram pós BRICS, o Lula estava com a agenda cheia e meio que não estava dando muita bola para isso, né? Mesmo porque como ele não usa rede social, ele não tem essa temperatura das redes, de ver e já querer reagir e tal, o que tem seu lado bom e ruim, né? Quando vem a carta, ela não é enviada pelos meios oficiais de correspondência da República. Ela é postada nas redes do Trump, o que é uma ofensa, porque você nem sequer se dá ao trabalho de garantir que aquilo chegue primeiro ao seu destinatário, né?

 

Celso Rocha de Barros: Claro.

 

 

Ana Clara Costa: Antes de chegar no público. Então, quando essa carta é postada, eles convocam uma reunião com o governo. Aí tava todo mundo lá, o Celso Amorim, o Mauro Vieira, o Sidônio, a Gleisi, o Haddad, o Alckmin, o Rui Costa. E eles decidem também não responder com uma correspondência oficial porque eles não receberam uma. Então, para quê dar essa deferência, né? E aí eles postam uma nota à imprensa respondendo muito secamente os pontos da carta, falam das big techs, falam da questão da taxação, que o Brasil tem uma relação comercial deficitária com os Estados Unidos, ou seja, o Brasil compra mais do que vende. Então o argumento do Trump é inócuo e eles falam em usar a lei de reciprocidade sem explicar muito bem como vai ser isso. E aí depois, conversando com algumas fontes depois da reunião, o que eles me disseram foi o seguinte quando o governo fala em lei de reciprocidade, não significa que ele vai tarifar os Estados Unidos em 50%. Não é isso. O que é mais provável que aconteça caso essa tarifa se mantenha até o dia 1° de agosto é que eles façam uso pontual da lei de reciprocidade, como por exemplo, sobre propriedade intelectual. O que que é você retalhar um país em propriedade intelectual? É, por exemplo, você suspender patentes de remédio. Você taxa remessa de dividendos de big techs, por exemplo. Você pode taxar. Eu não estou dizendo que eles vão fazer isso, mas assim, entre as coisas que estão sendo discutidas, há uma retaliação pontual em setores que chateiam muito os Estados Unidos. A ideia não é fazer uma grande tarifa de 50% contra os produtos americanos. Uma outra coisa, essa nota à imprensa que eles fizeram foi mais para a sociedade brasileira do que para o Trump, né? Eles queriam dar uma resposta e também dar uma resposta de que eles não querem prejudicar os setores que estão sendo retaliados com essa tarifa, assim, que o governo vai ter isso como premissa, o que a gente vai fazer na negociação comercial, não é com intuito de fazer briga política. É com o intuito de preservar o máximo que for possível as exportações brasileiras. O Brasil, ele tem um histórico diplomático de negociação comercial. Celso Amorim foi um grande negociador comercial na OMC que conseguiu inclusive a derrubada das patentes dos medicamentos para que a gente tivesse o genérico. E isso ele conseguiu no governo Fernando Henrique, quando Serra era ministro da Saúde. O Rubens Ricupero foi um grande negociador comercial. Você crescer no Itamaraty significava você passar pela OMC e se tornar um grande negociador comercial. Esse era o caminho para se tornar um grande diplomata. Então, o Brasil tem uma tradição nisso. O problema é que os Estados Unidos não têm, porque o Trump na verdade, dinamitou a diplomacia americana. Ele tirou todo mundo de lá. Enfim, as pessoas conhecidas pela diplomacia. Junto com o Marco Rubio, veio um bando de amigo dele, de vendedor de imóvel de Nova York, que são essas pessoas que hoje estão servindo de ponte com os outros países. Então, assim, a gente está numa situação em que a gente pode até ter as ferramentas para fazer a negociação, a discussão comercial, mas eles não têm. E aí o Alckmin, que está conversando com o secretário de comércio americano que é o cara que depois que o Trump faz isso é ele que sempre entra na jogada para tocar a conversa. E só para vocês terem uma ideia, o nome dele é Howard Lutnic, o nome do secretário de Comércio e ele é conhecido nos Estados Unidos como Howard Lunatic.

 

Celso Rocha de Barros: Opa!

 

Ana Clara Costa: Esse é o secretário.

 

 

Celso Rocha de Barros: Aí sim!

 

Ana Clara Costa: É esse o cara que vai lidar com o assunto, entendeu?

 

Fernando de Barros e Silva: Celso, o governo reagiu bem?

 

 

Celso Rocha de Barros: Fernando, eu acho que sim. Mas antes eu queria chamar a atenção para um fato: Jair Bolsonaro é o primeiro presidente brasileiro que conseguiu aumentar impostos depois de sair do poder. É uma façanha sensacional, Jair. Parabéns! E esse imposto gigantesco de 50% sobre as exportações brasileiras sequer vão ajudar a combater o déficit fiscal brasileiro. Vai reduzir o déficit fiscal americano.

