Nas duas últimas semanas, Caio Piovesan, produtor da cantora Karol Conká, marcou reunião com jornalistas especializados em gestão de crise. O objetivo era traçar planos e estratégias para conter a crise então em curso à medida que a cantora se envolvia em brigas e intrigas no Big Brother Brasil. Quando ela fosse eliminada, já teria opções de nomes e caminhos para apresentar a ela. Karol foi eliminada do programa na terça, 23, com recorde de rejeição em um paredão triplo, com 99,17% dos votos.
Piovesan viajou de São Paulo ao Rio de Janeiro na segunda, 22, e estava nos Estúdios Globo quando Karol foi eliminada. O canal permite apenas uma pessoa para resgatar o eliminado – parentes e amigos não estão indo ao estúdio por questões sanitárias. A emissora nega que a cantora tenha sido orientada por qualquer pessoa da produção entre a saída do confinamento e a entrevista dada ao apresentador Tiago Leifert, ao vivo. Segundo a emissora, o intervalo comercial entre uma coisa e outra se deu pela enorme demanda do mercado publicitário. No dia da eliminação de Conká, o BBB bateu pico de 38 pontos de audiência (2,9 milhões de domicílios ligados no programa) na Grande São Paulo; no Rio, chegou a 40 pontos – uma audiência gigante e há muito não vista pelo reality. Minutos depois, na entrevista dada ao site da casa GShow, a cantora foi poupada da exibição de seu perfil no Instagram. É praxe abrir essa rede social para causar surpresa – positiva! – com o ganho de seguidores do participante. Karol sofreu o efeito contrário (ela entrou no BBB com 1,5 milhão de seguidores, passou a 1,8 mi; saiu de lá com 1,2 mi).
Nunca na história houve uma edição de BBB como a atual. Primeiro, pelo faturamento. A propaganda de veiculação nacional de trinta segundos no BBB custa 508 mil reais pelo valor de tabela. Uma ação de merchan sai por 1,2 milhão de reais quando mostrada ao vivo (mais 15% de cachê ao apresentador Tiago Leifert e custos de produção).
Um levantamento feito pela consultoria de dados Arquimedes a pedido da piauí mostra que o BBB é o assunto mais falado no Brasil, a despeito da crise da pandemia de Covid-19, com 251.661 mil mortos no país (até 25/2), do desemprego, da crise política e das finais do Campeonato Brasileiro, encerrado nesta quinta-feira. No último mês, o termo “Big Brother Brasil” obteve 77 milhões de menções no Twitter. Só o participante Gilberto alcançou 20 milhões na mesma rede social. Depois, pela ordem em citações, estão Karol Conká (7 milhões), Jair Bolsonaro (6,5 milhões), Flamengo (5,5 milhões) e Vacina (4,5 milhões). “O país atravessa o auge da pandemia, com escalada de mortes e novas variantes do vírus em circulação, além de viver a reta final do Campeonato Brasileiro, sendo que o futebol desde sempre ocupa destaque no Twitter. Tudo somado acaba sendo fichinha comparado ao impacto do Big Brother nas redes sociais”, diz Leonardo Barchini, consultor da Arquimedes e pesquisador do Cepesp – o Centro de Estudos em Política e Economia do Setor Público da FGV.
Nas redes, falou-se de muita coisa – mas nada se comparou ao BBB. E a rejeição à cancelada Karol Conká, iniciada por suas atitudes no programa, foi inflamada por esse efeito de multiplicação das redes.
Chegou a hora de juntar os cacos.
Nas conversas do produtor de Karol Conká com os especialistas em recuperação de imagem, houve sugestões unânimes para acionar a “operação descancelamento”: pedir desculpas, assumir erros, reconhecer precisar de ajuda. Ainda que sejam metas reais, estão também dentro do objetivo de estabelecer empatia. Ou, para ficar numa expressão muito usada por Lumena, “trazer acolhimento”.
Na noite da eliminação, a apresentadora global Ana Maria Braga escalou pessoas de sua equipe para ver todo o paredão e os desdobramentos dentro do BBB. No dia seguinte, chegou ao estúdio com um relatório elaborado, com tudo apurado para entrevistar Conká por volta das 9h30. Ana Maria, que adora o reality, nega qualquer interferência do canal para pegar leve com a eliminada. Fez as perguntas que tinha de fazer (sobre a grosseria com o participante Lucas, o temperamento explosivo com Carla Diaz e o ciúme dela em relação a Bil, outro integrante do reality). Conversou sobre amenidades, como os looks de Karol, e terminou mostrando um clipe da cantora. A entrevista deu pico de 18 pontos de audiência em São Paulo no momento em que Karol seguiu a linha vislumbrada pelos gestores de crise (ela já tinha conversado com Piovesan neste momento) e se penitenciou: “Eu sabia que estava errada e fui invadida por uma amargura. Eu me perdi no jogo, me entreguei a esse lado azedo. Sou a nova Carminha, Nazaré (as vilãs das novelas Avenida Brasil e Senhora do Destino), mas a vilã que vocês viram não é real do lado de fora. Eu surtei dentro da casa, me despertaram demônios, reconheço o meu erro e vou tentar melhorar.”
