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    João Doria e Ciro Gomes - Intervenção de Amanda Gorziza em fotos de Eduardo Knapp e Ricardo Borges/Folhapress

questões de mídia e política

Doria x Ciro, o duelo pelo terceiro lugar

O que funciona ou não nas estratégias de quem se vende como “alternativo”

Pedro Bruzzi e Leonardo Barchini | 18 jun 2021_19h19
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Era uma quinta-feira (17) em que os três principais podcasts matinais falaram da (ausência da) terceira via. Mais uma desistência no campo dos nem Lula nem Bolsonaro era digerida, e a escassez de candidatos para enfrentar a “polarização” mexia com o ânimo dos analistas.

Mais tarde, Ciro Gomes anunciou em suas redes a participação em uma conversa com Leda Nagle, muito identificada com bolsonaristas, no Instagram. “Encontro com vocês lá”, foi a mensagem para a “Turma boa”, como o pedetista costuma chamar seus apoiadores.

Já Doria acenava para o recém-expulso do DEM Rodrigo Maia, também no Twitter, que agradecia ao governador tucano por ter sido recém vacinado. #VacinaPraTodos foi a hashtag utilizada pelo mandatário paulista ao agradecer as palavras de Maia. “Vacina” é o tema central, como não poderia deixar de ser, nas suas redes.

 

Após a hecatombe causada pela decisão do STF de tornar Lula novamente elegível, anulando suas condenações e devolvendo seus processos à estaca zero, o próximo pleito presidencial ficou dividido entre o ex-presidente petista e Bolsonaro. Segundo as pesquisas atuais, os dois candidatos só precisam tocar a bola de lado para chegar ao segundo turno. Enquanto isso, os aspirantes à chamada terceira via parecem estar numa espécie de segunda divisão no ano pré-eleitoral, se levarmos em conta a intenção de votos nessas mesmas pesquisas. 

A história mundial das eleições mostra uma inconteste vantagem do incumbente, aquele que está no poder e busca a reeleição. É sempre um ponto importante a ser considerado, dado o controle da máquina, do orçamento e de cargos, entre outros fatores. Claro que saber usar o sistema a seu favor é fundamental, e talvez seja esse o maior desafio de Bolsonaro. Ainda assim, o vento sopra a favor, enchendo sua vela, aumentando virtualmente o espaço no teto de gastos via inflação, apreciando o real frente ao dólar, agradando os rentistas com aumento da Selic e anunciando incremento no bolsa família, mesmo que fora do previsto no orçamento.

Do outro lado, Lula apresenta resiliência impressionante. Ainda em 2018, mesmo estando preso, conseguiu uma transferência de votos inimaginável a Fernando Haddad. E, após tudo o que passou, com grande desgaste de sua imagem junto ao eleitor, segue liderando as pesquisas atualmente. Ademais, tem mostrado sua inigualável capacidade de aglutinar velhos aliados e arrastado para sua órbita figuras importantes nas suas visitas aos estados. Mas Lula e Bolsonaro estão distantes, jogando numa primeira divisão da política que parece inatingível para os demais.

É bem verdade que a mesma decisão do STF que colocou Lula de volta no páreo também facilitou as coisas para alguns desses pré-candidatos da “segunda divisão”. O pelotão intermediário tinha Sergio Moro como candidato melhor posicionado nas pesquisas. O Supremo tornou o ex-juiz suspeito e o jogou para longe da disputa presidencial. O ex-superministro de Bolsonaro também fez seu papel, sendo contratado por um escritório que presta serviços às empresas que ele condenou quando era juiz.

Sem Moro, ainda disputando essa segunda divisão tínhamos Ciro Gomes, João Doria, Luiz Henrique Mandetta, Luciano Huck e João Amoêdo. E, por mais que possa parecer piada, visto que envolve um humorista, Danilo Gentili correria por fora, impulsionado pelo MBL. 

O apresentador Huck optou por aceitar o desafio de comandar os domingos da Globo, esvaziando suas possibilidades de participar de um pleito presidencial, ao menos no momento. Amoêdo se viu espremido pelo seu partido – meio oposição, meio bolsonarista – e desistiu da corrida. Mandetta não consegue se desvencilhar do emaranhado em que se transformou o DEM, também com metade da sua trupe totalmente alinhada ao bolsonarismo.