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bom.

 

Celso Rocha de Barros: Basicamente o Jair, o embaixador Bananinha, acharam ok fazer os brasileiros perder o emprego, fazer os empresários brasileiros quebrarem, tudo para o Jair fugir da cadeia. É provável, inclusive, que as tarifas do Trump batam mais nos Estados que votaram mais no Bolsonaro, porque são os que têm mais capacidade de exportar para os Estados Unidos de maneira competitiva. Então, assim você vai ter não só o agronegócio, que deve ser uma vítima séria disso. Embora ele tenha como fazer um REDD, pode sair uma negociação, mas assim que o Brasil entra pesado lá no mercado americano mesmo é o agronegócio, que é a nave mãe do Bolsonaro. E a indústria paulista entendeu que, em tese, seria administrado pelo Tarcísio. Ele pode não ter se informado muito bem sobre a situação econômica do Estado que ele se elegeu, que nem o lugar que ele votava, ele lembrava. Os Estados que devem apanhar mais dessas tarifas são estados em que o Bolsonaro foi bem na eleição, mesmo que não tenha ganho e em geral ganhou. E eu não sei se você lembra, na semana passada a gente tava o pessoal dizendo que o Lula tinha partido para o “nós contra eles”, por propor um mínimo de 10% de imposto para ricos e por reclamar do congresso no Twitter. Então, o pessoal que estava reclamando de “nós contra eles” agora arrumou uma super potência estrangeira para intervir no Brasil e tentar tirar o chefe deles da cadeia, entendeu? Então, isso sim é nós contra eles. Quando vocês quiserem procurar uma imagem do que é de fato radicalização política, vão atrás disso aqui. O Joel Pinheiro falou um negócio numa rede social que eu achei interessante. Ele falou imagina se o Lula, quando estivesse preso, conseguisse que a China impusesse sanções comerciais ao Brasil. Se dissesse assim: “se não soltarem o Lula, a China vai meter tarifa nos produtos brasileiros”. O que esse pessoal estaria dizendo? E, aliás, dizendo com razão. Cá entre nós, isso seria absolutamente bizarro. Então você pega, por exemplo, o setor de mineração, que pode ser fortemente atingido pelas tarifas. É um setor 100% bolsonarista, porque eles brigam muito com regulação ambiental. Agora eu te garanto que a Marina Silva não meteu nada de ambiental ali que atrase mais a vida deles do que o produto dele nos Estados Unidos ser 50% mais caro. Então, esse pessoal tava na hora de botar a mão na consciência. Eu sei que não vai, mas que tava na hora, tá. E aqui vale chamar a atenção para um fato quando a gente for analisar o peso de cada fator nessa decisão do Trump a solidariedade com o Bolsonaro, BRICS, etc. É bom lembrar que se fosse só pelo Bolsonaro, não teria sido isso que ele teria feito. Ele teria invocado a Lei Magnitsky contra o Alexandre de Moraes. Seriam sanções pesadíssimas contra o indivíduo Alexandre de Moraes. E isso aí você pode ter certeza que a elite não vai se importar nada com isso. Provavelmente acharia até legal. Então, agora que os bolsonaristas estão tentando inventar o discurso de que isso aí é mais ou menos a mesma coisa que eles estavam pedindo, mas não era porque justamente se eles fossem para uma reunião da Frente Parlamentar da Agricultura e dissesse que eu vou fazer um negócio aqui que vai aumentar 50% do negócio, o agronegócio abandonaria o Bolsonaro na hora. Então isso é uma coisa que vai ter muito político bolsonarista recebendo telefonema de financiador puto da vida. E, naturalmente, o Lula vai tentar lucrar politicamente com isso. O novo slogan do Lula que o Lula quer taxar os super ricos e Bolsonaro quer taxar o Brasil, é muito bom e é sinal de que valeu a pena tirar a área de comunicação do governo de uma aliança entre um deputado do PT, a primeira dama e o fotógrafo e entregar para um profissional, né? Que você vê… Interessante isso, né cara? Ninguém podia esperar que fosse melhorar. E inclusive teve outros bons frutos para o Lula, por exemplo. O Fernando falou do editorial do Estadão, teve o editorial da Folha também descendo o pau no Trump. A mídia em geral não comprou a história de que basicamente é culpa do Lula. Isso para o Bolsonaro é muito ruim. Para o empresariado. Isso é muito ruim. Se você perguntasse para os caras agora, o que você prefere? O imposto de renda baixinho que o Haddad queria te cobrar semana passada ou essa tarifa do Trump agora? Eles tatuariam a cara do Haddad, entendeu? Não tem a menor dúvida sobre isso. E você pode ver que todos os monitoramento até agora de rede social deram vitória para o governo. Os bolsonaristas estão tendo um momento difícil de tentar emplacar a narrativa deles. Gente que não apoiaria o PT em absolutamente nada. Felipe Moura Brasil, não sei se vocês lembram dele, que foi um cara que organizou uma coletânea do Olavo.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Nossa! Esse aí você foi buscar nas profundezas.

