Brasília, 7 de março, por volta das nove horas da noite. O jornalista Ricardo Noblat comemorava 50 anos de carreira. Para receber seus convidados foi fechado o restaurante Piantella, na capital do país, ponto de encontro de políticos, autoridades e imprensa por décadas. Naquela noite de lua crescente, mais uma vez, reuniu-se o novo, o velho e o de sempre da cena política brasileira.
Quando adentrou nos salões, o presidente Michel Temer foi saudado com entusiasmo. Ainda que, nos último seis meses, oito ministros tivessem sido destituídos do cargo – por suspeita de envolvimento em casos de corrupção –, ele mantinha a fleuma pública com demonstrações de força: a aprovação das reformas Trabalhista e Previdenciária pareciam questão de tempo. Os presidentes da Câmara e do Senado – Rodrigo Maia, do DEM, e Eunício Oliveira, do PMDB – haviam sido reeleitos com folga garantindo maioria ao governo. A proposta de emenda constitucional que congelava os investimentos públicos por vinte anos – outra vitória da base governista – fora aprovada. A economia dava sinais de melhora, a oposição estava acuada em um canto e os institutos de pesquisa ainda não haviam divulgado o baixíssimo índice de aprovação (10%, segundo CNI/Ibope) do novo mandatário do país. A turma tinha o que comemorar.
A noite era uma celebração com cara de volta ao passado. Passaram por lá Aécio Neves, José Serra, Moreira Franco – todos citados na Operação Lava Jato. Também os ministros do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes – presidente do Tribunal Superior Eleitoral, onde corria o processo que julgaria a cassação da chapa Dilma-Temer, absolvida em junho. Temer estava à vontade. Circulou abraçando amigos de longa data, correligionários e jornalistas da velha guarda brasiliense.
Meia hora depois de chegar, ele deixou o local. Rumou, como se sabe agora, para o Palácio do Jaburu, residência oficial. Tinha um encontro fora da agenda com Joesley Batista, diretor executivo do grupo J&F. O empresário levava em seu bolso um gravador para grampear o presidente. Com base nas gravações, Temer foi acusado pela Procuradoria-Geral da República de corrupção passiva: seu assessor e braço direito, o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, recebeu um suborno a mando de Batista – uma mala com 500 mil reais, entregue a ele em uma pizzaria.
Temer se tornou o primeiro presidente da República denunciado no exercício do cargo. Seu destino político está sendo julgado por seus pares. Na segunda-feira, dia 10, o deputado Sergio Zveiter, do PMDB, apresentou um parecer favorável ao prosseguimento das investigações contra Temer na Comissão de Constituição de Justiça da Câmara. Escreveu ele: “O presidente atendeu a Joesley Batista por livre e espontânea vontade, recebeu no exercício do cargo e para tratar de assuntos públicos, não republicanos.”
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Errata: diferente do que foi publicado originalmente, o empresário Joesley Batista levava o gravador em seu bolso quando gravou a conversa com Temer, e não numa mochila. Informação atualizada às 11h15 do dia 12 de julho.