De sobreviventes, assim, teríamos hoje, porque o Brasil não nos deixa fazer análises perenes, João Doria e Ciro Gomes. Por coincidência, os dois deram uma guinada em suas estratégias de comunicação digital de uns tempos pra cá, com efeitos importantes na performance de suas redes sociais online. Não haverá mais eleição sem que essa performance se constitua como um recurso eleitoral importante. Ignorá-la é uma decisão de altíssimo risco. 

Ciro Gomes apostou num super vitorioso publicitário para ajustar seu posicionamento e tentar cativar um público para além de seu combativo mas insuficiente agrupamento nas redes. De lá pra cá, escolheu reforçar os ataques ao PT e principalmente a Lula e seu legado, para tentar angariar mais atenção. 

Já João Doria saiu de uma estratégia tradicional (mas muito bem sucedida em 2016, por exemplo) de suas redes, que mantinha até meses atrás, para se aventurar no embate direto, irônico e sarcástico ao poderoso bolsonarismo no campo digital. Com um pouco mais de humor, tentando ser mais “lacrador” – se bem que despolitizado –, apostando na principal bandeira de sua curta vida política: a vacinação, com base no sucesso e alcance da CoronaVac. 

De acordo com os dados, um está em baixa e o outro em alta. Senão vejamos alguns números:

Neste ano, Doria conseguiu mais de 147 mil seguidores no Twitter, enquanto Ciro aumentou sua base em 116 mil. Vale destacar que o crescimento do pedetista arrefeceu consideravelmente após a mudança de posicionamento a partir de abril.

 

Outro dado interessante é o volume de interações. Ciro ainda tem um somatório total maior que Doria no Twitter em 2021, mas o peesedebista está em tendência de alta, enquanto o pedetista está em queda.

 

Ainda no Twitter, outra situação envolvendo Ciro chamou a atenção. A campanha “Picanha e Cerveja”, realizada na segunda (14), questionando a efetividade das entregas dos governos petistas, ficou espremida no seu agrupamento já fidelizado. Conforme evidenciado no grafo a seguir, o único agrupamento fora do nicho cirista que manteve alguma interação com o assunto foi justamente o de apoiadores do presidente Lula criticando o pedetista. Não houve, contudo, nenhuma figura do primeiro escalão do PT que se dignasse de responder às provocações da referida campanha. 

Os petistas (em vermelho) representaram cerca de 30% das publicações. Em azul, perfis de ciristas (42%), satélite ao agrupamento verde, que se constituiu em torno do próprio Ciro (28%). Isto é, além de estar sendo duramente rechaçado por petistas, Ciro não têm conseguido a atenção de outros agrupamentos, tais como órfãos do lavajatismo, liberais e o que restou dos centristas.

Grafo de menções no Twitter sobre a campanha “Picanha e Cerveja” em 14 de junho até às 18h

 

Nas outras redes sociais o cenário não é muito diferente. Doria tem conseguido se recuperar ou ao menos se manter, enquanto Ciro aparece em queda em vários dos indicadores.

 

 

 

No YouTube, Ciro tem folga na liderança em termos absolutos frente aos outros nomes da terceira via. Contudo, de uns meses para cá, apesar de ter aumentado o número de vídeos postados – sempre bem produzidos – as visualizações têm despencado, acompanhando o observado em outras redes. Cabe ressaltar que o YouTube é uma rede de amplo domínio bolsonarista, o que dificulta ainda mais qualquer bom resultado de outros nomes.

 

É bem verdade que Ciro precisa inovar para ampliar sua base de diálogo e aumentar seu alcance. A via da esquerda se mostra ocupada com Lula. Até agora, sua estratégia de atacar o petista, virando-se contra seu passado como ministro no governo Lula, e dialogar com valores partilhados por bolsonaristas, como o voto impresso, não tem conseguido bons resultados nem nas redes nem nas pesquisas de intenção de voto. 

Doria, por sua vez, não fez movimentos tão bruscos. Adequou seu posicionamento e tem uma bandeira forte: a vacina CoronaVac. Aderiu ao humor e tem lacrado nas redes, chamando a atenção novamente. 

O momento é oportuno para os dois postulantes testarem. E a contingência das dificuldades encontradas pelos outros nomes alternativos à polarização ainda favorece a consolidação desse segundo pelotão, que vai se desgarrando da confusão. Faltando mais de um ano para o início oficial da campanha de 22, o tempo também permite eventuais correções. Não é tarefa fácil, Lula e Bolsonaro têm ampla vantagem no debate digital e nas pesquisas de intenção de voto. Os recursos eleitorais ainda estão bastante concentrados na dupla e, se a gravidade operar sem resistências, vão acabar se concentrando ainda mais.

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