 

Celso Rocha de Barros: Não, Mas só para lembrar, ele e o Danilo Gentili, aquele comediante de direita, também vieram dizer “ah, os bolsonaristas acabaram com o combate na corrupção e agora estão ferrando a economia brasileira”, entendeu? Então, assim, o que você vai ver também é que não é só que é bom para o Lula. Pessoas que tinham visões alternativas da direita, mesmo numa direita bem dura, estão aproveitando a brecha para tentar ganhar espaço que era do bolsonarismo, entendeu? Então esse é um bom momento. Se você tem um projeto político de direita não bolsonarista para tentar enfiar na cara do Bolsonaro, ” ah sou melhor que você porque eu sou contra o PT, mas eu não fico botando tarifa de 50% nos produtos brasileiros”. E o Tarcísio? Enfim, o que dizer mais do Tarcísio a essa altura do campeonato, né, cara? Não tem nada que o Bolsonaro faça que ele não responda com “au au”, entendeu? Uma coisa absolutamente vergonhosa, um barbado daquele tamanho, com um nível de subserviência desse nível. Acho muito deprimente, acho uma indignidade, assim, o sujeito fazer isso. Não tem ninguém obrigando ele a fazer isso, entendeu? Porra, cara, que tristeza! Agora, o efeito de longo prazo disso na política brasileira pode ser mais incerto. Se as tarifas baterem demais na economia brasileira, vai ter gente pressionando Lula dizendo “cara, você pode até ter razão, mas tem que ceder porque o Brasil não pode quebrar”, etc. E as tarifas do Trump em si não tem a capacidade de quebrar a economia brasileira. O Paul Krugman, prêmio Nobel de Economia, fez um post muito bom no substack dele. Quem puder, eu recomendo, inclusive recomendo assinar. Dizendo que foi uma tarifa pró-ditador. Como antigamente políticas tarifárias podiam ser usadas. Pelo menos dizia-se que eram usadas para promover a democracia. Nesse caso, o Trump basicamente está punindo o Brasil por ser uma democracia. Está punindo o Brasil por ter Judiciário independente, punindo o Brasil por punir golpistas como a justiça americana não fez no caso do Trump.

 

Fernando de Barros e Silva: Exatamente.

 

 

Celso Rocha de Barros: E o Krugman também diz o seguinte que o Brasil, o México e a Colômbia, que tiveram que ceder rapidamente para o Trump, são absurdamente integrados com a economia americana e inclusive dependem dos Estados Unidos para operação militar para os problemas internos bem sérios. O Brasil não é nada disso. Ele botou os dados lá. Assim, você não tem como pegar um país soberano com essas características econômicas e obrigar os caras a absorver o seu ditador de estimação porque você é amigo dele, entendeu? Ou porque você se identifica com a história de vida recente dele que é tentar um golpe e tentar continuar na política. Agora, o Lula precisa ser muito hábil nessa reação, aquilo que a Ana falou, de que o pessoal não está pensando em fazer uma retaliação total em todos os produtos americanos, mas sim aspectos pontuais. É isso que tem que fazer mesmo. Assim, porque se ele resolver taxar todos os produtos americanos, quem vai pagar são os brasileiros. Sim, como a Ana disse que quem vai pagar as tarifas nos Estados Unidos são os consumidores americanos. Se o Lula mete aqui um tarifaço desse, aumenta os preços de todos os produtos americanos. Isso vai bater na inflação. O Banco Central vai ter que aumentar juros. É péssimo. Então tem que ser um negócio muito bem feito. Eu conversei aqui com o jornalista Sérgio Leo, que acompanhou as negociações de comércio internacional nos governos Lula e Dilma como colunista do Valor Econômico e ele estava lembrando o caso da Argentina. Na época, a Argentina aumentou impostos sobre produtos brasileiros e o Brasil, meio que discretamente, em vez de retaliar todos os produtos argentinos que seria ruim para o Brasil, além de ameaçar a relação diplomática, fez impostos pontuais sobre setores que eles sabiam que eram próximos do governo argentino da época. Uma coisa para doer no governo argentino, não para doer tanto, nem no cidadão argentino, nem, sobretudo, não no cidadão brasileiro. Então, assim, eu sou absolutamente contra o Lula chegar agora e falar assim: “ah, é ? Vai ser 50%? Então eu vou meter 50 em todos os americanos”. Seria ruim para o Brasil. Agora, se essa reação for hábil e não causar mais turbulência do que o Trump está causando, eu acho que realmente ele tende a ganhar com essa história, né?

 

Fernando de Barros e Silva: Ana, antes de terminar o bloco, vamos com você. Breaking News.