A Globo adotou o silêncio absoluto sobre o caso Karol Conká. Exigiu que as equipes da emissora e da cantora não falem nada sobre a estratégia de reconstrução de imagem. É consenso que a cantora precisa ser descancelada, e que toda ação deve passar pela Globo. A emissora não irá pagar por gestores de crise ou algo do tipo, mas estará na trincheira para ajudá-la. O empresário de outro confinado falou à piauí sob condição de anonimato: “Se a Globo fizer a gestão de crise da Karol, todos os outros participantes vão querer o mesmo tipo de serviço.” Procurada pela reportagem, a emissora se limitou a responder por sua assessoria de imprensa: “Todos os participantes recebem o apoio necessário quando eliminados do BBB.”
A reinvenção de Karol é questão fundamental para o programa. Na edição deste ano, o BBB contou com famosos relevantes. Caso de Projota (suas músicas já foram trilhas de novelas e séries), Karol Conká (apresentava programa de beleza no GNT), Fiuk (nasceu famoso por ser filho de quem é), Carla Diaz (estreou na tevê aos 4 anos) e Viih Tube (11 milhões de inscritos em seu canal no YouTube). Se Karol não se reerguer, corre o risco de só restarem subcelebridades para a edição de 2022. Artistas e seus empresários não podem se sentir abandonados.
A “onda do cancelamento” acabou gerando também a “onda da empatia”. Redes e mercado publicitário surfaram as duas. Na terça do paredão de Karol Conká, minutos antes da eliminação, a cantora Preta Gil postou em seu perfil no Twitter: “Não concordei com as atitudes da Karol no #BBB21. Mas também sempre questionei, a propagação de ódio e cancelamento é [sic] o caminho? Espero que ela aprenda com os erros e seja mt feliz. O que vcs acham, “@pequenalo, @thelminha e @amstel? #BebacomModeracao #AmstelNoBBB #Publi
A cervejaria Amstel, além de patrocinar o BBB, é cliente da Mynd, empresa de publicidade e agenciamento da qual Preta é sócia, ao lado de Fátima Pissarra. A Mynd tem em seu casting as influenciadoras Thelminha, vencedora do BBB20, e Pequena Lo. A ação publicitária foi criticada nas redes, que falaram em mercantilização do “bom mocismo” e tentativa de lucrar com a empatia. O termo “publi” virou trending topics do Twitter. Questionada pela piauí, a Amstel informou não ter pedido autorização a Karol Conká por ter usado o caso dela para fazer propaganda nem ter pago cachê para a cantora eliminada.
“A ação faz parte da estratégia da marca com o patrocínio no BBB, que é de gerar conversas dentro dos valores que temos em nossa essência como diversidade, tolerância e autenticidade. Para reforçar essas mensagens, temos um Time da Diversidade formado por influenciadores que humanizam e tangibilizam aquilo que acreditamos, já que por meio da vivência de cada um deles podemos gerar conversas conectadas ao posicionamento da marca. Vale reforçar que o indicativo #publi nas postagens é feito para sinalizar que há uma parceria entre o influenciador e a marca, e mostrar a nossa transparência com o público. Essa é uma regra imposta pelo Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), o que não significa dizer que o conteúdo do influenciador não reflete seu posicionamento próprio, ao contrário, mostra que compartilhamos das mesmas opiniões”, explicou a cervejaria à piauí, via assessoria de imprensa.
Karol Conká ainda não decidiu quem será seu gestor de crise. A Sony, sua gravadora, neste momento não vai participar dessa reconstrução de imagem – que, diga-se, em nada tem a ver com o lado cantora da artista. Especula-se que ela deve deixar as redes por um tempo para, ao retornar, poder dizer que aprendeu com a experiência. Com a onda de artistas pedindo empatia, entre eles Neymar e Anitta, Karol soma agora os mesmos 1,5 milhão de seguidores do longínquo tempo em que entrou no BBB, há um mês.
A cantora precisará de media training quando decidir deixar o casulo. Em entrevista ao Multishow, parte do contrato com a Globo, ainda que serena e falando em aprender com seus erros, soltou um “tenho amigos do Nordeste” quando confrontada por fazer graça com o sotaque da paraibana Juliette. Na tarde de quinta-feira (25), por volta das 15 horas, Karol Conká pegou a Rodovia Presidente Dutra para voltar à cidade de São Paulo e ver sua família. Ela escolheu viajar de carro para evitar possíveis constrangimentos ao circular em aeroporto e entrar em avião.