A cela em que Eduardo Cunha está, na superintendência da PF em Curitiba, foi escolhida segundo um critério interessante: fica na ala dos considerados não colaboradores, ou não delatores, onde também está o ex-ministro Antônio Palocci. A carceragem paranaense tem uma segunda ala, onde os federais colocam os que chamam de colaboradores ou potenciais colaboradores, onde hoje estão Marcelo Odebrecht e o doleiro Alberto Youssef, o primeiro delator da Lava Jato. Se depender da vontade de Cunha, porém, logo ele mudará de categoria e de ala – o que, no dia a dia da carceragem, denota uma espécie de promoção. Na parte reservada aos colaboradores, os presos conseguem, por exemplo, saber o que está passando no Jornal Nacional, pois ter uma tevê na cela fez parte do acordo de delação de Youssef. Todas as noites, o doleiro aumenta o volume da tevê na hora das chamadas principais do telejornal, de modo que os colegas delatores saibam do que se está falando. Antes mesmo de ser preso, Cunha já discutia com seus advogados a hipótese de fazer uma delação premiada. Ele imaginava que o dia de hoje pudesse chegar, e desenhou cenários e estratégias que serão postos em prática a partir de agora.
Tem sido muito difundido que o principal obstáculo a uma possível delação de Eduardo Cunha é a resistência do Ministério Público. É verdade que, na Lava Jato, Cunha rivaliza com Marcelo Odebrecht no topo do ranking de desafetos. Entre os investigadores, a vontade de fechar um acordo com o ex-presidente da Câmara é nula. Mas… e se ele entregar informações relevantes sobre Michel Temer, Renan Calheiros, Moreira Franco e companhia, como vinha deixando vazar aqui e ali nos últimos tempos? Foi o que perguntei, agora há pouco, a um dos investigadores que trabalha em processos relativos ao ex-deputado. A resposta: “Aí vai ficar difícil resistir.”
Nos bastidores da política, aquela zona cinzenta onde transitam os personagens que movem as peças dos grandes escândalos, Cunha é reconhecido pelo hábito de montar alentados dossiês sobre aliados e adversários, e pela truculência com que se vinga dos que cruzam seu caminho. Ele gosta de briga e tem muito pouco a perder. Por isso, gente que o conheceu na intimidade, no auge do poder, acha que, a depender do andar da carruagem, pode não ser necessário nem mesmo um acordo para que em depoimentos espontâneos ele comece a jogar lama em algumas figuras. Esse é um jogo de xadrez que só está começando, portanto é impossível prever o que vai acontecer. É razoável, porém, imaginar que muita gente hoje vai ter uma noite mais intranquila do que a dos colegas de ala de Eduardo Cunha.