 

Ana Clara Costa: Não é só porque eu acho que tem que ficar no nosso radar que algumas pessoas no governo fizeram essa ponderação. Não é uma turma majoritária, digamos, mas algumas pessoas notaram isso, que é o seguinte o Trump, quando ele twitta falando sobre o Bolsonaro, ele descreve o Bolsonaro como um líder forte, um negociador muito duro em comércio e todo mundo achou essa descrição um pouco aleatória.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Patética mesmo.

 

Ana Clara Costa: Digamos que você caracterizar o Bolsonaro como um negociador muito duro não é a principal característica dele, digamos. Não é o que mais salta aos olhos. Mas ele fez isso no tweet dele e logo em seguida anunciou essa taxa de 50%. Então tem gente olhando isso como talvez uma estratégia de o Trump depois voltar atrás nos 50% e depois dizer que foi o Bolsonaro que é um grande negociador comercial, como ele disse, falou com ele e ele conseguiu reverter isso. Ou seja, ele beneficia o Bolsonaro no discurso dizendo que o governo brasileiro motivou a taxação e é o Bolsonaro que vai desfazer. Então algumas pessoas leram essa descrição dele como negociador muito duro, como uma brecha para esse tipo de estratégia.

 

Fernando de Barros e Silva: Difícil isso emplacar, né? O sujeito está com um pé na prisão e outro no leite condensado.

 

 

Ana Clara Costa: E sobretudo, porque o Trump geralmente não faz esse tipo de coisa para beneficiar ninguém. Ele só se mete em confusão em que ele é o beneficiário.

 

Fernando de Barros e Silva: Exato.

 

Celso Rocha de Barros: Nessa estratégia, ele seria muito abnegado em entregar para o Bolsonaro esse protagonismo.

 

 

Celso Rocha de Barros: Faz sentido.

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bem. A gente encerra então o segundo bloco do programa. Vamos fazer um rápido intervalo. Na volta, vamos falar da CPI da Farra das Bets. Já voltamos.

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bem, estamos de volta. João Batista, vamos com você. Obviamente não vamos dizer que terminou em pizza. Essa CPI das bets terminou em fichas talvez, ou em apostas, em cliques, sei lá como chamar isso. Faz um resumo aí para gente dessa história dessa CPI que não deu em nada ou deu em alguma coisa que não deveria dar.

 

 

João Batista Jr: Na verdade, essa CPI foi muito eficaz para os donos das bets e para os políticos que estão nos bolsos deles. A CPI logo de cara queria investigar o Fernandinho OIG, que é o melhor amigo do Ciro.

 

Fernando de Barros e Silva: Ciro Nogueira.

 

João Batista Jr: O cara que dá carona para o Cássio Nunes Marques, para o próprio Ciro Nogueira nessas viagens pela Europa. O Fernandinho. Ele tem uma empresa chamada 7Games.bet. Beleza? Beleza. Numa sexta-feira de novembro, a Soraya estava em Brasília almoçando com uma amiga senadora e ela contou da dificuldade de poder notificar o Fernandinho. Daí ela contou que foi informada pelo Dr. Iran, que era o presidente da CPI das Bets e integrante do partido do Ciro Nogueira, o Progressistas que o Fernandinho não estava no Brasil, então não seria possível notificá-lo. A interlocutora, a senadora em questão falou para Soraya: “não é verdade. Ele não só está no Brasil como está em Brasília e neste momento está almoçando com Cássio Nunes Marques. Aliás, o jatinho dele está estacionado no aeroporto de Brasília”. A Soraya, no meio do almoço, liga para a Polícia Legislativa, que, por sua vez, liga para a Polícia Federal, órgão responsável por cuidar de aeroportos e manda uma equipe para lá. Quando o Fernandinho, no fim do dia, aparece no aeroporto para pegar o jatinho dele e voltar para o Piauí, ele é notificado e alguns dias depois ele aparece na CPI. Quando ele vai a CPI, acontece algo muito curioso, digamos assim. O Ciro Nogueira, que era integrante da CPI, estava sentado na primeira fileira. À medida que o Fernandinho era questionado, ele olhava para o Ciro como quem olha para um pai ou como quem olha para o advogado de defesa, sabe, perguntando por uma anuência pelo olhar. Foi bastante curioso essa relação entre eles ali. Mas o que não se sabia no dia em que ele foi na CPI, em novembro do ano passado, era uma outra relação com o Judiciário. Para além do Cássio Nunes Marques, o Fernandinho, que é do Piauí, ele transferiu no ano passado a sede da 7Games.bet para uma cidade chamada Santo Antônio de Lisboa, Santo Antônio de Lisboa é um município com 6000 habitantes, que fica a 300 km de Teresina. A cidade basicamente vive de duas coisas: aposentadoria rural e bolsa família. Beleza? Beleza. Essa cidade é comandada por um prefeito do PT. Esse prefeito se chama Francisco Erivaldo da Silva, mas ele é conhecido como Erivaldo Lopes. Esse prefeito concedeu um pacote de medidas para que a empresa não pagasse imposto ou pagasse muito pouco imposto. Então vamos falar dos efeitos práticos. O ISS de Santo António de Lisboa, em novembro do ano passado, era de 42 mil reais. Em dezembro, 59 mil reais. Em fevereiro desse ano teve um salto bastante significativo. Foi para 840 mil reais. Já em março passou para 1,6 milhões de reais. O ISS a gente sabe que é o imposto de serviço. O que o prefeito fez? Ele diminuiu o imposto de 5% para 1% justamente para beneficiar essa Bet. Agora uma coisa interessante, né? Se ele pagou 1,6 milhão de imposto de ISS, significa que a empresa faturou só naquele mês, 160 milhões de reais. É dinheiro para caramba. A mesma CPI pediu os dados do Coaf, do Fernandinho. E olha que curioso quando a Soraya, no relatório final, pediu para que ele fosse investigado, nada desses dados apareceram. Nenhum deles. Mas o que que os dados mostram? Que o Fernandinho remeteu 625 mil reais para um ex-assessor do Ciro Nogueira. Sabe o que o Ciro contou pra gente? Que esse dinheiro era para comprar um relógio suíço. O mesmo relatório mostrou que o Fernandinho mandou 1,8 milhões de reais para Gusttavo Lima. Enfim, umas relações bastante estreitas e bastante unidas. Uma coisa interessante também, o prefeito da cidade, Santo Antônio de Lisboa, é irmão de um desembargador chamado Erivan José da Silva Lopes. Esse desembargador, ele é o corregedor geral do Estado do Piauí, ou seja, a pessoa responsável por cuidar da lisura de todo o processo. Quando eu perguntei para o Ciro a respeito da relação do Erivan com o Fernandinho, ele deu a melhor definição. Ele falou que o Erivan era como um pai para o Fernandinho. E olha que tem pais que não fazem tudo isso por um filho, hein?

