Uma das mais sensacionais descobertas históricas recentes foi a identificação dos ossos de Ricardo III, o rei da Inglaterra que Shakespeare tornou célebre com a imortal peça de teatro que leva seu nome.
Ricardo III é um dos personagens mais controvertidos do passado, demonizado pela maior parte dos historiadores. Também a literatura fixou-o no imaginário popular como o grande vilão que muitos estudiosos pensam que realmente foi.
Há hoje uma ala revisionista que acredita que o rei teve também muitos méritos, mas sua mais que provável responsabilidade direta na morte de dois sobrinhos ? descobertos séculos mais tarde enterrados vivos na Torre de Londres ? é pecado suficiente para deixá-lo sem grandes chances de absolvição perante a História.
Mas muito além da discussão a respeito dos méritos relativos de Ricardo III, a descoberta de seu corpo é um verdadeiro milagre da arqueologia, notícia de merecido destaque em toda a imprensa mundial.
Enterrados logo após sua morte numa batalha em 1485, jogados numa vala comum sem caixão ou qualquer identificação, seus restos deveriam ter se transformado em pó em poucas décadas, não fosse o clima e a composição peculiar do solo nessa região.
O rei foi enterrado perto de uma abadia, o que teria ajudado mais tarde a localizar seus ossos, não tivesse a abadia sido demolida menos de cem anos após sua morte. Com isso tornou-se virtualmente impossível a localização de seus restos mortais.
Nos séculos seguintes, outras construções foram erguidas até que fosse construído no local um estacionamento.
Localizar as fundações da antiga abadia sob o local do estacionamento foi já um feito notável. Encontrar, debaixo do concreto, ossos preservados após mais de quinhentos anos é outra façanha altamente improvável. Que esses ossos tivessem características físicas semelhantes àquelas relatadas por seus contemporâneos, que o diziam corcunda, foi mais uma circunstância extraordinária.
Mas o maior milagre talvez resida na prova final da identidade de Ricardo III, que só seria indiscutível se fosse possível retirar amostras de DNA dos ossos, e se esse pudesse ser comparado com o de algum descendente. Para isso, era necessário localizar um ou mais descendentes, que tivessem mantido características do DNA transmitidas apenas pelas mulheres. Seria preciso, portanto, que nesses quinhentos anos se verificasse uma linha de descendência feminina nunca interrompida ao longo de mais de vinte gerações, o que quase nunca ocorre.
Por incrível que pareça, essa sucessão praticamente impossível de coincidências de fato aconteceu, permitindo que quinhentos anos mais tarde fosse identificado um corpo que todas as probabilidades destinavam à completa destruição e esquecimento.
O documento reproduzido nesta página é um dos raríssimos autógrafos do rei Ricardo III fora das coleções públicas. Procurados por todos os colecionadores interessados na trajetória histórica ímpar do monarca, os documentos assinados por Ricardo III são de uma raridade lendária e faltam a quase todas as grandes coleções.
Este foi assinado em 1476, sete anos antes de Ricardo se tornar rei, na sua então qualidade de duque de Gloucester, e seu conteúdo confirma os privilégios de um vassalo.
É escrito sobre pergaminho, pele de carneiro especialmente tratada para servir de suporte à escrita, e possui recortes específicos para o arquivamento do documento, segundo o sistema característico usado na época. Fez parte de coleções privadas prestigiosas desde o século XIX, e foi adquirido há dez anos num leilão na Inglaterra por seu atual detentor.