O centenário de Rubem Braga mostrou que as duas décadas passadas desde sua morte não lhe trouxeram o progressivo esquecimento que é o destino da maioria dos cronistas.
Seu anedotário é infinito, mas nesse centenário ? que encheu as paginas dos jornais do Rio e de São Paulo – seu apartamento de cobertura na rua Barão da Torre, em Ipanema, onde recebia os amigos, foi um dos assuntos mais evocados, assim como as noites de muita bebida e boa conversa.
Dois documentos permitem evocar aqui a figura de Rubem Braga.
O primeiro, uma carta dirigida em 1967 a Newton Freitas (a quem Braga chamava alternadamente de Zico ou tio) na qual recomenda Ana Maria Ribas, (falecida no ano passado) como uma “flor de moça” e onde Braga pede a Zico: “Trate-a bem, e a apresente a gente boa. Seja cavalheiro!”
Três grandes amigos, Cícero Dias, João Leite e Arnaldo Pedroso d´Horta, que moram fora do Rio de Janeiro, o visitam no momento da carta, e Braga, que os acompanha boa parte do tempo, comenta a que ponto teve que “adaptar” sua rotina: “Imagine o trabalho que não tenho tido. Sou obrigado até a beber para esquecer”.
Em seguida, evoca a possibilidade de nomeação de seu amigo como adido cultural em Madri, e promete falar com o então Ministro das Relações Exteriores, o politico mineiro José de Magalhães Pinto.
Braga fecha a carta mandando “muitas saudades do velho sobrinho” e deixa sob sua assinatura o famoso endereço da cobertura de Ipanema.
O outro documento data dos últimos meses de sua vida e foi evocado na crônica que Arnaldo Jabor dedica em forma de carta ao centenário de seu amigo, intitulada “Caro Rubem Braga”. No último parágrafo da “carta” que manda a Rubem Braga por seus 100 anos, Jabor diz: “Depois, você morreu. Soube emocionado que você contratou a própria cremação – foi a São Paulo e o funcionário perguntou: "Pra quem é?" "Para mim mesmo", respondeu você, poeta macho”.
A tal declaração foi de fato preenchida por Rubem Braga num formulário oficial de São Paulo, quatro meses antes de sua morte e o original está reproduzido nesta página.
Depois da menção impressa “São Paulo”, no formulário, o escritor insiste em escrever “Rio”, em sua letra.