Na terceira reportagem da série O complexo, sobre o SUS, Tiago Coelho conta na piauí deste mês como três famílias se relacionam com o sistema público de saúde. Uma delas é a família da auxiliar de enfermagem Mariana Alline Fernandez Silva, de 28 anos, composta por seu marido, o filho de 1 ano e sua avó materna de 92 anos. Eles vivem na Vila Ema, em São Paulo, e não têm plano de saúde privado, situação comum a 150 milhões de brasileiros.
Foi graças ao atendimento do SUS que Silva descobriu que seu filho é APLV – alérgico à proteína do leite de vaca. Por essa razão, só pode receber vacinas sem essa proteína. Um funcionário da Unidade Básica de Saúde (UBS) onde ela é atendida tem conhecimento das marcas de vacinas que não levam componentes do leite. “Eu fico muito aliviada”, conta Silva. O menino também recebe pelo SUS uma fórmula infantil especial, já que não pode tomar leite. O sistema de saúde dá para Miguel dez latas do produto por mês. “A UBS me atende em todas as áreas que eu preciso. Por isso eu não faria plano de saúde nesse momento”, diz.
O SUS também foi providencial depois que a avó materna de Silva se mudou para a sua casa. Por causa da insuficiência cardíaca, a idosa necessita de cilindros de oxigênio de uso doméstico. “Minha avó se cansa com facilidade. De repente, sente falta de ar, e a gente precisa colocar o cateter nasal acoplado ao oxigênio para ela respirar melhor. É o SUS que fornece.” Todo mês, a equipe da UBS vai até a casa de Mariana Silva conferir se está tudo certo com os cilindros. Aproveita para medir os sinais vitais da senhora de 92 anos e verificar a medicação. As fraldas geriátricas também são oferecidas pelo sistema de saúde. “Eles mandam pelo correio”, conta Silva.
No relacionamento das famílias com o SUS, um personagem central é o agente comunitário de saúde. Ele faz parte da equipe do programa Estratégia Saúde da Família, cujas equipes multidisciplinares atendem 44 milhões de domicílios. O cadastro de cada família, feito pelo agente comunitário, é o primeiro passo para o acompanhamento pela equipe do SUS.
Na Vila Ema, o agente comunitário Edivan Silva visita regularmente 240 famílias que já cadastrou, focando sua atenção nas crianças, nos idosos, nas gestantes e nos portadores de doenças crônicas, como diabetes e hipertensão. Munido das informações colhidas durante as visitas periódicas às casas, ele se reúne três vezes por semana com o restante da equipe do Estratégia Saúde da Família – um médico da família, um enfermeiro e um técnico em enfermagem – para discutir ações e medidas a serem tomadas.
O passo seguinte é dado pelo médico, que avalia o estado de saúde das pessoas da família. “O agente de saúde faz o questionário voluntário de doenças, que é muito peculiar, porque o paciente declara o que quer. Mas, quando as pessoas chegam à minha sala, tenho que aprofundar os detalhes colhidos”, explica a médica de família Patricia Molina.
No bairro Aeroporto, em Teresina, a cuidadora de idosos Francisca Moraes Cardoso, de 63 anos, contou que todo o atendimento de sua mãe, que morreu aos 89 anos, foi feito pelo SUS. “Sinto que as coisas melhoraram”, diz Cardoso. “Antes do SUS, o hospital do Inamps só tinha clínico geral. Faltavam muitas especializações. A gente ia lá tomar algum remédio, uma Benzetacil, por exemplo, e demorava muito para ser atendido, mais do que hoje.” O Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) foi um sistema público de saúde, mas que atendia apenas as pessoas inseridas no mercado formal de trabalho.
Ao contrário de Cardoso, que recorre exclusivamente ao SUS, sua primogênita, a zootecnista Michele Moraes, de 41 anos, e os dois filhos dela têm plano de saúde – e se equilibram entre as vantagens do serviço público e as do privado. “Meu filho teve meningite bacteriana quando estava com 3 anos, mas o plano não cobria. Então, ele foi internado no Centro Integrado de Saúde Lineu Araújo, um hospital municipal. A doença deixou sequelas neurológicas, não fixas, que fizeram com que ele tivesse atraso no desenvolvimento”, conta Michele. Esses problemas demandaram tratamentos com terapias que o plano de saúde também não cobria, mas o SUS cobriu. “Seria inviável eu pagar todo o tratamento. Tive que pagar apenas o fonoaudiológico, porque o SUS na época não tinha profissional nessa área.”
A série O complexo conta com o apoio da Umane, uma associação civil sem fins lucrativos que apoia iniciativas sobre saúde pública.
Assinantes da revista podem ler a íntegra da reportagem neste link.