A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se enfiou no olho do furacão do maior litígio corporativo em curso no Brasil, no qual a J&F, holding dos irmãos Batista, disputa com a Paper Excellence, do indonésio Jackson Wijaya, o controle acionário da Eldorado Brasil, uma das maiores fábricas de papel e celulose do país. A convite da J&F, a OAB decidiu tomar parte de uma ação secreta na qual a empresa dos Batistas alega que, durante uma suposta espionagem cibernética patrocinada pela Paper, violou-se o sigilo que protege a comunicação entre advogado e cliente.
Os advogados da Paper estranharam a posição da OAB porque o Ministério Público em São Paulo concluiu que não houve espionagem cibernética e o caso acabou arquivado. No raciocínio da Paper, se a espionagem nem chegou a ser confirmada, a quebra do sigilo profissional também ficava prejudicada, dada a ausência de espiões. De onde vinha então a convicção da OAB de que deveria apoiar um caso de violação do sigilo entre advogado e cliente numa situação tão controvertida, quando nem mesmo a espionagem fora comprovada?
À piauí, o presidente da OAB, Beto Simonetti, justificou a decisão nos seguintes termos: “A defesa das prerrogativas é a prioridade da OAB, que atua em favor de todas as advogadas e advogados que formalizam a solicitação de ajuda, não importa quem sejam seus clientes ou os casos em que atuam”.
Como o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, rejeitou a ação, o caso ficou por isso mesmo. Só que, na mesma época, a OAB pediu para participar como amicus curiae – posição que permite se manifestar ao longo do processo — em outra ação de interesse da J&F. A ação discute se a lei de terras rurais, de 1971, que restringe a compra e o arrendamento de terras por parte de estrangeiros, deve ser considerada válida ou não à luz da Constituição de 1988. Se for, a Paper, de propriedade de um indonésio, terá problemas de ficar com o controle acionário — e as terras — da Eldorado.
Quando soube da decisão da OAB, a Paper entendeu que a entidade havia ido longe demais, e entregou o memorando ao STF em que acusa a entidade de “fantoche” dos irmãos Batista e que “passou a atuar como alter ego da J&F” com o propósito de “criar embaraços para a transferência do controle acionária da Eldorado”.
Em nota da assessoria de imprensa enviada à piauí, Simonetti disse que a OAB “desconsidera em suas ações o eventual impacto em processos de terceiros”. Disse, ainda, que “a única preocupação da Ordem é cumprir as tarefas que lhe são atribuídas pela Constituição – neste caso, referentes à soberania nacional, à segurança alimentar e à proteção do meio ambiente e das populações rurais”. O julgamento sobre a constitucionalidade (ou não) da lei de 1971 ainda não tem data marcada.
A atuação da OAB é um capítulo — até agora inédito — no litígio entre a empresa de Jackson Wijaya e os irmãos Batista sobre o controle acionário da Eldorado. A disputa envolve cifras bilionárias, espionagem, ameaça de morte, golpes e contragolpes, orgulho, ganância e até questão de soberana nacional. Durante cinco meses, o repórter Breno Pires investigou o conflito, cujos desdobramentos mostram que os irmãos Batista, depois do vendaval da corrupção e de três temporadas na prisão, estão de volta à cena do jogo pesado.
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