Na manhã da última quarta-feira, em Brasília, um senador do PSDB conversava com um deputado, também tucano, sobre o PMDB. Tirou o celular do bolso e leu uma piada que vira na internet: “O PMDB é aquela mãe que deixa um filho em cada fila de caixa no supermercado. Para a que andar primeiro, ela vai…”.
Na mesma quarta-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB de Alagoas, marcou presença em pelo menos três filas. Começou o dia recebendo o ex-presidente Lula num café da manhã, passou pelo Palácio do Planalto à tarde para falar com a presidente Dilma Rousseff e entrou madrugada adentro jantando na casa de Tasso Jereissati. Estavam lá as cúpulas do PSDB e do PMDB no Senado. Aécio Neves, José Serra, Cássio Cunha Lima, Aloysio Nunes e o próprio Jereissati representavam os tucanos. Os peemedebistas Eunício Oliveira e Romero Jucá acompanhavam Calheiros.
Sobre o encontro com Lula, o senador alagoano deu a entender que o ex-presidente está propenso a dialogar com a oposição para baixar a temperatura da crise. Sobre Dilma, o parlamentar relatou ter sido duro com ela. Instigou-a a ouvir e se comunicar mais. Reclamou que o governo não conversa com o Legislativo, nem com o Judiciário e muito menos com as ruas. Dilma teria lhe respondido que está disposta a negociar.
Quando os senadores tucanos decretaram que o governo da presidente “já deu”, Calheiros concordou, mas não se alongou no assunto, fazendo jus à fama de esfinge. Ele costuma escutar mais do que fala e é capaz de negar um pedido sem dizer não. Ainda que discretamente, defende a ideia de um semiparlamentarismo – Dilma seguiria à frente do Executivo, só que passaria a compartilhá-lo com um primeiro-ministro. Seria a solução menos traumática.
Renan Calheiros foi um dos primeiros senadores do PMDB a apoiar Lula depois que o petista chegou à presidência da República. Ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, esteve ao lado do candidato José Serra nas eleições de 2002. Bem antes, no começo da carreira, ajudou a botar de pé a candidatura de Fernando Collor, mas se viu traído pelo aliado quando disputou o governo de Alagoas. Mal o Esquema PC estourou, virou algoz e deu entrevista à revista Veja implicando Collor no caso: “PC é uma extensão do presidente”. Não apenas escapou do escândalo como acabou absolvido pelo governo seguinte, de Itamar Franco, e foi nomeado vice-presidente executivo da Petrobras Química. Ladino, sempre acertou qual fila de caixa andaria mais rápido.
Figurando entre os principais interlocutores do governo federal no Congresso, Calheiros ensaiou uma ruptura com Dilma no início do ano passado, após ter recebido o aval dela para se eleger presidente do Senado. Estava furibundo com a Procuradoria-Geral da República, que acabara de pedir a abertura do primeiro inquérito da Lava Jato contra ele. No entanto, as arestas logo se apararam e o alagoano voltou a ser o fiador da governabilidade.
“Ninguém lhe afirmará isso abertamente, mas Renan só permanece ao lado de Dilma para ficar protegido da Lava Jato”, me disse um senador da oposição. Outro senador, aliado do presidente do Senado, classifica Calheiros como “a última trincheira do governo dentro do PMDB”. Acredita, porém, que, cedo ou tarde, ele acabará se unindo à maioria da legenda: “Esse governo já morreu, e só quem ressuscita é Jesus Cristo”.
Um tucano que jantou na casa de Tasso Jereissati brincou com Calheiros: “Café com o Lula, chá da tarde com a Dilma e jantar com a oposição… Você está bem, hein?”. O presidente do Senado aproveitou a deixa e retrucou: “Mas é aqui, entre vocês, que me sinto mais confortável”. A resposta, simpática e política, também confirma outra avaliação que se faz no Congresso: Calheiros e o PMDB não estão propriamente “desembarcando do governo”, como dizem a oposição e a imprensa. Estão apenas se posicionando para participar do próximo.