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    Ilustração de Paula Cardoso

questões epidemiológicas

Sars-Cov-2 dura mais na umidade

Físicos demonstram que vírus permanece ativo por mais tempo em ambientes onde gotículas infectadas demoram a evaporar

Camille Lichotti | 09 jun 2020_12h00
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Um estudo do American Institute of Physics relaciona condições climáticas com a permanência no ambiente do Sars-Cov-2, causador da Covid-19, e mostra que a taxa de crescimento da doença foi maior em cidades mais úmidas, onde as gotículas respiratórias de pacientes infectados demoravam mais a evaporar. As gotículas carregadas de vírus são expelidas quando uma pessoa infectada tosse ou espirra, por exemplo. Quando as gotículas secam, o vírus rapidamente é eliminado. Por isso, a transmissão da Covid-19 está diretamente relacionada ao “tempo de duração” dessas partículas. Segundo o estudo, o tipo de superfície em que as gotículas se acumulam, a temperatura ambiente e a umidade relativa do ar interferem diretamente na manutenção do vírus no ambiente. O trabalho, realizado por físicos indianos, foi publicado nesta terça no site do Instituto. A pesquisa foi realizada em seis cidades diferentes, com condições climáticas distintas – Nova York, Chicago, Los Angeles, Miami, Sydney e Singapura. Nas cidades mais úmidas, o tempo até a evaporação das gotículas foi maior, o que aumentou as chances de permanência do vírus nas superfícies e, consequentemente, as chances de contágio. 

Apesar de não ser o único, o clima se mostrou um fator importante no aumento do número de casos de coronavírus. Outro estudo publicado no dia 18 de maio na revista Science indicou que, sem medidas efetivas de controle, surtos mais severos de coronavírus eram mais prováveis em regiões úmidas e – diferente do que muitas pessoas acreditavam – o calor tropical não impediria a escalada do número de casos. 

Uma pesquisa realizada em maio pela Universidade Federal de Pelotas testou a presença de anticorpos para o Sars-Cov-2 em mais de 25 mil pessoas em todo o Brasil. Além de indicar um número de casos sete vezes maior que o oficial, a pesquisa mostrou que, das quinze cidades com mais de 2% da população infectada, onze eram da região Norte – a mais úmida do país, por causa da Floresta Amazônica, que abrange pelo menos nove estados brasileiros. Foi justamente lá, ao longo de 2 mil km do rio Amazonas, que os pesquisadores da UFPel encontraram um cluster formado pelas cidades com a maior taxa de prevalência do vírus: Castanhal, Belém e Breves, no Pará, Macapá, no Amapá, Manaus e Tefé, no Amazonas. 

A região Norte apresentou também uma rápida escalada na proporção de casos e mortes por Covid-19, enquanto a curva da doença nas regiões mais secas do país, como o Centro-Oeste, foi mais lenta. Os dados oficiais do Ministério da Saúde mostraram que, na oitava semana após a confirmação do primeiro caso, o número de casos por milhão de habitantes na região Norte era quase cinco vezes o do Centro-Oeste. É um cenário parecido com o encontrado pelos pesquisadores. Enquanto alguns municípios do Norte apresentaram altas taxas de prevalência – como Breves, no Pará, com 25% dos habitantes com anticorpos –, as cidades do Centro-Oeste visitadas pela pesquisa não apresentaram nenhum habitante com anticorpos para o coronavírus. Para os pesquisadores, isso representa o quão heterogênea é a epidemia no Brasil.

Os fatores ambientais, como a umidade, dão uma pista importante sobre o comportamento do novo coronavírus e os efeitos da pandemia. Mas, segundo o virologista Anderson Brito, pós-doutorando na Universidade de Yale, isso não é tudo. “A principal forma de contágio do novo coronavírus é o contato direto de pessoa para pessoa”, explica. Segundo Brito, a transmissão indireta através do contato com as superfícies existe, mas não é a principal via de contágio. 

Para ele, existem outros fatores que ajudam a entender o impacto da epidemia nas diferentes regiões. “É preciso pensar no modo de vida das pessoas, se elas têm condição de fazer isolamento social, se elas entendem o que é um vírus ou o que é preciso fazer para se proteger. Será que aquela pessoa no interior do Norte sabe quais são os protocolos de segurança ou pode colocar o distanciamento social em prática?”, questiona. “A dinâmica de transmissão de uma doença é muito complexa.” 

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