 

 

Fernando de Barros e Silva: É impressionante como o Brasil, o micro e macro se iluminam, né? Vai nos municípios de 6000 pessoas e tá tudo lá. Ana, faz sua pergunta para o João.

 

Ana Clara Costa: Eu, primeiro eu queria dizer que eu achei interessantíssimo que um assessor parlamentar do Ciro Nogueira tenha 600 mil para comprar um relógio assim.

 

João Batista Jr: O Fernandinho comprou o relógio, mas o assessor tinha de ter esse relógio, né?

 

 

Ana Clara Costa: Exato. A gente sabe que assessor parlamentar ganha bem, mas não o suficiente para ter 600 mil. E lendo sua matéria, João, eu confesso que eu fiquei em dúvida se o Ciro Nogueira ele só é, digamos, muito próximo do empresário das bets ou fiquei em dúvida se ele não é sócio. Assim, em determinados momentos a transação financeira é tão frequente que você fica se perguntando se ele não tem uma participação no business, né?

 

João Batista Jr: Mas essa é uma dúvida que realmente é latente, né? Ele pega carona no avião, ele ajuda a fazer com que o município possa conceder essas isenções todas. Ele atua como advogado de defesa. Ele trabalha arduamente para que a CPI não dê em nada. Ou seja, o Fernandinho depois foi reconvocado para CPI e ele não apareceu. E o Ciro trabalhou arduamente para isso. Só para entender o tamanho dessa pizza que se transformou a CPI das Bets. Fazia mais de dez anos que um relatório de CPI não era rejeitado. Então, esse engajamento, essa força do Ciro para ajudar o Fernandinho levanta suspeitas sim. É muito cabível mesmo.

 

Fernando de Barros e Silva: E a gente não está falando de um político qualquer, né? Ele é presidente do Progressistas e foi ministro da Casa Civil, nada menos, do Bolsonaro.

 

 

João Batista Jr: Exatamente.

 

Fernando de Barros e Silva: Está falando de um dos políticos mais influentes de Brasília.

 

João Batista Jr: Exatamente. E tem uma coisa bastante curiosa também gente, a sede da 7Games.bet na cidade de Santo Antônio de Lisboa, fica justamente numa casa cuja dona é a mãe do desembargador e a mãe do prefeito.

 

 

Celso Rocha de Barros: Agora, João, ainda sobre o Ciro, você menciona muito na sua matéria essas trocas financeiras entre o Fernandinho e o Ciro e ou empresas das quais o Ciro é sócio e tal. Mas a impressão que a gente tem lendo a matéria é que a influência das bets está em todo o congresso.

 

João Batista Jr: Exato.

