Michel Temer disse que ia, depois que não ia mais, e no fim acabou lá. Em 7 de julho, durante o primeiro dia do G20 em Hamburgo, na Alemanha, o presidente da República participava do evento, de onde saiu com a agenda curta. Não se reuniu com nenhum outro líder político mundial ou firmou qualquer tratado bilateral, como é de praxe em reuniões internacionais desse quilate. Os olhos e a mente de Temer estavam focados no Brasil. Temia por sua já combalida situação política depois do escândalo da JBS. Longe de Brasília, de terno escuro, cabelos penteados para trás e semblante abatido, Temer se posicionou em um corredor e, em frente a uma câmera de celular, mandou um recado à nação: disse que, entre as medidas que estava tomando para recuperar a economia brasileira, seu governo estava “fazendo voltar o desemprego”. A mensagem foi postada em sua conta oficial do Twitter. Em poucas horas, a gafe seria um dos assuntos mais comentados do mundo na rede social.
Em meio à crise provocada pelas delações dos irmãos Wesley e Joesley Batista, donos da JBS, e com a popularidade esfacelada (seu índice de aprovação é de 5%, segundo as últimas pesquisas), o presidente da República tentava salvar sua reputação investindo num mundo que lhe é estranho: o digital. O trabalho de cuidar das redes do governo e do presidente estava disperso, com equipes que não se comunicavam. Por isso o núcleo duro decidiu unificar a comunicação. Daniel Braga, que não era responsável pela conta do presidente no Twitter, foi demitido. Na sexta-feira, dia 28, soube-se que Braga fora desligado na semana anterior. Seu maior trunfo para ter chegado ao governo era ser o responsável pelo marketing digital do prefeito de São Paulo, João Doria.
A decisão fora tomada por Temer e Moreira Franco, secretário-geral da Presidência, após entendimento de que Braga fracassara ao tentar fazer com que Temer fosse visto de forma mais positiva pela sociedade. Há de se convir que a missão não é fácil.
O marqueteiro de Michel Temer, Elsinho Mouco, foi escalado para o desafio. A partir de agosto, é ele quem passa a cuidar de toda a mídia digital do governo. Ele imputa o fracasso ao fato de Braga tentar replicar, no Governo Federal, o mesmo trabalho que vinha fazendo para Doria. “Isso aqui é muito diferente de uma prefeitura”, avaliou. E analisou: “O presidente Temer é um reformador, completamente diferente do perfil de não-político de Doria”, disse-me.
Trata-se de uma desesperada tentativa de mudar a imagem do presidente junto à opinião pública. Mouco será o responsável pela direção e coordenação de conteúdo do marketing digital das agências TV1, do jornalista Sérgio Motta Mello, e da Isobar, multinacional especializada em marketing digital, empresas contratadas desde o governo Dilma Rousseff para tocar a comunicação digital governamental.
Os responsáveis pela comunicação do governo – além de Mouco e Moreira Franco, Márcio Freitas, secretário de imprensa – concluíram que o trabalho desenvolvido por Braga não levava para a opinião pública o que eles chamam de agenda positiva do governo. O trio entende que há uma incoerência na forma de a sociedade enxergar o presidente e que isso se reflete nas pesquisas. Embora a popularidade de Temer esteja no pé, 30% dos entrevistados não querem que o presidente saia. “É isso que precisamos trabalhar”, disse Mouco. “Se não há uma multidão nas ruas pedindo a renúncia do presidente e se 30% dos entrevistados querem que ele fique mesmo não aprovando o seu governo, é sinal de que é preciso chamar a atenção para o que vem sendo realizado.”
Mouco está convencido de que a baixa popularidade se dá pelo fato de a sociedade não ligar Temer às mudanças que vêm ocorrendo no país desde que ele assumiu a Presidência. E lista alguns dos fatos que ele considera um avanço: queda dos juros e da inflação, aprovação da reforma trabalhista, teto fiscal, aumento de 12,5% no reajuste do Bolsa Família (maior, inclusive, segundo ele, do que os 9% prometidos por Dilma), reforma do ensino médio e anúncio de demissão de dez mil cargos de confiança logo nos seus primeiros dias de governo. E, acrescenta, entusiasmado o que ele considera um “golaço” do governo: a chegada de oito mil homens das forças de segurança ao Rio de Janeiro na última sexta-feira, para combater a violência que, segundo ele, contará muito a favor do presidente. Para ele, o fato desses fatos positivos não chegarem à população é revelador de que o trabalho desenvolvido pela equipe de Braga na mídia digital não estava tendo resultado.
A tática vai ser na base do o que é bom a gente mostra, o que é ruim a gente esconde: nada de falar do ainda alto índice de desemprego (13,5 milhões de pessoas) ou das projeções de redução do PIB para 2018.
“O portal brasil.gov é uma ferramenta muito importante que está sendo mal utilizada. Nós vamos mudar isso.” E emendou com um linguajar de marqueteiro. “O desafio é organizar o setor, unir a equipe, tratar o ‘portal gov’ de uma maneira competitiva, em um ambiente saudável e de espírito coletivo.” Para isso, ele pretende integrar a comunicação offline com a online. “Vamos unificar toda a comunicação governamental, e o online é ferramenta chave”, disse Mouco, em tom de celebração.
Para Mouco, será fundamental explorar a imagem de um Temer “reformador”. “O presidente não vai se reeleger. Ele quer mostrar que o seu governo é o de fazer as reformas difíceis para aplainar o terreno para que o próximo presidente possa trabalhar sem essas pedras no caminho.”
A nova estratégia não deverá apenas mostrar com tintas douradas o que já foi feito até agora, mas também defender as próximas reformas, inclusive a indigesta reforma da Previdência, que não tocou em benefícios de juízes, militares e parlamentares.
Paulista de São José do Rio Preto, Elsinho Mouco, 58 anos, é um homem moreno, magro, com a barba sempre por fazer. Um pouco antes de Temer assumir a Presidência, ele começou a ir com mais frequência a Brasília, para cuidar da imagem do futuro presidente. Com o furacão JBS, ele praticamente se mudou para a capital federal. Costuma desembarcar na cidade na terça-feira e só voltar para São Paulo na sexta à noite.
Foi ele um dos responsáveis pelo primeiro pronunciamento proferido pelo presidente logo após o escândalo da delação da JBS ter vindo à tona, quando um Temer enfático garantiu que não renunciaria ao cargo. A partir daí, Elsinho Mouco se encarregou de ajudar na preparação de todos os discursos presidenciais, além de ajudar a criar uma agenda positiva na tentativa de melhorar a imagem do presidente.
Mouco é amigo de longa data de Temer. Tão próximo que acabou sendo citado por Joesley Batista como tendo recebido propina da JBS e transferido parte do dinheiro para o PMDB. Mouco nega. Diz que tem nota de todo o serviço que prestou à JBS e que sua relação com a empresa vem desde a pré-campanha de José Batista Júnior, irmão mais velho de Wesley e Joesley, na sua frustrada tentativa de concorrer ao governo de Goiás. “Tenho tudo comprovado”, disse ele. “Vou apresentar tudo à Justiça quando eu for chamado a depor.”
A relação de Mouco com Temer vem desde 2002, quando sua empresa, a Pública Consultoria, começou a fazer a divulgação do PMDB e do político. Ele também é responsável pela criação e produção dos programas de tevê do partido, além de dar consultoria para a Fundação Ulysses Guimarães. “A decisão do presidente de me levar também para o online foi uma solução caseira”, disse. “Agora, caberá ao Moreira Franco, ao Márcio Freitas e a mim virar a imagem do governo.” A conferir.