A cidade de Belterra, no Pará, ganhou seu primeiro hospital em 1938, criado para atender os funcionários do projeto do industrial americano Henry Ford para explorar borracha na região. Em 1992, sucateado pela falta de recursos, o hospital foi desativado. Era a única instituição de saúde que atendia os moradores de Belterra. Só cinco anos depois, a cidade conseguiu construir seu primeiro posto de saúde, graças aos recursos de uma iniciativa relativamente recente: o Sistema Único de Saúde (SUS).
A história de Belterra é contada na primeira reportagem da série “O complexo”, que a piauí começa a publicar na edição deste mês. A série – que conta com o apoio da Umane, uma associação civil sem fins lucrativos que apoia iniciativas sobre saúde pública – vai traçar um amplo panorama de uma das maiores conquistas da democracia brasileira: o SUS.
Ao longo do século XX, o sistema de saúde do Brasil adotou múltiplos modelos, escreve Rodrigo de Oliveira Andrade. Na década de 1920, havia as caixas de aposentadorias e pensões, as chamadas CAPs, que reuniam trabalhadores por empresas e eram financiadas por patrões e empregados. Na década seguinte, surgiram os Institutos de Aposentadorias e Pensões, os IAPS, que passaram a reunir trabalhadores por categoria profissional, com uma novidade: além de patrões e empregados, o governo também passou a financiar o sistema, encarregando-se de sua administração.
Essa estrutura voltou a ser alterada na ditadura militar, que unificou todos os IAPS em um único órgão: o Instituto Nacional de Previdência Social, o antigo INPS. Com isso, todos os trabalhadores passaram a ter o mesmo sistema de previdência e saúde. Nos anos 1970, o governo acabou com o INPS e criou o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência (Inamps), introduzindo uma mudança inédita: pela primeira vez, separou as ações de previdência e as ações de saúde.
Todos esses modelos, porém, tinham uma característica comum: atendiam só os trabalhadores formais e seus dependentes, o que à época correspondia a menos de 30% da população brasileira. Quem não tivesse carteira assinada, ou não fosse dependente de um trabalhador formal, tinha apenas duas opções: pagava pelos serviços de saúde ou recorria às instituições de caridade, como as Santas Casas.
A Constituição de 1988 mudou tudo isso ao criar o SUS. Com ele, o atendimento de saúde no Brasil passou a ser um dever do Estado, gratuito e aberto a todos, empregados ou desempregados, sem distinção de qualquer natureza. Para os brasileiros mais abastados, o SUS não fez diferença alguma. Para os assalariados com carteira assinada, fez alguma diferença, na medida em que lhes oferece serviços que seus planos de saúde não cobrem. Para os pobres e desempregados, fez toda a diferença.
Assinantes da revista podem ler a íntegra da reportagem neste link.