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    Flávio Dino foi tema de uma reportagem publicada logo antes de ser nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal Imagem: Evaristo Sá/ AFP

vultos da república

Cinco rostos do poder

Um ministro do Supremo, dois presidentes de partidos e outras figuras de proa que passaram pelas páginas da piauí em 2024

| 28 dez 2024_08h55
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Em agosto de 2023, Flávio Dino vivia um dilema: ser um político com tentáculos no Judiciário ou um integrante do Judiciário com tentáculos na política. Com a aposentadoria da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber se aproximando, ele era um dos cotados a assumir sua sucessão. Foi o candidato indicado ao presidente Lula por dois ministros alfa do STF: Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. E, enfim, tomou a decisão.

Dino, em fevereiro deste ano, se tornou o primeiro ex-governador a tomar posse no Supremo. Em pouco tempo se consolidou como o ministro que gosta do embate. Convidado a depor em uma Comissão de Segurança Pública do Senado produziu um episódio que virou meme rapidamente: em provocação ao senador Marcos do Val (Podemos-ES), que gosta de dizer que integra o grupo da elite da polícia americana, Dino disse: “Se o senhor é da Swat, eu sou do Vingadores”. Ao assumir o cargo no STF, o ministro deixou distante um sonho que nunca escondeu: virar presidente da República nas eleições de 2030.

A piauí publicou, em janeiro deste ano, um perfil que conta a história e a ascensão de Flávio Dino, logo antes de chegar à instância máxima do Judiciário. Para quem olha a partir de qualquer outro ponto do Brasil, o ex-governador é o retrato falado de um personagem que chegou com tudo para dinamitar a célebre tradição oligárquica da política no Maranhão. Por um lado é isso mesmo. Mas não é bem assim.

 

Um dos personagens mais influentes do ano foi Valdemar Costa Neto. A quem o perguntasse, dizia que seu partido, o PL, emplacaria até mil prefeitos nas eleições de outubro. Terminou com pouco mais da metade disso – o que, ainda assim, foi um crescimento significativo para o partido, que antes disso somava em torno de trezentos alcaides. O resultado se deve à filiação de Jair Bolsonaro, que transformou a legenda na ponta de lança da extrema direita.

“O Bolsonaro mudou a minha vida”, costuma dizer Valdemar, ex-deputado federal de 75 anos. Sua trajetória foi mesmo marcada por guinadas, como mostrou um perfil publicado pela piauí em junho deste ano. De playboy de Mogi das Cruzes, filho de um prefeito de direita, Valdemar virou o poderoso sócio de um bem-sucedido governo de esquerda. Desse patamar, despencou para o fundo do poço no escândalo do Mensalão, transformado em inquilino da Papuda. Quando se pensava que estava morto, surgiu das profundezas, na pele de presidente do maior partido político da direita radical do Brasil. Há poucas semanas, foi denunciado pela Polícia Federal no inquérito que apura a tentativa de golpe de Estado.

O bom desempenho eleitoral do PL se deve a Bolsonaro, mas não apenas. O deputado federal Nikolas Ferreira foi talvez o mais aguerrido puxador de votos do bolsonarismo. Filho de um pastor, o parlamentar de 28 anos é um fenômeno de votos e também um fenômeno digital. A pedido da piauí, a Palver, empresa de engenharia e análise de dados, examinou 80 mil grupos públicos de WhatsApp entre 10 de agosto e 9 de setembro deste ano, para medir o índice de menções a políticos da extrema direita. Nikolas desbancou todos os pesquisados – a saber, os deputados federais André Fernandes (PL-CE), Carla Zambelli (PL-SP) e Julia Zanatta (PL-SC) e o trio de irmãos Flávio, Eduardo e Carlos Bolsonaro.

 

Para a esquerda, Nikolas Ferreira pode parecer um fantasma redivivo – sua militância, que combina ações públicas a missões discretas, mimetiza o que os movimentos de esquerda faziam no passado, antes de entrar na fase menos ativa. No plano público, ele esteve no ato do Sete de Setembro, na Avenida Paulista. Saiu mais aplaudido que Bolsonaro. Nas ações discretas, promoveu um verdadeiro strike na eleição para o Conselho Tutelar de Belo Horizonte: dos 45 conselheiros, emplacou 33 – todos evangélicos.

Em sua cruzada ideológica, Nikolas Ferreira virou o garoto de ouro do bolsonarismo. A piauí contou, em um perfil publicado em outubro, como ele chegou a esse patamar.

 

Em 2022, pela primeira vez na história do Brasil, duas mulheres transgênero foram eleitas para o cargo de deputada federal. Em São Paulo, Erika Hilton (Psol) foi a nona mais votada. Em Minas Gerais, Duda Salabert (PDT), de 43 anos, ficou em terceiro lugar. O resultado foi um acontecimento de forte significado para o Brasil, país que registra uma alta taxa de homicídio contra pessoas trans. Tanto Hilton quanto Salabert estão alinhadas à esquerda desde que se embrenharam na política – inicialmente levantando a bandeira dos direitos das pessoas trans, mas depois se envolvendo em diferentes causas.

O trajeto de Erika Hilton, porém, tem uma peculiaridade: “Eu sou uma política pop”, disse a deputada, em uma reportagem publicada pela piauí em agosto. “Há uma cultura política que não cabe muito em um comportamento midiático público atual. E eu mesma não cheguei na política passando pela academia, mas porque sou uma travesti negra, crescida na periferia, que via a realidade brutal que a política impunha às pessoas e disse a mim mesma que, para transformar essa realidade, o nosso corpo e a nossa mente, eu precisava estar lá.”

 

Criador e presidente do PSD, Gilberto Kassab se sagrou o grande vencedor das eleições municipais de outubro: seu partido elegeu cerca de 900 prefeitos, superando o MDB pela primeira vez em vinte anos. Ex-vereador, ex-vice-prefeito, ex-prefeito, ex-deputado, ex-secretário e ex-ministro, Kassab criou o próprio partido e fez dele, em treze anos, a maior força municipalista do Brasil. Cresceu se equilibrando habilmente entre a direita, o centro e a esquerda. É base, ao mesmo tempo, do governo Lula e do governo Tarcísio de Freitas. O importante é estar no governo.

Apesar da fama de articulador contumaz, Kassab é um homem pacato. Nasceu em Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, e, aos 64 anos, ainda mora no mesmo bairro. É afeito às tradições familiares. Estudou no Liceu Pasteur, onde seu pai atuou como diretor até falecer, em 2009. Hoje, Kassab é presidente da fundação que administra o colégio. Desde que nasceu, é sócio do Esporte Clube Pinheiros, onde jogava bola quando criança (era zagueiro). Vai ao clube todas as manhãs para uma caminhada. Não é um ás da retórica, nunca levanta a voz e parece se retrair sempre que toca num assunto controverso, como se não quisesse ser ouvido. Caminha desengonçado e veste ternos largos.

Na edição de novembro, a piauí perguntou a Kassab quais são suas ambições. Sentado na poltrona de seu escritório, ele respondeu de bate-­pronto, antes que a pergunta fosse concluída: “Eu quero preparar o PSD para ter, o mais breve possível, um candidato próprio à Presidência.” Logo esclareceu: “Não tem pressa.” É preciso ter objetivos, disse Kassab, e não só ganância por cargos. Mas completou: “Queremos estar no poder, com bons cargos, para ficar duzentos, trezentos anos na política brasileira.” 

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