 

Ana Clara Costa: E aí eu fiquei em dúvida se a CPI não conseguiu relatórios de transações financeiras envolvendo outros parlamentares ou se todos esses parlamentares ficaram do lado das bets por lealdade ao Ciro, ou porque o Ciro manda na maior parte deles assim, porque na questão da documentação não tinha muita coisa envolvendo outros nomes né?

 

 

João Batista Jr: Oh Ana, essa é uma ótima pergunta pelo seguinte: o começo da CPI pareceu promissor. Ela mostrou os dentes. A Soraya, ela começou a pedir vários relatórios ao Coaf e também a abertura de investigações sobre alguns dos donos das bets. No entanto, a partir do terceiro e quarta reuniões, nada disso foi aprovado. Então, o relatório do Coaf, com a aprovação dos dados do Fernandinho, foi logo no início. Se fosse depois, nada aconteceria. Então o Ciro, o Irã, o Omar Aziz, vários deles trabalharam arduamente para que nenhum dos pedidos de RIFS, que são os relatórios de informações financeiras do Coaf fossem aprovados. Com o relatório do Fernandinho já foi possível descobrir muita coisa, porque tinha a compra de apartamentos feitos pela construtora do Ciro Nogueira. Dinheiro indo para o assessor do Ciro Nogueira. Dinheiro indo para Gusttavo Lima. Ou seja, só com o sujeito, a possibilidade de estrago seria gigantesca. Quando senadores viram esse tipo de possibilidade, eles frearam tudo. Então, o que pareceu ser promissor, depois tudo foi derrubado. Tem uma outra ligação que eu acho interessante para a gente mostrar o grau de influência da bancada das bets, né? Depois da bancada da Bíblia, da bala, agora a gente tem a bancada das bets. União Brasil que tem como presidente, o Antônio Rueda tem muita ligação com Nildo Júnior que é o dono da Pix Bet. Essa Pix bet fica sediada na Paraíba, então a gente sai do Piauí, vai para Paraíba. O Nildo Júnior, ele designou um ex-funcionário da BET dele, Michel Alexandre, para disputar a prefeitura da cidade de Serra Branca. Serra Branca é onde fica a cidade natal dele. Onde está a Bet dele. O Michel Alexandre com o dinheiro dele com influência, teve comício do Wesley Safadão, comício com um monte de artistas ali, acabou vencendo. O União Brasil, assim como progressistas atuam pesadamente em Brasília em prol das bets. São dois dos partidos que querem fazer com que o imposto das bets não suba de 12 para 18%. Esse é Nildo Júnior. Ele é um cara muito ligado ao universo dos esportes também. É a bet dele que patrocina o Flamengo tem um contrato gigantesco de 470 milhões de reais ao longo de quatro anos.

 

Fernando de Barros e Silva: A reportagem é muito impressionante. Celso, quero te ouvir.

 

Celso Rocha de Barros: João queria fazer uma pergunta. Eu fiquei impressionado com essa história da formação de uma bancada da BET, que, pelo que eu entendi no momento, eles estão mais ou menos cooptando uns caras que já estavam lá, como o Ciro Nogueira, por exemplo, que já está aí, enfim, no noticiário há muito tempo, especialmente nesse tipo de noticiário. Mas assim, você acha que na próxima eleição eles vão bancar candidato? Eles vão tentar eleger gente diretamente desde a origem, ligados a ele?

 

 

João Batista Jr: Com certeza, Celso. Se a gente está vendo esse movimento nas cidades, com eles, elegendo prefeitos e esses prefeitos criando leis de forma a concederem isenção de impostos, imagina que eles não vão querer na esfera federal? Então, a bancada das bets hoje, ela é muito forte com os progressistas. Vamos pegar a CPI das bets. Os CPIs das bets tinham como presidente o Dr. Iran, senador por Roraima. Ele é do partido do Ciro Nogueira. Dentre os integrantes também estava o próprio Ciro Nogueira. O que foi falado ali entre os senadores, que parte da comissão trabalhava arduamente para que as reuniões sequer acontecessem. Então tinha dias em que não tinha quórum para acontecer os pedidos de rifs e de aprovações para que eles fossem ali para depor. Eles eram negados ou não tinha nem quórum para votar. Então eles estão trabalhando arduamente para isso. Se essa arrecadação das bets não para de crescer e elas têm interesses ali em Brasília, me parece algo bastante natural que elas vão tentar interferir nas eleições. A agenda para isso elas tem. Elas não querem que o governo federal aumente o imposto.

 

Fernando de Barros e Silva: Sabe o que vai acontecer? Vai virar enredo de escola de samba. Vai acabar em carnaval esse negócio. Aí a gente vai ver o Galvão Bueno, provavelmente em cima de um carro alegórico, Luciano Huck em cima de outro.

 

João Batista Jr: Olha, não vai faltar ala, nem possibilidades de cenários, né? E tigrinho jogando carta.

 

 

Celso Rocha de Barros: Destaques, né? Destaque vai ter muita coisa agora.

