A pandemia atingiu em cheio o emprego dos brasileiros, que passaram a trabalhar por conta própria para conseguir botar comida na mesa. No final de 2021, o número de ocupados era 0,2% maior do que no final de 2019, enquanto os trabalhadores por conta própria haviam crescido 6,6%, segundo dados do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Mas, se o trabalho por conta própria cresceu na pandemia, também ficou mais precarizado. O rendimento médio de quem se tornou autônomo durante a crise sanitária é 69% do recebido por quem já trabalhava dessa forma antes. Junto com a remuneração, a proteção social também ficou menor. No final de 2021, três em cada quatro trabalhadores autônomos não tinham CNPJ e nem contribuíam com a Previdência Social. O =igualdades desta semana faz um raio X no trabalho por conta própria no Brasil.
De acordo com dados do quarto trimestre de 2021, o rendimento médio dos trabalhadores autônomos que começaram a trabalhar nessa posição em 2020 e 2021 equivalia a 69% do recebido por aqueles que estavam nessa condição há dois anos ou mais. Para quem começou a trabalhar por conta própria antes da pandemia, o rendimento médio era maior de R$ 2 mil – e quem começou durante a crise sanitária recebia R$ 1,4 mil.
Para recuperar uma ocupação durante a pandemia, os cidadãos estão recorrendo ao trabalho por conta própria como alternativa. A remuneração é mais baixa que na época pré-pandemia, o que também dificulta a contribuição à Previdência. No quarto trimestre de 2021, 74% dos trabalhadores autônomos que passaram a essa condição até dois anos não tinham CNPJ e não contribuíam com a Previdência Social. Já para quem está nessa condição há mais de dois anos, o percentual é menor – 58%.
Os trabalhadores no setor privado sem carteira assinada, em 2016, representavam 22%, em 2020, 25% e, em 2022, passaram a 26%. Com o passar dos anos, cada vez menos pessoas têm a garantia de um contrato formal de trabalho. O percentual de empregados com carteira de trabalho assinada no mesmo setor neste ano mostrou cenários distintos: as Regiões Norte (59,9%) e Nordeste (56,9%) apresentaram números inferiores aos das demais regiões. Por outro lado, a Região Sul (83,0%) atingiu patamar superior.
Durante a pandemia, as pessoas que começaram algum trabalho por conta própria eram aquelas com menor grau de qualificação – principalmente se comparado aos mais antigos. É o caso de vendedores dos comércios e mercados, operadores de instalações e trabalhadores elementares – categoria que vai desde servente de pedreiro a ajudante de limpeza. Quem tinha maior grau de qualificação teve dificuldade de começar o trabalho de forma autônoma durante a crise sanitária. Profissionais das ciências e intelectuais representavam menos de 10% dos trabalhadores por conta própria após 2020.
O abismo das desigualdades de gênero e raça no país evidencia a diferença de rendimento médio: o total recebido por mulheres negras no trabalho por conta própria, tanto antes da pandemia quanto durante, foi menor entre todas as categorias de trabalhadores. Uma mulher negra que começou a trabalhar como autônoma depois de 2020 recebia metade do rendimento médio de um homem branco: R$ 994 para elas, em média, em comparação com R$ 1.924 para eles. Essa desigualdade já existia e era até um pouco maior antes da crise sanitária: há dois anos ou mais, homens brancos recebiam R$ 2.864, mulheres brancas, R$ 2.368, homens negros, R$ 1.671, e mulheres negras, R$ 1.242.
Com o desemprego batendo à porta durante a pandemia, novas opções foram surgindo como forma de sobrevivência. Os motoboys foram uma delas. De 502 mil condutores de motocicletas, cerca de 40% estavam há menos de dois anos trabalhando sobre duas rodas por conta própria.
Trabalhadores de alojamento e alimentação eram 6,2% do número de trabalhadores por conta própria, segundo menor setor de atividade, antes da pandemia, e passaram a ser 10,6% após 2020. Foi também o setor que mais apresentou a entrada de autônomos durante a pandemia: dos 1,9 milhão de trabalhadores por conta própria em alojamento e alimentação, 647 mil (34%) começaram no período da crise sanitária. De acordo com o economista Gustavo Monteiro, acredita-se que parte dos autônomos tenha apostado em pequenos empreendimentos na área da culinária para driblar o desemprego. Por outro lado, o setor da agricultura, entre os autônomos, apresentou a menor entrada de trabalhadores por conta própria durante a pandemia: apenas 10% dos trabalhadores ingressaram no setor após 2020.
Fonte: Dieese/Pnad