Nunca houve um jogador de futebol igual a Rogério Ceni. Não que ele seja o maior goleiro da nossa história, longe disso. Rogério jamais foi titular da seleção brasileira e é provável que não seja sequer o melhor goleiro da história do São Paulo, mas ele tem uma peculiaridade que não me lembro de ter visto antes: os torcedores do São Paulo, sem exceção, o veneram; os torcedores dos demais clubes, sem exceção, o detestam. Semana passada Rogério declarou que o São Paulo parou no tempo. Não sei se essa é a melhor explicação, mas creio que ele não está de todo errado. Pelas minhas contas, de 2009 pra cá o São Paulo participou de 16 competições e venceu apenas uma – justamente a mais fuleira delas.
Um momento emblemático desse longo período de seca são-paulina aconteceu na apresentação dos seis reforços contratados pelo clube para a temporada de 2010: Xandão, André Luís, Carlinhos Paraíba, Léo Lima, Marcelinho Paraíba e Fernandinho. O que estava por trás dessa lista sinistra não era falta de dinheiro, ausência de planejamento ou ralo conhecimento futebolístico. A palavra que melhor explica a opção por aqueles pretensos reforços é essa: soberba.
Durante muito tempo o São Paulo acreditou que planejamento e organização – de resto, indispensáveis – resolveriam tudo. Qualquer que fosse o nível técnico do contratado, bastava vesti-lo com a camisa tricolor que daria certo. Isso funcionou até 2008, quando duas mudanças fundamentais mexeram com a estrutura do futebol brasileiro: a crise na Europa e o aumento brutal nas receitas dos nossos clubes, por causa da grana da tevê e dos patrocinadores. Os maiores clubes europeus continuam fazendo suas contratações milionárias – sobretudo os russos, que entendem mais de lavanderias do que de futebol –, mas deixou de ser aquela festa generalizada e irrestrita. Por outro lado, o dinheiro dos patrocínios e das cotas televisivas deu aos nossos clubes uma possibilidade que, até 2005, 2006, não existia: a de trazer grandes jogadores. Foi assim que Adriano, Deco, Fred, Ronaldinho Gaúcho, Renato Augusto, Pato, Zé Roberto, Emerson e outros voltaram ao Brasil. Além disso, essa grana permitiu aos clubes começarem a se ajeitar e – apesar da maioria deles insistir em fazer um monte de bobagens – há muito o São Paulo deixou de ser o único clube organizado do país. Hoje temos o Cruzeiro, o Inter, o Corinthians, o Grêmio, a nova diretoria do Flamengo parece empenhada em fazer as coisas certas, etc. E aí vale rever e atualizar Neném Prancha, inspirado filósofo do futebol da Praia de Botafogo: se organização e planejamento ganhassem jogo, o campeonato alemão terminava empatado.
Falar em rebaixamento do São Paulo é uma precipitação e um desatino. A não ser que o mundo caia, não vejo a menor chance do São Paulo seguir para a segundona. Mas para voltar a conquistar títulos como os de 2005, 2006, 2007 e 2008, Rogério tem razão: o clube precisa correr para recuperar o tempo perdido.