Todos nós já rabiscamos uma folha de papel numa reunião interminável e há quem acredite que o estilo desses rabiscos diz muito sobre a personalidade de seu autor. Nos últimos anos, surgiram em leilão vários rabiscos de presidentes dos Estados Unidos como Roosevelt ou Eisenhower (ou mesmo de John Kenndy, que gostava de desenhar barquinhos).
A peça mostrada nessa página é excepcional pois trata-se de uma das poucas folhas rabiscadas por Napoleão Bonaparte que sobreviveram à destruição e chegaram até nós. O imperador anotou na folha o nome de algumas sedes de bispados europeus das regiões que dominava e dos prelados que pretendia nomear para as diferentes funções.
Seu tio Joseph Fesch, irmão de sua mãe, era padre e fora elevado a cardeal pelo papa a pedido do sobrinho. O cardeal Fesch influia pesadamente na política religiosa de Napoleão, mas existia um entendimento tácito de que qualquer sugestão do imperador seria submetida ao Papa, que teria a última palavra. È bem sabido quão difíceis foram as relações entre o Papa Pio VII e o imperador Napoleão, que foi coroado por ele na França, mas o perseguiu mais tarde e chegou a prendê-lo.
Na folha e no verso mostrados nesta página, tudo indica que Napoleão, provavelmente entediado pela reunião de nomeação dos bispos, tenha desenhado o que parece ser os contornos de um forte, assunto muito mais próximo de suas preocupações que a política religiosa. No verso, o desenho num dos cantos segue o mesmo princípio.
Na verdade, tudo que dizia respeito ao poder que exercia era de sumo interesse para Napoleão. Mas é legítimo imaginar que, como todo ser humano, tivesse suas áreas de preferência. Neste caso, a presença dos rabiscos parece indicar que talvez as nomeações religiosas não fossem para Napoleão o assunto mais fascinante.
Esse documento, de extrema raridade, foi adquirido em Paris há alguns anos por seu atual detentor e faz parte de um reduzidíssimo grupo de rabiscos hoje conhecidos de autoria de Napoleão.