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    Com um clique e um zumbido, sou empurrada para o interior do aparelho. Minha cabeça está amarrada e estou envolvida por um cobertor de forma que eu possa tocar minha virilha – meu clitóris em especial – com certo grau de modéstia. Não estou aqui para um procedimento médico ou para um filme erótico. Em vez disso, estou prestes a me estimular até o orgasmo enquanto um aparelho de ressonância magnética funcional rastreia o fluxo do sangue em meu cérebro.

Questões da Ciência

Um orgasmo pela ciência

Num laboratório americano, uma repórter se submeteu a um experimento no qual se masturbou até alcançar o orgasmo enquanto um aparelho de ressonância magnética funcional rastreava o fluxo do sangue em seu cérebro. Ao entender as regiões cerebrais ativadas durante o estímulo sexual, os cientistas esperam poder desenvolver tratamentos para mulheres com dificuldades para atingir o orgasmo.

Bernardo Esteves | 20 maio 2011_14h44
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Assim começa uma reportagem da revista New Scientist sobre um estudo que busca investigar os mecanismos cerebrais envolvidos no orgasmo feminino. A repórter Katy Sukel tomou parte do estudo da equipe de Barry Komisaruk, da Universidade Rutgers, no estado americano de Nova Jersey. A jornalista masturbou-se até alcançar o orgasmo, que ela sinalizou aos pesquisadores levantando a sua mão livre.

A ressonância magnética mostrou a ativação do córtex pré-frontal de Sukel tanto durante a masturbação quanto em exercícios mentais nos quais ela apenas imaginava que estava se tocando. A equipe de Komisaruk foi a primeira a mostrar uma ativação dessa área no orgasmo feminino. Em estudos parecidos, outros pesquisadores obtiveram resultados contraditórios, o que pode indicar que há mais de um caminho fisiológico para se alcançar o orgasmo.

O aparelho de ressonância magnética funcional permite monitorar as variações do fluxo sanguíneo no cérebro – uma forma indireta de se identificar as áreas mais ativas durante uma determinada atividade. Num experimento como esse, o voluntário se deita em uma cama, tem sua cabeça imobilizada e depois introduzida no aparelho, no qual é submetida a um campo magnético que permite mapear a atividade cerebral (uma foto do aparelho ilustra um post anterior deste blog).

A neurocientista Suzana Herculano-Houzel, da UFRJ, participou certa vez como voluntária de um desses estudos. Mais acostumada a estar do lado de quem esmiúça o cérebro alheio, ela relatou a experiência em seu blog:

Parecia que meu corpo estava afundando, meu cérebro formigando. Pensei até que pudesse estar tendo um ataque de ansiedade, mas então conferi mentalmente o que eu sabia sobre a máquina: o campo magnético fica ligado o tempo todo, é preciso entrar nele devagar para que a atividade elétrica do corpo todo possa se ajustando lentamente, e sensações estranhas são comuns, mas logo passam (li uma vez que o pessoal do CERN, na Suíça, andava brincando de enfiar a cabeça no campo magnético do sincrotron para “dar barato”…). Por via das dúvidas, resolvi respirar fundo e devagar até me convencer de que tudo continuava bem.

Nesse caso específico, Herculano-Houzel reagia a frases variadas que ela lia de dentro do aparelho – o objetivo dos pesquisadores era entender mecanismos cerebrais dos vínculos afetivos entre pais e filhos. Estudos desse tipo podem investigar como o cérebro reage aos mais diversos estímulos – piadas, fotos, cheiros, sabores. No caso da pesquisa feita em Rutgers, a ideia era entender o que acontece no cérebro durante o orgasmo feminino.

O experimento de que Katy Sukel tomou parte pode ajudar a entender por que algumas mulheres têm dificuldade de atingir o orgasmo. Barry Komisaruk tem a intenção de mostrar a algumas delas em tempo real o padrão de sua atividade cerebral durante o estímulo sexual. “A esperança é que esse feedback possa ajudá-las a manipular sua atividade cerebral para aproximá-la do padrão de atividade durante o orgasmo”, conta a jornalista.

Katy Sukel não é a primeira repórter a se voluntariar para participar de um experimento de neurociência. No Brasil, o jornalista Marcelo Leite foi cobaia de um estudo realizado no Instituto Internacional de Neurociências de Natal (IINN). Com a cabeça e o peito cobertos por 29 eletrodos, ele passou duas noites (traumáticas) num dormitório do IINN e participou de sessões de videogame antes e depois de dormir. O objetivo da pesquisa era investigar uma possível função evolutiva dos sonhos. Marcelo Leite não precisou se despir. O relato de sua experiência está na piauí 27.

Imagem: detalhe de Orgasmo, foto de Greg Simon (CC 2.0 BY-SA)

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