 

Ana Clara Costa: É impressionante, porque se você for fazer uma comparação com um outro setor, que é o setor das bebidas, das bebidas alcoólicas, que é um setor que é tributado, se você pegar o preço final que você paga de imposto em cima da bebida, pode chegar a 60%. E o setor de bebidas é um setor que tem um lobby muito forte, né? Ou seja, eles trabalham muito para não ser mais que isso, né? Enfim. Agora, no caso das bets, que não tem um lobby profissional por trás, são empresários meio chinfrins assim que surgiram do dia para noite, vindo do jogo do bicho, de setores talvez dentro de uma certa ilegalidade. Você vê que a cooptação do Congresso era muito mais grosseira. Ela é assim realmente, e eu te pago e você me ajuda. E aparentemente, ninguém se choca com isso. E, pelo contrário, você tem um movimento de massa ali dentro do Congresso para permitir que isso se perpetue. E assim, se você pegar e comparar com as empresas de bebidas, são gigantes as empresas de faturamento bilionário. Enfim, se você for comparar hoje, parece que as bets tem até mais poder que elas.

 

João Batista Jr: As bets contrataram os maiores escritórios de advocacia do Brasil, todos os grandes tem vários clientes de bets, alguns escritórios abriram alas só para cuidar de apostas online. Isso é uma coisa. A outra coisa que daí mistura a ilegalidade com a legalidade, digamos assim, mas tudo meio que na lama. Tem muitos senadores e deputados que agora eles querem a legalização do jogo do bicho, não apenas dos cassinos físicos, que esse me parece já carta marcada. Vai liberar. Uma vez que tem apostas online operando dentro da lei, digamos assim, não tem mais porque ou outro motivo para não liberar os cassinos. Então isso me parece muito claro. Então virou um samba lelê geral.

 

 

Celso Rocha de Barros: E realmente se permitir esse resto todo, e,u também não sei porque que o jogo do bicho seria proibido.

 

Fernando de Barros e Silva: Parece inofensivo, até.

 

João Batista Jr: Pueril.

 

 

Celso Rocha de Barros: Comparado.

 

Fernando de Barros e Silva: Comparado, exato, ao estrago que as bets fazem. Eu lembro daquele documentário ‘Vale o Escrito’ que a Rede Globo publicou sobre o bicho. Tinha em certo momento uma depoimento do Boni e ele cinicamente falava: “não, eu negociava porque ele tinha que negociar o carnaval, a transmissão do carnaval pela Globo. Eu negociava com os presidentes das escolas de samba, não com os bicheiros.” Eram as mesmas pessoas, eram as mesmas.

 

Sonora: É o Clark Kente e o Super-Homem.

 

 

Fernando de Barros e Silva: A gente vive nesse mundo. O cinismo institucionalizado assim escarrado, o cinismo sem desconto. Bom, a gente tem que encerrar porque também está sem desconto aqui o nosso tempo. João, quero te agradecer demais.

 

João Batista Jr: Obrigado.

 

Fernando de Barros e Silva: Vai então para um rápido intervalo. Na volta, Kinder Ovo. Já voltamos.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bem, estamos de volta. Mari Faria, o momento da maldade. A hora do Celso. Kinder Ovo. Solta aí!

 

Sonora: Os sistemas presidencial, parlamentar do sistema semipresidencial e parlamentar…

 

Ana Clara Costa: Haddad!

 

 

Sonora: Surgiram das necessidades políticas e depois é que se estruturou em termos de um discurso.

 

Ana Clara Costa: Gilmar Mendes!

 

Sonora: Nós temos que começar a produzir, a discutir os espaços. E aí você cria uma mudança que possa fazer com que esse nosso sistema presidencial seja substituído, que se esgotou, seja substituído por um sistema que funcione.

 

 

Ana Clara Costa: Parece Fernando Henrique. Parece Fernando Henrique.

 

Fernando de Barros e Silva: Eu sei quem é.

 

Celso Rocha de Barros: Nelson Jobim.

 

 

Ana Clara Costa: Parecia o Fernando Henrique.

 

Fernando de Barros e Silva: Mais uma para o Celso. Já está. Já virou 7×1,7×0, 14×0. Nelson Jobim.

 

Celso Rocha de Barros: Eu peguei pelo semipresidencialismo esse papo furado aí dos caras. Semi presidencialismo é os caras dizendo assim o centrão só ganha eleição para o Congresso, não quer ser responsável por nada. Então o poder vai ser do Congresso e a responsabilidade é do presidente. Pronto.

 

 

Fernando de Barros e Silva: O Nelson Jobim, que é um semi progressista, semipresidencialista, semi progressista, semi democrata.

 

Celso Rocha de Barros: Depende do dia.

 

Fernando de Barros e Silva: É. Varia.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Bom para os anais. O ministro aposentado do STF, Nelson Jobim, a CNN Brasil, durante o Fórum de Lisboa, o Gilmarpalooza. Então temos um Kinder Ovo do Gilmarpalooza. Muito bem. Muito bem.

 

Fernando de Barros e Silva: Vamos então agora para o melhor momento do programa, para o Correio Elegante o momento de vocês. E eu vou começar então com o e-mail da Lina Reis. “Cresci em uma casa cercada de revistas piauí. Meus pais assinavam e tínhamos até o clássico pinguim de geladeira, mas nunca tinha escutado podcasts até me mudar para Campinas em 2022, para fazer mestrado. E senti uma necessidade gigante de ter vozes na casa. E foi em Campinas que também conheci o amor da minha vida, o Lucca, compulsoriamente submetido a maratonas de podcasts e que me levou na Feira do Livro para vê-los ao vivo. Juntos, criamos um hábito esquisito de, quando em silêncio, olharmos um para o outro e começarmos a cantar a vinheta do podcast Medo e Delírio, ‘Celso Rocha de Barros, Celso Rocha de Barros, as análises embasada, as análises embasada’. Fica aqui o meu agradecimento pela companhia nesses últimos anos e um beijo para toda a equipe do Foro, para o meu companheiro e para as minhas amigas Ruana e Clara Ramos, que são tão fãs quanto eu.” Poxa vida, Lina, Um beijo para você.

 

Ana Clara Costa: Um beijo, Lina. Obrigada.

 

 

Celso Rocha de Barros: Valeu, Lina.

 

Fernando de Barros e Silva: Pro Lucca. E você tem toda razão. Análise embasada do Casca de Bala.

 

Ana Clara Costa: No Spotify, A @flopesa postou: “Sou engenheira química e mãe de uma nova colega de profissão do Celso. Ela acaba de chegar da School of Public Policy e está retornando à pátria para se transformar numa farialimeF, mas só no CEP, tá? Fui eu quem apresentei o Foro à minha filha Sol, enquanto vivíamos separadas, mas no mesmo país. Eu no Texas, pois é, e ela estudando. Agora ela vai ficar ainda mais longe. Mas seguiremos unidas pelo Foro de Teresina. Celso manda um alô para ela. A mais nova cientista política no Brasil.” Caramba, que legal!

 

 

Celso Rocha de Barros: Muito legal! Parabéns, Sol! Boa sorte para você. Aparece aí para conversar com a gente.

 

Fernando de Barros e Silva: Muito bom!

 

Sonora: A Cíntia Brugiolo postou no YouTube: “Que entre para os anais, a interpretação das pastilhas foi algo digno de Oscar. Fernando, revelando qualidades de ator. Ri, me indignei, morri de raiva, tudo como de costume ao ouvir o Foro. Mas ao chegar ao Correio Elegante, quero deixar aqui uma solicitação, cobrança ou quase protesto, quando vai sair o Tinder do Foro? Pois estou procurando um match que seja também ouvinte assíduo. Estou bem cansada de desviar de caras com papo ultradireita. Quero saber onde assino. Beijo em todos.” Valeu, Cíntia! Pois é, está em estudos. Quer dizer, não tá não, mas eu inventei agora.

 

 

Fernando de Barros e Silva: Não estava em estudos. Agora está.

 

Celso Rocha de Barros: Agora está.

 

Fernando de Barros e Silva: Bom. Em clima de Tinder do Foro, a gente vai encerrando o programa de hoje por aqui. Se você gostou, não deixe de seguir e dar five stars para a gente no Spotify. Segue no Apple Podcast, na Amazon Music. Favorita, na Deezer e se inscreva no YouTube. Você também encontra a transcrição do episódio no site da Piauí. Foro de Teresina uma produção da Rádio Novelo para a revista Piauí. A coordenação geral é da Paula Scarpin. A direção é da Mari Faria, com produção e distribuição da Maria Júlia Vieira. A checagem é do Gilberto Porcidônio. A edição é da Carolina Moraes, da Paula Scarpin e do Thiago Picado. A identidade visual é da Amanda Lopes. Finalização e mixagem são do João Jabace e do Luiz Rodrigues, da Pipoca Sound. Jabace e Rodrigues, que também são os intérpretes da nossa melodia tema. A coordenação digital é da Bia Ribeiro, da Emily Almeida e do Fábio Brisola. O programa de hoje foi gravado aqui na minha Choupana, em São Paulo, no Estúdio Rastro, do Danny Dee e na Agência de Podcasts em São Paulo. Eu me despeço então dos meus amigos. Tchau, Celso.

 

 

Celso Rocha de Barros: Valeu, Fernando. Até semana que vem.

 

Fernando de Barros e Silva: Tchau, Ana.

 

Ana Clara Costa: Tchau, Fernando. Tchau, pessoal!

 

 

Fernando de Barros e Silva: É isso gente! Uma ótima semana a todos e até semana que vem!

 

 

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